Explicando o mercado – Luís Fernando G. Camillôtto

Edição 53

Regulamentação dos fundos de pensão e o impacto no gerenciamento de risco

As propostas de regulamentação das entidades fechadas de previdência privada no Brasil devem ter como objetivo o aprimoramento da qualidade da gestão de seu patrimônio. Boa qualidade na gestão se atinge quando se administra os ativos de forma consistente com as exigibilidades impostas pelo passivo. A necessidade de honrar os benefícios nos prazos previstos é que deve nortear a administração dos ativos, dentro da melhor relação possível entre risco e retorno.
Todas as evidências (teóricas e empíricas) apontam para o fato de que a determinação pura e simples de limites percentuais do portfólio para alocação por classes de ativos – sem levar em conta o porte do fundo e o perfil de seu passivo – impede o atingimento dos objetivos citados acima.
A tendência é de que critérios universalmente aceitos como os hoje vigentes para bancos no âmbito do Acordo da Basiléia passem a ser aplicados para os fundos de pensão. Um bom ensaio neste sentido é o documento “Risk Standards for Institutional Investment Managers and Institutional Investors”, elaborado pelo Risk Standards Working Group sob coordenação do CMRA (Capital Market Risk Advisors – www.cmra.com). Este estabelece 20 regras para uma adequada gestão de riscos, agrupadas sob aspectos de gestão, medição e supervisão. Tal enfoque seria mais pertinente às peculiaridades dos fundos de pensão e respeitaria as particularidades de cada instituição. Seria ainda fundamental que as autoridades regulatórias se capacitassem para zelar pela adequação a tais diretrizes, analisar os eventuais desenquadramentos e exigir ajustes.
Para o cumprimento de tais exigências seriam pré-requisitos fundamentais: • um sistema integrado de gestão de riscos, com cultura e processos disseminados por toda a instituição, apoiado em fontes consistentes de dados sobre posições de carteira e precificação de mercado; • uma Controladoria eficiente, com processo orçamentário bem estruturado; • um sistema de ALM (Asset Liability Management) que minimize os descasamentos que possam ameaçar o cumprimento do fim último do fundo: o pagamento dos benefícios; • separação nítida entre as atividades de alocação de ativos, seleção de ativos e compliance.
Inequivocamente, a regulamentação no mundo caminha no sentido de um melhor controle, em vez de mais extenso; a Comissão Européia proporá a liberalização das restrições sobre os investimentos dos fundos de pensão no âmbito da União Européia, simultaneamente exigindo a “prudent man rule”, dentro do contexto das exigibilidades dos passivos das instituições (Pensions and Investments, 16.11.98, p.23). Mesmo no Japão – que apresentava uma rígida regulamentação (conhecida como “5-3-3-2”, ou seja, mínimo de 50% em títulos do governo, máximo de 30% em ações japonesas, máximo de 30% em títulos no estrangeiro e máximo de 20% em imóveis japoneses) – a regra foi abolida desde 1996, sendo substituída por exigências que refletem os pré-requisitos anteriormente aqui mencionados.
A implementação de tais exigências poderia suscitar questionamentos quanto ao custo de sistemas e processos. É certo que instituições com grandes patrimônios para administrar teriam custo maior para implementá- los em função do volume de informações a serem processadas; por outro lado, instituições com patrimônios menores poderiam alcançar tais objetivos com processamento em sistemas desenvolvidos internamente ou contratando especialistas no mercado na forma de pools de fundos, com substancial redução de custos. Em qualquer dos casos, o investimento é compensador em virtude dos ganhos de eficiência. Além disto, não se deve perder de vista que o novo conjunto de regras ora em discussão no Brasil implicará em razoável aumento de gastos com monitoramento de posições, avaliação de gestão e geração de relatórios, com retornos questionáveis.
Em última instância, o que se deve buscar é uma supervisão racional e eficaz que garanta qualidade na gestão.

Luís Fernando G. Camillôtto é gerente da Diretoria de Planejamento da PREVI. O artigo foi escrito junto com Wellington Dantas de Amorim, da mesma Diretoria