A meta atuarial em risco … | Os prejuízos dos fundos na mar...

Edição 119

A marcação a mercado das carteiras, a partir do dia 31 de maio, trouxe uma nova dor de cabeça aos fundos de pensão, além daquela representada pela queda das cotas dos fundos de investimento. É que, com o novo mecanismo, o cumprimento da meta atuarial de 2002 torna-se ainda mais difícil, caso persistam as incertezas em relação à eleição presidencial, à capacidade de pagamento das dívidas do Governo e à subida do risco País. “O mercado ficou estressado, mas a culpa não é da marcação a mercado”, diz o consultor da Risk Control, Mathias Fulda.
Na verdade, momentos de euforia e depressão dos investimentos fazem parte do jogo do mercado. A única diferença é que, agora, esses cenários de curtíssimo prazo são totalmente refletidos nas cotas de investimento dos fundos de pensão, que antes não marcavam a mercado. Entre alguns gestores, essa exposição do risco nas cotações, que começou a ser feita agora, chegou a assustar quando foi contabilizado o ajuste histórico. Com isso, desde o dia 31 de maio vários fundos passaram a ser sacudidos por fortes oscilações. Em algumas instituições a turbulência acabou logo no primeiro dia, mas em outras durou até quatro dias. Levantamento feito pela Mercer Human Resource Consulting, utilizando dados da Anbid, mostra como foi o comportamento dos cinco principais fundos dos 14 maiores administradores, que divulgaram cotas no dia 31 de maio (veja tabela).
É interessante notar que o comportamento desses bancos foi diferenciado. A Nossa Caixa, por exemplo, teve a maior perda (4,17%), mas a oscilação negativa ocorreu apenas no primeiro dia. Já a Caixa Econômica Federal, com queda de 3,30%, perdeu também na semana seguinte. O Banespa, que teve desvalorização das cotas de 2,02%, só conseguiu recuperar-se no dia 5 de junho. No Banco do Brasil (perda de 1,21%), a variação negativa durou menos tempo: dois dias. O mesmo ocorreu com o Itaú, que perdeu 0,86% no primeiro dia do novo sistema. O JP Morgan teve uma perda pequena no dia 31, de 0,08%, no entanto acumulou desvalorizações da cota durante quatro dias.
Toda essa virada no mercado acabou afetando diretamente as fundações. A Basf perdeu 0,3% do seu patrimônio de R$ 180 milhões com a mudança no sistema de marcação de cotas. Agora, a saída apontada por um integrante da equipe de investimentos é a de “rezar para a bolsa subir”. A Previ chegou a contabilizar perda de R$ 600 milhões. Mas segundo fonte do fundo de pensão, já foi contabilizada pequena recuperação de R$ 38 milhões, nos dias seguintes à introdução das novas regras.
Na Sistel, onde quase metade do patrimônio está em fundos exclusivos, a antecipação da nova marcação a mercado teve um impacto pequeno e não chega a preocupar, explica o diretor de planejamento da fundação, Wilson Carlos Duarte Delfino. “Nos fundos de mercado a cota caiu razoavelmente. Tivemos casos de fundos que ficaram em 50% a 60% do CDI do dia, mas isso teve apenas uma pequena influência no patrimônio”, afirma Delfino.
Já a Previllares, com boa parte do patrimônio de R$ 113 milhões investida em fundos abertos, reclama que sequer foi informada pelo gestor do fundo sobre o percentual de perda. O gerente administrativo da Previllares, José Carlos Ravelli, desconfia de perdas significativas nesses fundos, mas não quer arriscar nenhum percentual. Nos primeiros dias de funcionamento da nova marcação, ele disse que passou a cobrar dos outros gestores, que administram os fundos exclusivos, o cumprimento do contrato. Segundo ele, havia sido combinado com todos a marcação a mercado dos títulos. Ainda em relação ao cumprimento da meta atuarial, o gerente da fundação está confiante de que conseguirá reverter a situação de perda. “No primeiro quadrimestre nossa meta era de 2,84%, mas conseguimos rendimento de 4,90%. Vamos compensar uma diminuição no rendimento futuro com esse resultado positivo”, diz.
A Sabesprev não conseguiu bater sua meta atuarial no primeiro quadrimestre deste ano. O objetivo era chegar a 4,72%, mas o rendimento obtido ficou em 4,50%. Segundo o diretor financeiro, César Soares Barbosa, o motivo foi o desempenho ruim da bolsa. Agora, com a mudança da marcação a mercado, houve mais perdas. Mas, segundo ele, essas não chegaram a 0,10% e ficaram concentradas apenas em aplicações de fundos abertos (no total, há R$ 24 milhões em fundos condominiais). Apesar disso, o diretor acha que não terá dificuldades em bater a meta atuarial para o ano “porque o mercado financeiro pode ter uma recuperação”. A estratégia adotada por Barbosa é a de não fazer nenhum movimento, por enquanto, mantendo entre 17% e 18% o percentual aplicado em bolsa.
Na hora de avaliar se o novo regime de marcação trará novos prejuízos à rentabilidade das fundações, é preciso levar-se em conta o tipo de plano que é oferecido ao participante. Segundo o diretor do Instituto Brasileiro de Atuária (IBA), Heitor Rigueira, os planos de contribuição definida não terão problemas de rentabilidade, porque o risco de obter uma rentabilidade menor é do participante e não do fundo. Na previdência aberta, esse é o caso, por exemplo, dos fundos PGBL disponíveis no mercado. Já em planos de benefício definido, a mudança compromete. “Fica mais difícil atingir a meta atuarial”, diz Rigueira.

Oscilação não é perda – O consultor da Mercer, Lauro Araújo, defende que o ato de marcar os títulos a mercado apenas faz a cota oscilar mais sem, no entanto, prejudicar o resultado dos rendimentos das aplicações dos fundos de pensão, porque a duração média dessas carteiras é pequena. “A marcação a mercado prejudica a rentabilidade no curto prazo, mas é benéfica para as fundações no longo prazo já que traz maior transparência”, afirma. Outro que acha que a mudança não compromete a meta atuarial dos fundos é o atuário Newton César Conde, da Watson Wyatt. “Os fundos já tiveram uma mudança muito mais brusca, que foi o início da cobrança de Imposto de Renda, mas o impacto foi bem absorvido pelas fundações”, afirma Conde.
Conde lembra que o horizonte dos fundos de pensão é de longo prazo e que, portanto, não vão ocorrer saques das aplicações financeiras que signifiquem uma realização de prejuízos. “O dia-a-dia das fundações não é especulação. Não é porque a bolsa cai que vão ocorrer resgates”, diz. “Aquelas que registrarem déficits em um determinado momento, por conta das fortes oscilações no mercado financeiro e da nova marcação, poderão reverter a situação a médio prazo”.

Juros altos – Em meio à turbulência, os juros reais altos são um fator positivo para as fundações. Isso porque são suficientes para estimular ganhos em renda fixa das fundações e garantir o cumprimento da meta atuarial. Já em renda variável o cenário tende a tornar-se mais instável. Caso isso ocorra mesmo, as fundações que estão mais carregadas em ações são as que teriam as maiores perdas e ficariam ainda mais longe da meta. É o caso dos fundos de pensão mais antigos e das estatais, como a Previ e Aerus.