Ter ou não ter? | A depreciação do real no ano passado e sua rece...

Edição 343

A mudança de tendência no mercado neste início de ano, com as perdas nas bolsas lá fora e o real valorizado frente ao dólar machucou duplamente as carteiras de exterior em janeiro, mas ainda assim faz sentido seguir com uma parcela dos ativos alocados nessa categoria, avalia André Natali, diretor de investimentos da Fundação Promon. “Houve uma virada de chave completa no mercado este mês e, como alocamos sem hedge cambial, então machucou um pouco”, diz. “Tivemos resultado negativo de 10% no mês, mas entendemos que continua a fazer sentido pela diversificação geográfica”.
A fundação aplica em investimentos internacionais desde setembro de 2019, por meio de um fundo exclusivo da MSquare que rendeu 50% em dólar e 100% em reais nesse período e o seu plano CD já atingiu 10% dos ativos alocados em exterior. “A alocação era de 7% em 2019 mas subiu por conta da valorização. Vamos reduzir agora, voltando aos 7%”, diz. “Além disso, estamos estruturando proteções contra a variação cambial e o S&P, via derivativos, porque a nossa gestão de risco já tem conseguidos bons resultados por meio dessas operações no mercado de opções”, conta.
Em 2021 o retorno foi de 16% em reais, uma performance que não capturou todo o ganho entregue pelas bolsas e ficou abaixo da variação do S&P, de 27%, porque a opção foi por aplicar em outras classes além de equities. A carteira é multi estratégias, aplica de 60% a 70% em ações mas inclui também crédito high yeld e um fundo de retorno absoluto, indo além do mercado de ações. “No ano passado essa decisão atrapalhou porque as ações subiram muito mais, mas em contrapartida temos uma carteira bem balanceada e melhor ponderada em risco. Agora com a reversão da tendência de alta nas bolsas, por exemplo, a nossa carteira se sustenta melhor”, explica.
Independente da conjuntura dos mercados, uma ampliação do limite legal de 10% para 20% seria muito bem vinda, aponta Natali. Para ele, seria importante também uma revisão das demais restrições regulatórias, tanto da Resolução CMN 4661 quanto do anexo 101 da CVM.. “As regras atuais criam restrições para algumas combinações de alocação e seguem o modelo quase espelhado dos UCITs (organismos de investimento coletivo em valores mobiliários, dentro de regras da União Europeia), o que restringe o acesso aos gestores independentes lá fora”, avalia.

Entre as fundações pioneiras em investimento no exterior, a Metrus começou a testar essa fronteira em 2016 e chegou a ter sete fundos abertos que exploravam diversas estratégias internacionais. “No final de 2018, porém, decidimos montar fundos exclusivos e hoje temos dois deles, um para o plano BD e outro para o plano CV, ambos com a Schroders, iniciados em janeiro de 2021”, conta Keite Bianconi, diretora de investimentos. Na época, a fundação pediu ao gestor que montasse estratégias distintas para os dois planos porque o BD, deficitário, teria que ter menos risco. Um ano depois, entretanto, a estratégia conservadora está sendo revista. “O retorno em 2021 ficou em 5,44%, muito abaixo da meta do plano, de 15,3%, e inclusive da própria rentabilidade do plano, de 14,7%”, explica Bianconi. O exclusivo do BD, no valor de R$ 59 milhões ou 3,9% dos ativos totais do plano (R$ 1,52 bilhão), deverá “apimentar” um pouco a alocação e acrescentar papéis com um pouco mais de estratégias de crescimento e volatilidade para rentabilizar melhor em 2022.
Já o exclusivo do CV, de R$ 80 milhões ou 4,97% do patrimônio do plano (R$ 1,6 bilhão), entregou resultado de 15,27% em 2021. Nenhum dos dois fundos faz hedge cambial, o que permitiu capturar a variação do dólar no período e, no caso do plano CV, os investimentos em ações de crescimento também ajudaram bastante. “Até pensamos em aumentar seu percentual de 4,7% no ano passado, mas com a alta do juro pago pelas NTN-Bs mudamos de idéia”, diz a diretora da Metrus.
O ALM de 2022 da fundação indica um pequeno aumento da fatia de exterior mas, como as bolsas lá fora não estão entregando resultados frente à sinalização do Fed, a Metrus resolveu dar um stand-by na decisão de ampliar seus investimentos globais esperando a acomodação dos mercados nos EUA e no mundo. “Também queremos observar se as alterações na carteira do plano BD farão diferença. Estamos felizes com o gestor e não pretendíamos nos intrometer no mandato mas começamos a nos incomodar com a diferença de retorno de um plano para outro e achamos que chegou a hora de mudar essa estratégia”, observa Bianconi.

