Edição 234
No fim do ano passado, quando a Bolsa ainda não mostrava sinais de recuperação e os juros apontavam para a queda, o pessimismo tomou conta do mercado. Não era difícil ouvir o comentário “nenhum fundo de pensão vai conseguir bater a meta atuarial”, ou então “foi um ano desastroso”. Passada a onda de preocupações, as fundações começam a divulgar seus relatórios referentes a 2011, e os resultados mostram que o ano, apesar de desafiador e complicado, não foi tão ruim quanto se esperava – pelo menos para algumas entidades. Ainda não está disponível um dado geral do sistema, mas os resultados das fundações Cesp, Sabesprev e Refer mostram que elas superaram suas metas atuariais.
Segundo dados preliminares da Associação Brasileira das Entidades Fechadas de Previdência Complementar (Abrapp), nos nove primeiros meses de 2011 a rentabilidade média das fundações ficou em 4,43%, contra 9,28% do INPC+6% para o mesmo período – as informações da associação só estavam atualizadas até setembro do ano passado no fechamento desta edição. Não se trata exatamente de um desempenho satisfatório, mas também não chega a ser o caos vivido pelo sistema em 2008. Naquele ano, a média de rentabilidade das entidades foi de -1,62%, diante de um INPC+6% de 12,87%.
“2011 foi um ano difícil, mas não podemos falar que foi desastroso como 2008”, diz Antônio Gazzoni, sócio-consultor da Gama. A consultoria presta serviços para cerca de 50 planos de benefícios, e aproximadamente metade deles ou empatou ou superou a meta atuarial no ano passado. A média de rentabilidade desse conjunto de planos, que representa reservas de R$ 270 bilhões, foi de 12%. Considerando a meta atuarial de INPC mais 6%, mantida por grande parte das fundações, que chegou a 12,44%, a média dos clientes da consultoria ficou pouco abaixo. “Falando de planos de benefícios, a maioria empatou ou bateu suas metas, mesmo porque um bom número deles já reduziu a taxa de desconto”, explica Gazzoni.
O consultor esclarece que uma mesma entidade fechada pode ter mais de um plano de benefícios e que muitos deles já diminuíram a taxa de desconto para abaixo de 6%. Considerando um plano que tenha meta de INPC mais 5,5%, o objetivo ficou em 11,94% em 2011 – ou seja, ligeiramente acima da média de rentabilidade de 12%. “Diferentemente de 2008, quando havia maior exposição a renda variável, os gestores de recursos estavam mais atentos e as estratégias de hedge não foram tal mal. Sem falar na governança e no maior profissionalismo que existe atualmente”, enumera Gazzoni. Por outro lado, o desempenho dos imóveis e das participações societárias trouxe boa rentabilidade e compensou a má performance de outros segmentos.
Protegido da Bolsa – A Fundação Cesp, por exemplo, registrou rentabilidade global de 13,2% em 2011, superando a meta de 11,9% (IGPDI+6%). É certo que o resultado foi favorecido pelo grande estoque de títulos públicos com marcação na curva que representa cerca da metade das aplicações da entidade, cujo patrimônio total soma R$ 19,3 bilhões. Porém, não foi só isso que garantiu a superação da meta no ano passado, uma vez que as participações societárias e a carteira de imóveis deram rendimentos acima do CDI. Além disso, a carteira de renda variável não foi tão mal, se descolando do Ibovespa.
“Tivemos um fundo de dividendos, no qual inclusive aumentamos a alocação de recursos, que rendeu 8% positivo. É uma aplicação que representa um contraponto na renda variável, compensando períodos de queda do mercado”, revela Jorge Simino, diretor de investimentos da Fundação Cesp. Apesar de ter ficado abaixo da meta, o resultado superou amplamente a queda do Ibovespa. Este fundo recebeu um aporte adicional de cerca de R$ 50 milhões no segundo semestre de 2011. A carteira de renda variável representa cerca de 27% do patrimônio do fundo de pensão, mas cerca de metade corresponde às participações societárias.
“A queda da Bolsa não afetou tanto nossa carteira, não chegou a destruir nosso resultado global”, diz Simino. O dirigente admite que foi um ano muito difícil e, por isso, comemora a rentabilidade acima da meta. “Se tivéssemos ficado 0,1 ponto acima da meta, já seria motivo de comemoração”, observa. Em 2011, os gestores da Fundação Cesp não fizeram grandes movimentos de entrada e saída de segmentos. Não houve nenhum grande movimento, como em 2007, quando o fundo chegou a vender cerca de R$ 1,2 bilhão da carteira de ações, o que acabou permitindo a minimização dos efeitos da crise de 2008.
A única movimentação mais acentuada no ano passado foi o aumento dos ativos de crédito privado. A carteira de crédito saltou de R$ 750 milhões para R$ 1,25 bilhão no fechamento do ano. Foram comprados Certificados de Crédito Bancário (CDBs), Letras Financeiras e debêntures. “Apostamos no crédito privado, mas sem abrir mão da qualidade dos papéis, com mínimo de rating duplo A e outros critérios”, aponta o diretor de investimentos. Os Fundos de Investimento em Direitos Creditórios (Fidcs) e os Certificados de Recebíveis Imobiliários (CRIs) foram evitados.
