Edição 60
Projeções sobre o déficit público
O mercado foi surpreendido pela notícia negativa divulgada no final de junho de um déficit de R$ 796 milhões no mês de maio para o Governo Central, muito inferior ao superávit de R$2,3 bilhões em abril. Nossa avaliação é que o governo foi inábil ao não preparar o mercado para este resultado, uma vez que a queda de arrecadação proveniente de concessões de serviços públicos e o aumento de repasses para estados e municípios era previsível.
No entanto, a maior preocupação está na elevação de gastos na conta OCC (outras despesas de custeio e capital), onde o governo tem maior poder discricionário e que, até então, estava sendo uma das bases para os resultados fiscais positivos. A meta de R$12,8 bilhões acordada com o FMI para o primeiro semestre deste ano deve ser atingida, pois esperamos para os Estados, Municípios e as Estatais um superávit de R$ 650 milhões em maio e junho. Neste mês o Governo Central também deve registrar um superávit de R$ 1,8 bilhão. Adicionalmente, mantemos uma visão relativamente otimista para o segundo semestre baseada em 3 pontos: elevação da arrecadação tributária com o crescimento positivo do PIB esperado para os dois últimos trimestres deste ano; aprovação na justiça das medidas questionadas com liminares (ver discussão adiante) e; o comprometimento de todas as esferas governamentais com o baixo nível de gasto proposto.
Com relação ao perfil da dívida pública, esta ainda continua concentrada em títulos pós-fixados (54%) o que, num cenário de queda de taxa de juros, é favorável, uma vez que reduz automaticamente o serviço da dívida do governo. A parcela de títulos pré-fixados, embora tenha aumentado de 5% para 6% no último mês, ainda não deve ser elevada substancialmente, ao menos enquanto o setor público tiver a possibilidade de auferir ganhos com a queda dos juros. Acreditamos que a partir de agora o ritmo de redução dos juros será bem inferior ao até então observado, mas mantemos nossa projeção de uma taxa Selic ao ano de 16 a 17% em 31/12/1999, se os fundamentos internos permitirem o ingresso de capitais de médio e longo prazos, que em contrapartida são mais seletivos e difíceis de conquistar. Gostaríamos de salientar que este ano esperamos um serviço da dívida interna e externa de ordem de 11% do PIB, que somados aos 3% de superávit primário, perfaz um déficit nominal do setor público consolidado de 8% do PIB. Este número é razoavelmente inferior ao esperado no início do ano, quando reduzimos o custo de desvalorização da moeda sobre o serviço da dívida de 10% do PIB para 6%. Estes juros incidentes sobre 6% do PIB por conta da desvalorização do real em janeiro deste ano não se repetirá no ano 2000 e os números de déficit nominal, embora altos, não podem ser considerados negativos, por não se tratar de um fenômeno recorrente. Esperamos num cenário tranquilo para o ano 2000 uma conta de juros da ordem de 6% do PIB e um superávit de 3%, produzindo uma redução do déficit nominal público de 8% para apenas 2% do PIB, viabilizando a estabilidade da relação dívida pública sobre o PIB. A tabela II traz nossas projeções para o déficit e para a dívida pública para o triênio 1999-2001, lembrando que a efetivação destes números depende da continuidade da redução dos juros reais, que reduz o serviço da dívida interna e diminui a pressão sobre o seu crescimento. O superávit primário ao redor de 3% nestes 3 anos passa a ter uma importância crescente quando comparada ao serviço da dívida a partir do ano 2000, sendo crucial para permitir as trajetórias aqui apresentadas. O bom resultado primário depende por sua vez do andamento das reformas e o compromisso com o corte de gastos e aumento de receitas proposto.
Na tabela III analisamos as medidas atualmente em discussão na Justiça e seu possível impacto para o Programa de Estabilidade Fiscal (PEF). Em primeiro lugar, estamos discutindo a abrangência de R$22,5 bilhões ou 75% do PEF original. Se toda esta receita fosse perdida, o superávit primário cairia de 3,1% para menos que 1% do PIB, por isso a relevância desta discussão. Trabalhamos com as seguintes hipóteses futuras: 1) a perda de receita da arrecadação da contribuição dos inativos e da equalização do COFINS para o sistema bancário vão ser cobertas com folga pela receita adicional do COFINS sobre os setores monopolistas, aprovada pelo STF e 2) o governo não deve perder a receita relativa ao aumento da alíquota de COFINS de 2 para 3%, bem como não deverá perder a receita do CPMF. Sumarizando, a situação das medidas discutidas na Justiça não devem comprometer o esforço fiscal do governo.
Hugo Penteado é estrategista e Economista do ABN Amro Asset Management – Brasil