Edição 260
Com as perdas sofridas pelos fundos de renda fixa atrelados à inflação no ano passado, o mercado ainda registra os efeitos da forte volatilidade dos juros. “Os fundos de pensão queriam voltar para CDI. E tentamos dizer que não, que estamos vendo o horizonte de 10 ou 20 anos, então as carteiras estão bem alocadas”, diz Alcindo Canto, novo diretor executivo da asset do HSBC. Ele entrou no lugar de Pedro Bastos, que recebeu uma grande missão para comandar a região da Ásia-Pacífico. A unidade responde por cerca de 45% dos ativos sob gestão (equivalentes a US$ 280 bilhões) de toda a asset global do HSBC.Economista com passagens pelo ABN AMRO Asset Management e Unibanco Asset Management, Canto tem agora a responsabilidade de tocar a asset do HSBC no Brasil. Ainda em referência à renda fixa, ele diz que o ano passado foi atípico. “Acendeu uma luz amarela para vermos que os fundos de pensão têm que sair um pouco do mercado local. É preciso começar uma diversificação de riscos” diz Canto. Para isso, o novo diretor revela que a asset tem planos para diversificar sua grade de produtos. Entre os novos focos da gestora estão os fundos multimercados e os investimentos no exterior. Confira a seguir a entrevista na íntegra:
Investidor Institucional – A renda fixa ainda é o negócio principal da asset do HSBC?Alcindo Canto – No Brasil, sim. Temos 85% de nossa asset hoje, que no mercado brasileiro tem US$ 40 bilhões, vendendo produtos de renda fixa. E globalmente o HSBC tem US$ 450 bilhões em ativos, então o Brasil é quase 10% da operação global. No resto do mundo é menor essa proporção renda fixa-variável, sendo 60% renda fixa, e 40% variável, mas ainda é a principal característica do HSBC ser um grande gestor de renda fixa ao redor do mundo.
II – O que vocês esperam em termos de juros e bolsa para o mercado doméstico?AC – A Selic deve ficar estável nos próximos meses e razoavelmente maior após eleição. A parte de investimento, valorização e precificação de bolsa, dependerá da visão do estrangeiro. O cenário está entre o neutro e o positivo. Já vimos o aumento de alguns riscos na carteira, mas a parte de bolsa ainda aguardamos como será no segundo semestre. A atividade está em linha como imaginávamos, com a dinâmica da política monetária atual. A economia real está estável, temos o pleno emprego, se olharmos os números reais, a economia cresce pouco, mas a renda real cresce. De alguma forma, as coisas não estão tão ruins, mas só vão melhorar realmente se tiver algum eixo político novo no cenário eleitoral.
II – Como você analisa a influência desse cenário político eleitoral?AC – O Banco Central já fez o trabalho pesado, subiu os juros. Existe um prêmio sobre a eleição, que está na curva de juros, nas emissões privadas, e o mercado está mais frio, esperando para fazer novas emissões de debêntures. No Brasil, a parte fiscal é ruim, mas a parte monetária foi razoavelmente bem feita, a inflação, com a Selic a 11%, dá um espaço. Tem o efeito Dilma versus oposição. Não operamos cenário político, mas está na hora de esperar um pouco e ver como isso vai caminhar ao longo dos próximos meses. Piora não vai ter. Ou é neutro ou melhora muito. E teremos que saber operar essa virada.
II – Como você avalia a reação da bolsa diante das pesquisas eleitorais?AC – De março a maio, o mercado deu um rali a favor por conta de pesquisas. Existem expectativas em relação a política, porque é dali que vai ou não vai sair uma melhora substancial. Estamos olhando e digerindo, e tentamos não deixar que o dinheiro especulativo nos influencie. Estamos vendo o fluxo a favor, mas nosso talento será em pegar a mudança na hora certa.
II – E como avalia os resultados do ano passado em que houve forte volatilidade na renda fixa?AC – No ano passado, quando a inflação e os juros subiram muito, a volatilidade dos portfólios aumentou demais. Foi exatamente no primeiro ano que as fundações decidiram aumentar esse benchmark híbrido de inflação mais pré-fixado. Isso machucou e assustou a todos. E nossa angústia na parte educacional era dizer que 2013 foi o primeiro ano muito ruim para renda fixa, com as cotas dos fundos com marcação a mercado negativas.
