Edição 94
O conselho de curadores do fundo de pensão multipatrocinado do Aerus, de empresas do setor aéreo, encontrou uma forma radical de resolver um problema com uma de suas patrocinadoras. Dirigido pelo presidente da Varig, Ozires Silva, o conselho decidiu excluir a Transbrasil do quadro de patrocinadoras do fundo de pensão por causa do impasse provocado na negociação de uma dívida de R$ 62 milhões. “Decidimos excluir a Transbrasil e a Secretaria de Previdência Complementar aprovou a decisão”, confirma Ozires Silva.
Contudo, a exclusão da patrocinadora ainda não foi formalizada porque na última reunião do conselho, realizada no começo de março, a Transbrasil pediu para adiar o início do processo de retirada. A empresa solicitou mais um prazo, até a próxima reunião do conselho, para renegociar com a SPC uma outra saída para o caso. Segundo informações do vice-presidente executivo da Transbrasil, Flávio Carvalho, uma nova proposta será apresentada para a SPC e para o fundo de pensão para tentar evitar a retirada da patrocinadora.
O conselho do Aerus não fechou as portas para uma possível mudança de posição. “Nossa preocupação maior é resguardar os direitos dos participantes e se a Transbrasil fizer uma boa proposta, não teremos problema em voltar atrás”, revela o presidente da Varig, Ozires Silva.
A dívida é proveniente de retenção de contribuições tanto da patrocinadora, no valor de R$ 51 milhões, quanto dos participantes, avaliada em R$ 11 milhões.
A proposta de exclusão da patrocinadora foi apresentada para a Secretaria de Previdência Complementar que aprovou o encaminhamento do caso dado pelo Aerus. Após a decisão, o presidente do Aerus, José Alberto Teixeira, renunciou ao cargo e em seu lugar foi nomeado o ex-presidente da Abrapp, Mizael Matos Vaz (ler quadro).
O conflito explodiu no início deste ano quando a SPC descobriu que a Transbrasil possuía uma dívida proveniente de retenção de contribuições dos participantes, no valor de R$ 11 milhões. Esse tipo de retenção é classificada como apropriação indébita e geralmente constitui motivo para intervenção no fundo de pensão, além de resultar em processo criminal contra a patrocinadora. A Secretaria, porém, resolveu deixar primeiramente que o fundo de pensão negociasse com sua patrocinadora em busca de uma saída. A dívida de R$ 51 milhões surgida a partir das retenções da contribuição da patrocinadora não era problema porque já estava contratada entre o Aerus e a Transbrasil.
Primeiro a Transbrasil apresentou uma proposta de pagamento da dívida de R$ 11 milhões em 18 meses que foi recusada pelo Aerus. O fundo de pensão alegou que a patrocinadora não havia oferecido nenhuma garantia para o cumprimento da proposta. Após a recusa, o conselho do Aerus decidiu propor a exclusão da patrocinadora como forma de preservar a saúde financeira do fundo de pensão.
Depois de tomar conhecimento do pedido de exclusão, a Transbrasil decidiu repensar a proposta de pagamento da dívida de R$ 11 milhões. A empresa pretende apresentar outra proposta para a SPC e para o Aerus, desta vez, acompanhada de uma garantia. “Nossa intenção é permanecer no Aerus”, ressalta Flávio de Carvalho.
Se não houver acordo e a retirada da Transbrasil for confirmada, será o segundo caso de saída de patrocinadora do Aerus. A TAM decidiu sair do plano do Aerus e migrou para outro fundo multipatrocinado no final de 1998. A empresa decidiu transferir o plano de benefícios de seus funcionários para o Multipensions do Bradesco.
Discussão – O conflito entre o Aerus e a Transbrasil reacendeu uma antiga discussão sobre a legislação do segmento dos fundos multipatrocinados. Até hoje não foi criada uma regulamentação específica para esse tipo de entidade fechada e alguns especialistas acreditam que os multipatrocinados não conseguem oferecer uma segregação total entre planos. Por isso, problemas com uma das patrocinadoras podem afetar as outras empresas que participam do fundo múltiplo. “Casos como o do Aerus evidenciam a deficiência da legislação em relação aos multipatrocinados”, aponta Paulo Sérgio Cavezzale, advogado especialista em fundos de pensão.
O advogado exemplifica que a Lei 6435/77 refere-se apenas à possibilidade de intervenção na entidade e não no plano de benefícios. “Como proceder em um caso como o do Aerus em que o problema é localizado apenas no plano de uma das patrocinadoras?”, questiona. Segundo o advogado, se fosse em um fundo de pensão com apenas uma patrocinadora, a SPC já deveria ter decretado a intervenção devido à retenção de contribuições dos participantes. Como o problema ocorreu em um fundo multipatrocinado, o órgão preferiu não intervir na entidade para não prejudicar os planos das outras patrocinadoras.
Outros especialistas discordam da interpretação dada por Cavezzale. O diretor do fundo multipatrocinado do CCF, Rogério Aguirre, acredita que os multipatrocinados podem oferecer uma segregação total entre os planos das distintas patrocinadoras. “Os fundos multipatrocinados, sobretudo aqueles ligados a instituições financeiras, adotam mecanismos internos, tais como contratos e acordos, que garantem a total segregação entre os planos”, afirma Aguirre.
Ele afirma que se uma patrocinadora deixa de repassar as contribuições para o fundo de pensão, o CCF tem instrumentos legais para impedir que o problema contamine outros planos. Da mesma forma, o fundo também possui uma fórmula para cobrar as contribuições atrasadas da empresa e, em um caso extremo, tem condições de promover a liquidação de apenas um dos planos.
Mizael assume presidência da fundação
O ex-presidente da Abrapp, Mizael Matos Vaz, volta a ocupar lugar de destaque no sistema de fundos de pensão. O executivo foi indicado para assumir o cargo de presidente do Aerus. Ele entra no lugar de José Alberto Teixeira, que deixa o fundo de pensão em meio a uma grave crise provocada pela negociação da dívida que a Transbrasil possui com a fundação. Mizael Vaz assume a direção do Aerus com a difícil missão de resolver o problema com a Transbrasil e evitar, desta forma, a intervenção da Secretaria de Previdência Complementar.
O ex-presidente da Abrapp (1990 a 1996) e atual presidente do Instituto Cultural de Seguridade Social (ICSS), desde 1992, assume a presidência do Aerus com a aprovação do presidente do conselho de curadores do fundo de pensão, Ozires Silva. Para quem conhece o histórico de Mizael Vaz dentro do sistema, já está apontando-o como um dos prováveis sucessores de Carlos Duarte Caldas na presidência da Abrapp.
Ex-engenheiro de telecomunicações da Embratel, Mizael Vaz começou a atuar no sistema de fundos de pensão na Telos (Embratel) como assessor atuarial em meados da década de 80. Em seguida tornou-se diretor de treinamento na Abrapp e em 1990 ganhou a eleição para a presidência da associação. Ocupou o cargo de diretor de seguridade da Telos enquanto ainda era presidente da Abrapp, mas foi afastado em 1996 da fundação na época da CPI dos fundos de pensão. Depois passou a ocupar um posto no conselho de curadores do fundo de pensão da Gazeta Mercantil.
Mizael Vaz é também lembrado como um árduo defensor da imunidade dos fundos de pensão. Atuou a favor da queda dos limites compulsórios de investimentos das fundações que vigoravam até 1996, até a aprovação da Resolução n o 2324.