Os fundos de pensão se preparam para aumentar o nível do risco em suas carteiras em 2019, diante da perspectiva de taxa básica de juros estável em 6,5% ao menos durante o primeiro semestre. Renda variável doméstica e crédito privado são as duas classes que mais despertam o interesse dos institucionais. Na divisão por veículos, os fundos multimercados são o grande destaque, por sua flexibilidade para navegar entre os ativos ao sabor das mudanças do cenário que promete volatilidade.Na Fundação Celos, entre os planos para enfrentar o cenário de juros baixos, o diretor administrativo financeiro, Henri Machado, cita a migração da exposição hoje de aproximadamente 3% do total de R$ 3 bilhões da carteira em multimercados institucionais, que concentram sua atuação na renda fixa, para os multimercados estru-
turados, que preveem um retorno superior aos seus pares mais conservadores através de uma atuação mais diversificada
Segundo Machado, a rentabilidade dos multimercados institucionais fica, em média, próxima de 105% a 110% do CDI, e não farão mais frente à meta atuarial da fundação, de inflação mais 5,34% (no plano de Benefício Definido) e 5,13% (no plano de Contribuição Variável). No acumulado de 2018, até novembro, o retorno do CDI ficou em 5,90%. “Já em alguns multimercados estruturados é possível encontrar taxas de retorno de até 130% do CDI, e serão esses os veículos no radar da Celos”, diz o dirigente. Além de migrar de multimercados institucionais para estruturados, a fundação também pretende aumentar dos atuais 3% para 5% sua alocação no nicho.
Títulos públicos – Segundo Machado, mesmo os títulos públicos, com retorno atualmente ao redor dos 5%, poderão ser adquiridos pela Celos, já que ela conta com uma carteira de títulos marcados na curva com cupom médio de inflação mais 6,40%, tendo assim a possibilidade de adquirir papéis com taxas um pouco menores para diluir os ganhos, que mesmo dessa forma seguirão acima de seu atuarial.
Na Fundiágua, o diretor financeiro, Mário Figueiredo, vai monitorar o mercado de títulos públicos para aproveitar as oportunidades que devem surgir em momentos de maior volatilidade. “Quando as discussões em torno da reforma da previdência começarem a avançar, é natural que ocorra uma queda de braço com o Congresso durante a contagem de votos, e deveremos ter um aumento das taxas das NTN-Bs nesse período”. As taxas dos títulos públicos atrelados à inflação estão hoje ao redor de 5,1%, e chegando em 5,5% quando houver algum estresse de mercado já estarão em patamar suficientemente elevado para serem encarteiradas pelo fundo de pensão.Na Derminas, o gestor de investimentos, Adilson Soares, conta que também estará no radar da entidade potenciais oportunidades que devem aparecer nas NTN-Bs. Soares ressalta que em 2019 estão programados vencimentos na carteira da Derminas, de NTN-Bs e letras financeiras, que devem representar cerca de 10% do PL de R$ 480 milhões da fundação, e que precisarão ser reinvestidos. “Estamos bastante atentos às oportunidades que podem aparecer nos títulos públicos para manter a solvência da nossa carteira”.
Em um plano B, caso não consiga encontrar NTN-Bs com prêmios satisfatórios a Derminas vai usar uma parte dos recursos oriundos dos vencimentos para alocar em fundos IMA-B 5. “Mesmo que esses fundos não estejam com retorno acima da nossa meta, que é de INPC mais 4,5%, ao menos eles terão retorno melhor que o do CDI”.
Renda variável – Na renda variável, a Celos prevê aumentar a exposição atual, hoje em R$ 165 milhões, e que deve subir para R$ 190 milhões, via uma maior diversificação da base de gestores terceirizados. A fundação adotou a política de não ter mais de 1% do PL do plano, ou cerca de R$ 24 milhões, em nenhum gestor, por mais positivo que seja o retorno entregue. Para o diretor, diante do atual patamar do Ibovespa, próximo de sua máxima histórica, a Celos vai privilegiar os gestores ativos, que no curto prazo tendem a entregar uma performance superior à média do mercado. “Devemos optar por fundos de ações abertos, de alta liquidez e com volume grande, para não termos nenhum tipo de dificuldade para entrada ou saída”.
Apesar da bolsa já ter tido forte desempenho em 2017 e 2018, Machado entende que os espaços para ganhos no segmento continuam. “Se analisarmos o preço da bolsa em dólar ela ainda está muito defasada em relação a outros países emergentes”, pondera o diretor, que reconhece, contudo, as dúvidas que se fazem presente no horizonte sobre o sucesso do novo governo em suas articulações no Congresso para ser bem sucedido na aprovação das reformas de ajuste fiscal.
