Tesouro RendA+: um alerta para as EFPCs |_ José Roberto Ferreira

Edição 353

No último dia 30 de janeiro, iniciou-se a oferta do novo título público anunciado pelo Tesouro Nacional, denominado Tesouro RendA+, nome comercial das NTNs-B1. O principal apelo apresentado foi a simplificação – como o slogan “a sua aposentadoria a um PIX” – comparado aos planos de benefícios operacionalizados pelas Entidades Abertas e Fechadas de Previdência Complementar. Essa referência induziu à hipótese de que tais títulos pudessem ser considerados de natureza previdenciária, o que tem incomodado o sistema de previdência privada.
Compõem a formação dessa percepção os fatos de que o Tesouro RendA+ admite aquisições periódicas e que o resgate das aplicações ocorrerá por meio de prestações mensais, pelo prazo de 20 anos. Os valores aportados serão atualizados com base na variação do IPCA, acrescido de juros definidos nas emissões dos títulos.
A tributação será similar àquela aplicável aos demais títulos públicos federais – tabela regressiva, com alíquota mínima de 15%, incidente sobre os rendimentos – e as aquisições poderão ocorrer com aportes a partir de R$ 30,00. Além disso, os custos de administração serão muito reduzidos, podendo nem haver cobrança de taxa de custódia, por exemplo.
Apesar de todas essas características e do grande esforço de comunicação empreendido pelo Tesouro Nacional, no intuito de caracterizar esse novo título como um veículo previdenciário, não é disso que se trata. Primeiro, por falta de amparo legal – não se enquadra no âmbito do Artigo 202 da Constituição Federal e, por consequência, das Leis Complementares nºs 109 ou 108/2001, que regulamentam o assunto. Em segundo, porque o próprio tratamento tributário atribuído ao Tesouro RendA+ o classifica nas mesmas condições aplicáveis aos demais títulos públicos federais, que é.
Qualquer outro ativo financeiro disponível no mercado também conta com a possibilidade de agendamento de aplicações periódicas e de resgates programados, há mais de vinte anos.
Então, por que o Tesouro RendA+ tem causado tanto incômodo ao sistema de previdência privada? A explicação mais óbvia: porque, embora não se trate de um veículo previdenciário, busca captar haveres financeiros disponíveis para alocação em longo prazo, assim como ocorre com a previdência privada! E o sistema já experimentou algo parecido quando do lançamento dos VGBLs, que embora também não fossem um veículo previdenciário foram os responsáveis pelo crescimento teórico da previdência complementar aberta nos últimos anos – como também são comercializados por seguradoras são, por equívoco, estatisticamente computados como previdência aberta.
Outra explicação é o número crescente de Entidades Fechadas de Previdência Complementar cuja atenção tem se concentrado quase que exclusivamente nos investimentos, como se tratasse de uma instituição financeira. Nos últimos oito anos 71% dos recursos financeiros das EFPCs estão concentrados em ativos de renda fixa, grande parte constituída por títulos públicos federais.
Por óbvio, há justificativas para esse direcionamento de portfólio, que está na anomalia de uma elevada rentabilidade com baixo risco e alta liquidez ou mesmo num certo receio quanto às operações de crédito privado, em face de problemas pretéritos, particularmente envolvendo Fundos de Investimentos em Participações – FIPs.
Ocorre que os custos administrativos inerentes ao funcionamento de uma Entidade Aberta ou Fechada de Previdência Complementar, com tal perfil de gestão, podem resultar em dúvida por parte de participantes, patrocinadores e de instituidores, quanto à efetiva utilidade desse modelo previdenciário. Como as operações de Tesouro Direto, inclusive o Tesouro RendA+, viabilizam o acesso direto e facilitado àqueles títulos, não haveria, em tese e apenas para a gestão financeira de recursos, a necessidade desses agentes intermediários – os fundos de pensão.
Portanto, o Tesouro RendA+ representa mais um alerta para as EFPCs, no sentido de resgatarem a sua vocação e a sua razão de ser, que passa pela atenção à cobertura previdenciária, sob a ótica das expectativas e das necessidades dos participantes. Naturalmente, não há se falar em negligenciar ou ignorar a importância dos investimentos na equação previdenciária. Mas, enquanto equação, há outros fatores relevantes a se observar.
Assim, um adequado dimensionamento de renda, enquanto projeção; o cuidado com eventos incertos, cujo amparo se faz imperativo; maior proximidade com o mercado segurador, em busca de proteção por meio da externalização dos riscos; projetos de aperfeiçoamento da operação previdenciária, via revisão de processos e automação, com o objetivo de redução de custos e aumento da segurança; efetivas medidas de educação financeira e previdenciária; melhor compreensão do seu público-alvo; permanente qualificação técnica de dirigentes e demais integrantes; e crescente aprimoramento da governança, são atributos essenciais ao objeto.

José Roberto Ferreira é sócio-Diretor da Rodarte Nogueira & Ferreira e ex-Diretor Superintendente da PREVIC