Edição 77
Oque parecia problema acabou virando solução. A demora de mais de dois anos para aprovar o novo modelo de gestão de investimentos dos fundos de pensão acabou favorecendo tanto o governo como o mercado. A duração da “novela” da aprovação das regras, que determinam os novos limites das aplicações das entidades fechadas baseados em critérios de risco e de segmentação de ativos, foi estrategicamente esticada pelo próprio governo para dar tempo ao órgão fiscalizador do sistema, a Secretaria de Previdência Complementar (SPC), de se reestruturar. Por outro lado, enquanto a área econômica do Executivo trabalhava no aperfeiçoamento do projeto, os fundos de pensão, consultorias e administradores tiveram tempo para apresentar propostas para modificação do modelo e “digerir” suas orientações gerais.
O novo Modelo de Gestão de Investimentos (MGI) começou a ser discutido no interior do Ministério da Previdência e Assistência Social no final de 1997, mas foi apenas no segundo semestre do ano seguinte que a SPC apresentou a primeira versão pública do projeto. Depois de receber sugestões e críticas de especialistas e dirigentes de fundos de pensão, a SPC encaminhou o modelo para o Banco Central ainda no primeiro semestre de 1999 e, desde então, a proposta ficou aguardando sua aprovação pelo Conselho Monetário Nacional. Um ano depois, quando já começavam a surgir dúvidas quanto ao avanço do projeto, o CMN pegou o mercado de surpresa e aprovou as novas regras, através da Resolução no 2720, do último dia 24 de abril, em substituição a Resolução no 2324/96.
Uma das razões que mais pesou para atrasar a aprovação do projeto foi a indefinição quanto a capacidade do órgão que realizaria a fiscalização da aplicação do novo modelo. Ao final, acabou prevalecendo a força do MPAS, que chamou para si a responsabilidade de promover a reestruturação da Secretaria de Previdência Complementar e de criar as bases para o surgimento da Agência Nacional de Previdência Complementar. A nova legislação não foi aprovada em prazo mais curto porque a Secretaria de Previdência Complementar estava no início de seu processo de reestruturação.
“Olhando para trás, foi bom que o modelo não tenha sido aprovado antes, porque tivemos mais tempo para aparelhar e modernizar nossos sistemas de informação e fiscalização”, revela Paulo Kliass, secretário de previdência complementar.
Agora, a SPC tem o desafio de avançar rapidamente com o processo de informatização de seus sistemas, patrocinado pelo BID e pelo Banco Mundial, para que daqui a um ano quando entra em vigor as determinações da nova Resolução, o órgão esteja preparado para fiscalizar o sistema. O projeto de criação da agência, que já se encontra em mãos do Executivo, também deve ser acelerado. “É muito provável que o governo apresse a transformação da SPC em agência nacional”, revela o secretário.
Boa aceitação – Ao contrário do que ocorreu quando o MGI foi apresentado pela primeira vez, no final de 1998, recebendo na época uma série de críticas, a legislação final aprovada foi bem aceita pelos dirigentes dos fundos de pensão. Enquanto a proposta permaneceu nas mãos do Banco Central, os dirigentes dos fundos e especialistas do mercado continuaram atuando junto à SPC no sentido de propor alterações. “A legislação final aprovada incorporou várias de nossas sugestões e deixou de lado os critérios que engressavam os primeiros modelos apresentados pela Secretaria”, afirma Carlos Duarte Caldas, presidente da Associação Brasileira das Entidades Fechadas de Previdência Privada (Abrapp).
Desta forma, a Resolução do CMN eliminou o critério da segmentação da carteira por risco de mercado que constava de versões anteriores do MGI. Agora, os próprios fundos de pensão poderão estabelecer os riscos de crédito ou contratar avaliadores externos para isso. Outro alteração considerada positiva foi a eliminação da obrigatoriedade da contratação de um avaliador de gestão para analisar e selecionar os ativos financeiros para compor os segmentos e carteiras da entidade. A contratação dessa figura torna-se facultativa, embora continue obrigatória a utilização de auditoria contábil para realizar a avaliação técnica e jurídica da administração dos recursos do fundo de pensão.
O presidente da Abrapp elogiou também o aumento do limite global para a concentração dos ativos de renda variável que sobe de 50%, da Resolução 2324, para 60% da nova legislação, somando-se os segmentos de ações em mercado (50%) e especial (10%). Este último segmento engloba aplicações em empresas emergentes, project finance e companhias abertas em processo de reestruturação. Além disso, Caldas considerou satisfatório o prazo de um ano previsto pela nova norma para que as entidades possam se adequar às suas determinações.
Mais um aspecto positivo levantado por especialistas é a orientação do novo modelo no sentido de concatenar a gestão dos passivos com a administração dos ativos. “É a primeira vez que uma legislação referente aos fundos de pensão traz claramente a determinação de aliar a gestão dos investimentos com as necessidades dos passivos das entidades”, ressalta Antônio Fernando Gazzoni, consultor sócio da Gama e ex-diretor da SPC.
O consultor, que participou da elaboração da primeira versão do Modelo de Gestão enquanto estava na SPC (onde permaneceu até final de 1998), acredita que a proposta terá efeitos positivos sobre o mercado, mas poderia ter sido aperfeiçoada em alguns pontos. “Um dos problemas que a nova legislação impõe às pequenas e médias fundações é a determinação de implantar e manter sistemas próprios de controle de risco de mercado”, afirma Gazzoni. Ele explica que as entidades de pequeno e médio porte poderão ter seus custos aumentados devido à essa regra.
Por fim, a Resolução do CMN também estabelece regras que determinam a prestação de informações pela direção dos fundos de pensão para que os participantes e o próprio mercado possam acompanhar o desempenho da administração dos planos de benefícios. A nova legislação pretende estabelecer padrões de análise para definir como estão as condições de solvência e liquidez das entidades. “O novo modelo de gestão está afinado com a tendência do mercado de controle e minimização dos riscos na gestão dos fundos com o objetivo de permitir maior transparência ao sistema”, afirma Carlos Antônio Rocca, consultor sócio da RPR Financial Services.
O que muda com a nova legislação
Como ficou com a Resolução 2720/abril de 2000
– Casar as necessidades do passivo com a gestão dos ativos
– Adoção de critérios de risco e liquidez
– Criação do Segmento Especial: infra-estrutura, fundos de empresas emergentes e empresas em reestruturação (Até 10% da carteira de investimentos)
– Criação do segmento de controle de exposição de risco: operações com derivativos e swap
– Aplicações em renda variável (ações em mercado mais especial) sobe para 60%
– Limite de imóveis cai para 10% da carteira da entidade até 2007
– Junção dos limites para empréstimos a participantes e financiamento imobiliário até 10% da carteira
– Determinação para prestar informações aos participantes
– Obrigatoriedade de contratar auditoria de gestão
– Manutenção de sistema de controle e avaliação de risco
Como era com a Resolução 2324/96
– Não relacionava os ativos com os passivos
– Apenas divide os investimentos em macrossegmentos (renda fixa, renda variável, imóveis, etc)
– Possui apenas segmento de fundos de empresas emergentes (Até 5% da carteira da entidade)
– Não prevê segmento para controle de risco
– Limite de 50% para a renda variável
– Limite caía para 15% até 2002
– Estabelece limites separados de 3% para empréstimos a participantes e 7% para financiamento imobiliário
– Não traz esse tipo de determinação
– Não é obrigatório
– Não há determinação para isso