Edição 379

Para o CIO da Porto Asset, Izak Benaderet, o potencial de alta do mercado de capitais brasileiro ainda está travado por questões fiscais e, eventualmente, políticas. Segundo ele, o desempenho da bolsa brasileira, superando os 144 mil pontos em 16 de setembro, e do dólar, que na mesma data caiu abaixo de R$ 5,30, teria potencial para ir além. “Se você pegar em termos históricos, o beta do Brasil sempre foi melhor do que os seus pares emergentes”, diz. Atualmente, grande parte dos emergentes têm tido desempenho melhor do que o do Brasil.
Comandando uma asset com pouco mais de R$ 37 bilhões sob gestão, dos quais R$ 10 bilhões são de terceiros e pouco mais de R$ 27 bilhões do próprio grupo Porto –que inclui recursos de previdência aberta, previdência fechada, reservas técnicas, gestão de recursos vinculados e caixa das empresas, Benaderet conta que a casa está prestes a começar a oferecer produtos internacionais para clientes institucionais. Não dá detalhes. Veja abaixo os principais trechos da entrevista dele à Investidor Institucional
Investidor Institucional – O que está acontecendo com a bolsa brasileira, que sobe apesar dos problemas conjunturais, ignorando o tarifaço, a questão fiscal e a questão política colocada pela condenação de Bolsonaro?
Izak Benaderet – Primeiro que essa valorização está acontecendo globalmente, tanto nas bolsas chinesas como nas bolsas de mercados emergentes. Então, não é absolutamente nada idiossincrático brasileiro, muito pelo contrário. Se você pegar o histórico do beta do Brasil em relação às outras bolsas de emergentes, a gente deveria estar esperando algo até melhor, em termos de alta. Óbvio que algumas empresas acabam se beneficiando mais desse rali, principalmente as empresas que estão entregando lucro, enquanto outras, ainda muito dependentes de juros, acabam não conseguindo ter uma valorização que compense o que elas vêm sofrendo nos últimos anos. Mas, de fato, é um movimento globalizado e a gente apenas está tomando carona nesse movimento, digamos assim.
O dólar fraco está ajudando?
O dólar mais fraco é sempre um bom catalisador de movimentos pró-mercados emergentes. A busca por diversificação, quando o dólar está fraco, é meio que inevitável, pois beneficia as moedas emergentes. Então é por isso que, mesmo com todas as questões fiscais que estão longe de serem endereçadas, com todas essas tarifas que agora estão sendo colocadas, com toda essa piora marginal do nosso conta-corrente, o dólar ainda se valoriza. Parecido com o que falamos de bolsa.
Quer dizer, estamos apenas seguindo o fluxo, mas poderíamos estar melhor?
Sim, em termos históricos o Brasil sempre supera os seus pares emergentes. Sob a ótica do beta, nós sempre tivemos um beta mais alto, então era de se esperar algo até melhor do que está acontecendo. Mas acho que algumas notícias vinculadas à parte fiscal e, eventualmente, à sucessão presidencial, podem estar limitando um pouco uma valorização maior, tanto de bolsa quanto da moeda. Vamos lembrar que isso pode acontecer dos dois lados, pois o Brasil tende a ir pior quando o mercado vai mal e tende a ir melhor quando o mercado vai bem.
Você vê espaço para uma maior valorização?
Claro, quando você olha para a valorização das demais moedas emergentes, por exemplo. A gente ainda está longe de ser a melhor. Então, se tivesse uma correção de rota, uma correção de rumo nessas questões específicas que você citou, a gente poderia melhorar muito. Mas concordo que o movimento lá fora está sendo tão forte, mas tão forte, que estamos passando por cima dessas questões.
Como você interpreta essa tendência de queda do dólar em relação à várias outras moedas globais?
Eu acho que o que está predominando é, primeiro, a questão geopolítica, relacionada a esse jeito do Trump de impor tarifas ao mundo, que acaba desglobalizando o mundo e tornando o mundo menos cooperativo em termos de relações comerciais. Isso acabou gerando, primeiro, dúvidas sobre a inflação dentro dos Estados Unidos, o que levou o Fed a fazer um movimento de alta nos juros. Mas o mais importante é que, nos últimos meses, você tem visto uma pressão política por cortes de juros sobre o Fed, o que faz os Estados Unidos perderem um pouco daquele brilho que era quase que exclusivo dele. Além disso, o país passa a ter uma projeção de crescimento que está longe de ser algo único, e passa a ter juros que estão longe de serem os mais altos. Então, esse rebalanceamento que está acontecendo, que culmina com o Fed começando a cortar juros antes mesmo do que o Banco Central Europeu, coloca uma pressão para o dólar seguir fraco.
O Brasil está com as relações comerciais com os Estados Unidos estremecidas e estreitando relações com a China, isso preocupa?
Realmente nossas relações com os Estados Unidos estão estremecidas e há rumores de eventuais novas tarifas, ainda maiores, na margem. Hoje mesmo (essa entrevista feita em 15/9) saíram algumas notícias dizendo que pode haver uma segunda rodada de eventuais sanções. A gente não consegue prever a profundidade dessas novas medidas, mas com certeza não serão positivas, olhando à frente. E, por mais que o nosso saldo não seja positivo com os Estados Unidos, é um parceiro importante sob várias questões, não só de comércio de bens mas também de tecnologia. Então, tem uma série de positividades dessa relação histórica que a gente tem com os Estados Unidos e vai ter que acompanhar de perto se, de fato, acontecer essa segunda onda de tarifas ou sanções. Eu acho que o aumento das relações com a China é natural, você tem visto no tabuleiro global a China tentando criar esse bloco antagônico aos Estados Unidos, então acho que é natural, faz parte da geopolítica.
