Edição 137
Aguerra pelo equilíbrio da previdência pública no país deu um enorme passo no início de agosto, com a reforma da Previdência aprovada em primeiro turno na Câmara dos Deputados. As propostas contidas no Projeto de Emenda Constitucional 40 (PEC 40) concentraram esforços no sentido de reduzir o déficit da previdência dos servidores públicos.
A partir da entrada em vigor das novas regras, os servidores públicos inativos passarão a ter de contribuir para a previdência, o que era um dos gargalos do sistema. Outra mudança importante foi a equiparação do teto das aposentadorias e pensões do serviço público ao da previdência social, fixado em R$ 2.400,00. Mas esse só passa a valer para os novos servidores, os que estão na ativa poderão se aposentar com o benefício integral desde que contribuam um pouco mais de tempo: a idade mínima subiu de 48 anos para 55 anos, no caso das mulheres, e de 53 anos para 60 anos, para os homens. Quem não quiser esperar até a idade mínima terá uma redução de 3,5% por ano de antecipação no valor do benefício integral.
Para os novos servidores, que terão o benefício limitado a R$ 2.400, serão criados fundos de pensão complementares em regime de contribuição definida. Para Fábio Mazzeo, diretor regional de São Paulo da Abrapp e presidente do Instituto Metrus, essa é uma das grandes vitórias da reforma. “Os planos CD tem maior consistência e justiça social, além de apresentarem menores riscos. Quem tiver maior interesse faz maiores contribuições. É diferente dos planos BD, em que o pessoal de maior renda acaba se beneficiando mais”, opina.
Ele destaca ainda a importância desses fundos para o país, como formadores de poupança interna de longo prazo. “A previdência complementar terá forte impulso com a reforma, podendo contribuir decisivamente para a formação da poupança interna e para o desenvolvimento social”, acrescenta Mazzeo.
Os efeitos positivos da reforma no setor de previdência complementar fechada serão sentidos já a curto prazo, no crescimento do número de participantes e ativos financeiros. O secretário geral da Central Única dos Trabalhadores (CUT), João Vaccari Neto, estima que só a União deverá contratar cerca de 200 mil novos servidores nos próximos anos. De acordo com ele, essas contratações são uma resposta às pressões do Tribunal de Contas da União para que se regularizem as atividades de parte da mão-de-obra do setor público, que atualmente é desempenhada por empregados contratados de empresas de prestação de serviços, estagiários e outras formas de contrato. “A hipótese de adesão desses novos servidores aos fundos de pensão complementares é grande, porque eles não terão mais direito ao benefício integral”, acredita.
A proposta da CUT em relação aos fundos de pensão era de que a opção pelos regimes de benefício definido ou contribuição definida fosse dada aos participantes em conjunto com os patrocinadores. “Em algum momento houve uma contestação ao regime de contribuição definida, mas hoje vemos que muitos fundos reclamam que o benefício definido está custando caro. Nós achamos que essa deveria ser uma escolha dos participantes e patrocinadores, que efetivamente são os que pagam o plano”, acrescenta.
O secretário geral da CUT criticou o fato de não haver regras de transição entre a situação atual e a nova, criada pela reforma, e classificou como injusta a aplicação do “pedágio” de 3,5% para os salários mais baixos. “Matematicamente, o percentual de 3,5% é igual para todo mundo, mas na prática faz mais falta para quem ganha R$ 400 do que para quem ganha R$ 12 mil”, comparou. A Central propunha, ainda, que o teto dos benefícios fosse de vinte salários mínimos, ou R$ 4.800.
A falta de regras de transição também foi criticada por Sandra Garcia, presidente da Anaprem (Associação Nacional de Previdência Municipal). Ela salienta que muitos regimes próprios de previdência municipal tinham uma situação equilibrada e não necessitavam de uma mudança da magnitude da proposta na reforma para sobreviver. “Existem regimes próprios em que a alíquota é de 6% e agora terão que subir para 11%, onerando o servidor”, diz. Ela ressalta que o servidor sai prejudicado com a quebra de contrato e com uma queda nos benefícios, porque estes serão calculados pela média dos últimos sete anos. “Não é justo, pois os servidores contribuiram pelo teto e agora as regras foram mudadas”, afirma.
Segundo a presidente da Aneprem, hoje os regimes próprios têm R$ 20 bilhões aplicados no mercado, dos quais 80% são de municípios e 20% de estados. “Os municípios que fizeram a lição de casa vão pagar pelos problemas dos estados e da União”, acrescenta.
