Fim do diferimento de passivos | Novo tratamento para a contabili...

OLIVEIRA: impacto maior na EuropaDANIELLI: impacto imediatoEdição 239

 

Enquanto o mercado brasileiro aguarda a abertura de audiência pública para analisar as novas regras internacionais de contabilização de benefícios, cresce a preocupação das patrocinadoras que possuem desequilíbrios nos passivos atuariais. Existe a previsão de que o Comitê de Pronunciamentos Contábeis (CPC) coloque em audiência pública nas próximas semanas a primeira versão da tradução da IAS 19,  atualizada internacionalmente em meados do ano passado. Até o final do ano deve ser publicada a CPC 33, que atualiza a IAS 19 para o mercado nacional. As novas regras devem estar em vigor já no ano que vem.

“Existem ainda algumas dúvidas quanto à atualização das regras internacionais, mas esperamos um certo impacto para as empresas no Brasil em razão das alterações da IAS 19, principalmente para aquelas que não vinham realizando adaptações graduais nos últimos anos”, avalia o diretor técnico da Gama Consultores Associados Cesar Luiz Danielli. A IAS 19 foi publicada em junho de 2011, porém o Comitê de Pronunciamento Contábil, órgão que regula a questão no Brasil, ainda não preparou a versão nacional do documento, denominado CPC 33.

A principal preocupação gira em torno da extinção do diferimento de ganhos e de perdas atuariais ao longo do tempo. As novas regras impõem o reconhecimento imediato de tais desequilíbrios com os passivos, enquanto as orientações anteriores permitiam a amortização no caso de perdas. Era a opção ao denominado “método corredor” que permitia o reconhecimento de déficits ao longo do tempo. “As empresas tinham a prerrogativa de amortizar ganhos ou perdas dos planos de benefícios ou colocá-los dentro do resultado líquido. Com as novas regras, terão que reconhecer imediatamente tanto os ganhos quanto as perdas”, explica o consultor senior da Towers Watson Evandro Oliveira.

O consultor da Towers minimiza, porém, os impactos negativos sobre os balanços das empresas no Brasil, pois ele acredita que a maioria delas vinha se adaptando às mudanças nos últimos anos. “Os balanços das empresas no Brasil vem convergindo para as orientações de reconhecimento do passivo de acordo com as regras internacionais. Acredito que o impacto negativo não será generalizado, devendo afetar apenas algumas empresas que deixaram para se adaptar na última hora”, analisa Oliveira. Ele não tem uma dimensão do tamanho do impacto, mas afirma que certamente será muito menor do que na Europa, onde as empresas estão sofrendo com a adaptação às mudanças da IAS 19. “No Brasil veremos problemas pontuais, não será como na Europa onde as mudanças impactam setores inteiros”, compara.

Danielli, por sua vez, espera que os impactos sejam mais significativos. “Empresas com planos de benefícios com passivo significativo e exposição elevada a ativos com maior risco serão objeto de uma análise mais minuciosa pelas partes interessadas”, afirma. De acordo com as novas orientações da IAS 19, perdas superiores a 10% do tempo de serviço futuro deverão ter reconhecimento imediato, ou seja, não contarão mais com a alternativa de amortização.

O consultor da Gama explica que as novas regras poderão provocar uma revisão generalizada dos procedimentos de gestão de risco aplicados aos benefícios pós-emprego. Ele admite, porém, que muitas empresas no Brasil já vinham optando em reconhecer os desequilíbrios de planos de benefícios em seus balanços.

Demora na atualização – A demora na tradução e adaptação da IAS 19 poderá implicar em atraso na elaboração de consenso quanto à interpretação de alguns dos requisitos”, diz Danielli. Em todo caso, as empresas de consultoria contábil estão buscando se antecipar para prever os impactos e mudanças nos balanços, tanto de companhias listadas na Bovespa, quanto de empresas não-listadas.

Segundo o consultor da Gama, as regras de contabilização da IAS 19 têm o objetivo de padronizar o tratamento conferido ao risco dos planos de benefícios, administrados em sua maioria, pelas entidades fechadas de previdência complementar. Desta forma, facilitam a leitura e interpretação dos balanços das empresas por parte dos investidores.

