Perspectivas 2006 – Robert John Van Dijk

Edição 166

Líquidez e crescimento ajudam a derrubar juros

Farta liquidez internacional e baixa percepção de risco devem determinar
boa parte dos acontecimentos que marcarão o ano de 2006, a exemplo do
que se observou em 2005. Tal liquidez permitirá que os indicadores de
solvência externa brasileira sigam em recorrente melhoria. Haverá uma
recomposição adicional das reservas internacionais líquidas e o saldo
comercial ainda será robusto, embora menor do que em 2005. Este
ambiente de farta liquidez e de crescimento permitirá que o Banco Central
Brasileiro mantenha a rota de redução da SELIC, que no entender da BRAM
pode atingir a casa dos 16% aa já em meados de 2006. O processo de
redução dos juros deve contribuir para a recomposiação da confiança dos
consumidores. Confiança, continuidade do processo de recuperação da
renda, expansão do crédito e o provável aumento dos gastos do setor
público – que podem chegar a algo em torno de 1 ponto percentual do PIB,
ou seja, em torno dos R$ 18 bilhões – deverão dar novo alento à
demanda, fazendo com que o Brasil cresça algo como 3,2% em 2006. Este
é um resultado evidentemente melhor do que os prováveis 2,2% a serem
observados em 2005, mesmo em um ano onde a incidência do calendário
eleitoral pode trazer alguma volatilidade para o mercado financeiro.

O ambiente externo
A poupança global passou de 23,9% do PIB mundial em 2003, para 24,9%
em 2005, nível historicamente elevado se comparado ao que vigorou, em
média, na década de 90, a saber, 22,9%. É provável que em 2006 a
poupança global novamente cresça, passando a representar algo em torno
dos 25,2% do PIB. Tal elevação acontecerá em decorrência da preservação
de uma dinâmica já observada nos últimos anos. Os grandes responsáveis
pelo incremento no nível de poupança global têm sido os países
emergentes, que depois dos processos de ajuste adotados como resposta
às dificuldades impostas pelas crises da última metade da década de 90,
investiram em reformas que redundaram em significativas melhoras de
seus resultados fiscais. As melhores performances fiscais se associaram a
maiores taxas de lucro das empresas, e, no caso específico dos
emergentes asiáticos, os dois fenômenos se combinaram com uma
predisposição tradicionalmente alta das famílias em postergar consumo,
explicando o por que das poupanças terem se elevado nestes países no
período mencionado. Todos estes elementos estarão presentes em 2006.
Os emergentes, que à duras penas conquistaram uma situação fiscal
saudável, não estarão dispostos a enveredar em trajetória oposta, dados
os benefícios já colhidos pelas reformas e a clara noção de custo do ajuste
que tais países adquiriam depois de feita a lição de casa. Em segundo
lugar, dada a pujança das economias emergentes, especificamente da
Ásia, leste europeu e produtores de petróleo, é também razoável trabalhar
com a hipótese de manutenção de taxas elevadas dos lucros de suas
empresas.
No front internacional, a novidade ficará por conta da contribuição que os
Estados Unidos darão para definir o comportamento das principais
variáveis. A economia norte- americana tem crescido de forma
surpreendente. O PIB do terceiro trimestre de 2005 se expandiu 4,3% em
termos anualizados, sendo provável que o crescimento alcance algo entre
3,7% e 4,0% em 2005. Este crescimento é puxado pelos gastos das
famílias e em grande parte financiado pela liquidez abundante que se vê
no planeta. Para se ter uma idéia, hoje em dia 75% da poupança global
migram para os Estados Unidos. Por outro lado, já há fortes indícios de que
o investimento norte-americano esteja reagindo e venha a assumir um
papel de maior relevância na dinâmica do crescimento, mais em linha com
o que se observava na segunda metade da década de noventa. Nestas
condições estaríamos diante de um ciclo de crescimento mais duradouro e
mais sólido, o que realimentaria a fase positiva que os emergentes
atravessam, via efeito multiplicador sobre a atividade e via melhor
percepção de risco. Trata-se de um ciclo virtuoso, a despeito da
continuidade do processo de alta dos Fed Funds e, consequentemente, de
um provável movimento de realinhamento de juros em boa parte dos
cinco continentes. Estamos trabalhando com a hipótese de o Fed Fund
encerrar o ano de 2006 na casa dos 5,0% aa, sendo importante destacar,
todavia, que boa parte deste provável ajuste já foi amplamente antecipado
pelo mercado. Mesmo diante dessa antecipação pelos agentes, os juros
dos títulos de prazos mais longos se mantêm em patamar baixo,
fenômeno que apesar de aparentemente se constituir em um enigma,
parafraseando as palavras de Mr. Greenspan, se explica pela já
mencionada melhora na percepção de risco. Isso deriva, sem dúvida, do
crescimento de “melhor qualidade” dos EUA, que torna mais palatáveis os
problemas representados pelo crescimento seus déficits gêmeos nos
últimos anos, mantendo baixa a percepção de risco e realimentando o ciclo
virtuoso de crescimento e liquidez.

