Edição 92
Waldeck Ornellas, Ministro da Previdência Social
O Ministro da Previdência Social, Waldeck Ornellas, considera que as mudanças que estão ocorrendo na área de previdência complementar são necessárias e urgentes, para evitar que alguns fundos de pensão cheguem à insolvência e não tenham recursos no futuro para saldar os compromissos de pagamento de aposentadoria aos participantes. De onde vem esse receio de Ornellas? Exatamente da queda da taxa de juros, que dá ao ministro a sensação de que muitos fundos de pensão não conseguirão cumprir com sua meta atuarial, de inflação mais 6% ao ano, não gerando recursos no longo prazo para saldar os compromissos de aposentadoria.
Então, a idade mínima funcionaria como um alívio para esses fundos, já que retardaria o momento do gozo do benefício pelo participante, dando mais tempo ao fundo para formar a poupança. “Nós estamos fazendo o equacionamento desses cálculos atuariais para garantir o recebimento da aposentadoria no futuro”, diz o ministro.
Além disso, ele fala sobre a gestão dos recursos dos fundos sob intervenção, que somam R$ 296 milhões e devem ser administrados por 3 a 5 empresas de asset, escolhidas dentro de um processo de licitação. As regras já estão definidas, disponíveis no site da SPC, esclarece. Veja, a seguir, os principais trechos da entrevista de Ornellas:
Investidor Institucional – A Secretaria de Previdência Complementar tem publicado, nos últimos meses, uma série de regras mudando a vida dos fundos de pensão. Isso tem criado muita insegurança no sistema de fundos, que está praticamente parado por causa disso. Qual sua avaliação sobre essa situação?
Waldeck Ornellas – Esse processo de mudança, de criação de novas regras, visa garantir a estabilidade do sistema no longo prazo. Hoje nós estamos tendo uma queda continuada e progressiva na taxa de juros, então é preciso ajustar os cálculos atuariais dos planos de fundos de pensão, que foram feitos contemplando uma hipótese de inflação mais 6% de rendimento. Esse resultado vai ser cada vez mais difícil de se obter. Então, é preciso prevenir para não ter que remediar.
II – Quer dizer, sem isso os fundos não terão recursos para pagar as aposentadorias?
WO – Exatamente. Quando nós adotamos medidas como a da idade mínima para saída do regime da previdência complementar, nós estamos fazendo o equacionamento desses cálculos atuariais para garantir o recebimento da aposentadoria no futuro. E isso sem onerar os participantes que, do contrário, teriam que comprometer no presente uma parcela muito grande dos seus salários para terem a manutenção do seu nível de renda no futuro quando pararem de trabalhar.
II – Não há um excessivo engessamento sobre as atividades dos fundos de pensão?
WO – Eu acho que as medidas são necessárias e permitirão monitorar os indicadores de desempenho dos fundos de pensão. É preciso que haja profissionalização na gestão dos fundos. Inclusive, a lei que está no Congresso prevê a responsabilização
dos diretores das fundações, que passam eles e não mais os fundos a serem punidos com multas; se eu multo o fundo eu estou multando os participantes e não quem agiu mal na direção.
II – Como está a questão da gestão dos recursos dos fundos sob intervenção?
WO – A Secretaria vai realizar uma licitação para selecionar bancos que venham a administrar os recursos desses fundos que estão em fase de intervenção ou liquidação. Vão ser licitados R$ 296 milhões, a serem divididos entre 3 e 5 gestores. As normas, qualitativas e quantitativas, já estão definidas e disponíveis no site da secretaria.
II – A internet está sendo bastante usada na área da previdência, como canal de difusão de informações. O acesso é grande?
WO – Ainda não é muito, mas acreditamos que o interesse crescerá. A página da previdência social na Internet está disponibilizando dados de desempenho dos fundos, taxas de remuneração de corretoras, com que corretoras os fundos operam etc. Agora, é preciso que os participantes dos fundos de pensão despertem para o fato de que aquele patrimônio é deles e são eles que têm que fiscalizar os fundos de pensão, não é a Secretaria de Previdência Complementar. A nossa política é uma política preventiva, é uma política de transparência, de dar informações para os participantes, mas eles é que têm que zelar pelo seu patrimônio.
II – Qual é a situação da previdência brasileira hoje?
WO – O ano 2000 marcou a virada da previdência social brasileira, com a estabilização do déficit, a modernização da previdência e a ênfase que estamos dando agora ao programa de estabilidade social, que é a ampliação do seguro social no meio da população brasileira. Nós precisamos evoluir rapidamente de uma margem de proteção social da ordem de 40% para um patamar superior. O Uruguai, por exemplo, tem 70% de proteção social.
II – O sr. falou que o déficit estabilizou?
