Edição 155
Dia 28 de fevereiro é a data final. A maior entidade de previdência fechada do País, a Previ, vai passar a régua em todas as pendências, antigas e espinhosas, que envolvem o cálculo de seus benefícios. Isso inclui chegar a um valor mais baixo para a Parcela Previ (PP), que ainda se encontra supervalorizada ocasionando o achatamento do valor da aposentadoria de seus participantes.
Desde 1997, a PP vinha sendo corrigida por um índice de inflação superior ao utilizado no reajuste dos salários. Só em junho último, o Índice Geral de Preços no conceito Disponibilidade Interna (IGP-DI) foi trocado pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC), que fica mais em linha com os índices utilizados nas reposições sala-riais. A troca, entretanto, não foi suficiente para equacionar essa conta, uma vez que o reajuste segue sendo feito sob uma base inflada. Ou seja, é preciso tirar a gordura que a supervalorização deixou neste valor.
A PP funciona como um substituto ao teto de benefícios pagos pelo Instituto Nacional de Seguridade Social (INSS). Logo, a aposentadoria paga pela Previ é a diferença entre o valor da PP e a média de salários que o participante teve na ativa. Ao ser redu-zido o valor da PP, os benefícios concedidos pelo fundo de pensão têm, naturalmente, um acréscimo.
A PP vale hoje R$ 2.057,00. Os participantes chegaram a uma cifra de R$ 1.373,00, que seria o valor corrigido da PP desde que ela foi criada pela mesma correção concedida aos salários dos funcionários do Banco do Brasil (BB) no período. Já o banco apresentou um valor de R$ 1.440,00 para a PP. Apesar de os números serem próximos, eles representam bilhões de reais em um curto espaço de tempo.
Apenas como efeito de comparação, um aposentado que contribuiu em tempo integral para a Previ e que venha a se aposentar hoje receberia um acréscimo de mais de R$ 600,00, caso a PP fosse reduzida dos atuais R$ 2.057,00 para algo próximo de R$ 1.400,00, conforme defendem os trabalhadores. Isso também vale, proporcionalmente, para quem tem tempo menor de contribuição.
Os participantes, liderados pela Comissão de Empresas do BB, tinham a predisposição em aceitar o valor, porém o cálculo apresentado pelo banco para se chegar até esse valor deixou-os receosos. O índice de reajuste usado pelo BB foi o crescimento da massa salarial dentro do banco. Os participantes temem que, no futuro, esse cálculo, de domínio e manuseio exclusivo do BB, possa ser distorcido e usado para inflar novamente a PP.
“Os valores estão próximos, de fato, mas não é uma questão de negociar apenas isso. O número ao qual chegamos é a correção exata do valor dos salários no decorrer do período. Já o valor do banco é feito por um cálculo no qual entram outras variantes que podem distorcê-lo, como o crescimento do número de agências ou a forma de crescimento no valor dos salários”, analisa um dos membros do Conselho Deliberativo da Previ e presidente da Associação Nacional de Funcionários do BB (Anabb), Valmir Marques Camilo.
As partes colocaram no papel o compromisso de resolver a questão até o final de fevereiro. Afinal, o BB também está disposto a solucionar a pendência, até porque a instituição não quer correr o risco de, mais para frente, ter que aportar recursos na fundação para cobrir eventuais déficits. Já os participantes, com a fatura da eleição do presidente Lula nas mãos, querem zerar suas pen-dências agora, já que 2006 já será um terreno politicamente movediço.
Na mesa de negociações estão os representantes da gerência executiva de relações com os funcionários do BB, Carlos Néri e Vassili Chaves, o representante da comissão de empresas do BB, Marcel Ramos, o presidente da Associação Nacional dos Funcionários do Banco do Brasil (Anabb), Valmir Camilo, os conselheiros da Previ, José Wilson e José Ricardo Sasseron, além do diretor de investimentos da Previ, Luiz Carlos Aguiar.
