Edição 82
No último dia do mês de junho, num escondido hotel da cidade paulista de São Roque, um grupo de grandes investidores institucionais ouvia atentamente as preleções do executivo de uma importante empresa da área de telecomunicações, que após uma exposição de cerca de meia hora sobre as perspectivas do seu negócio passou a palavra ao representante de outra empresa da área, sua concorrente. Os investidores continuaram ouvindo atentamente, fazendo algumas anotações. Ao final de 1 dezena de apresentações, todos se reuniram para conversas amenas sobre o frio que estava fazendo, ainda mais agudo naquela região serrana.
Muitos não conheciam São Roque, localizada na região da Mata Atlântica. Eles tinham vindo de várias regiões do país, convidados pelo Citibank para participar de um encontro entre investidores e tomadores de crédito, uma espécie de road-show coletivo. Nem os investidores, com potencial de investimento que somava várias dezenas de bilhões de reais, nem as empresas, com receitas da mesma magnitude, estavam comprando ou vendendo algo naquele momento.
Foram convidados para esse encontro cerca de 110 participantes que atuam na área de renda fixa, incluindo assets, fundos de pensão e empresas tomadoras de crédito. Além de ampliar seu contato com esses participantes, o Citi está de olho no crescimento do mercado de operações financiadas sem ser por dívida direta, que deve acontecer nos próximos anos.
O Citi é hoje um dos maiores originadores de operações desse tipo, com cerca de R$ 7 bilhões em negócios realizados com empresas no primeiro semestre do ano, incluindo operações consorciadas com outras instituições (metade em debêntures e a outra metade em commercial papers). Sua expectativa é fechar o ano com negócios da ordem de R$ 14 bilhões.
“Esse mercado vai dar um salto nos próximos anos”, avalia Vinicius de Queiroz, diretor de mercado de capitais do Citibank. Segundo ele, o Brasil reúne hoje as condições necessárias para dar esse pulo. A principal delas é a estabilidade econômica, conseqüência da inflação baixa, taxas de juros decrescentes e superávits primários na área governamental. A segunda condição é a volta do crescimento econômico, com projeção de uma elevação do PIB da ordem de 3,5% para este ano e de 4% para o ano que vem. E a terceira é o crescimento da poupança interna, resultado do aumento da indústria de fundos de investimento, de previdência complementar e de seguros.
Para Queiroz, as empresas vão começar a recorrer com mais freqüência ao financiamento interno, via colocação de papéis ou outro tipo de operação, para custear seus programas de investimento. Até mesmo aquelas com sede no exterior que, teoricamente, poderiam recorrer a empréstimos em dólar. “Elas buscaram financiamento externo na hora de participar dos processos de privatização, mas uma vez instaladas no mercado elas não vão querer continuar dependendo de empréstimos externos”, avalia ele. “Suas receitas são em reais, elas vão preferir ter dívidas também em reais”.
Isso vale tanto para as grandes corporações, com investimentos vultuosos nas áreas de telecomunicações, saneamento básico e infra-estrutura, quanto para as menores, que fornecem para essas grandes corporações. As grandes, segundo Queiroz, vão demandar cada vez mais operações de project finance, empréstimos sindicalizados e colocação de títulos para lastrear seus programas de investimento, enquanto as menores poderão colocar títulos garantidos por recebíveis das grandes corporações, que são seus clientes, numa espécie de arbitragem de crédito.
Para o Citi, o mercado de operações financeiras para a área corporativa vai crescer com a retomada da atividade econômica, principalmente a partir do ano que vem. Além do previsível aumento de demanda por parte das corporações, também haverá um crescente interesse por parte dos investidores nos papéis, uma vez que a massa de poupança que se está formando não poderá continuar investindo apenas em títulos públicos, pois com o controle fiscal que o governo começa ter ele irá emitir cada vez menos e pagar taxas de juros cada vez mais baixas.
A saída natural para essa massa de poupança que se está formando será, realmente, a compra de papéis de empresas, incluindo as grandes e as menores. Mas a área de investimento do Brasil tem pouca experiência na análise de projetos empresariais, na análise de crédito de empresas, no acompanhamento das empresas ao longo da duração das operações, o que abre para o Citi um mercado bastante promissor. Segundo Queiroz, um dos objetivos do encontro de São Roque foi ouvir dos participantes desse mercado as suas necessidades, analisando o que precisam e o que esperam contar nos próximos meses e anos.
De acordo com a responsável para área de distribuição de produtos de renda fixa do Citi, Eliane Habib, uma das decisões do Citi, já tomada e em implementação, é alongar o prazo das operações. “Já estamos começando a dilatar”, afirma ela. Outra, é garantir que as operações de colocação de papéis seja realmente pulverizada entre investidores, forçando um preço justo aos dois lados.
Segundo ela, encontros do tipo como esse realizado pelo Citi, aproximando grupos de investidores e de tomadores, são freqüentes fora do Brasil. Além das empresas, também foram convidados para fazerem exposição o diretor de política monetária do Banco Central, Luiz Fernando Figueiredo, e o diretor da Comissão de Valores Mobiliários (CVM), Joubert Rovai.
O primeiro encontro no Brasil levou três meses para ser preparado, desde a fase de convite aos participantes até a preparação da infra-estrutura do evento. Foram convidados 35 assets management e 15 fundos de pensão, com a recomendação à cada um de que enviassem um administrador de renda fixa e um analista de crédito de renda fixa. Às assets e fundações foi apresentada uma lista de empresas, para que escolhessem entre elas as dez que mais tinham interesse em ouvir. Escolhidas, essas dez corporações foram contatadas. De acordo com Habib, para serem convidadas não foi pré-requisito que assets, fundações ou corporações tivessem negócios com o Citi.
Os negócios do mercado de capitais para renda fixa, no Citi, é composto pelas áreas de originação e estruturação de operações, que fica sob o guarda-chuva do banco de investimentos e tem no seu comando Queiroz, e distribuição de produtos para institucionais, que fica sob o guarda-chuva da tesouraria do banco e tem no seu comando Eliane Habib.