Apesar do maior peso dos passivos dos fundos fechados de pensão, também são consideradas obrigações com benefícios de fundos abertos de pensão, bem como planos de saúde e pensões, sempre que implicarem em responsabilidade da empresa após o desligamento ou aposentadoria de seus funcionários.

Uma das dúvidas que ainda persiste entre os consultores é o tratamento conferido aos planos de benefícios com mais de um patrocinador. “Ainda não sabemos se a contabilização vai gerar o mesmo impacto para todos os patrocinadores de um mesmo plano, ou se devem ser considerados individualmente”, diz Evandro Oliveira, da Towers Watson. Ele esclarece porém que esse problema não deve ocorrer com as empresas que participam de fundos multipatrocinados, mas com planos segregados. Neste caso, teoricamente os planos são administrados de forma independente e segregada, e cada um possui um balanço próprio.

Aspectos positivos – Os impactos esperados pelas mudanças na IAS 19 não são apenas negativos. As atualizações nas regras também podem ter consequências positivas para os balanços das empresas, em caso de superávits dos planos de benefícios. Além disso, devem ajudar na padronização e transparência na contabilização dos benefícios pós-emprego. “As novas regras devem permitir melhor comparabilidade através da extinção do pressuposto de retorno esperado dos ativos do plano. As empresas que partiam do pressuposto de que taxas elevadas de retorno esperado dos ativos iriam automaticamente melhorar os seus lucros, irão provavelmente verificar uma mudança na análise de indicadores de desempenho”, diz Danielli. Tal mudança provavelmente terá que ser explicada para investidores e analistas.

As empresas devem acelerar as mudanças no sentido de reduzir os riscos dos planos de benefícios. Os planos do tipo de benefício definido, neste sentido, terão que enfrentar mais um fator contrário a sua manutenção, o que já vem ocorrendo sistematicamente nos últimos anos. “As empresas terão mais um motivo para centrar as atenções na transferência de risco de planos de benefício definido. Em vez de assegurar passivos crescentes, pode ser mais vantajoso para a empresa a transferência do risco de sobrevivência para uma companhia de seguros”, diz o consultor da Gama.

Outra possível consequência das novas regras será a atualização da análise de longevidade com os funcionários que terão direito aos benefícios pós-emprego. Desta forma, as empresas e seus fundos de pensão devem ter maior preocupação em atualizar as tábuas de mortalidade dos planos de benefícos. “Uma alteração no crescimento da sobrevivência, com base em testes de aderência da tábua de mortalidade adotada, é provavelmente a forma mais atrativa de analisar o risco de longevidade”, explica Danielli.

Em geral, as novas regras da IAS-19 tendem a provocar uma padronização das premissas utilizadas tanto pelos fundos de pensão quanto pelos balanços das empresas. Até agora, permanecia uma brecha para que os balanços tivessem um tratamento mais flexível para as premissas dos planos de benefícios, enquanto as entidades fechadas vinham tratando com maior rigor o enfrentamento de desequilíbrios atuariais. “As novas regras trazem hipóteses mais factíveis para a publicação dos balanços, mais compatíveis com a realidade atual do mercado”, defende Danielli.

 

Principais consequências da revisão

1. Melhor comparação entre as informações dos benefícios nos balanços com a extinção do pressuposto de “retorno esperado dos ativos do plano”. Espera-se que as empresas utilizem a taxa de juros de desconto atuarial, na medida em que o impacto é imediato na conta de resultados, ao invés de utilizar a taxa de retorno esperada para os ativos do plano.

2. Reconhecimento de ganhos e perdas: as empresas que recorrem ao reconhecimento diferido e possuem grandes perdas atuariais em suas fundações irão se deparar com uma mudança radical no seu balanço. Contudo, há uma potencial melhoria nos lucros futuros.

3. Atenção à longevidade: uma alteração no crescimento da sobrevivência, com base em testes de aderência da tábua, é a forma mais atrativa de analisar o risco de longevidade.

4. Aumento do interesse pela transferência de risco de planos BD: Em vez de assegurar, em seus balanços, passivos crescentes, pode ser mais vantajoso para a empresa a transferência do risco de sobrevivência para uma companhia de seguros.