Os gastadores voltaram | Para o líder do governo na Câmara, os &#...

Edição 87

Arnaldo Madeira, deputado

O deputado Arnaldo Madeira (PSDB-SP), líder do governo na Câmara, considera que o crescimento da economia traz de volta à ribalta “os gastadores”. São os que primeiro autorizam 1as despesas para depois buscar as fontes de financiamento. Entre outras coisas, eles estão pleiteando agora um aumento para o salário mínimo, mas financiado com recursos da tributação dos investimentos dos fundos de pensão. “Eles não percebem que alguns atos equivocados com relação a essa área de atividade (fundos de pensão) podem resultar em um efeito negativo, contrário mesmo ao que eles desejam. Acho que o problema é mais de um pensamento atrasado sobre a economia”, avalia o deputado Madeira. Veja, abaixo, os principais trechos da entrevista que o deputado deu à Investidor Institucional:

Investidor InstitucionalQual a sua avaliação sobre esse debate em torno do aumento do salário mínimo e das propostas de arranjar dinheiro tributando os investimentos dos fundos de pensão?
Arnaldo Madeira – A minha avaliação do que está acontecendo é a seguinte: há uma forte demanda por gastos e os ordenadores de despesas saem atrás de possíveis áreas de arrecadação. Então, como há essa pendência dos fundos de pensão, é natural que surja essa proposta de tributação sobre eles.

IIQual é a posição do governo com relação isso?
AM – Eu não saberia te falar sobre a posição do governo. Eu sou o líder do governo na Câmara e até agora e não recebi nenhuma orientação sobre a forma de procedimento sobre esse tema. Mas a questão surgiu na área da Receita Federal, que tem levantado o tema, e politicamente eu ainda não recebi nenhum tipo de instrução de como proceder.

IIMas os sinais que o governo emite parecem contraditórios. De um lado sinaliza que considera importante o crescimento do mercado de capitais, como forma de financiar a continuidade do processo de desenvolvimento do país, e de outra faz essa confusão em torno dos investimentos dos fundos de pensão, que são exatamente os grandes investidores de longo prazo. As duas posições não são conflitantes?
AM – Eu vou te dar um opinião em caráter estritamente pessoal. Acho que, nesse instante, o país tem uma taxa de poupança muito baixa, o que resulta em investimentos muito baixo também. Uma das grandes discussões que temos feito, inclusive na época da reforma da previdência da qual fui o relator, e agora na organização dos fundos de previdência complementar do setor público, é justamente sobre a necessidade de estimular os cidadãos a complementarem a sua renda através de fundos de pensão, que de um lado proporciona uma renda adicional na sua aposentadoria e de outro lado eleva a taxa de poupança brasileira que gera investimentos. Então, é sob esse ângulo que a discussão tem que ser feita.

II Mas essa discussão não está sendo feita. Porque?
AM – Essa é uma discussão que tem que ser feita com muito cuidado. Ela não pode ser feita sob a pressa do final de ano, de ter que se buscar dinheiro para o orçamento. Isso, para mim, é muito claro. Porém, reafirmo, isso é uma opinião absolutamente pessoal, não é do governo.

IIO senhor não acha que o governo deveria sinalizar mais claramente qual a sua posição em relação a isso? Uma posição clara do governo não evitaria o surgimento de propostas como essa, de cobrir o aumento do mínimo com recursos da tributação dos fundos de pensão?
AM – Esse assunto do aumento do salário mínimo surgiu agora, quando o presidente está no exterior (a entrevista foi feita no dia 26/10/2000, quando o presidente Fernando Henrique Cardoso encontrava-se na Espanha), mas acredito que nos próximos dias deve sair uma orientação a respeito disso.

IIQue forças políticas o sr. avalia que pressionam mais pela tributação dos fundos de pensão?
AM – Há pessoas que são muito críticas em relação ao mercado de capitais. Não vou citar nomes, mas no meu ponto de vista elas têm uma visão atrasada. Acham que o mercado de capitais é uma coisa de especulador, de explorador, etc. Essas pessoas não têm a capacidade de verificar que os fundos de pensão representam milhões de família que investem e que poupam para ter uma garantia de renda futura. Então, elas não percebem que alguns atos equivocados com relação a essa área de atividade podem resultar em um efeito negativo, contrário mesmo ao que elas desejam. Acho que o problema é mais de um pensamento atrasado sobre a economia.

II Curiosamente, quem está propondo mais fortemente a tributação é o PFL.
AM – A quem você se refere…? Quem está propondo a taxação no PFL?

