Edição 164
SPC incentiva fundos de pensão a usarem as plataformas eletrônicas;
caso adesão não seja satisfatória até o primeiro trimestre do ano que
vem, utilização poderá se tornar compulsória
A negociação de compra e venda de ativos pelo telefone está com os dias
contados. À reboque da quebra do sigilo bancário de 14 corretoras
acusadas de terem causado prejuízo de cerca de R$ 9 milhões a seis
fundos de pensão em operações com títulos públicos, a Secretaria de
Previdência Complementar (SPC) decidiu acelerar o plano de incentivar as
fundações a usarem voluntariamente as plataformas eletrônicas de
negociação do mercado: Bovespafix, Somafix, CetipNet e a Câmara de
Ativos da BM&F. Mas o secretário de previdência complementar, Adacir
Reis, alerta: estuda-se a obrigatoriedade dessa utilização.
À princípio, a SPC irá aguardar até o final do primeiro trimestre do ano que
vem para avaliar o grau de adesão dos fundos de pensão às plataformas.
E, dependendo desse resultado e do direcionamento que o debate tomar
no Grupo de Trabalho do Mercado de Capitais e Poupança de Longo Prazo,
as corretoras podem mesmo perder mais este filão. A Secretaria só quer
evitar, no entanto, o risco de travar o mercado, ou seja, de empurrar
apenas as fundações para o uso compulsório desse sistema, permitindo
que outros atores – como bancos e corretoras – arbitrem em cima delas.
Tanto que a Associação Brasileira das Entidades Fechadas de Previdência
Complementar (Abrapp) posiciona-se contra a obrigatoriedade das
plataformas eletrônicas, embora incentive o uso delas. Segundo o
superintendente da entidade, Devanir da Silva, esse sistema permite o
registro de todas as operações, dando transparência à negociação e,
sobretudo, segurança ao investidor a partir da referência de preços que se
cria no sistema. “Mas as adesões devem ser feitas de maneira consciente,
não obrigatória. Isso é um problema de cultura e nós já estamos
trabalhando na divulgação da ferramenta, através de seminários
regionais”, diz Silva.
O superintendente da Abrapp, no entanto, acha difícil transferir no curto
prazo todas as negociações para as plataformas eletrônicas. Até porque,
hoje, são poucos os fundos de pensão que usam a ferramenta. “Este é
um trabalho que está sendo iniciado”, diz Silva, ao lembrar da dificuldade
encontrada para se acabar com o pregão viva-voz da Bolsa de Valores de
São Paulo (Bovespa) – apesar de o eletrôni-co ser uma tendência
mundial. Segundo a SPC, já houve uma primeira resposta deste trabalho
de divulgação. Em outubro, apenas três fundos de pensão usavam a
plataforma para negociação de Certificados de Depósito Bancário (CDB) e,
neste mês, já são 14 as que usam o sistema para este fim.
Entretanto, caso as adesões não cheguem a um número satisfatório e em
situação de obrigatoriedade da utilização das plataformas, o planejamento
da SPC será gradual: começa pelos títulos públicos, segue pelos
Certificados de Depósitos Bancários (CDBs), passa pelas debêntures,
pelos fundos de recebíveis, fundos imobiliários e assim por diante, até
fechar todos os papéis de renda fixa do mercado. A Abrapp não
concorda. “Tem dirigente que tem fundamentado o seu procedimento na
negociação individual e isso deve continuar. O fato de um fundo de
pensão utilizar a plataforma não significa que ele deve efetuar os
negócios lá. Pode servir apenas para tomada de preços”, diz Silva.
Quem não deve estar gostando muito desse novo cenário são,
principalmente, as corretoras que operam na renda fixa. Elas continuam
como intermediárias das operações mesmo com a plataforma eletrônica –
assim como ocorre com as ações no sistema Mega Bolsa –, porém elas
deixam de ganhar no spread (diferença entre o preço de compra e de
venda de um ativo).
“Com a melhor precificação do ativo, esse ganho deixa de existir. Mas o
nosso objetivo não é criar entrave para o negócio das corretoras, cujo
papel é ganhar na corretagem, mas sim dar mais transparência,
impessoalidade e segurança aos investidores”, diz o diretor de análise de
investimentos da SPC, Ricardo Pena Pinheiro.
Para o superintendente geral da Câmara de Custódia e Liquidação (Cetip),
Antonio Carlos Ferreira Teixeira, o incentivo às plataformas eletrônicas é
ótimo, desde que o mercado possa manter características de balcão
organizado. Ou seja, que o investidor possa negociar o papel diretamente
com a contraparte e não só por leilão.
“Às vezes um investidor não tem limites para operar com um determinado
banco, por exemplo. E este é um mercado em que quem está negociando
dá crédito à outra parte. Não dá para eliminar esta característica, que é de
balcão organizado”, defende Teixeira. E, no caminho em que as
discussões andam, continuará sendo possível que o fundo de pensão
feche uma negociação na plataforma eletrônica não necessariamente pelo
melhor preço, desde que justificado o motivo da escolha.
Mais alterações à vista
Mesmo faltando pouco para acabar o ano, a SPC ainda prepara novidades
para o sistema, como a dispensa da contratação da auditoria de
benefícios, a criação de um cadastro de dirigentes, a formação de
conselheiros e a extinção dos 5% de taxa de rotatividade para que a
empresa justifique a alteração no quadro de empregados. Isto, além da
esperada regulamentação das modalidades de planos de benefício – que
ganhou caráter emergencial com a aprovação da Medida Provisória 255,
no mês passado – e da densa discussão sobre a modificação do piso da
tábua de mortalidade (veja matéria à página 21).
Segundo Reis, a obrigatoriedade de auditar benefícios se sobrepõe à
Resolução nº 13 do Conselho de Gestão da Previdência Complementar
(CGPC), que trata de controles internos. “Queremos da fundação uma
visão integrada do gerenciamento de riscos. E, na parte que toca ao
passivo, cabe ao auditor independente avaliar a metodologia e estrutura
de concessão de benefícios”, diz o secretário. A matéria deve ser
regulamentada na final de novembro por meio de uma Resolução do
CGPC.
Quanto ao Cadastro Nacional de Dirigentes (CND), Reis informa que a
medida faz parte de um ciclo, já que a SPC já completou o cadastramento
das entidades e dos planos de benefícios. O objetivo, então, será o de ter
um histórico do dirigente, que seria encaminhado à Secretaria após 15
dias da posse. Não funcionaria como uma pré-aprovação ao cargo, como
faz o Banco Central no sistema financeiro, mas ajudaria a evitar, a partir
de um cadastro de ocorrências, que um mau dirigente continue atuando
no setor.