A bolsa ainda traz oportunidades | Juan Morales

Edição 340

A vida é incerta de várias maneiras e para gestores de investimentos obviamente não deveria ser diferente. Investidores sempre estão dispostos a pagar uma quantia de dinheiro hoje para um retorno incerto no futuro, seja de curto ou longo prazo. O mercado de ações certamente é um dos que embutem mais incertezas pela própria natureza dinâmica das empresas subjacentes, o que torna muito desafiador aos analistas especializados traçar projeções minimamente confiáveis em prazos mais longos. Contudo as ações sempre compuseram muito bem um portfólio diversificado entre classes de ativos que tenta maximizar uma relação entre retorno esperado vis-à-vis risco numa visão mais de longo prazo.
Vale ressaltar que é sempre muito difícil convencer um investidor, seja ele um indivíduo ou um institucional, a pensar no longo prazo com uma classe de ativos que é diariamente marcada a mercado. É quase irresistível espiar quanto sua carteira de ações está rendendo no dia. O problema é a volatilidade diária das cotações e a falsa impressão que ele pode proteger seu patrimônio se realizar a perda de curto prazo, pois sempre existirá um outro papel com um potencial de valorização mais atrativo. Essa recorrência comportamental mirando o ganho rápido não deixa que o gestor se aproprie dos retornos compostos de longo prazo e explicita uma falta de disciplina na gestão. Por outro lado, à medida que as janelas de investimento se alongam, a volatilidade média dos retornos vai diminuindo e a composição de retornos trabalha a favor dos investidores menos afoitos.
Quem investiu na bolsa em períodos de um ano desde 1968 na média obteve um retorno real ao ano de inflação + 16.2% mas, na maior parte das simulações, poderia ter retornos que oscilaram entre -41.4% até +73.9%, tornando muito transparente o enorme risco ao se tentar fazer market timing.
Quando o prazo de investimento aumenta, há uma diminuição do retorno real médio e uma redução substancial da dispersão de retornos, ou seja, a volatilidade também caiu. Em janelas de mais longo prazo, como as de 15 ou 20 anos, o retorno médio convergiu para inflação + 5.8% a.a. Para um investidor institucional com um passivo de duração mais longa e meta atuarial em torno de inflação + 4.5% a.a., a bolsa funcionou com uma excelente alternativa de alocação. Além disso, evidenciou sua capacidade de preservação de capital, pois o Ibovespa não somente tem se mostrado resiliente à inflação como também a rentabilidade acumulada foi positiva na maioria das janelas de resgate.
A parte deste levantamento estatístico, muitos investidores se perguntam qual seria o potencial de retorno do Ibovespa em 2022, ou seja, no curtíssimo prazo. Fundamentalmente existe uma enorme oportunidade para a entidade que decida investir na bolsa agora. A assimetria de risco hoje é muito clara e favorável à valorização expressiva das ações. Tendo como premissa que o valor de uma empresa oscila em função do crescimento de seus lucros + dividend yield esperado + expansão/contração de seus múltiplos o Ibovespa sugere um potencial de alta de 40%.
Segundo o consenso, as projeções para 2022 apontam para que os lucros das empresas cresçam 4.5% e que o dividend yield seja de 6.1%. O que há de extraordinário é o potencial do múltiplo preço/lucro do Ibovespa. Atualmente o P/L 2022 está em 8.2x e se este assumir o comportamento recorrente de reversão à média poderia convergir rapidamente para sua média histórica de 10.6x, com uma valorização de 29%.
Se tais argumentos fundamentalistas ainda não são suficientes para convencer investidores mais céticos, pode-se analisar o valuation do Ibovespa por outro ângulo, tentando calcular qual o crescimento implícito de lucros de nossas empresas na perpetuidade que justifica um nível tão baixo de nosso índice. Com o Ibovespa negociando a 110 mil pontos e considerando os lucros projetados em 2022, isso significa um crescimento implícito do PIB de 0% a.a., ou seja, chega-se a uma situação absurda de que o Brasil é um país estagnado ad aeternum. Obviamente que este valuation é uma radicalização fomentada por uma alta aversão ao risco Brasil. Apenas para contextualizar tamanho absurdo, o Brasil de 2010 a 2019 cresceu na média 1.3% a.a., período bastante conturbado e que pode ser considerado efetivamente nossa década perdida. A assimetria de risco é clara e muito favorável à valorização das ações. Não seria surpresa se houvesse alguma correção no curto prazo.
Juan Morales é Superintendente de Renda Variável na SulAmérica Investimentos