Na Fundiágua, a exposição em renda variável, hoje por volta de 4% do plano de Contribuição Definida (CD), deve saltar para até 10%, também com foco em fundos de gestão ativa. Da mesma forma, a alocação em multimercados, atualmente ao redor de 3%, deve chegar a 6% no decorrer do ano que se inicia. Tanto em ações como nos multimercados os aumentos ocorrerão tanto com novas alocações em gestores já em carteira como também via a seleção de novas casas para o portfólio. Como o plano CD da fundação tem entradas líquidas mensais de contribuições da ordem de R$ 4 milhões, não serão necessárias reduções em renda fixa para aumentar a exposição seja em bolsa ou nos multimercados.
Na Ceres, a intenção é manter a alocação próxima do nível atual, ao redor dos 10%, sem grandes alterações no mix do portfólio, mas com um possível ativismo maior da gestão interna da fundação na compra e venda de papéis na bolsa diante do atual patamar da bolsa que pode gerar uma limitação de novos ganhos à frente apenas com uma gestão passiva.“Temos uma carteira de ações prudente, com papéis blue chips como, Itaú, Bradesco, Vale e Petrobras. São empresas sólidas com boas perspectivas de pagamento de dividendos”, comenta o diretor de investimentos, Dante Scolari, que se aposentou em dezembro de 2018 após oito anos no cargo. Em seu lugar assume o então diretor de seguridade da Ceres, José João Reis. Na fundação da Embrapa a expectativa é que a bolsa tenha um desempenho positivo ao redor dos 16% em 2019.
Já a Derminas não tem atualmente nenhuma aplicação direta ao mercado acionário, sem considerar a exposição via multimercados, e tendo em vista as incertezas no horizonte, e também o patamar no qual se encontra o Ibovespa, se trata de um segmento que no momento não desperta o interesse da entidade.
“Caso a bolsa volte a atrair nosso interesse, seja por uma maior clareza do cenário à frente, ou caso haja uma realização que gere um ponto de entrada atrativo, iremos resgatar parte dos recursos nos multimercados para colocar nas ações”, diz o gerente de investimentos Adilson Soares, acrescentando, que, por conta do cenário incerto, o aumento do risco no portfólio tem sido evitado.
Ao longo de 2018 a tomada de risco pelo fundo de pensão mineiro se deu via multimercados estruturados, que hoje representam cerca de 4,5% da carteira. A Derminas tem exposição aos multimercados da Bahia Asset, Safra, SPX, Canvas e Kinea. Soares nota que pouco após a alocação nos fundos houve a greve dos caminhoneiros, e alguns dos multimercados que receberam investimentos ainda estão se recuperando do tombo sofrido. O gerente diz que ainda deve acompanhar por mais alguns meses a performance dos veículos para então decidir se vai promover alguma troca na carteira.
COEs – Ainda dentro do universo dos fundos multiativos, começa a ganhar espaço na indústria dos fundos de pensão os Certificados de Operações Estruturadas (COEs), ou fundos de capital protegido, uma espécie de multimercado que pode transitar entre as diversas classes de ativos do mercado, principalmente por meio de operações com derivativos, e que em caso de desempenho negativo o investidor tem seu principal garantido.
A Celos já fez em 2018 seu primeiro investimento em um COE estruturado pela CM Capital Markets como forma de aprendizado, e sentiu a necessidade de aprimorar suas áreas de controles e compliance para um melhor acompanhamento das operações realizadas pelo fundo, processo que está agora em andamento.
“Tem uma série de bancos estrangeiros oferecendo COE aos fundos de pensão”, nota o diretor financeiro da Fundiágua, onde os COEs também tem sido uma alternativa monitorada.
Risco suficiente – Na VivaPrev, o lema é ‘em time que está ganhando não se mexe”. A carteira de renda variável da entidade teve retorno de 22,43% em 2018, até novembro, contra a alta de 17,15% do Ibovespa no mesmo período, por meio de um mix entre fundos passivos e estratégias ativas. Tendo em vista o bom resultado obtido, para 2019 a tendência é permanecer do jeito que está, diz o presidente interino do fundo de pensão, Júlio César Alves. A ARX é a atual gestora responsável pelo fundo ativo de ações na entidade.
“Com as indicações de que a inflação deve seguir sob controle mesmo com a aceleração no ritmo da atividade, diante do hiato do produto que ainda se faz presente na economia, permitindo manter a Selic no mesmo patamar em que se encontra, a renda variável deve seguir sendo a melhor opção no cardápio de investimento do fundo de pensão nos próximos meses com a provável intensificação nos resultados positivos das empresas”, diz Alves.
O dirigente lembra que a VivaPrev já tem cerca de 15% em ações, bem acima da média da indústria de previdência fechada de 7,27%, e portanto não existe a intenção de aumentar esse percentual ainda mais.