Institutos de Previdência – Por outro lado, os institutos de previdência devem aumentar o volume de reservas capitalizadas nos próximos anos. A maior arrecadação com o estabelecimento da alíquota de 11% para servidores ativos e aposentados e o aumento da idade de aposentadoria irão beneficiar o cálculo atuarial dos regimes próprios, que contarão com maiores reservas e pagarão menores benefícios.
Outro ponto importante é que esses institutos poderão administrar também os fundos de pensão complementar dos novos servidores, segundo interpretação da Aneprem. Pelas novas regras, esses fundos de pensão devem ter administração pública, ou seja, não serão entidades de caráter privado. Embora ainda dependa de regulamentação, a ser definida pela legislação ordinária, o consultor Newton Conde, da Watson Wyatt também acredita que os regimes próprios poderão administrar os novos fundos de pensão porque isso evitaria a criação de estruturas duplicadas, o que geraria aumento de custos e pessoal. “Centralizar o regime próprio e o fundo complementar em um único instituto gera economia administrativa e ganho de escala”, explica.
Para ele, resta saber como montar fundos de pensão para os municípios e estados menores, porque a maioria não tem condições de montar um fundo próprio.
Planos BD – A reforma da previdência também alivia a situação atuarial de parte dos planos de benefício definido que ainda está vinculada ao benefício da previdência social. Ou seja, com o aumento do teto do INSS para R$ 2400, esses fundos terão de pagar uma complementação menor para garantir o benefício ao associado. “Mas é necessário analisar cada tipo de plano, pois o impacto é diferente. Em geral, o impacto sobre o sistema não é muito grande pois a maioria dos planos atualmente é desvinculada da previdência social”, observa Newton Conde.
Éder Carvalhaes, consultor senior da Towers Perrin, concorda com a possibilidade de redução da complementação pelos planos BD, mas por enquanto não acredita que haverá forte movimentação nesse sentido. Para ele, o novo teto de R$ 2400 pode levar algumas patrocinadoras a reverem as contribuições aos planos. “Como a cobertura da previdência social irá aumentar, a necessidade de complementação será menor, e existe uma margem para reduzir as contribuições. Algumas empresas, principalmente aquelas com dificuldades financeiras, podem aproveitar a mudança para contribuir menos”, observa.
Ele ressalta, porém, que isso não deve ocorrer na maioria dos casos. “Por enquanto, acho que as patrocinadoras terão uma postura “mineira” (cautelosa) e vão esperar a definição mais clara da questão do teto e da Reforma como um todo”, opina. Os especialistas descartam que possa haver a saída de participantes dos planos de previdência com o aumento do teto do INSS, pois mesmo aqueles que estão abaixo do teto já têm uma percepção da importância do plano complementar.
Abertas – Quem não gostou muito da Reforma da Previdência foram as empresas abertas do setor, pelo menos no que se refere à formação de fundos fechados para os futuros servidores. “É um erro não permitir que as empresas de previdência aberta administrem os novos fundos de pensão dos servidores públicos. Defendemos a diversidade de opção”, afirma Osvaldo do Nascimento, presidente da Anapp (Associação Nacional de Previdência Privada). “Discordamos da política do atual governo que privilegia apenas os fundos fechados”, reitera.
Para ele, o problema dos fundos fechados patrocinados por entes públicos é o risco de desequilíbrios, porque a conta sempre é paga pela sociedade. Apesar da impossibilidade das empresas de previdência aberta administrarem os fundos de pensão dos servidores, as mudanças devem refletir positivamente no aumento do número de participantes dos planos abertos. “Mesmo antes da Reforma muitos servidores públicos estavam procurando individualmente planos abertos de previdência porque já tinham a percepção que a previdência social iria mudar. Essa procura deve aumentar ainda mais”, prevê o presidente da Anapp.
Principais Pontos da Reforma da Previdência
– Teto do setor privado: sobe de R$ 1.869,34 para R$ 2.400,00.
– Teto para o setor público: estabelecido em R$ 2.400,00 para novos servidores. Para os servidores atuais, a aposentadoria integral é garantida somente para aqueles que tenham 35 anos de contribuição para os homens e 30 anos para as mulheres; 60 anos de idade para homens e 55 para mulheres; 20 anos no serviço público e 10 anos no cargo em que se dará a aposentadoria.
– Pedágio: o servidor que se aposentar antes da idade estabelecida pela nova lei terá um redutor de 3,5% por ano a menos trabalhado no seu benefício.
– Contribuição de inativos: os que ganham a partir de R$ 1.440,00 terão de contribuir sobre o excedente a esse valor.
– Pensões: teto é de R$ 2.400,00, com exceção das Forças Armadas e da Polícia Militar, que terão lei específica.
– Fundo complementar: os funcionários públicos terão a possibilidade de participar de um fundo de pensão complementar, em regime de contribuição definida.