Com um retorno de 17,94% na carteira de exterior em 2021, a Value Prev aloca 8% de seus ativos totais em estratégias globais por meio de cinco fundos (três deles de renda variável), cada um com gestão de uma casa, e quer acrescentar um sexto fundo, com hedge cambial, para elevar a fatia de aplicações protegida contra variações cambiais, diz João Carlos Ferreira, diretor financeiro e AETQ. “Queremos buscar mais um fundo de renda variável hedgeado porque estamos reduzindo um pouco as posições não hedgeadas. É um movimento técnico para reequilibrar essa proteção e ficar com metade da carteira hedgeada”, detalha. A alocação não hedgeada ganhou força nos últimos dois anos e hoje representa 65% da carteira, o que exige um rebalanceamento técnico.
O impacto da retirada dos estímulos pelo Fed sobre os mercados globais não provocará grande volatilidade porque deverá ser um movimento paulatino, acredita Ferreira, mas a perspectiva de guerra na Ucrânia e uma eventual piora no quadro da pandemia são fatores capazes de causar maior volatilidade. “Poderá haver uma correção para baixo da bolsa mas isso tende a ser saudável e dentro das regras normais do jogo”, avalia.
Os investimentos da fundação têm um foco global e não em temas. O mais “temático” deles é um fundo que investe mais em infraestrutura, mas é uma exceção. “Na renda variável temos um fundo de aeroportos, portos e estradas, um fundo como não temos no Brasil. Na prática, 99% das oportunidades de renda variável estão lá fora”, diz.

Na Real Grandeza, que está prestes a iniciar a seleção de gestores para estrear seus investimentos internacionais, a reviravolta dos mercados ainda está sendo observada com atenção, explica Patrícia Queiroz, diretora de investimentos. “O ALM e as políticas para este ano indicam uma alocação de até 10% no exterior mas ainda não investimos nada porque estávamos em meio ao processo de aprovação do manual unificado de gestores para todas as classes de ativos”, informa.
A expectativa é concluir ainda no primeiro semestre uma listagem dos gestores de fundos para levar à aprovação do comitê e só então é que começarão as discussões sobre como explorar esse mercado. “Mas a fundação sempre entra em novas classes de ativos de maneira gradual e bem abaixo do alvo estratégico, porque não é o nosso padrão fazer movimentos bruscos”, pontua a diretora.
Os cenários local e internacional têm sido discutidos, mas ela lembra que tudo depende de como a classe será olhada. “No nosso caso, vemos como um redutor de risco da carteira como um todo, com o benefício da diversificação”. A preferência tende a ser por investimentos com gestão passiva e, num primeiro momento, apenas em renda variável. Talvez em ETFs ou BDR de ETF. “Investir no exterior é uma decisão ligada a diversificação geográfica, correlação menor com os ativos da carteira e maior poder de proteção, o que ajuda a reduzir o risco”, diz.

Com uma alocação em exterior que passou a preencher o limite legal para essa classe, próxima de 9,5% dos seus ativos totais de R$ 1,6 bilhão, a Previsc considera o efeito da diversificação como o principal objetivo desses investimentos. “Desde o início tivemos essa visão e ela continua, talvez até mais efetiva agora porque enxergamos a descorrelação entre os cenários local e internacional”, afirma Ricardo Esch, diretor de investimentos. A fundação, que administra 19 planos de benefícios, decidiu ampliar a parcela de exterior, que era de 6% e já no final de 2021 chegou aos 9%, patamar que deverá ser mantido ao longo de 2022.
“Em alguns aspectos, como o da inflação pressionada, vamos na mesma direção da economia global, mas aqui temos outras nuances como as questões de política fiscal e o cenário político do País; as perspectivas são mais negativas localmente e um pouco mais otimistas no exterior e a alocação no exterior ajuda a descorrelacionar os dois cenários” avalia.
Os ganhos com o câmbio nunca foram uma estratégia, mas sim uma consequência dela, embora a entidade tenha conseguido capturar também essa vantagem ao investir com o dólar a R$ 4,80. A fundação fechou o ano passado com rentabilidade consolidada de 26,3% na parcela de exterior, sendo que os fundos de renda variável renderam perto de 30%, já incluindo aí o componente cambial. Na renda fixa, o retorno foi de 7,95%.
São quatro fundos ao todo, alocando 32% dos recursos da parcela de exterior em mercados de renda fixa e 68% deles em renda variável. Os três fundos de renda variável, sem hedge cambial, incluem dois fundos de ações – dos gestores JP Morgan e Schroders – e um fundo de fundos (FoF) do Itaú. Os três são estratégias globais, que investem em ativos dos EUA, Europa e, no caso do FoF, também um pouco da Ásia. O único fundo de renda fixa, da Pimco, é hedgeado e é mais voltado para o crédito, informa Esch.