Dúvidas protelam decisão | Mais uma vez, fundos adiam posicioname...

Edição 111

Embora a Receita tenha considerado baixa a adesão ao primeiro RET, de 31 de dezembro, a ponto de cogitar a extensão do prazo para 28 de fevereiro, o titular da Secretaria de Previdência Complementar, José Roberto Ferreira Savóia, comemorou os números apresentados pela Abrapp: das 186 entidades consultadas pela Abrapp, 15 não haviam aderido. “A adesão foi muito expressiva e mostra um amadurecimento das fundações na questão do tratamento tributário”, avaliou, enfatizando que quase todas as grandes fundações acataram a sugestão da Receita.
A maioria das que não aderiram se enquadra nos casos já esperados pelo governo – direito à imunidade tributária por contribuírem sozinhas para os planos de previdência dos funcionários, ou que têm ações já julgadas e transitadas.
Entre as que não aderiram – pequenas, principalmente – a palavra de ordem é continuar brigando até as últimas conseqüências pela manutenção da imunidade a que julgam de direito. Ninguém adianta que atitude pretende tomar em 31 de janeiro sobre a anistia aos débitos passados, abrindo mão de ações e, sobretudo, desembolsando a primeira parcela dos débitos acumulados com o IR nos últimos cinco anos.
Devanir da Silva, da Abrapp, acha que a Receita será pragmática na questão da adesão à anistia e vai exigir o primeiro pagamento. “Algumas liminares dizem que podem aderir da anistia sem desistir das ações, que tratam da imunidade tributária. Acho que a fundação pode até estar protegida, mas corre o risco do encaminhamento no futuro”, avisa.
A duas semanas do vencimento do prazo, os conselhos de muitas fundações ainda relutavam em aderir à MP e adiavam a tomada de posição para após a assembléia da Abrapp, marcada para 28 de janeiro. Aliás, nem mesmo a adesão ao novo regime porá um fim à longa batalha nos tribunais. “Mesmo optando, a maioria tem mandados de segurança e, no dia-a-dia, estão se mexendo para reverter a situação”, diz Sérgio Malacrida, da Consultoria RPA.
“Algumas entidades com as quais conversamos já manifestaram a intenção de optar pela anistia e pelo pagamento parcelado em seis vezes, entretanto têm dúvidas quanto à aplicação desse princípio para PIS, Cofins e contribuição social, discordando da base de cálculo dos tributos ou questionando sua propriedade jurídica”, insiste Savóia.
É justamente por causa da indefinição que a Metrus só tomará a decisão de aderir ao segundo prazo do RET após a Receita se posicionar mais objetivamente com relação à MP 2.222. “É muito delicado tomar uma decisão diante de tantos pontos obscuros. Se o que está sendo dito verbalmente for colocado no papel, a adesão pode ser feita sem problemas”, avalia Fábio Mazzeo, diretor-presidente da Metrus.
Sem falar em valores, o dirigente calcula que grande parte do que a Metrus terá de pagar equivalente aos cinco anos passados – se for esta a decisão –, já está depositada em juízo e, portanto, não haveria grande impacto sobre a fundação. “Creio que quatro parcelas seriam quitadas tranqüilamente com esse montante”.
A Sistel, por sua vez, tem provisionado 100% do IR devido nos últimos cinco anos, somando R$ 800 milhões já efetuados os descontos, segundo cálculos do diretor de planejamento e controle, Wilson Carlos Duarte Delfino. “Por enquanto não temos nenhuma decisão tomada, se vamos pagar ou não, mas se decidirmos pagar não teremos problemas de falta de liquidez. Temos 25% aplicados em renda variável e pouco mais de 60% na renda fixa, e a opção será pelo parcelamento em seis vezes”, explica Delfino. “Mas a ordem é brigar até o fim”.
A mesma disposição tem a Funcef, que aderiu ao RET no dia 27 de dezembro do ano passado e a partir daí já vem se preparando para possíveis resgates. “Programamos nosso fluxo de caixa e tudo deverá ocorrer dentro da normalidade. Pensamos, inclusive, em parcelar no máximo permitido”, conta o gerente de controladoria, Itamar Jardim Junior. “Até lá, vamos continuar questionando, para esgotar toda e qualquer dúvida de ordem jurídica e de interpretação”.
Pelos seus cálculos, a fundação precisaria contar com R$ 557 milhões provisionados para liquidar IR, IOF, PIS e Cofins, já com os descontos. Só para IR, entretanto, a fundação tem R$ 613 milhões provisionados, o que possibilitará usar os descontos nesse imposto (de R$ 132 milhões) para cobrir com folga o PIS e Cofins (R$ 111 milhões), não provisionados.

