Edição 51
A crise cambial mostrou que, de fato, os gestores de recursos estão mais
conservadores
A crise cambial mostrou que, de fato, os gestores de recursos estão mais
conservadores. Ao contrário do que acontecia no passado, a excelente
performance que muitos fundos de renda fixa e derivativos tiveram em
janeiro derivou de uma gestão conservadora dos investimentos.
Esses fundos, que superaram a sua média de rentabilidade de 98,
praticamente não tinham posições compradas em dólar no início do mês.
Venceram, por um lado, por terem na carteira títulos públicos cambiais,
que pagavam uma taxa de juros mais a desvalorização do câmbio. Esses
títulos, emitidos a partir da crise russa, em agosto do ano passado, teriam
rentabilidade próxima ao CDI, se nada tivesse acontecido.
Por outro lado, também em consequência da crise russa, as apostas
deliberadas nos mercados futuros perderam espaço para operações de
curtíssimo prazo e no overnight, forma encontrada pelos gestores para
neutralizar os riscos do “dia seguinte”. “Desde o segundo semestre de 98
só tínhamos posições líquidas. Só trabalhávamos no curto prazo”, diz o
sócio do Pactual responsável pelos produtos do asset management, Paulo
Cunha. “A cada dia ficava mais difícil as contas do país fecharem, e vimos
que o modelo econômico poderia romper”.
Apesar da evidente fragilidade do real, com a demora na aprovação dos
ajustes na economia e a pressão sobre as reservas cambiais, o governo
dava fortes sinais de defender a política econômica ancorada ao dólar. Por
isso, apostar em qualquer das duas pontas era, no mínimo, bastante
arriscado. “No ano passado, o cenário não apontava para uma maxi-
desvalorização do real, mas era bastante instável”, sintetiza o gerente de
vendas locais do CCF, Marcelo D’Agosto.
Na dúvida, quem agiu com cautela se deu bem. Um deles foi o banco
Liberal. “Não tinha nada definitivo na nossa carteira, ficava tudo no
overnight. Desde o final do ano passado, zeramos todas as nossas
posições, preocupados com o que poderia acontecer”, conta o diretor de
institucionais Guilherme Cavalcanti.
Na cola – O passo seguinte, na mesma linha conservadora, foi rechear a
carteira dos fundos com títulos públicos cambiais que o governo ofertou no
início de janeiro. “A rentabilidade desses títulos, se não acontecesse nada,
ficaria pelo menos muito próxima ao CDI”, acrescenta.
A consequência foi uma rentabilidade de 169,2% do CDI no fundo Liberal
Tradicional e de 1.470% do CDI no Liberal Moderado, que tinha um
percentual maior de títulos cambiais na carteira. O moderado assumiu,
ainda, algumas “posições curtas” no mercado futuro, durante a crise.
Esses fundos, nos quais se concentra a maior parte das aplicações de
institucionais no banco, renderam 103% do CDI e 120% do CDI em 98.
Já os fundos do banco Pactual se valeram de operações curtas,
basicamente arbitragens de cupom cambial, que é a diferença entre taxa
de juros e desvalorização cambial, conta Paulo Cunha. O High Yield, de
perfil moderado, e o Hedge, agressivo, renderam 125% do CDI e 172%
do CDI em janeiro, contra uma média de 110% e 120% do CDI em suas
respectivas categorias. “Montamos uma estrutura de operações de
arbitragem de cupom cambial que multiplicava os ganhos, quanto maior
fosse o percentual de desvalorização do real. A idéia era que mesmo se
não acontecesse nada, teríamos lucro. Para cada movimento de 1% do
real, ganhávamos 1%, mas se passasse de 10%, ganharíamos muito
mais”, exemplifica Cunha.
O fundo Leverage do banco Matrix, tinha uma pequena posição comprada
em câmbio no início de janeiro mas, segundo o diretor Celso Portásio,
foram as arbitragens que levaram à rentabilidade de 173% do
CDI. “Fizemos posições rápidas nos mercados de juros, câmbio e bolsas”,
conta. O Leverage tinha um histórico de 104% do CDI, e concentra as
aplicações dos institucionais em fundos do banco, fora os de renda fixa
tradicionais.
Diversificar – Para Marcelo D’Agosto, do CCF, a principal lição dessa crise é
a de que diversificar os investimentos é a melhor maneira de ganhar
sempre. Ele conta que o fundo CCF Multi conseguiu 131% do CDI, sendo
um fundo de renda fixa conservador. Esses fundos, em geral, perseguem
o CDI, e por isso qualquer coisa acima ou abaixo costuma ser mal vista.
Mas a estratégia do CCF foi simplesmente colocar títulos públicos cambiais
na carteira, cuja rentabilidade seria muito próxima à do
benchmark. “Depois da crise da Rússia, o governo colocou títulos cambiais
com rentabilidade de CDI, sem o prêmio pelo hedge, para acalmar o
mercado. Achamos que era uma oportunidade de diversificar a carteira,
sem risco”, explica.
O CCF Multi é só para institucionais, e tem patrimônio de R$ 500
milhões. “O fundo foi desenhado para as fundações, e por isso não corre
riscos de crédito nem tem alavancagem. As posições no mercado futuro
são apenas para hedge”, esclarece.