II– Como foi a reação dos investidores perante esse cenário?AC – Os fundos de pensão queriam voltar para CDI. E tentamos dizer que não, que estamos vendo o horizonte de 10 ou 20 anos, então as carteiras estão bem alocadas. O ano passado foi atípico, e é possível recuperar o que foi perdido. Mas acendeu uma luz amarela para nós para vermos que os fundos de pensão têm que sair um pouco do mercado local, da dependência do Banco Central, da taxa de juros nominal, da inflação e dos juros domésticos. É preciso começar uma diversificação de riscos.
II – Agora que está a frente do comando da asset, pretende diversificar a grade de produtos da asset?AC – Na parte de produtos, vamos rever a nossa grade. Lançamos no meio do ano passado a HSBC Global, família de seis fundos criados para atender o cliente private e o fundo de pensão. A diversificação talvez seja nossa maior bandeira para os próximos três anos, para os fundos de pensão e clientes pessoa física qualificados, super qualificados ou investidor profissional.
II – Como tem sido a transição desde a saída de Pedro Bastos e a sua promoção?AC – O processo de transição da gestão do Pedro Bastos para a minha está sendo bem tranquilo. Eu já era responsável pela área comercial, no time de distribuição, então na forma de atuação de projetos, relacionamento com cliente, já tinha proximidade. As novidades ficam mais para a parte de investimento. Contratamos um novo diretor de investimentos, em janeiro, o Guilherme Abbud.
II – A contratação do novo diretor de investimentos para a AL segue a estratégia de diversificação da asset?AC – Foi uma contratação bem negociada, pois ele pode dar uma energia nova e importante nos processos, principalmente em produtos de valor agregado, renda variável, multiasset, ou na parte crédito mais longo. Abbud vem de uma casa com esse DNA e ele tinha essa cabeça de diversificar fora das fronteiras de Brasil. Ele chegou em janeiro, tem trazido uma capacidade boa de gerenciar riscos desses portfólios com expertise legal.
II – Como a diversificação da grade de produtos pode atrair os clientes fundos de pensão?AC – Antigamente percebíamos que os planos de benefícos dos fundos de pensão tinham seu benchmark quase em 100% de CDI. Depois da crise de 2008, o juro real estava próximo de 1,5%, tirando a inflação. Os planos perceberam que precisavam ter uma carteira diferente com títulos que também acompanham a variação da inflação, mais um juro real para alongar a carteira e depois, nos próximos 30, 40 anos, ter a garantia de que o benchmark consiga pagar a meta atuarial dos planos. Em 2010, vimos as políticas de investimentos mudarem.
II – Qual foi a principal mudança?AC – Os fundos de pensão começaram a diversificar dentro da parcela de renda fixa o que era só CDI, e começaram a delegar aos gestores produtos com benchmark diferente. E nos diferenciamos nisso desde 2010. Temos uma família inteira com gestão ativa de inflação. Os fundos de pensão pediram para que a carteira de renda fixa que estava 100% no DI ficasse 70% no DI, 20% em uma inflação de 40 anos, então foi compondo o benchmark da renda fixa.
II – Como a diversificação pode ajudar os fundos de pensão?AC – Por exemplo, ano passado a bolsa local caiu e a americana subiu. Se os fundos tivessem a parcela de renda variável alocada 20% no S&P 500 ou em uma cesta de bolsas de países desenvolvidos, o retorno seria 15% nominal. Mas foi negativo, pois só tem Ibovespa na carteira. Então é essa a diversificação que estamos indicando. No médio e longo prazo, o benchmark da renda fixa tem que ser mais complexo, com inflação, juros pré-fixados e CDI, mas tem que ter uma parcela, que a legislação permite, para internacionalizar o portfólio.
II – Como vocês estão fazendo essa internacionalização?AC – O que pensamos em fazer mais ativamente, por termos assets em 20 países ao redor do mundo, é oferecer ao cliente institucional produtos geridos pelo HSBC fora do Brasil, portanto, com o mesmo processo de investimento que temos aqui. E dar a chance do investidor local diversificar suas carteiras através de um processo que ele já conhece aqui por já ser nosso cliente. Esse é um dos grandes projetos que temos para os próximos três anos.
II – Quais produtos no exterior vocês estão oferecendo para os institucionais?AC – Temos uma família de fundos no exterior que está com R$ 550 milhões de patrimônio. São seis FIs locais que seguem a norma 409, multimercados em reais, e 100% do dinheiro compra cotas de fundos administrados e geridos pelo HSBC lá fora.