Como você vê a perspectiva de juros mais baixos nos Estados Unidos?
Sem dúvida, isso traz um certo alívio. Nós temos o maior diferencial de juros de muitos e muitos anos. Acho que é o que sustenta esse câmbio aqui apreciado. Nós temos um juro hoje que é mais do que o dobro do México, e estou citando o México porque é um parceiro que sempre olhamos como um peer parecido, mas também podemos citar outros, como Chile, Peru, que são menores mas que têm juros bizarramente menores. Agora, o nosso desafio será, quando o Banco Central aqui do Brasil iniciar o corte de juros, entender até onde vai e o quão a gente consegue manter a moeda relativamente tranquila tirando um pouco desse custo do carrego. Porque com juros de 15% ao ano, com diferencial de juros acima de dois dígitos, é muita pressão pró-real contra o dólar.
Mas isso só deve acontecer no ano que vem.
Exato, a prova do Pudim vem ao longo do ano que vem, quando você tiver, de fato, uma Selic três pontos mais baixo, que é mais ou menos o que a gente imagina de ciclo de corte de juros ao longo do ano que vem.
Os dados do governo mostram que a economia já começa a desaquecer e a dúvida é se o Copom corta os juros ainda neste ano ou só no início do ano que vem. Qual é a percepção de vocês e como que vocês estão se preparando para essa virada?
Como boa parte do mercado. Acho que é inequívoco que os dados marginais nas últimas semanas foram pró-atividade mais fraca. Dá prá enumerar diversos indicadores que vieram marginalmente mais fracos na ponta. Hoje saiu o IPC-Br, que não só foi revisitado para baixo como o número veio para baixo, antecipando o que a gente projetava para dois meses à frente. Então, apesar de acreditarmos que o corte começaria no ano que vem, tínhamos também um certo viés de olhar esse risco de antecipação e tudo caminha a favor de que o Copom de fato antecipe o corte.
Qual a aposta de vocês?
Hoje o mercado já trabalha com a probabilidade do corte começar em dezembro, é pequena ainda essa probabilidade porque cerca de 70% é pela manutenção, mas a gente entende que a chance do corte começar em dezembro desse ano é maior do que o mercado aposta. A gente entende que essa chance tem crescido, é maior do que está sendo precificado, e temos pela frente alguns números que podem ratificar isso.
Quais são esses indicadores que vocês identificam?
Por exemplo, o Fed reduzindo os juros, independente do tom, claro que isso ajuda. O próprio Focus tem tido um componente que a gente não via há muito tempo, de alguma convergência, que também ajuda. O câmbio, por mais que não seja exclusivo nosso, ele acaba fazendo uma pressão baixista. Então, para todos os lados que a gente olha, entendemos que a Selic tem espaço para cair.
Acha que o Banco Central também lê assim?
Acho que o Banco Central, na sua missão de ratificar a confiança do mercado, presta atenção à todos esses sinais. Acho que o Banco Central está cumprindo um papel muito bom, mas parece inevitável. Os juros de mercado já estão com a precificação de corte ao longo do ano que vem. A discussão agora é, quando e quanto.
Por conta dos juros altos os últimos dois anos tem sido o reino absoluto da renda fixa, recebendo recursos saídos dos multimercados e da renda variável. Como a Porto Asset está se preparando para a queda dos juros?
A gente tem mantido uma prateleira de produtos que se beneficiam dessa queda. É claro que até aqui, nos últimos dois anos, o mercado foi muito atrelado a produtos pós-fixados, produtos que se beneficiam da alta da taxa Selic, precisamente os fundos indexados ao CDI. Mas a gente tem bastante produtos pré-fixados na plataforma da casa. Esse pré-fixado que acabou sofrendo quando a taxa foi colocada num patamar mais alto do que a gente imaginava, que apesar de serem de renda fixa acabaram sofrendo pela marcação a mercado.
O que vai estar na prateleira?
A gente acredita que, com essa virada da taxa de juros, via queda do juro real, os nossos produtos voltados da renda fixa ativa devem se beneficiar. Então a gente enxerga no portfólio desde produtos de renda fixa puro-sangue, que têm duration e uma queda de juros acaba trazendo a eles um valor presente positivo, assim como os produtos voltados para renda variável. Não só produtos da nossa parceira estratégica mas também alguns FoFs de renda variável que a gente acredita que devem se beneficiar. Por mais que hoje a maior parte dos recursos estejam alocados a esses fundos pós-fixados com um pouco de crédito privado, a gente entende que eventual migração em busca de um maior retorno por taxa pré-fixada, esses produtos já estão disponíveis na nossa prateira.
Uma outra característica do mercado no último ano tem sido as consolidações, principalmente de casas que eram focadas em multimercados e renda variável e ficaram muito vulneráveis. A Porto está olhando essas possibilidades?
Sim, a gente fez uma parceria pioneira no ano passado com a SFA para fundos de renda variável e estamos olhando outras oportunidades para eventuais consolidações, parcerias estratégicas. Somos uma casa com um tamanho importante de recursos, temos feito um esforço muito grande no segmento institucional, fizemos um movimento importante no time comercial voltado para o segmento institucional e para os canais mais voltados aos nossos clientes internos. Então, com esses dois canais relativamente sendo bem cobertos, a gente entende que dá para seguir com uma eventual expansão, ou para outras possibilidades que possam vir a surgir ao longo do tempo.
Uma área que vocês não cobrem atualmente é a internacional. Quando você fala em expandir a atuação da casa está pensando em produtos internacionais?
É uma opção também. Veja, a gente está lançando um produto voltado para ações internacionais, voltado ao institucional, com o JP Morgan, e isso está em vias de ser anunciado. Não posso dar detalhes, mas estamos na reta final dessa estratégia de oferecer produtos no segmento institucional com características internacionais.