WO – Sim, ele estabilizou em 0,9%. A política do governo em relação ao regime geral de previdência social era de promover a estabilização do déficit do INSS, que projetava um déficit de 2,4% do PIB em 2020. Nós conseguimos estabilizar esse déficit em 0,9% do PIB e isso deve se manter e se sustentar pelos próximos 20 anos. E se nós conseguirmos reduzir os subsídios indevidos que hoje existem, esse déficit cai ainda mais.
II – De quanto são esses subsídios?
WO – Eu tenho R$ 8,3 bilhões de subsídios e mais R$ 1,5 bilhão de benefícios assistenciais da renda mensal vitalícia, que corre indevidamente à conta da Previdência Social. Se não fosse isso, não haveria déficit. Então, eu diria que o regime geral de previdência social está hoje praticamente equilibrado.
II – Como tirar esses subsídios e benefícios da conta da Previdência?
WO – Eu diria que, sempre que nós tivermos benefícios subsidiados ou benefícios assistenciais, isso deve ser custeado por uma fonte fiscal e não ser jogado à conta da contribuição do trabalhador ou da contribuição solidária do empregador. Por quê? Porque cada trabalhador deve pagar o seu próprio seguro e não mais do que isso.
II – Qual deveria ser a fonte de financiamento desses subsídios e benefícios?
WO – Como eles se financiam é um problema fiscal, não é um problema previdenciário. Sempre quando o Congresso aprovar subsídios, mantiver subsídios, ele tem que dizer como é que financia.
II – A previdência tem sido vítima de verdadeiras quadrilhas de assaltantes, que agem tanto sonegando impostos quanto desviando recursos. O que está sendo feito para diminuir a ação dessas quadrilhas?
WO – Nós temos tomado medidas firmes e rigorosas de combate à sonegação e ao desvio de recursos. Temos descoberto gangs que vinham operando no Rio de Janeiro, por exemplo, desde 1992, há oito anos, portanto. A informatização e a modernização da previdência é um item fundamental no combate às fraudes, à corrupção, à sonegação, porque toda vez e sempre que nós pudemos cruzar informações, nós detectamos as discrepâncias, os desajustes existentes e temos então uma ação fiscalizadora importante.
II – O sr. falou que o Brasil quer elevar sua margem de proteção social acima dos 40% atuais. Como o governo pretende fazer isso?
WO – O presidente Fernando Henrique já enviou ao Congresso, em regime de urgência, um projeto de lei que cria incentivos para a formalização do emprego no campo. Nós já tínhamos criado, quando da lei do fator previdenciário, medidas de incentivo aos trabalhadores autônomos e às mulheres, como a extensão do salário-maternidade. Então, só no ano passado nós tivemos a filiação de 1,8 milhão de segurados novos, dos quais 1,2 milhão foram mulheres.
II – A formalização do emprego do trabalhador do campo é a prioridade?
WO – Do trabalhador rural e dos autônomos. Temos hoje cerca de 38 milhões de trabalhadores desassistidos, dos quais 20 milhões são autônomos e 18 milhões são de trabalhadores rurais, são de moradores do campo. Então é preciso que esses diversos segmentos venham para a previdência social. Além disso, nós temos no país cerca de 5 milhões de trabalhadores domésticos, dos quais apenas 1 em cada 5 tem previdência social. infelizmente, os dados nos mostram que a previdência social é uma grande desconhecida da população brasileira, que não há entre nós uma tradição de seguro social, uma cultura de seguro social, talvez por força da presença ativa da inflação no passado incidindo na vida da sociedade brasileira, coisa que felizmente se superou a partir de julho de 94 com o Plano Real.
II – Qual sua avaliação do processo de reforma previdenciária?
WO – Eu considero que o processo de reforma na previdência básica está completo, está realizado, é uma tarefa que o governo Fernando Henrique cumpriu, legando ao país uma nova previdência social e, sem dúvida, pelos próximos vinte anos as projeções nos indicam estabilização do déficit. É evidente que os próximos governos vão ter que se dedicar a uma sintonia fina, mas os grandes saltos foram dados já no período do governo Fernando Henrique. Então, de agora em diante é monitorar a previdência social e isso os economistas, sociólogos e todos sabem muito bem como deve ser feito.
II – O interesse pela área previdenciária tem crescido ultimamente. Porque o sr. acha que isso está ocorrendo?
WO – Estamos firmando vários convênios com instituições de pesquisa e isso coloca o tema mais em evidência. Fizemos um convênio com a FGV que está criando um núcleo de estudo e pesquisa voltado para a previdência social. Essa é uma área para a qual o meio acadêmico brasileiro ainda está despertando. Nós já firmamos convênios com 6 ou 8 delas, para estimular a realização de cursos, estudos, cursos de extensão, estudos e pesquisas com ênfase em aspectos diversificados da previdência social, como por exemplo, atuária, demografia, perícia médica, direito previdenciário e assim por diante.