II – Como você analisa a resposta dos clientes para esses produtos?AC – Temos alguns competidores com estratégia de BDR, coisas mais simples. Mas temos uma gestão ativa, queremos dar acesso a internacionalização, mas queremos ser um bom gestor do fundo em Hong Kong, nos EUA, etc. Temos que dar o benefício não só do acesso, mas da performance ativa lá fora. Percebemos muito na parte de renda variável e multiasset também. Vários clientes adaptaram sua política de investimentos para poder ter a parte estruturada de fundos multimercados. Tanto para a parte de renda variável, mutimercado e de investimento no exterior, os principais clientes aprovaram nossas políticas de 2014 e a possibilidade do gestor usar esse tipo de risco.
II – Quantos fundos de pensão investem nesses produtos?AC – Temos sete clientes que já usam a estratégia de investimento no exterior. Já é até acima do esperado. Os produtos, além dos retornos, têm variação cambial solta. Achávamos que o investidor ia demorar mais, mas foi uma surpresa. A Faelba é um exemplo disso (ver matéria na pág. 54), por estar fora do eixo Rio-São Paulo e ser um dos primeiros a alocar nisso. Hoje, o principal assunto é investimento no exterior. Temos sido lembrados pelos clientes como um das principais casas provedoras desse tipo de produto. Não podemos abrir o nome de outras fundações.
II – Quais mercados você avalia mais propícios para investimento?AC – Para o segundo semestre, na parte internacional, avaliamos que as coisas estejam melhor do que no último ano e meio. Uma das inseguranças do ano passado foi a questão do tapering, de quando os EUA ia aumentar juros para conter o risco da deflação. A transição da presidente do Fed foi boa nesse sentido, eles estão diminuindo os incentivos, mas o mercado descobriu que a magnitude do ajuste não vai ser tão severa. Desde o final de abril, o Banco Central Europeu jogou a taxa de juros da zona do euro pra baixo. Eles estão fazendo o que os EUA fizeram em 2008, 2009. Isso ajudou a Europa, que tinha uma situação complicada. A zona do euro conseguirá, com juros nominal e real mais baixo, ter mais crescimento.
II – E os outros mercados?AC – O Japão está estável, tem menos impacto, e a parte da Ásia cresce menos, China cresce menos, mas a gente descobriu que os 10% que ela crescia não era natural e talvez agora com 7% esteja bom pra manter o motor funcionando. No cenário externo as coisas melhoraram de janeiro pra cá.
II – Os países da Ásia apresentam oportunidade? Como está a presença de vocês na região?AC – Temos 45% da asset do HSBC na região, ou seja, US$ 280 bilhões em ativos. A economia lá é bastante aberta, somos banco líder em Hong Kong, que acaba sendo um hub para a gestão de recursos. Havia certa angústia em relação a dinâmica de crescimento da China, que impacta diretamente as operações da região, mas já se estabilizou. Eles vivem bem com crescimento de 7,5%. Agora queremos promover a região, levar América Latina e Brasil para esses países.
II – De que forma a ida do Pedro Bastos para a Ásia-Pacífico pode ajudar na aproximação com o mercado asiático?AC – Temos uma distribuição de varejo no Japão que compra fundos geridos no Brasil, renda fixa e variável, distribuídos para pessoas físicas no Japão. Queremos fazer o caminho inverso. No Japão os fundos de pensão são super fechados, então têm uma oportunidade de trazer investidores para o Brasil e América Latina. Esses mercados são geridos pelo mesmo time do HSBC. Um dos planos do Pedro é justamente aumentar a penetração dos investidores do Japão aqui no Brasil.
II – Vocês enxergam oportunidades nos mercados de fronteira?AC – Temos o produto New Frontier que estávamos analisando se vamos fechar para captação. Ficamos mais confortáveis em operar esse produto por saber que há inteligência do HSBC nesses mercados. Temos quatro ou cinco assets que cobrem os países da carteira. Esse é um produto que gostamos bastante, pois mistura ideia de setor, atividade econômica e crescimento. Não dá pra ter muito dinheiro alocado lá. Tem uma cesta de 14 países. A Irlanda por exemplo voltou a ser um país de new frontier. É um país que apresentou uma melhora após a crise.