“O governo costuma ter uma mão muito pesada”

Edição 25

A cobrança de impostos sobre os rendimentos das aplicações em renda
fixa e variável é um dos pontos mais polêmicos do pacote do governo

A cobrança de impostos sobre os rendimentos das aplicações em renda
fixa e variável é um dos pontos mais polêmicos do pacote do governo. “A
mão do governo costuma ser muito pesada. Com esse pacote, eles
podem desestimular a formação de poupança interna”, diz o
superintendente geral da Abrapp, Devanir da Silva.
A entidade está tentando mudar esse e outros pontos do pacote
considerados prejudiciais aos fundos de pensão. De acordo com Devanir, a
Abrapp tem mantido contato com o relator da comissão mista no
Congresso que analisa o pacote, o deputado Roberto Brandt, para
apresentar emendas sobre três pontos do pacote:
• A primeira é quanto ao pagamento de imposto de renda sobre os lucros
das aplicações.
• A segunda é sobre o limite de abatimento do imposto de renda da
patrocinadora, que passaria a ser o dobro da contribuição do participante.
Isso prejudica as patrocinadoras que pagam integralmente, pois como o
participante não paga nada, elas também não poderiam deduzir nada.
• A terceira é sobre o limite de 12% (dentro de um limite maior, de 20%,
para educação, previdência e INSS) para a previdência complementar, por
parte do participante.
“São medidas equivocadas, estamos tentando eliminá-las do pacote”, diz
Devanir. Para o diretor financeiro da Sistel, José Vianna, a tentativa do
governo de taxar o lucro dos fundos de pensão vai sofrer contestações na
Justiça. “Essa medida deve gerar uma onda de ações judiciais por parte
das fundações”, afirma.
A medida estaria atropelando o poder judiciário, que concedeu a algumas
entidades liminar garantindo a imunidade tributária até o julgamento da
questão pelo Supremo. E, por serem imunes, essas não deveriam pagar
nenhum imposto até a definição da questão pelo STF. Segundo o
superintendente da fundação Fibra (Itaipu), Rubens Ghilardi, sua entidade
não vai pagar os impostos, salvo se o Supremo votar contra a
imunidade. “O governo terá que respeitar a Justiça, que nos deu liminar
favorável à imunidade tributária”.

Indexador – Para Álvaro Andrade, assessor da diretoria financeira da
Regius, o mais preocupante é que as regras para essa cobrança ainda não
estão definidas. “Em geral, para se calcular o IR dos investimentos, leva-
se em conta o custo da aquisição corrigido por um indexador. Nós, por
exemplo, temos em carteira ações da Telebrás que foram compradas na
época da crise do México. Se forem seguidas essas regras, os ganhos
auferidos quando tínhamos imunidade seria tributado agora”, diz.
Segundo Ana Maria Martin, consultora jurídica da Mercer MW, “as
fundações deverão discutir em juízo a cobrança de impostos, mas não há
garantia de sucesso”.
Para ela, entretanto, o limite do que a patrocinadora pode deduzir do IR
(o dobro da contribuição do empregado) a título de gastos com
previdência, é uma ameaça. “Essa questão é gravíssima e vai ter um
reflexo imediato nos planos, com algumas empresas podendo até mesmo
pensar em fechar os fundos”, alerta.
Segundo ela, esse limite deve causar um forte impacto negativo no
sistema de previdência complementar, seja no que se refere à
manutenção de planos existentes, que poderão ser alterados, seja no que
se refere à iniciativa para criação de novos planos, já que o benefício fiscal
não é mais tão atraente.
Mas, nem todas as fundações seriam atingidas diretamente, pois algumas
contribuem com duas vezes ou menos do que o participante. É o caso da
fundação Enersul, em que a relação é de 2 para 1 e da Bases (Banco do
Estado da Bahia), que é ainda maior. “A patrocinadora paga 1,8 para cada
1 do participante”, diz Gilvan Dantas, superintendente da fundação.
A preocupação em relação às medidas do pacote não é exclusiva dos
dirigentes de fundos de pensão. Não só elas devem ser atingidas, mas
também os planos abertos podem sofrer grande impacto. “Tanto para
pessoas físicas como jurídicas, estimamos que o mercado vai ser afetado
de forma negativa”, avalia José Inchausti, da Vera Cruz Seguradora.
“A regra do FAPI (que agora foi equipado a plano previdenciário para
efeito de desconto no IR) previa planos onde apenas as empresas
poderiam contribuir”, diz Valdery Albuquerque, da Sasse Seguros. Seu
medo é de que essa medida desestimule as empresas a implantarem
planos de previdência para seus funcionários.

Vendas – Os especialistas das abertas estimam que o limite de dedução
no imposto de renda pessoa física, para a contribuição em planos de
previdência, vai afetar muito as vendas do setor. Embora muitos avaliem
como razoável o limite de 12% de dedução do IR, ele pode retrair a
iniciativa de participantes em contribuições obrigatórias.
Se os 12% são considerados razoáveis, o fato de estar atrelado a outro
limite (de 20%, em que se inclui também gastos com educação e
previdência social) desagradou. A previsão é de que esse limite deve
desestimular sobretudo os de renda mais baixa, com filhos em escola
particular. Muitos participantes que contribuem, devido aos gastos em
educação, podem ser bitributados em relação aos planos de previdência,
já que pagarão o excedente dos 20% na contribuição e mais tarde, sobre
a totalidade do resgate, quando forem se aposentar.