Precaução – Mesmo com sentença transitada e julgada reconhecendo a imunidade, a Fachesf resolveu aderir ao primeiro RET diante da recente decisão do STF no caso da Ceres e da MP 2.222. Na fundação, a palavra de ordem é se cercar de todas as garantias antes de se posicionar sobre o pagamento dos débitos passados. “Não queremos nos basear apenas na nossa sentença favorável. Queremos nos garantir por todos os lados”, diz o diretor administrativo e financeiro, Marcus Vinícius de Oliveira e Silva. “Se a decisão for pela adesão, temos condições e liquidez suficientes.”
A Fundação São Rafael, que tem provisionado 100% dos débitos atrasados, está pisando em ovos diante da nova RET. “Estamos fazendo caixa e conversando com os bancos sobre qual a melhor alternativa de desmobilização, se devemos pagar em cota única ou em parcelas e se esse passo deve ser dado ao longo de todo o mês. O objetivo é fugir de uma eventual corrida para venda de papéis nos últimos dias”, confessa o gerente de investimentos, Marcelo Neves. O executivo calcula um estorno de R$ 13 milhões dos R$ 49 milhões provisionados. “Caso não tivéssemos feito o provisionamento e este dinheiro estivesse aplicado no mercado financeiro ganharíamos menos porque a aplicação seria tributada”, calcula.
Também na Centrus, a decisão sobre uma eventual adesão ao RET ficará para o final do mês. Mesmo com ação transitada e julgada, a diretoria quer evitar surpresas e prefere adiar seu posicionamento. Ela se enquadra em uma situação um pouco diferenciada das demais fundações, por causa do artigo 6o da MP 2.222, que desde 1º de janeiro isenta do IR sobre os ganhos e aplicações as fundações com contribuição exclusiva dos participantes ou patrocinadas por pessoa jurídica imune.
Segundo o diretor de investimentos, Ricardo Monteiro de Castro Melo, mesmo sem estar fazendo os aportes, o Banco Central continua sendo patrocinador. “Em momento algum perdeu essa condição, mesmo porque o BC tem responsabilidades com a fundação, que conta hoje com cerca de 1,2 mil participantes”, ressalta. Segundo Castro Melo, apesar disso, a fundação ainda não decidiu se vai ou não aderir ao RET. “Vamos estudar e ver qual o melhor caminho”, diz ele, acentuando que a fundação tem provisionados os recursos para pagamento do IR passado.
É o mesmo caso da Uranus, patrocinada pela Comissão Nacional de Energia Nuclear (CNEN), uma autarquia federal que goza de imunidade tributária. A fundação não tem provisionados os R$ 2,5 milhões que a Receita considera como devidos nos últimos cinco anos, que representam quase 20% do seu patrimônio de R$ 14 milhões. Como a Centrus, além de ser patrocinada por pessoa jurídica imune, a Uranus também não recebe contribuição da patrocinadora, o que também garante a imunidade.
O caso da Uranus, aliás, é peculiar. Embora com uma ação julgada e transitada, a fundação, já autuada pela Receita, conseguiu liminar impedindo que o ato fosse levado adiante, mas foi surpreendida pelo STF, que acatou recurso da União, mesmo após ter se esgotado o prazo. “Assistimos a uma truculência, que põe em dúvida o ordenamento jurídico de nosso País”, diz o superintendente, Cristóvão Araripe Marinho, afirmando que a ordem é continuar brigando pela manutenção da imunidade até o fim.

Decisão requer cautela
As fundações devem se precaver contra uma armadilha em potencial embutida na MP 2.222, que exige a desistência expressa e irrevogável quanto às ações judiciais em andamento, que tenham por objeto o IR e demais tributos administrados pela Secretaria da Receita Federal, mas dá em troca vantagens apenas para os cinco anos passados, contados a partir de 1997. Para o advogado Leonel de Castro, isso permitirá à Receita avançar para antes de 1997 e pegar todos de surpresa.
“Aqueles que desistirem das ações ficarão sujeitos à autuação por períodos anteriores a 97”, alerta. Outra dica de Castro é que as fundações exijam a isenção da contribuição sobre o lucro também sobre os anos anteriores a 2002. Esta isenção está prevista apenas a partir de janeiro deste ano na MP 16, de 27/12/2001.
Há, ainda, outra questão delicada, no entender de Castro: uma série de empresas patrocinadoras, especialmente estatais, vêm fazendo aportes relativos a dívidas antigas de várias naturezas. “Se o IR incidir sobre esse volume, o estrago será ainda maior”, avalia o advogado, ressaltando que a MP fala genericamente sobre contribuição da empresa.