O gestor da tempestade é o mesmo da bonança | Maurício Gentil

Edição 197

Recentemente, estive em uma reunião onde o tema reinante era a crise econômica. Tratava-se de mais uma ocasião para debater o tema do momento. Estavam presentes pessoas bem informadas e com recursos aplicados em fundos de investimentos de todas as classes (ações, multimercado, long short, etc).
Ao longo de nossa conversa, observei que se iniciou uma corrente de repulsa aos serviços prestados pela indústria de gestão de recursos. Sem qualquer segregação ou juízo de valor, a atitude reinante era de que os gestores eram incapazes de oferecer serviços de qualidade em situações de crise. A frase recorrente era: ”Para perder dinheiro, eu perco sozinho”!!! Ocorreu-me, então, uma figura de imagem: um vôo internacional com os passageiros desfrutando da champagne da primeira classe. Todos confiam no piloto. Sequer imaginam se foi colocado combustível suficiente ou se foram tomadas medidas de segurança. Não sabem ao certo que riscos correm e desfrutam dos prazeres da viagem.
Enquanto tudo ia bem, o piloto é congratulado. Diante de uma grande turbulência, o avião treme e começa a descer. Alguém a bordo recomendaria trocar o piloto por um dos passageiros? Este é o atual cenário na indústria de gestão de recursos: questiona-se a competência dos gestores que ofereceram retornos com sucesso por quase cinco anos. Não se trata de uma simples troca de produto (Fundo x CDB, ou Fundo x Poupança), mas é necessário o entendimento do investidor que estará, em plena turbulência, trocando de lugar com o piloto.
Não defendo unilateralmente a indústria e, nem de longe, quero depreciar a capacidade de decisão dos investidores individualmente. Entendo que, ao longo destes anos, o investidor não sabia que poderia ter algum risco implícito. A euforia do crescimento da indústria (64% em cinco anos*), como toda bolha, provocou uma flexibilização dos processos comerciais dos gestores, e a ganância tomou o lugar da prudência.
Acredito que todos devem rever as formas de abordagem e a qualidade técnica de suas equipes comerciais. A indústria passa por um processo de “filtragem” involuntário (saída de R$ 30 bilhões no ano*). Ficou claro que ocorreram alocações indevidas em produtos que não eram compatíveis com a disposição do cliente em assumir riscos. Além disso, muitos produtos, particularmente, nos segmentos multimercado e long short, tiveram desempenhos incompatíveis com os discursos de venda.
Será que o processo de remuneração induz o vendedor a “empurrar” o produto? Apesar disso, não me parece razoável tomar o lugar do piloto. Vale lembrar que estamos falando de uma indústria de serviços, onde os fundos são os veículos que tangibilizam os benefícios gerados. A rigor, os ativos adquiridos, ao se investir em fundos, são inteligência e tempo.
Ao tomar esta decisão, o investidor deixará de ter acesso ao tempo de pessoas que estão exclusivamente dedicadas a esta atividade e que possuem formação suficiente para “pilotar” em períodos de crise. Além do mais, pasmem: trata-se dos mesmos gestores que estavam no comando durante a bonança! A pergunta é: será que uma pessoa que exerce atividades não relacionadas diretamente com o mercado financeiro, como os participantes da minha reunião, teriam “pousado o avião” de forma mais segura que o piloto? Vale a pena abrir mão do conhecimento em situações de risco? Existem gestores imunes às crises, por mais preparados que sejam? Não.
Não há na história econômica nem um só gestor que ganhe todo o tempo.
Neste momento, Warren Buffet deve estar feliz com a compra de ações da Goldman Sachs. O papel vale agora U$110,00. Entretanto, desde que a operação foi realizada (por US$ 105,00), a ação chegou a valer U$ 78,00!!! Existem gestores bons e gestores ruins, como em qualquer atividade. O que deve definir a escolha, por utilizar os serviços de gestão ou atuar sozinho, é o custo do erro. Decisões financeiras erradas costumam custar bem mais que o custo de contratação de um gestor (algo em torno de 2,5% ao ano, em média). Pessoas qualificadas que dediquem todo o seu tempo, exclusivamente, a uma atividade tendem a desempenhá-la melhor que o praticante eventual. Não se tem notícia de um paciente que peça para ficar acordado durante uma cirurgia para, no caso de risco, assumir o lugar do médico.

(*) Fonte Anbid

Maurício Gentil é Superintendente Comercial da Meta Asset Management