Edição 99
O mercado prepara-se para viver uma nova rodada de fusões e aquisições entre empresas de gestão de recursos, com o objetivo de consolidar grandes players mediante ganho de escala. Movimentando a nada desprezível cifra de R$ 400 bilhões, o mercado aguarda com expectativa a conclusão das negociações envolvendo a asset management do UBS Warburg em processo de venda para o Credit Lyonnais, o BNP Paribas ou a Invesco, entre os três nomes que se especula. Outro negócio aguardado pelo mercado é o da AGF Braseg, que estaria em processo de ser adquirida pelo Credit Lyonnais. Esses dois negócios, porém, são apenas uma amostra do que deve acontecer nos próximos meses.
Entre os participantes desse mercado, especula-se sobre quase uma dezena de outros nomes que seriam candidatos a serem comprados por empresas maiores ou que estariam em busca de uma parceria numa eventual fusão. Embora a maioria dos nomes seja de pequenas assets, comenta-se também de vendas e fusões entre assets de maior porte.
Os nomes dos eventuais compradores ou vendedores não são explicitamente apresentados, mas fala-se claramente que eles pertenceriam a algumas categorias de assets. Uma dessas categorias seria a das assets de pequeno e médio porte com foco muito concentrado em investidores institucionais, cujas taxas de administração têm caído ao longo dos últimos anos e chegado a níveis muito baixos. Essas, sem poder compensar essa baixa rentabilidade com as taxas mais elevadas dos clientes de varejo e private, não teriam outra alternativa a não ser deixar o mercado ou fundir-se com quem tenha varejo.
“Um bom mix de clientes e produtos é fundamental para manter a saúde da asset”, avalia o diretor comercial da Liberal Asset Management, Guilherme Cavalcanti. Segundo ele, quem estiver com recursos divididos de forma equilibrada entre os segmentos de varejo, institucionais, corporate e private tem mais chances de sucesso que quem estiver focado em apenas um ou dois segmentos. “O segmento de institucionais, por exemplo, está com a rentabilidade muito depreciada.
Outra categoria de assets com dificuldades de sobreviver na atual conjuntura seria formada por administradores com modestos volumes de recursos captados, insuficientes para manter sua rentabilidade e a qualidade dos serviços. O corte de quanto seria esse limite mínimo é muito elástico, variando de uma asset para outra, mas em geral concorda-se que um volume de administração abaixo de R$ 1 bilhão tornaria inviável a atividade, principalmente de gestores ligados a nomes internacionais, cujos padrões de exigência são altos, tanto em relação à qualidade dos serviços quanto em relação à rentabilidade do negócio.
“O setor ficou tão competitivo e as taxas desceram a níveis tão baixos que quem não tiver escala não conseguirá sobreviver”, diz o diretor-executivo do Citigroup Asset Management, Roberto Apelfeld. Ele considera que o mercado brasileiro não é suficientemente grande para comportar o número de assets que existem hoje, fazendo coro às previsões de uma consolidação do setor nos próximos dois anos. Ele acha que “quem tem menos de R$ 5 bilhões de recursos para administrar deve estar repensando seus negócios”.
As contas que o mercado faz para chegar a esses números são simples, limitando-se a analisar o quando custa e o quanto rende o negócio. É a mesma conta que faz um dono de padaria, ou de um supermercado, para ver se o seu negócio tem futuro. No caso das assets, a conta envolve basicamente duas variáveis: taxas e volumes. Se uma asset tem uma taxa de 0,18%, em média, para fazer a gestão de recursos de investidores, ela vai receber por cada R$ 1 bilhão administrado a quantia de R$ 1,8 milhão no final do ano, ou R$ 150 mil por mês. Subindo o volume, isso pode chegar a R$ 300 mil mensais para R$ 2 bilhões sob gestão. Segundo os analistas, com esses resultados uma grande parte das assets não paga seus funcionários e suas contas.
Há pouco mais de um ano, muitos avaliavam que a linha divisória para se manter no mercado estava situada em R$ 2 bilhões. Porém, mesmo com volumes inferiores, muitos sobreviveram. Entretanto, a concorrência continuou crescendo, assim como os custos, enquanto as taxas de administração entraram em franco declínio, avalia Apelfeld. “A demanda existente hoje é por uma prestação de serviços de primeiro mundo, o que exige aumento dos investimentos, mas as taxas praticadas estão abaixo dos níveis nos países desenvolvidos”, diz ele.