Ainda segundo a avaliação do presidente da fundação, o risco do mercado de renda variável é mais palatável, em sua percepção, se comparado com o de crédito privado. “O risco que os ativos de crédito embutem em nossa carteira é elevado. De dez operações com risco de crédito, posso ser muito bem sucedido em nove, mas se uma der problema, o impacto pode ser bastante significativo”, afirma Alves, que prefere a diversificação possível de ser obtida por meio das estratégias disponíveis na bolsa.
O dirigente nota que é preciso manter alguma cautela na estratégia da fundação, tendo em vista o horizonte político e econômico incerto, e também o grau elevado de maturidade da população de segurados. A VivaPrev paga anualmente cerca de R$ 280 milhões em benefícios aos seus participantes, cerca de 10% dentro de um patrimônio total na casa dos R$ 2,8 bilhões.
Crédito – Já na Celos o mercado de crédito privado é outra opção que também volta ao radar em 2019. A entidade ficou ausente do segmento nos últimos anos, após uma experiência negativa em períodos anteriores. O fundo de pensão ainda carrega em balanço ativos emitidos pelo antigo banco PanAmericano, adquiridos por gestões anteriores, e que a atual diretoria tem trabalhado para tentar vendê-los. “No entanto, as emissões de títulos privados de alta qualidade que tem vindo a mercado, e que serão o foco da entidade a partir de agora, ainda não estão com taxas suficientemente atraentes”, ressalta Machado.
“Confirmada a retomada da economia prevista, caso as reformas avancem como estamos esperando, as empresas vão voltar a investir, e terão de tomar recursos no mercado para se financiar, o que pode gerar boas oportunidades de investimento em nossa percepção”, prevê o diretor de investimentos da Ceres, Dante Scolari. A entidade comprou em 2018 cerca de R$ 300 milhões em Letras Financeiras de alta qualidade com taxas ao redor de 6,5%, frente à sua meta de 5,5%, com uma gordura caso algum outro investimento não vá tão bem. “Vamos seguir em busca de ativos com essas características”, afirma Scolari.
O dirigente diz também que enxerga no perfil pró-mercado do novo governo, que tem sinalizado a intenção de promover uma série de privatizações, potenciais oportunidades a serem aproveitadas pelas EFPCs, assim como já ocorreu em ciclos anteriores. “Eventualmente podem aparecer bons ativos para serem avaliados pelas fundações”.
Exterior – Sobre a alocação no exterior, Machado, da Celos, afirma esse é um nicho que deve ficar restrito aos multimercados estruturados, já que ainda haveria alguma dificuldade para fazer de maneira adequada o necessário acompanhamento de uma alocação feita diretamente em ativos internacionais. A Previc, em visita recente à entidade catarinense, questionou-a sobre os controles internos para acompanhar a evolução da alocação internacional dentro dos seus multimercados.
Scolari, da Ceres, também não demonstra entusiasmo com o segmento internacional para o curto prazo diante da volatilidade esperada no front global. “No atual patamar do câmbio, na casa dos R$ 3,90, caso o governo Bolsonaro entregue as medidas esperadas pelo mercado, a tendência é de valorização do Real, com potencial impacto negativo para as aplicações internacionais”, aponta o diretor de investimentos.
Já a Fundiágua incluiu em sua política para 2019 um percentual de até 3% do plano CD em fundos de investimento no exterior. A alocação deverá ser em um fundo de renda variável sem o hedge cambial.
FIPs – Em relação aos Fundos de Investimento em Participações (FIPs), Machado, da Celos, comenta que a fundação “ainda está muito machucada”, por conta de investimentos que não trouxeram retornos positivos no passado recente, e que junto com a carteira de crédito contribuíram para os planos de equacionamento de déficit em curso no fundo de pensão. “Estão começando a aparecer novos produtos, temos recebido algumas visitas de gestores e monitorado o segmento, mas não acredito que já em 2019 faremos algum investimento em FIPs”. A Celos ainda tem em carteira o FIP PCH, que está em fase de desinvestimento.
Na Ceres, Scolari afirma que estruturados, como FIPs e FIIs, seguirão sem atrair interesse em 2019, assim como na Fundiágua. “O cenário futuro, de juros baixos, está muito condicionado ao sucesso do novo governo. Por isso vamos aumentar a alocação de risco, mas sempre em ativos líquidos, e monitorando o cenário. Não estamos contemplando ativos ilíquidos como FIPs”, afirma Figueiredo, da Fundiágua.
Também na VivaPrev, até mesmo por se tratar de uma população já madura, e considerando as incertezas no horizonte, investimentos em fundos estruturados como FIPs ou FIIs estão completamente descartados, de acordo com o presidente Júlio César Alves.