Alívio no curto prazo | Nova regra de solvência traz flexibilidad...

Edição 277

 

A tão esperada nova regra de solvência dos fundos de pensão finalmente foi aprovada pelo Conselho Nacional de Previdência Complementar (CNPC). Pressionados pelos fracos retornos dos investimentos nos últimos três anos, a regra trouxe algum alívio imediato para os fundos com necessidade de equacionamento de déficit no curto prazo. Porém, no longo prazo, especialistas e dirigentes de entidades ressaltam que a nova norma é mais rígida.
A maior rigidez no longo prazo é explicada porque a partir de agora deve-se considerar a duration (duração do passivo) média de um plano e aplicar um redutor de quatro para estabelecer qual é o limite do déficit. Por exemplo, para um plano com duration de 12 anos, o limite para o equacionamento, que pela regra antiga era 10% de déficit independente da duração do passivo, passará a ser 8%. Em planos com duration ainda menor, a regra é mais dura, a ponto que, em um plano com duration de quatro anos, a tolerância para déficit passará a ser zero.
A principal vantagem, segundo dirigentes de entidades, é que a nova regra permite que o déficit a ser equacionado seja apenas o que ultrapassar o limite estabelecido pela regra. Ou seja, em uma fundação cujo limite de déficit é 8%, o que será equacionado será tudo o que ultrapassar os 8%. “Em um primeiro momento, percebemos que a regra é mais severa, pois pega a duração média do passivo e faz a redução de quatro”, enfatiza o diretor de investimentos da Funcef, Mauricio Marcellini.
Por outro lado, o diretor avalia positivamente a mudança no equacionamento do déficit. “O que ela introduz de conceito é que não precisamos mais equacionar 100% do déficit, apenas a diferença, o que faz com que fundações olhem para o longo prazo. Tenho visão positiva da regra, apesar dessa redução do limite de déficit, mas no conjunto geral é moderna e aderente às melhores práticas dos países”, salienta o executivo.

Aplicação – Como a norma permite que as fundações já executem seu plano de equacionamento de déficit com base nos novos cálculos, de forma facultativa, para o ano que vem, a Funcef considera apresentar seu plano adotando a nova regra. A decisão final ainda depende de aprovação da fundação e da patrocinadora. “Fizemos uma discussão com as entidades que representam nossos participantes. A princípio, devemos adotar a regra nova de imediato, pois vamos reduzir o déficit a ser equacionado do plano de benefício definido (BD) REG/Replan saldado, que está em R$ 5,1 bilhões, equacionando apenas R$ 1,9 bilhão. E em vez de equacionar o déficit em 12 anos, que é a duration do plano, a nova regra permite que eu equacione em 18 anos, ou seja, uma vez e meia a duration”, diz Marcellini.
No caso do outro plano BD, REG/Replan não saldado, a fundação registrou R$ 400 milhões de déficit no ano passado, e com nova regra não teria mais que fazer o equacionamento relativo ao exercício. “Isso gera impacto para os anos seguintes, pois vai acumulando novos déficits. Contudo, se eu fechar 2015 com mais déficit, tenho que apresentar um novo plano para começar uma cobrança até 2017. O que a regra permite é que eu conviva com um déficit de 7,5% por conta da nossa duration. É mais atrativo para o participante não equacionar agora, pois a ideia é recompor esse déficit com resultados dos investimentos no longo prazo”, complementa.
A Fundação Copel também já deve optar pela adoção das novas regras, que na opinião de seu diretor financeiro José Carlos Lakoski, são pertinentes, mas um pouco tardias. “As normas são oportunas e visam minimizar um pouco ou equalizar a distorção que tínhamos em relação ao prazo de equacionamento. Já era uma demanda antiga dos fundos de pensão. Essas medidas são importantes para que os fundos consigam tratar a questão do déficit estrutural”, salienta o executivo.
Com a nova regra, a fundação, que deve encerrar 2015 com um déficit de 2%, ficará abaixo do limite de 8% estabelecido com base na duration de 12 anos. “Não faria sentido ajustar esse déficit pequeno em 2017. Essa nova metodologia de solvência é inteligente nesse sentido, em capturar a característica de cada plano”, opina José Carlos Lakoski.
“Éramos cobrados no curto prazo, trazendo um grande desconforto, pois acabávamos fazendo política de investimento com foco nesse prazo menor em função de regras que não eram adequadas, distorcendo nossa política. Agora voltamos a ter um foco central que é o que norteia um fundo previdenciário, com política de longo prazo e fazendo ajustes necessários ao longo dos anos”, destaca o diretor da Fundação Copel.
Rigidez e segurança – De acordo com o presidente da Associação Brasileira das Entidades Fechadas de Fundos de Pensão (Abrapp), José Ribeiro Pena Neto, a regra de solvência sofreu um aperto frente à proposta enviada pela sociedade civil. “Houve um endurecimento da regra em relação ao limite do déficit para fins de equacionamento. A sugestão da Abrapp é que esse limite fosse calculado com base no modelo de duration-3”, explica Pena Neto. O executivo destaca, contudo, que o princípio básico da regra, que é ligar a solvência ao duration do plano, incentivando assim a gestão de longo prazo, foi acatado.
Além disso, Pena Neto acha ser positivo o fato de que a norma terá vigência já a partir de sua aprovação. “Com isso, as entidades que tiverem que apresentar um plano de equacionamento até o final de 2015, podem fazê-lo com base na nova regra de forma facultativa”, diz. Já a partir de 2016, a norma passa a valer para todos os fundos de pensão.
Para Antônio Gazzoni, diretor e consultor da Mercer, as regras são duras, mas dão a equidade de tratamento e a segurança para o sistema. “Não é flexibilização, pois dá uma visão de longo prazo para o plano. Além disso, essas regras só podem ser utilizadas se a entidade comprovar que tem liquidez para adiar o equacionamento. Por exemplo, em um plano com 12 anos, o limite para equacionamento é 8%. Mas a entidade só pode usar esse limite se, ao verificar o déficit, demonstrar que pode carregá-lo. Para isso, precisa ter liquidez sem que haja necessidade de se desfazer de capital”, diz Gazzoni.
O executivo destaca que à medida que a duration do plano é menor, a entidade não terá mais limites de déficit e será obrigada a equacionar qualquer insuficiência que tiver já no exercício seguinte. “Além disso, o equacionamento nunca poderá ser inferior a 1%. Se a duration de um plano é 12,5, o limite para déficit será 8,5%. Mas se o déficit for de 9%, a fundação deve equacionar no mínimo 1%, e não 0,5%. Outro ponto é que se o fundo de pensão tiver três planos de equacionamentos ativos, a partir do quarto deverá equacionar no mínimo 2%, e por aí em diante”, explica.
O executivo salienta que o mercado passou por um momento crítico e precisa criar mecanismos para proteger a segurança das entidades. “Tentamos dar a máxima longevidade possível aos planos. Essa é uma das regras mais avançadas e engenhosas que temos, pois permite a individualidade do plano de acordo com sua maturidade”, diz Gazzoni.