Segundo uma estimativa média de gestores, a redução do número de assets nos próximos dois anos será de pelo menos 30%. “Vamos assistir um processo brabo de consolidação nos próximos meses”, anuncia Robert John Van Dijk, diretor superintendente da Bradesco Asset Management (Bram). Embora a nova empresa de asset do Bradesco já tenha nascido grande, com R$ 60 bilhões sob sua gestão e 15% do mercado, ele não descarta novas aquisições. “Queremos chegar a 20% do mercado”, diz o diretor da Bram.
Planos expansionistas semelhantes também estão sendo acalentados na concorrência. Depois de passar os dois últimos anos digerindo as aquisições do BFB e do Bankers Trust, além de começar a distribuir os fundos do Matrix, o Itaú revela apetite por novas aquisições. “Estamos estudando a compra de uma asset para ganhar escala e especialização. Seria um bom negócio adquirir um gestor com uma carteira de R$ 1 bilhão”, revela Alfredo Setúbal, vice-presidente do Itaú. “Pode ser, inclusive, uma asset estrangeira”.
Para o diretor da Unibanco Asset Management – UAM, Renato Raglione, as assets mais vulneráveis são aquelas muito focadas em corporate e no segmento de institucionais. Ele diz que a UAM também está avaliando no mercado oportunidades de compra, que possam agregar escala, receitas ou uma nova prateleira de produtos à asset. Segundo ele, a UAM não está interessada em um segmento específico. “Olhamos o conjunto. Temos hoje uma posição bem distribuída, com 50% dos negócios no segmento corporate e de institucionais e mais 50% no varejo e em private”, diz.
Números – A tendência à consolidação já vem acontecendo há algum tempo. Enquanto a indústria mais do que dobrou nos últimos três anos, passando de R$ 150 bilhões no final de 1997 para R$ 389 bilhões em dezembro de 2000 –segundo o ranking Top Asset de Investidor Institucional– o número de administradores de recursos foi reduzido em 17% no mesmo período. Nos últimos seis anos, a redução foi de 30%, de 188 assets em 1994 para131 em abril deste ano, segundo a Anbid.
Juntas, as dez maiores assets do País são responsáveis por cerca de 70% dos recursos administrados, percentual que sobe a 85% entre as vinte maiores. Restam, portanto, apenas 15% dos recursos para um grupo de mais de 100 gestores, que terão de brigar para não desaparecer do mercado.
Para Márcio Verri, sócio-gerente da BankBoston Asset Management (Bam), só as assets com grande escala de recursos sob sua gestão vão sobreviver. Mas a estratégia da Bam é crescer centrando esforços na atual base de clientes. “O nosso foco não é comprar; é crescer com a tradição do nome da instituição”.
Para o presidente da Invesco no Brasil, Luiz Pretti, quem não tiver um acionista forte por trás e uma visão de longo prazo, dificilmente sobreviverá. Instalada há pouco mais de três meses no País quando comprou a Merrill Lynch, a Invesco é terceira maior administradora de recursos do mundo, com US$ 400 bilhões sob gestão. “Estamos olhando as oportunidades no mercado, porque queremos crescer”, diz.
Para o diretor da ABN AMRO, Fernando Meibak, o banco não descarta a compra de assets concorrentes desde que agreguem escala ou expertise. Segundo ele, a asset do ABN AMRO administra hoje cerca de R$ 13 bilhões, dos quais R$ 2,2 bilhõe são de clientes institucionais, segmento no qual espera crescer 25% neste ano.
Dança das cadeiras – O diretor comercial da BBA Icatu, Carlos Garcia, prevê que o atual processo de fusões e aquisições no Brasil deve se dar entre grandes instituições financeiras, assim como acontece no exterior, e não entre as assets de menor porte. Segundo ele, associações como a que aconteceu entre o BBA e o Icatu devem ser menos comuns que as fusões e aquisições entre instituições de grande porte. “A dança das cadeiras já começou e, como sempre acontece, alguém deve perder o lugar ”.
Para o diretor de renda variável da Lloyds Asset Management, Paulo de Sá Pereira, o grande problema que impede o fortalecimento das empresas de gestão de recursos no Brasil é o perfil de distribuição dos fundos. “Os bancos comerciais não abrem a sua rede de varejo para vender fundos de outros bancos”, reclama. “Muitas instituições são obrigadas a investir pesado, mesmo trabalhando com margens de lucro baixas”.
Candidatos a comprador não faltam no mercado. Nomes à venda também não, embora não apareçam publicamente. Para Vitor Emanuel Duarte, consultor da Risk Fund, empresa especializada na avaliação de fundos de investimentos, a maior parte das aquisições deve englobar instituições locais, basicamente os bancos de atacado, que até agora resistiram ao assédio externo. Exata ou não a previsão, o certo é que o processo de consolidação das assets, iniciado no ano passado, está apenas começando.