Crise faz o investidor ficar mais conservador

Edição 25

O susto das bolsas tornou o investidor institucional mais conservador

O susto das bolsas tornou o investidor institucional mais conservador. Em poucas semanas, olhando a volatilidade do mercado de ações e as derrapadas das aplicações em renda fixa, ele mudou. Na análise dos administradores de recursos, o mercado está mais avesso aos riscos.
“Vamos ter que mudar também, vamos ter que oferecer produtos que reflitam melhor essa nova perspicácia do investidor”, reconhece o vice presidente do BCN Alliance, Roberto Pitta. O BCN Alliance está lançando três novos fundos de renda fixa, com modestos 10%, 15% e 20% de renda variável na sua composição. Na área de ações, está lançando um fundo de ações com papéis escolhidos através de análise fundamentalista, cujo objetivo é proporcionar retorno com base nos resultados das empresas e não na sua análise gráfica.
“Estamos lançando produtos para clientes que saíram da crise muito machucados”, admite Pitta. Segundo ele, na primeira quinzena de novembro, o Alliance foi procurado por duas fundações interessadas em fazer fundos exclusivos. O interessante foi a composição que elas pediram: 80% em renda fixa e 20% em variável. Além disso, fizeram questão de conhecer os papéis que iriam compor a carteira de renda variável.
Segundo Pitta, ao montar fundos exclusivos, a Alliance costumava abrir sua composição aos clientes, mas eles não ligavam muito. “Agora, passaram a questionar mais, querem saber se os papéis são realmente bons”, diz. “Estão mais atentos ao risco”.
A fundação Real Grandeza tinha uma nítida vocação para o risco antes da crise. Mas, com o prejuízo que levou, está mudando. Segundo o operador de renda fixa, Wilson Barcellos, a fundação tinha quase 100% de sua carteira de renda fixa aplicada em fundos mútuos, alavancados e de derivativos, travados com cotas de fundo mais conservadores. Uma obra de engenharia especulativa, que ele supunha segura.
Porém, a queda das bolsas desvalorizou as cotas dos fundos e a rentabilidade caiu abaixo do CDI – meta estabelecida pela fundação para sua carteira de renda fixa. Agora, a fundação está resgatando os seus fundos mais voláteis e reaplicando os recursos em fundos exclusivos. “Estamos preferindo correr menos risco, mesmo que seja para ganhar um pouco menos”, diz Barcellos.
Outra que tinha vocação para o risco, mas que parou antes do prejuízo, foi a Eletros. Ela praticava, no período da crise, um jogo arriscado, de comprar papéis em bolsa num dia para revendê-los, alguns dias depois, um pouquinho mais caros. Era o jogo da volatilidade. Parou exatamente em 10 de novembro, quando uma análise feita na própria fundação mostrou que o risco estava aumentando muito. “Exceto a inflação, os dados macroeconômicos não estavam bem. Apontavam para um risco grande, porque a economia está muito atrelada à entrada de recursos externos”, conta Beni Faermann, diretor financeiro da Eletros. “Saímos daquele jogo arriscado e estamos buscando posições mais moderadas”.

Cálculos – A Secretaria de Previdência Complementar (SPC) está começando a calcular os prejuízos das fundações com a crise, baseando-se nos dados de setembro, que está recebendo. Segundo a secretária Mônica Messemberg, se em outubro os fundos mantiveram as mesmas posições de setembro, o prejuízo pode ter sido grande. Mas ela não se arrisca a falar em valores. Afirma, entretanto, que os prejuízos estão levando os fundos de pensão a se preocuparem mais com o risco, depois de terem tomado um susto.
“Vamos ter que explicitar mais os riscos aos nossos clientes”, admite o diretor do BBA Capital, André Pires. Segundo ele, dos 5 fundos de renda fixa e 6 de renda variável que o BBA possui, 3 e 2, respectivamente, utilizam derivativos. Esse perfil de risco deve ser redefinido. “Os clientes estão mais seletivos quanto ao uso de derivativos, eles estão exigindo uma definição clara dos riscos”, diz. “Vamos ter que acompanhá-los, estamos pensando em alguns produtos”.
Outro banco que está preparando novos produtos para os clientes é o Patrimônio. Um desses é um fundo que oscila entre a renda fixa e a variável, como se fosse a carteira de uma fundação. Isso, de acordo com o idealizador do fundo, Ricardo Weiss, “permite ao cliente escolher vários perfis de aplicação, do conservador ao agressivo, sem mudar de fundo”.
Ele se soma aos 17 fundos já administrados pelo banco, dos quais 3 são de renda fixa pura, 3 são renda fixa balanceada (com Bradesco), 3 de derivativos e 7 de ações carteira livre.
Para o diretor do Patrimônio, Fábio Vidigal, “o mercado está repensando o risco que está disposto a correr””. O perfil da indústria de fundos foi formado em 95, quando a CVM regulamentou esse mercado. De lá para cá, ele pouco mudou. Agora, com os novos receios os investidores, ele vai mudar. “O mercado vai demandar produtos com mais proteção contra desvalorização cambiais e outros que vão tentar aproveitar as altas taxas de juros”, raciocina Fábio.
Os fundos indexados ao CDI estão tendo maior procura no CCF, segundo o vice-presidente da Instituição, Marcelo Giufrida. “Estamos notando uma maior procura por esse produto, acho que é porque os clientes estão um pouco assustados”, diz. O fundo indexado ao CDI do CCF, criado em 1988, estava meio esquecido nos últimos meses. Em setembro ele estava com R$ 450 milhões mas em novembro já batia nos R$ 600 milhões.
De acordo com Giufrida, os produtos tipo CDI “devem entrar na moda, uma vez que não correm tanto risco”. Já os produtos com garantia do principal, “devem sair da moda, eles eram bons quando as bolsas estavam subindo”.

Migração – No BankBoston, a tendência de migrar do fundo de renda fixa para fundo DI ficou clara nos últimos dias de novembro. O fundo de renda fixa Capital Fix perdeu R$ 1,7 milhão em novembro, até o dia 21, acumulando patrimônio de R$ 112 milhões. Em compensação o fundo DI teve uma captação líquida de R$ 14 milhões, acumulando patrimônio de 1 bilhão. “O nosso cliente está passando de um fundo para outro”, diz Fábio Rodrigues de Oliveira.
Segundo ele, uma das peculiaridades dessa crise é que ela afetou não apenas a rentabilidade da renda variável mas também a da renda fixa, porque alguns bancos tinham vendido fundos DI que não eram fundos de renda fixa alavancados, levando os clientes a perderam dinheiro. “Dessa vez, os clientes viram as aplicações que tradicionalmente eram seguras terem um impacto negativo”.

Cadeiras – A desconfiança dos clientes, segundo Pitta, do BCN Alliance, deve levar a uma dança das cadeiras das contas das fundações. Muitas ficaram insatisfeitas com a performance dos seus gestores atuais, e podem trocá-los ou agregar um segundo ou terceiro gestor, dividindo os recursos. “Para nós, que estamos chegando agora, essa deve ser uma boa fase”, comemora.