Hora de fazer planos

Edição 164

Fundos de pensão definem suas políticas de investimento para o ano que
vem na expectativa de juros nominais gradualmente mais baixos e
apostando na atratividade da renda variável

O cenário traçado pelos analistas do mercado financeiro para 2006 sinaliza
um bom ano na renda variável para os fundos de pensão, sobretudo com
a perspectiva de queda gradual dos juros nominais. Os juros reais,
entretanto, devem continuar altos – na casa dos 10% ao ano –, o que
também deverá manter a atratividade dos títulos públicos federais. Os
analistas esperam, ainda, por um arrefecimento da crise política brasileira,
com transição eleitoral tranqüila, e a repetição dos bons resultados
financeiros das empresas. No cenário externo, considera-se uma discreta
elevação dos juros norte-americanos e a manutenção da alta liquidez
mundial.
A partir dessas perspectivas, as fundações finalizam suas políticas de
investimento para 2006. A Valia, dos empregados da Companhia Vale do
Rio Doce, por exemplo, deve ampliar para 30% da sua carteira de
investimentos o volume aplicado na Bolsa de Valores, o que equivale a
quase R$ 2 bilhões. Hoje, este porcentual está em quase 27%. A
Fundação Cesp também pretende investir mais no mercado acionário:
15% de sua carteira de crédito privado, de R$ 750 milhões, deve tomar
este rumo.
O diretor de gestão de risco da fundação, Édner Bitencourt Castilho,
acredita que, embora as metas atuariais deste ano sejam alcançadas com
tranqüilidade – devido ao elevado juro real brasileiro –, deverá ser feita
uma reavaliação de alguns ativos para o próximo
exercício. “Continuaremos acompanhando de perto novas opções de
investimentos, mas não acreditamos numa guinada imediata para ativos
de maior risco. Principalmente por já estarmos bem posicionados em
ativos referenciados à inflação”, diz.
Já a Fundação Sistel é assessorada pela MCM Consultores, do ex-ministro
Maílson da Nóbrega, sobre como deverá se comportar em 2006. O gerente
de planejamento e análise de investimento da Sistel, Décio Magno
Andrade Stochiero, explica que foram traçados três cenários macros, com
três probabilidades cada um, para se tentar fazer as melhores escolhas.
No dia 9 de novembro, o Conselho Deliberativo fechou a faixa e o nível de
alocação dos investimentos. “Em linhas gerais, conclui-se que ainda
prevalece o prêmio para exposição em Bolsa, só que com redução”,
afirma.
A MCM considera como pano de fundo dois pontos da economia
internacional: como se comportarão a política e a economia norte-
americanas e o risco de retração na liquidez global. Nesse caso, começa-
se a perceber tendência de redução da poupança mundial, mas que deve
se confirmar somente em 2007. Nos Estados Unidos, espera-se
manutenção ou aumento gradual dos juros. No contexto interno brasileiro,
acredita-se numa leve queda no aquecimento da atividade econômica,
uma vez que o dólar caiu muito em relação ao real, o que desaquece a
indústria exportadora. Já a inflação deve seguir a rota estabelecida pelo
governo.
Stochiero também aposta que a política brasileira não deve trazer
novidades além de uma polarização na provável corrida presidencial entre
o atual presidente, Luiz Inácio Lula da Silva, do PT, e o candidato do
PSDB, José Serra, atual prefeito de São Paulo. Mesmo a possível
candidatura do governador paulista Geraldo Alckmin não deve trazer
mudanças nessa disputa. “A condição estrutural que observamos hoje,
depois da crise política, não abre espaço para candidatos aventureiros,
com propostas de mudanças radicais”. Assim, “deverá ocorrer continuidade
da atual política econômica, com leve redução dos juros nominais e reais”.
A Funcef, fundação dos funcionários da Caixa Econômica Federal, não
deverá ser tão conservadora no próximo ano, uma vez que a queda nos
juros, mesmo gradual, abre a possibilidade de rentabilidade em outros
segmentos. O diretor financeiro do fundo, Demóstenes Marques, avalia
que a atratividade da renda variável continuará elevada até o fim do ano.
Ele destaca que, embora o cenário de alocação para 2006 da Funcef ainda
não esteja pronto, não devem ser feitas alterações significativas em
relação ao período que termina agora.
Entre essas pequenas alterações, a fundação deve assumir uma posição
maior em renda variável, além de aportar recursos em três Fundos de
Investimentos em Participações (FIP), subscritos em 2004 e
2005. “Estamos analisando outros com foco em investimento em infra-
estrutura de médio porte e devemos investir em exportação”. Por ser um
ano político, a Funcef pretende redobrar o nível de atenção até que se
escolha o próximo presidente da República. “Mas a nossa aposta é de que
a tendência macroeconômica continue a mesma. Vamos ficar de olho se
os elementos econômicos vão se configurar por causa da política. Caso
contrário, estaremos preparados para tomar medidas de ajustes se
alguma instabilidade por causa da eleição ocorrer, mesmo sem
conseqüências concretas”.
Uma fundação que deve fugir a regra será a Real Grandeza, abalada em
toda a sua estrutura depois de perder R$ 150 milhões com a quebra do
Banco Santos em novembro do ano passado. Toda a diretoria foi trocada
em agosto e desde o começo do ano sua política de investimento foi
radicalmente revista. Hoje, é descrita como “altamente conservadora”. O
presidente Sérgio Wilson Fontes ressalta que até mesmo o processo de
aprovação das estratégias das políticas de investimento para cada ano foi
dificultado. Primeiro, a diretoria faz a proposta ao Comitê de
Investimentos e depois ela deve ser aprovada pelo Conselho Deliberativo.
Dentre as medidas tomadas em 2005 pela Real Grandeza, e que
continuam a valer no próximo ano, a fundação deve investir em papéis de
baixo risco de crédito e limitado a 10% do patrimônio líquido da emissora.
Antes, esse limite era de 25%. A fundação também dispõe, a partir de
agora, da avaliação de seis agências de classificação de risco e ela ainda
limita as operações nas instituições financeiras com patrimônio líquido
superior a R$ 2 bilhões. Com isso, sobram apenas doze bancos para
investimentos em renda fixa privada.