Brasil
O vigor da economia norte-americana manteve aquecida a atividade
global, impulsionando os fluxos de comércio e abrindo espaço para que as
economias emergentes viessem a acumular fartos incrementos de
exportações líquidas e importantes superávits em seus balanços de
pagamentos. Com o Brasil não foi diferente. O excelente resultado das
exportações e a redução do endividamento externo do setor privado
brasileiro têm produzido uma seqüência de melhores indicadores de
solvência externa, o que faz crescer o apetite do investidor estrangeiro pelo
Brasil, especialmente face às atrativas taxas de retorno (diferencial de
juros) oferecidas, mantendo o Real apreciado. São estas mesmas
condições que em 2006 – levando em consideração o calendário eleitoral –
permitirão que a cotação do dólar, em média, não se descole do patamar
previsto para o ano de 2005, que na expectativa da BRAM, gira em torno
de R$ 2,40. Este patamar, em confronto com uma cesta de moedas
relevantes para nossas exportações, está próximo de 18% abaixo da
média dos últimos 25 anos. A propósito, é provável que alguma
volatilidade sobre o preço dos ativos financeiros – em especial do câmbio –
seja produzida pelo advento das eleições, mas nada que se assemelhe ao
grau de comprometimento observado em 2002.
Mesmo face a essa apreciação cambial, a balança comercial revelou
superávit de US$ 40,4 bilhões no acumulado do ano até novembro, com
exportações de US$ 107,4 bilhões e importações de US$ 66,9 bilhões. Para
o ano de 2005, a expectativa é de o saldo comercial atinja o recorde
histórico de US$ 43,5 bilhões, com ampliação importante da corrente de
comércio. A expectativa para 2006 é de que o saldo recue suavemente,
para o patamar dos US$ 37 bilhões. O maior dinamismo da demanda
doméstica deve criar pressões sobre as importações, mas o crescimento do
comércio mundial e uma nova alta esperada nos preços das commodities
tendem a compensar parte deste efeito. Dado o cenário de farta liquidez e
baixa percepção de risco, além dos excelentes indicadores de solvência
externa brasileira, importações mais elevadas nos permitirão crescer sem
necessariamente incorrermos em pressões que ponham em risco o
cumprimento da meta de inflação. Aliás, são notórios os ganhos no
ambiente inflacionário. Nossa expectativa é de que o IPCA feche o ano de
2005 com a alta de 5,85%, caindo para 4,85% em 2006. Uma vitória não
só em relação ao patamar de 7,6% de 2004, mas principalemnte em
relação às fortes pressões sobre os preços que se formaram ao longo do
segundo semestre daquele ano e que certamente teriam feito a inflação de
2005 ser muito maior do que a observada, não fosse a ação contundente
da autoridade monetária. Todavia, permanece a preocupação com o
comportamento da taxa de investimentos no Brasil, que se mostrou
titubeante ao longo de 2005. O desempenho pouco dinâmico do
investimento reduz os graus de liberdade do Banco Central para cortar a
taxa Selic de forma mais ousada, mesmo diante de um crescimento do PIB
brasileiro que novamente ficará aquém da média dos emergentes em
2006.
Por fim, tendo em vista o cenário apresentado, acreditamos que os
investimentos em renda variável continuarão atrativos, mesmo com a
volatilidade que o ano eleitoral poderá trazer. A queda dos juros, aliada à
probabilidade de menores pressões inflacionárias, deixa atraentes os
papéis indexados a índices de preços, com destaque aos atrelados à
variação do IPC-A (NTN-B); uma vez que os cupons de juros reais
oferecidos estão em patamares elevados. Neste contexto tornam-se
interessantes os investimentos em Fundos Multimercados e Multi-Índices.

Robert John Van Dijk é diretor-superintendente da Bram – Bradesco Asset
Management