Neste ano, os gestores da Fundação Cesp terão que enfrentar alguns desafios para manter os resultados acima da meta. “O problema é que temos uma grande quantidade de ativos vencendo em 2012 e não devemos conseguir as mesmas taxas. Mesmo assim, não pretendemos abrir mão dos critérios de qualidade”, avisa Simino. Ele admite que a alternativa será, provavelmente, aceitar menores taxas. Por outro lado, o fundo de pensão não tem planos para ampliar o investimento no segmento de estruturados, pelo menos no curto prazo. “Temos pouquíssimas aplicações em estruturados, e ainda estamos avaliando a performance do segmento. Por enquanto, não pretendemos ampliar”, diz.
No fim do ano passado, a direção da Fundação Cesp estava cogitando o aumento da exposição em renda variável. Devido à queda do Ibovespa, os preços de alguns papéis estavam atraentes. Até houve um pequeno movimento nessa direção, porém o fundo planejava a entrada no começo deste ano. Mas com a valorização da Bolsa em janeiro e fevereiro, os preços voltaram a perder atratividade. “Subiu muito rápido, cerca de 15% em pouco mais de um mês. Agora teremos que aguardar uma nova janela de reacomodação para pensar em entrar na Bolsa”, pondera Simino.
Volatilidade sob controle – O fundo de pensão da Sabesp é outro que conseguiu bater a meta em 2011. A entidade alcançou rentabilidade global de 14,32%, acima do INPC+6% (12,44%). A exemplo da Fundação Cesp, a Sabesprev também possui uma carteira de títulos públicos com marcação na curva que representa mais da metade de seu patrimônio, que fechou o ano passado em R$ 1,64 bilhão. Essa carteira possui uma TIR (taxa interna de retorno) média de 7,5% acima da inflação. “Nosso estoque de títulos acabou segurando a volatilidade do mercado no ano passado e ajudou a garantir o resultado acima da meta”, explica Cesar Soares Barbosa, diretor de previdência e investimentos da Sabesprev
A carteira de renda variável registrou resultado negativo (-7,7%), mas não chegou a comprometer a rentabilidade global. Isso ocorreu porque a exposição ao segmento representa hoje apenas 14% do patrimônio total. “Apesar de ficar no negativo, nosso resultado foi bem acima do Ibovespa, que caiu 18%”, lembra o diretor da fundação. Ele explica que o bom desempenho é resultado de uma reestruturação da gestão da carteira de renda variável iniciada no fim de 2010 e concluída em meados de 2011. O fundo de pensão trocou os dois gestores antigos por seis novos, que receberam mandatos de fundos de valor ou de dividendos (leia mais no quadro).
No segmento de fundos estruturados, a Sabesprev conseguiu resultados positivos, por conta não apenas da valorização das cotas, mas também por uma reavaliação realizada em 2011. O fundo mantém aplicações em dois fundos imobiliários que, juntos, representam cerca de 10% do patrimônio. A reavaliação provocou um ajuste positivo de cerca de R$ 20 milhões no valor das cotas. “Percebemos que os valores imobiliários estavam defasados e decidimos pela reavaliação ajustada ao mercado”, afirma Barbosa.
Outro fundo de pensão que conseguiu bater a meta atuarial foi a Refer. A rentabilidade global das carteiras foi de 17,26%, acima da meta atuarial de 12,44% (INPC+6%). O resultado foi alcançado devido à valorização da carteira de imóveis, concentrada em shopping centers, e ao baixo percentual de aplicações em renda variável. Na renda fixa, houve um movimento de alongamento dos títulos públicos, que também colaborou para melhorar o desempenho no ano.
Reestruturação da renda variável
A Sabesprev contratou seis novos gestores para cuidar do segmento de renda variável. O processo foi iniciado ainda no fim de 2010, quando entraram BBM, BNY Mellon Arx, Franklin Templeton e Jardim Botânico (JB). Os últimos dois gestores, Gap e MSquare, assumiram seus mandatos em maio de 2011. “Não estávamos satisfeitos com os dois gestores anteriores que seguiam estratégias atreladas ao Ibovespa. A proposta foi contratar assets com mandatos que realizem avaliações estratégicas de empresas”, diz Cesar Barbosa. Já no primeiro ano de trabalho dos novos gestores, a direção da Sabesprev avalia que houve redução da volatilidade da carteira de renda variável se comparada com os mandatos anteriores.
Em 2012, a proposta é contratar mais um gestor de renda variável, com perfil diferenciado, provavelmente para um mandato de fundo de dividendos. Também na renda fixa, o fundo de pensão planeja a contratação de novas casas. “Hoje temos quatro gestores na renda fixa e pretendemos contratar mais dois ou três”, revela Liège Oliveira Ayub, diretora presidente da Sabesprev. A fundação já possui cerca de R$ 50 milhões, atualmente em fundos DI, para os novos gestores. Durante o ano, esse montante deve chegar a até R$ 150 milhões. A ideia é contratar gestores com mandatos de arbitragem para inflação e juros.
Outra mudança que a Sabesprev está estudando para 2012 é a redução da meta atuarial. “Já discutimos em nosso conselho deliberativo, mas ainda não tivemos condições de realizar a redução da meta. Estamos aguardando um momento adequado”, avisa a diretora presidente.