Edição 382

O mercado de ativos privados no Brasil demonstrou grande dinamismo ao longo das últimas duas décadas, mesmo diante de ciclos de instabilidade econômica e mudanças no cenário político. Nesse intervalo, o setor se fortaleceu, com crescimento do número de gestoras e maior variedade de estratégias à disposição dos investidores. Essas novas alternativas ampliam as oportunidades de diversificação, permitindo acesso a nichos de mercado com potencial de melhorar o retorno ajustado ao risco do portfólio dos investidores.
A principal transformação do mercado brasileiro de investimentos alternativos foi a ampliação da diversidade de estratégias. Na primeira década deste século, os fundos de private equity foram predominantes, impulsionados pelo crescimento econômico e por um ambiente de maior estabilidade institucional. Venture capital ainda era uma tese incipiente com poucos gestores e casos de sucesso. O cenário começou a mudar a partir da década seguinte e ganhou maior tração com a crise iniciada em 2015, quando houve expansão do número de fundos de tecnologia e de oportunidades no setor. Paralelamente, estratégias como crédito estruturado, ativos estressados e investimentos em ativos jurídicos ganharam relevância.
As transformações do mercado podem ser acompanhadas por diferentes métricas. Em 2012, o capital disponível para investimentos alternativos era de R$ 20 bilhões, com 79% concentrados em private equity. Desde então, o avanço da indústria passou a ser puxado principalmente por venture capital e por estratégias de situações especiais, voltadas a operações como crédito estruturado, precatórios, dívidas inadimplidas e outras estruturas mais complexas. Hoje, o mercado soma cerca de R$ 56 bilhões em capital disponível, com uma composição bem mais diversificada: 31% em private equity, 26% em venture capital e 24% em situações especiais, enquanto o restante se distribui entre estratégias de nicho.
Outra forma de evidenciar a força das novas estratégias é observar a evolução do volume captado. Entre 2010 e 2014, 92% da captação de alternativos foi direcionada a private equity, enquanto venture capital respondeu por 5% e fundos de situações especiais por 3%. Entretanto, no período de 2021 a 2025, a distribuição se tornou muito mais equilibrada: private equity representou 42% da captação, venture capital 31% e situações especiais 27%. No comparativo entre os dois intervalos, o volume total captado saltou de R$ 51 bilhões para R$ 108 bilhões, com captação praticamente estável em private equity e crescimento expressivo nas outras duas estratégias.
O desenvolvimento de uma nova estratégia de investimentos raramente ocorre sem desafios. Uma nova tese de investimentos costuma seguir algumas etapas. Os fundos pioneiros conseguem capturar um fluxo de oportunidades único e gerar retornos diferenciados. Esse desempenho atrai novos gestores e investidores, ampliando a oferta de capital, a maior competição aumenta a disputa pelos mesmos investimentos e pode fazer a compressão dos retornos. O que leva a um processo natural de seleção de gestores que sobrevivem à subsequente queda de interesse pela estratégia O private equity percorreu esse ciclo, que resultou em uma redução no número de gestoras e um recente movimento de reaquecimento. O venture capital apresenta indícios de estar no meio do processo, enquanto as estratégias de situações especiais seguem em fase de expansão, com crescimento tanto no número de casas quanto no volume de captação.
A identificação e a avaliação criteriosa de novos gestores e a compreensão da oferta de capital de uma estratégia são elementos centrais para a construção de um programa consistente de investimentos em ativos alternativos, assim como a disciplina e a resiliência para manter as alocações mesmo em cenários macroeconômicos adversos. Por exemplo, entre 2014 e 2017, período marcado por forte estresse econômico e político, o private equity se mostrou uma boa oportunidade de investimento, com taxa interna de retorno média de 14% nos fundos dessas safras. O quartil superior desse período apresentou uma TIR de 25%, recompensando os investidores que selecionaram os melhores gestores. Outro exemplo, são os investidores que analisaram novas teses de investimento no mesmo período e investiram em fundos de venture capital alcançaram TIR de 21% na média, enquanto o quartil superior apresentou TIR 30%. Em ambos os casos, a decisão de manter investimentos de longo prazo em um período de incerteza, seja em uma tese consolidada como o private equity ou em estratégias emergentes, resultou em retornos expressivos.
A maior maturidade do mercado e das gestoras de ativos privados, somada ao crescente refinamento dos investidores, cria um panorama especialmente favorável à diversificação. Apenas por meio de monitoramento contínuo e de um programa de investimentos disciplinado e resiliente é possível capturar bons retornos, capazes de complementar e potencializar as estratégias tradicionais de investimento.
Renato Abissamra é sócio da Spectra Investments.