Edição 95
Antonio Kandir, deputado
Como relator da nova lei das SA, aprovada no último dia 28 de março pelo Congresso, o deputado Antonio Kandir (PSDB-SP) teve um papel de destaque. Ele visitou e conversou com inúmeras associações de classe explicando as vantagens da nova lei em relação à anterior, que não protegia os investidores em bolsa mas sim os acionistas controladores das empresas.
E, no seu entendimento, uma proteção ao acionista minoritário é fundamental para atrair capital para as bolsas, que permitam a capitalização das empresas e viabilizem investimentos produtivos. É sobre isso que ele fala a seguir à Investidor Institucional, em entrevista exclusiva:
Investidor Institucional – Como foi a aprovação da nova lei das SA?
Antonio Kandir – Foi uma vitória importante. Conseguimos 374 votos a favor da lei e apenas 30 parlamentares votaram contra, do PDT, PC do B e PSB. O PT e o PTS votaram a favor, votaram junto com o governo.
II – Quer dizer que o trabalho de convencimento foi bem feito?
AK – Sem dúvida, senão não teria havido essa divisão da oposição. Se não tivéssemos conseguido convencer alguns parlamentares oposicionistas eles não teriam votado a favor da aprovação da lei. Essa não foi uma vitória do tipo posição versus oposição, ou onde os parlamentares votaram por alinhamento automático. Não, foi um trabalho de convencimento sobre a oposição, por isso tivemos uma vitória tão expressiva.
II – Quais são as vantagens da nova lei das SA?
AK – São inúmeras, mas o mais importante é que ela cria uma série de defesas para os investidores, tanto pequenos quanto grandes, que passarão a ser protegidos por uma CVM muito mais forte. Talvez a principal diferença entre o mercado de capitais dos EUA e do Brasil é que lá você tem uma CVM fortíssima, que é a SEC, que proteje os investidores minoritários.
II – Além do fortalecimento da CVM, o que mais muda com a nova lei?
AK – Passará a haver uma transparência maior das companhias, uma vez que os investidores minoritários poderão ter participação maior no Conselho de Administração, no Conselho Fiscal. Isso também vai significar um maior zelo da companhia com relação ao dinheiro dos acionistas. A nova lei também criará normas contábeis mais transparentes, o que aumentará a confiança dos investidores. E quando os acionistas, os investidores, estão mais protegidos, eles põem mais dinheiro no mercado de capitais.
II – O sr. falou em novas normas contábeis, mas isso é uma legislação paralela, não?
AK – Tem uma legislação propriamente dita, mas tem também um comitê que está sendo criado para sugerir modernização permanente das normas contábeis. Então, como eu dizia, quando você aumenta a confiança dos investidores eles colocam mais dinheiro, há um incentivo à poupança e ao deslocamento de recursos para as empresas no sentido positivo. Ou seja, com mais gente investindo no mercado de capitais fica mais fácil para as empresas levantarem capital, há mais investimento e mais empregos.
II – Como vai ficar essa questão da CVM independente, está no escopo da legislação?
AK – De forma bem objetiva, o poder público faz uma lista de um presidente e diretores da CVM, apresenta ao Congresso Nacional, eles são sabatinados, se aprovados ganham um mandato fixo de 5 anos. E não é só um mandato fixo, eles também podem operar uma agência com orçamento próprio.
II – Isso deve diminuir a questão do insider information?
AK – Essa questão do insider information tem um outro lado, que também não tem a ver com a questão da CVM, mas é uma outra coisa. Pela primeira vez nós estamos transformando em crime o insider trading e a manipulação de mercado. Pela primeira vez o insider trading e a manipulação de mercado é crime no Brasil. Antes, ficava em processo administrativo no âmbito da CVM.
II – O sr. falou que a nova lei das SA permitirá um aumento dos investimentos. Está se referindo a investimentos do mercado interno ou do mercado externo?
AK – Todos os mercados, todo mundo. Agora fica mais fácil para as pessoas investirem no Brasil, nas boas empresas brasileiras. Essas pessoas não ficarão com medo do que poderá vir a acontecer no futuro com os seus investimentos, por manobras das companhias. Antes, algumas faziam isso, tanto com o investidor nacional quanto com o investidor internacional.
II – O sr. sentia que os investidores internacionais esperavam por uma lei desse tipo?
AK – Bem, a demanda maior por uma lei desse tipo era do próprio Brasil, que precisava crescer mais e para isso precisava atrair investimentos. Então, havia uma demanda do próprio Brasil, porque com uma lei desse tipo se consegue atrair mais investimentos. Na verdade, o mercado internacional tem hoje excelentes alternativas de investimento em todo o mundo, então o problema era mais nosso. Acho que era muito mais de nosso interesse do que do capital estrangeiro aprovar uma lei desse tipo.
II – Quem foi contra?
AK – Sempre tem alguns que gostariam de ter um pouquinho mais, mas a dificuldade maior que encontramos foi mesmo em alguns setores empresariais.
II – Os controladores?
AK – Lógico!
II – Essa lei revoga uma outra que o sr. mesmo tinha criado anteriormente, e que ficou conhecida como lei Kandir. Porque aquela lei?
AK – No processo de privatização, num determinado momento se chegou a um impasse para se fazer a privatização no setor de telecomunicações e do setor elétrico. A advocacia geral da União, na época, dizia que não poderia fazer uma alteração específica na Lei de Privatização, que não se podia fazer uma alteração temporária na lei das SA. Então, a lei que ficou conhecida como lei Kandir foi uma decisão de governo, para permitir a privatização naquele momento.
II – Ela viabilizou o processo de privatização?
AK – Não tenha dúvida. Ela viabilizou, por exemplo, a privatização do setor de telecomunicações. Diga-se de passagem que não foi uma má idéia, porque quase quadruplicou o número de telefones disponíveis, aumentou o serviço. Acho que, a essa altura do campeonato, ninguém pode imaginar o salto de qualidade que nós tivemos no campo das telecomunicações sem as privatizações. Boa parte do que o Brasil está crescendo agora, a 4% ao ano, é conseqüência do processo de privatização. Muitas vezes as pessoas não entendem bem o porque, é que tem uma massa de investimentos enorme que está sendo feita, três a quatro vezes maior do que aquela que era feita antes.
II – Muita gente diz que as privatizações foram compras de empresas já instaladas, mas não se investiu em nada de novo.
AK – O processo de privatização desencadeou investimentos que o setor público não fazia. O maior fator de crescimento que está ocorrendo na economia brasileira decorre dos investimentos feitos pelas empresas que antes eram estatais agora são privadas. Então, acho que o Brasil lucrou, e muito, por nós termos viabilizado a privatização naquela época. A intenção sempre foi temporária, tanto que agora nós nos empenhamos tanto para fazer essa lei.