Edição 112
Embora as regras já existam, a marcação de ativos ainda tem gerado muita polêmica. Ainda há muito a ser feito, porque a forma como os bancos vêm fazendo a marcação a mercado tem gerado grandes transtornos além do aumento de custos para as fundações. Não por acaso, elas estão intensificando o processo de terceirização dos serviços de controladoria. São os casos recentes dos fundos de pensão dos empregados da Volkswagen e da Petrobras (ver box).
Muitos fundos abertos estão deixando de marcar os seus ativos a mercado, causando enormes prejuízos para as fundações que mantêm seus recursos aplicados nesses fundos. Durante o primeiro semestre do ano passado, esses fundos encheram suas carteiras com títulos cambiais (NBC-E) “swapados” com contratos futuros de CDI, mas deixaram de fazer corretamente a marcação a mercado dos preços desses ativos, especialmente quando o dólar e as taxas dos juros futuros começaram a subir, a partir de setembro, com o ataque terrorista aos Estados Unidos.
Como as operações de swap são bastante complexas, precisam de uma correta precificação para não causar distorções aos seus cotistas. Segundo o consultor da Rabbat, Prandine & Associados, Sérgio Malacrida, alguns fundos chegaram a estar com 80% do seu patrimônio aplicado em títulos cambiais (NBC-E) “swapados” com DI. Quando o dólar começou a subir, essas operações, que pagavam entre 102% e 103% do CDI passaram a pagar cerca de 108%. “A partir daí, as cotas desses fundos passaram a dar prejuízos, que não foram computados”, explica o consultor.
Embora as maiores não estejam imunes às perdas, são as pequenas as que mais sofrem, na opinião do consultor da RiskControl, Felipe Margueron. “As fundações de maior porte possuem um controle de risco mais apurado, o que não significa que não foram atingidas também”, diz. “Quem não tem uma estrutura interna sólida de controle de risco certamente está com problemas”, complementa Marcelo Neves, diretor de investimentos da Fundação São Rafael (Xerox).
Segundo ele, a fundação acompanhou atentamente o desempenho dos seus fundos naquele período. “Fizemos uma gestão compartilhada com nossos gestores. Todas as nossas operações estavam devidamente “swapadas” e marcadas a mercado”, conta Neves.
A Fundação Celos, dos empregados da Celesc, ainda não constatou se houve perdas, mas está com receio de estar com problemas entre os seus 20 fundos abertos de renda fixa. Esses fundos, em especial os indexados ao CDI, são os que apresentaram os maiores problemas de precificação. Muitos deles, estão sendo alvo de investigação pelo Banco Central, por não estarem fazendo corretamente a marcação a mercado dos seus ativos.
A Celos está em processo de migração de fundos abertos para fundos exclusivos. Segundo o gerente de investimentos da fundação, Zumar Pereira, “eventuais perdas só poderão ser verificadas apenas quando a fundação estiver transferindo efetivamente seus recursos dos fundos abertos para os fundos exclusivos ou, ainda, quando fizer a avaliação trimestral das carteiras”.
Pistas – Um gestor de um banco estrangeiro, que preferiu não se identificar, dá algumas pistas para avaliar se os fundos abertos naquele período apresentam problemas. Segundo ele, os fundos que apresentarem baixa volatilidade e rentabilidade praticamente estável no decorrer do segundo semestre do ano passado, “certamente estará com problemas”.
Ele explica que, como durante todo o primeiro semestre de 2001 papéis como as Letras Financeiras do Tesouro (LFT) e Notas do Banco Central (NBC-E), indexadas ao câmbio, foram fortemente encarteirados pelos fundos de investimentos, quem não fez a precificação correta dos ativos naquele período pode estar acumulando prejuízos enormes na carteira, pois esses papéis perderam seu valor ao longo de todo segundo semestre.
“O investidor que saiu de um fundo por causa da desvalorização dos ativos, no início do segundo semestre de 2001, obteve ganhos. Já quem entrou naquele período pagou caro pelas cotas. Nas fundações, que são compradoras de grandes volumes e permanecem por um período mais longo nesses fundos, as perdas podem ser substanciais”, avalia o gestor.
Outra pista do executivo para as fundações é avaliar todos os papéis que compõem o fundo e verificar se ativos iguais têm preços diferentes. Se isso acontecer é porque a marcação a mercado não foi feita ou feita por critérios incorretos e, por isso, estão destoando da precificação do restante do mercado.
Desconforto leva fundações a centralizar controle de ativos
Para maior segurança nas aplicações financeiras, as Fundações da Volkswagen e da Petrobras decidiram centralizar o controle de ativos em um único banco. A primeira iniciou os estudos para a implantação em agosto do ano passado, e desde fevereiro o Mellon Brascan é o responsável junto à Secretaria de Previdência Complementar (SPC), Banco Central e CVM pela precificação dos ativos dos seis fundos exclusivos da fundação. “Tiramos a responsabilidade dos nossos seis gestores e centralizamos as informações sobre os ativos em um único administrador”, disse o gerente de investimentos, Flávio Talasca.
Para o executivo, a precificação dos ativos é questão delicada. “Quem diz que está confortável com os problemas de marcação dos ativos não está falando a verdade. Não tem ninguém confortável com esse problema”. Antes de centralizar a controladoria, a fundação já tinha um controle de risco feito pelos seis gestores, além de uma consultoria externa para avaliar o risco das aplicações. Ainda assim, durante o processo de avaliação do desempenho dos gestores para eventual troca de parceiros foram constatados ativos com problemas de precificação.
Já a fundação da Petrobras, Petros, espera minimizar os riscos com operações realizadas por gestores que estejam em desacordo com a legislação dos fundos de pensão. A fundação ainda se encontra em processo de contratação da controladoria centralizada. “A centralização da controladoria aumentará o nível de segurança das aplicações, permitindo um maior controle sobre os investimentos”, diz a diretora de investimentos da fundação, Eliane Lustosa.
Anbid aperfeiçoa código
A Associação Nacional dos Bancos de Investimento (Anbid) criou, no início de fevereiro, um capítulo específico sobre marcação a mercado. A nova versão do código de auto-regulação da indústria de fundos, que entrou em vigor no dia 2 de fevereiro, ganhou mais dez conceitos básicos para uma melhor precificação dos ativos. O gestor que aplicar as regras da Anbid vai receber um selo de certificação.