Paridade – Com a contribuição nos moldes de “um para um”, o Banco do Brasil aceita reduzir a PP, mas não no valor proposto pelos participantes. Estuda-se que o dinheiro que solucionaria a questão viria do Fundo Paridade, que tem cerca de R$ 5 bilhões provenientes de superávits da Previ e que foram provisionados devido à ações judiciais dos bancários de Brasília e São Paulo. Ou seja, este dinheiro está preso judi-
cialmente e, a rigor, quando liberado pertencerá em partes iguais ao banco e à Previ. Logo, o banco aceita colocar o Fundo Paridade na discussão, mas os participantes têm de abrir mão do bloqueio judicial.
Apesar de o valor estar bem próximo de um acordo, há outro problema: quem se aposentou entre 97 e hoje, que são cerca de 15 mil funcionários, teria de ter seu benefício recalculado para cima. Na última reunião, os representantes do BB, Carlos Néri e Vassili Chaves concordaram que existe aí outro desvio, mas que não há possibilidade de o banco acordar um recálculo agora. Cada dia de atraso em um acordo vai colocando mais gente no bolo, já que outros 15 mil funcionários devem se aposentar nos próximos dois anos.
Outra distorção entre o cálculo da Previ e da previdência pública é o alargamento do tempo de contribuição do INSS. Na Previ, o tempo de contribuição é de 30 anos e com a extensão do tempo de aposentadoria no INSS muitos funcionários do BB terão de contribuir mais e correrem o risco de receber o mesmo. É o caso do próprio representante da comissão de empresa, Marcel Barros, que estagiou no banco desde os 15 anos e poderia se aposentar aos 45. Com o alongamento de contribuição, o representante da comissão terá de contribuir por mais três anos.
“A proposta feita ao banco é a de calcular o benefício pelo tempo total de contribuição, em vez de congelar o tempo de contribuição em 360 meses. Se alguém contribuiu 31 anos devido à nova regra do INSS, levaria-se em conta esses 372 meses no cálculo”, diz. Mas isso demandaria mudança no estatuto.
Saúde – À parte estas questões que estão diretamente ligadas ao valor da PP, há outro imbróglio no Banco do Brasil e que diz respeito à Caixa de Assistência dos Funcionários do Banco do Brasil (Cassi) – o plano de saúde dos funcionários. A Cassi apresentou déficit operacional nos últimos três exercícios até 2003 em seu plano de associados. Segundo a auditoria contratada pela empresa, a Deloitte Touche Tohmatsu, a empresa busca, por meio de medidas administrativas, sanar os prejuízos, porém o restabelecimento econômico da Cassi depende do sucesso nas mudanças administrativas.
Segundo os participantes da Previ, houve uma defasagem no valor dos salários que diminuiu o valor da contribuição direcionada à Cassi, mesmo com o crescimento do quadro de funcionários. Hoje, os trabalhadores contribuem com 3% do salário e o BB com outros 3%. Esse porcentual já foi de 1% e teve de ser reajustado exatamente porque o plano de associados estava começando a comer as reservas financeiras da Cassi, em vez de ser autogerido pelas contribuições. A idéia é dar uma solução definitiva, que não seja apenas a de aumentar periodicamente as contribuições. Até agora, os representantes do BB descartaram a discussão sobre a Cassi na pauta da Parcela Previ. Eles disseram que o assunto, apesar de pertinente de solução, deve ser tratado separadamente.
Os ânimos estão exaltados. Para o representante da comissão de empresa, Marcel Barros, a intenção é, de fato, colocar todas as pendências dentro desta negociação. “Já havíamos tentado colocar discussão sobre a PP no processo de negociação salarial de 2004. Mas não era o fórum adequado. Agora, porém, queremos colocar o máximo de pautas na discussão. Até porque dificilmente algo será decidido em ano de eleições”, diz. O conselheiro da Previ e presidente da Anabb, Valmir Marques Camilo, engrossa o coro. “O funcionalismo que fez a greve de 2004 pode chegar muito longe em suas demandas este ano”.
O titular da Secretaria de Previdência Complementar (SPC), Adacir Reis, informou que só irá se pronunciar a respeito das pendências na Previ quando puder falar do processo todo e não apenas das questões pontuais, como as que estão sendo colocadas agora. A Previ também prefere não se pronunciar antes de batido o martelo.