Redução do equacionamento – Como a nova norma estabelece que o valor a ser equacionado será apenas o que ultrapassar o limite do déficit, cálculos feitos pela Previc apontaram que haveria uma redução de 33% do valor do déficit que seria equacionado atualmente, com base em dados de 2014, e queda de 6% no superávit que seria distribuído com a regra vigente na mesma base de dados.
Contudo, executivos deixam claro que esse não é o objetivo da norma. “Não encaramos essa regra como um benefício para os fundos de pensão”, diz Silvio Rangel, coordenador da comissão técnica Ad-Hoc de precificação e solvência da Abrapp e diretor superintendente da Fundação Itaipu (Fibra). “Não queremos postergar déficits que precisam ser equacionados, nem antecipar equacionamentos que não precisam ser feitos. Inclusive, para algumas entidades, a nova regra será mais rigorosa que a antiga”, salienta.
O foco não é ampliar ou reduzir o déficit, complementa Gazzoni, mas sim verificar a necessidade do equacionamento do déficit no curto prazo. “A nova regra faz com que algo como 30% dos recursos que seriam exigidos de participantes, assistidos e patrocinadores não sejam usados no momento, o que dá um oxigênio e traz recursos necessários a cada momento. Mas o déficit permanece. A entidade apenas terá mais tempo para planejar melhor o fluxo das contribuições futuras, tendo uma visão de longo prazo e permitindo que patrocinador, participante e assistido se programe para pagar as contribuições”, salienta Gazzoni.

Entenda o que muda com a nova regra

Nova regra
• Os planos de benefícios serão obrigados a equacionar déficit quando seu percentual for superior ao respectivo duration do plano de benefícios;
• A fórmula utilizada será: 1% x (duração do passivo – 4);
• Para um plano de benefícios com uma duração de passivo de 12 anos, o limite percentual de déficit, sem a necessidade de equacionamento, corresponde a (12-4) x 1% = 8%;
• Neste caso, se o plano de benefícios possuir um déficit técnico acumulado de 7%, não há necessidade de equacionamento em um primeiro momento;
• Somente o que exceder aos referidos limites devem ser equacionados. No exemplo, caso o déficit técnico acumulado seja 10%, deverá ser equacionado o excedente de 2%;
• O limite do prazo para o equacionamento corresponderá a até uma vez e meia a duration do plano, ou seja, em um plano com duration de 12 anos, o prazo será de até 18 anos;
• A distribuição de superávit correspondente ao que excede a reserva de contingência dos planos, que agora será vinculada à duração do passivo do plano;
• Observa-se a seguinte fórmula: 10% + (1% x duração do passivo do plano);
• Para um plano de benefícios com uma duração de passivo de 12 anos, o limite da reserva de contingência passa a ser de (10% + (1%x12)) = 22%;
• Neste caso, se o plano de benefícios possuir 12% de superávit, não há o que distribuir. No entanto, caso o plano de benefícios possua 25% de superávit, poderá distribuir 3%.

Regra antiga
• A regra anterior estabelecia o equacionamento do déficit quando o mesmo ultrapassasse 10% das reservas;
• O equacionamento também era exigido em caso de registro de três anos consecutivos com déficit;
• A distribuição de superávit era associada à constituição de reserva especial dos planos, que correspondia ao excedente sobre a reserva de contingência com limite fixo de 25%.