Pesquisa – Uma pesquisa inédita da Mercer Investment Consulting
aponta que 77,8% dos 102 fundos de pequeno, médio e grande portes
ouvidos pela consultoria pretendem manter os limites vigentes na política
atual para 2006, com predominância para aplicação em renda variável.
Somente 6,7% pretendem aumentar os limites, enquanto 4,4% prometem
diminuir. Nada menos que 82% vão dar continuidade à política utilizada
em 2005, contra 15,5% que sinalizam para alteração do índice rumo à
renda fixa.
“Os números refletem uma situação totalmente dentro do que a gente
esperava, pois os fundos não fazem grandes mudanças de um ano para
outro, trabalham com médio e longo prazos, mas sem deixar de lado as
possibilidades de ajustes”, explica o coordenador do estudo e líder da
Mercer, Thyrso Pizzoferrato. “Por outro lado, os números apontam que as
estratégias dos fundos estão mais fundamentadas e isso é muito
positivo”, acrescenta.
Em relação à pesquisa anterior, a Mercer identificou um porcentual maior
de empresas patrocinadoras com patrimônio acima dos R$ 500 milhões.
Chegou a 25%, contra 15,4% em 2004. “É um reflexo da evolução natural
como um todo, embora o nível de pagamento das contribuições não seja
tão grande”, avalia Pizzoferrato. Os recursos, conseqüentemente, vêm da
alta rentabilidade dos juros. A longevidade também se destaca: 76% dos
fundos têm mais de dez anos de vida. De todo o universo consultado,
34% têm entre mil e três mil empregados; 29%, de 3 mil a 10 mil; e 21%
acima de dez mil.
Outros aspectos foram tratados pela pesquisa da Mercer, como, por
exemplo, de que forma cada entidade pretende se posicionar em relação
ao IMA – Índice de Mercado da Associação Nacional das Instituições do
Mercado Financeiro (Andima) –, criado no início de abril e que se propõe a
ser a nova referência de rentabilidade (benchmark) para o mercado de
renda fixa no longo prazo. Nada menos que 81,6% dos entrevistados
disseram que aguardarão maior histórico e aceitação e apenas 6,9%
garantem que não pretendem utilizá-lo. Com os fundos escaldados pelas
investigações da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) dos Correios,
mais do que nunca, o momento de turbulência e exposição do setor
recomenda todo tipo de cuidado.