IIComeça pelo senador Antonio Carlos Magalhães…
AM – Mas acho que tem outros setores do PFL que não defendem isso não. Essa é uma discussão que ainda está muito incipiente, muito no começo, acho que as coisas estão sendo recolocadas…

IIComo o senhor avalia que a discussão sobre a tributação dos lucros dos fundos de pensão vá evoluir? Qual a sua avaliação sobre essa discussão?
AM – Vou dizer o que eu acho. Acho que há muitos desentendimentos sobre essa questão, tem uns querendo a imunidade total, outros querendo tributar tudo e alguns talvez até a bi-tributação. Eu acho que, nesse campo, precisamos ter uma conversa muito séria, inclusive com os especialistas das áreas, com o pessoal dos fundos de pensão, sobre quais são os limites. Precisamos fazer uma discussão muito técnica e muito racional para ver o que é possível, como é possível, onde é possível, e em que medida é possível. Devemos partir do princípio que nós queremos estimular os fundos pensão e não desestimulá-los.

IISerá que não há um desconhecimento, por parte de muitos parlamentares, da realidade dos fundos de pensão?
AM – Claro que há. Veja, outro dia veio falar comigo um parlamentar escandalizado com o volume de recursos dos fundos de pensão. Ele me procurou dizendo “olha, veja aqui quanto os fundos de pensão têm, são R$ 128 bilhões”, como se estivesse revelando um grande número. Então eu falei para ele, olha você está equivocado, isso não é nada para um país com a dimensão do Brasil. Nós teríamos que ter esse valor multiplicado por 4 ou por 5, e aí o cara se assustou. Então, eu acho que há muita falta de entendimento sobre esse tema, e acho que uma discussão desse tipo poderá propiciar um alto grau de esclarecimento sobre a questão.

IIQual seria o caminho adequado para essa discussão?
AM – Acho que é o debate no Congresso. No transcorrer do debate no Congresso vão aparecer, seguramente, artigos na imprensa, vão acontecer debates nas cidades etc. Acho que, com isso, aos poucos as coisas irão se aclarando.

II E com relação ao aumento dos gastos que, em várias áreas, estão sendo autorizados?
AM – Eu estou vendo as coisas da seguinte forma: o país voltou a crescer, a criar emprego, vamos crescer de 3,5% a 4% neste ano, e ai começam a aparecer os eternos gastadores. É gente que estava em baixa quando a economia estava parada e agora percebeu o crescimento. Então, começa a querer gastar, não percebe que nós conseguimos o equilíbrio das contas públicas com muito sacrifício. Mas a lição de casa ainda não está completa, temos que continuar trabalhando.

IIEsses gastos podem comprometer a política do governo?
AM – Acho que não chegará a isso. Isso vai decantar, a minha experiência diz que isto vem com muita força mas depois aparecem os argumentos racionais e a coisa vai decantando. Vai decantando com a discussão. Essa gente esquece o que está acontecendo com a economia americana, o que está acontecendo nesse estranhamento entre árabes e judeus, esquecem do petróleo, esquecem da Argentina e começam a querer gastar e aí vêm com essa conversa de tributar os bens financeiros. O que pensam é em gastar.

IISão gastos em várias esferas, não é só para o aumento do salário mínimo.
AM – Claro, há outros gastos, como o aumento do Judiciário. Esse aumento do Judiciário é o maior absurdo que eu já vi, é uma coisa inacreditável, não honra a história do Supremo.

IIO sr. acha que isso vai decantar?
AM – Acho que sim.

IIOs projetos que regulamentam a previdência complementar serão votados neste ano?
AM – Dos três PLs sobre fundos de pensão, dois já votamos no Senado e deveremos votar votar o PL 9 neste mês de novembro.

II Com relação ao imposto, vai ser mantida a proposta de cobrar imposto apenas no diferimento?
AM – A princípio sim, é isso que está no projeto. Estamos trabalhando naquele substitutivo que foi apresentado pelo deputado Aleluia.

IIMantém o diferimento como é hoje.
AM – É isso que está sendo trabalhado.

IIUm estudo feito pela Abrapp, mostra que os fundos de pensão já pagam hoje mais de R$ 1 bilhão em imposto de renda retido na fonte, referente a quase 500 mil beneficados do sistema. Então, não se pode falar que o sistema de fundos de pensão não paga impostos.
AM – Lógico, é isso mesmo. Mas acho que isso precisa ser colocado cada vez mais.