O novo presidente da Anbima, Carlos Ambrósio, tomou posse em junho último sucedendo a Robert van Dijk que dirigiu a entidade nos últimos dois anos. Ambrósio, que é um dos sócios fundadores da Claritas, gestora comprada pela Principal entre 2012 (60%) e 2016 (o restante), falou com Investidor Institucional sobre suas principais prioridades à frente da entidade. Veja a seguir os principais trechos da entrevista:
Investidor Institucional – Quais são suas prioridades à frente da Anbima?
Carlos Ambrósio – No mandato do Robert teve uma discussão grande sobre um plano de ação que, agora que a gente toma posse, vamos dar implementação. O foco é acelerar o mercado de capitais e já temos uma série de iniciativas embaixo dessa questão, como a promoção do investimento de longo prazo. Além disso, temos iniciativas ligadas à questão da educação financeira e também a questão de conduta e de comportamento dos participantes do mercado, que já refletem de alguma forma na nova auto-regulamentação que entra em vigor a partir de janeiro do ano que vem.
II – Um dos entraves colocados pelo mercado de capitais é a questão dos custos, que são redundantes e elevados para o mercado. Como a Anbima pretende tratar desse tema?
CA – Esse é um outro item do nosso plano, que é buscar a redução do custo de observância em várias frentes. Queremos incentivar o mercado de capitais revisando uma série de itens, e estamos fazendo tudo isso com foco também em redução de custo de observância.
II – Como o mercado de capitais vai se comportar nessa nova realidade de taxas de juros baixas, de um dígito?
CA – Esse é um movimento que já começou, que já começamos a enxergar, é um movimento saudável e que vai promover uma busca de alternativas de retorno para os investimentos. A gente vê a indústria de fundos com uma gestão mais ativa, uma locação maior de risco, e também um incremento grande de juros nas emissões de papéis.
II – Nessas emissões há espaço para a volta dos IPOs?
CA – IPOs nem tanto ainda, teve alguma aceleração mas já diminuiu, acho que aí tem uma questão do nosso cenário político que não ajuda. Mas eu diria que a gente já vê uma maior busca por ativos de crédito, aumentaram as emissões de crédito. Acho que um ambiente de taxa de juros estável, e baixa para os nossos padrões, é positivo para o amadurecimento do mercado e para o desenvolvimento do mercado de capitais.
II – O custo das emissões no Brasil é bastante elevado. Como conciliar essa nova necessidade, de juros baixos e necessidade de mais emissões por parte do mercado, com o custo dessas emissões?
CA – O mercado de capitais acaba tendo um papel importante nessa situação que você descreveu. Na hora em que a gente tem um mercado de capitais mais desenvolvido vamos promover uma revisão de emissão 400, 476. Quer dizer, o acesso direto de quem quer captar o recurso. Esse é o papel do mercado de capitais. Para tentar potencializar isso estamos fazendo, junto com o regulador, uma revisão na parte da emissão 400 e 476 para deixá-la mais ágil, mais coerente e reduzindo os custos. Tanto na 400 que é para o público em geral quanto na 476 que é para o público profissional.
II – Quais seriam as propostas da Anbima nesse sentido?
CA – A gente não tem uma proposta fechada, a proposta está em discussão. Hoje existe uma discrepância muito grande entre a 476 e a 400, de custos e de tempo. São para públicos diferentes, e que continuem sendo diferentes, mas estamos tentando olhar itens que façam sentido para diminuir essa distância entre as duas ofertas, em termos de custo e prazo e de tempo para vir a mercado. Acreditamos que isso poderá fomentar um fluxo de oferta de 400, que hoje tem sido mais baixo, uma vez que as ofertas de 476 tem sido mais altas.
II – A Anbima pretende fazer gestões junto à B3 para tentar uma redução dos custos de emissão, que tornam tão caro para as empresas abrir o capital?
CA – A gente não tem nenhuma iniciativa nesse sentido, mas sabemos que a B3 está com algumas iniciativas para desenvolvimento do mercado de acesso, mas essa é uma pauta mais da B3 do que da Anbima.
II – Mas que acaba refletindo nos fundos, que compram esses papéis para suas carteiras, não é?
CA – Não acredito que hoje o grande limitante seja o custo da emissão, acho que antes tem uma situação do ambiente, do cenário, da conjuntura como um todo. A renda fixa ainda é a mais propícia, a queda da taxa de juros propicia mais a renda fixa. A nossa parte de renda variável ainda depende muito do mercado externo e sofre muito mais com todas as turbulências lá fora, seja pela taxa de juros americano, seja pelas incertezas políticas.
II – Nos últimos anos os fundos estruturados, e me refiro especificamente aos FIPs, apresentaram muitos problemas, e isso levantou uma questão importante de ética na indústria de fundos. Como vocês estão olhando isso aí?
CA – A gente sabe que existiram casos específicos e concentrados em agentes específicos, num determinado segmento, mas não é algo generalizado. Os FIPs tem sido muito importante para a indústria e possuem uma série de histórias de sucesso em vários outros segmentos. E na verdade a gente já está fazendo esse movimento, de começar a olhar mais conduta do que produto. Já fizemos isso com os multimercados, renda fixa, fundo de ações e FIDCs e estamos trabalhando em conjunto com a ABVCap para seguir na mesma linha com os FIPs. Vamos começar a olhar mais a questão de conduta e ética dos agentes na condução daquele produto.
II – Existe uma iniciativa da Anbima de aproximar a legislação dos FIDCs e dos FIDCs NPs. Poderia falar um pouco sobre como será isso?
CA – Hoje tem uma norma específica para FIDC e uma norma específica para FIDCs não padronizados, a gente está trabalhando para que não haja essas duas normas diferenciadas. A ideia é você trabalhar o produto como um todo, com uma norma só, a ideia é de simplificação. É ter uma regra geral do produto e uma regra de enquadramento específico, para simplificação mesmo.
II – Você colocou anteriormente a questão da importância da poupança de longo prazo. Como você vê a questão da educação financeira nesse contexto?
CA – A gente olha várias em frentes diferentes. Tem a educação do profissional, e já temos mais de 500 mil certificados em todo o Brasil, e tem também a do profissional de risco. Além disso, tem as novas certificações que estamos trabalhando, sempre no intuito da educação financeira para o profissional. Tem uma pesquisa que a gente vai soltar ainda esse ano, que é o perfil do investidor. No ano passado soltamos uma, mostrando como o brasileiro lida com o dinheiro, e esse ano vamos divulgar o Raio X do Investidor.
II – Além da educação, também é falha a disponibilidade dos dados para o investidor, a transparência dos dados. Como melhorar esse aspecto?
CA – Essa é uma outra questão, a da transparência de dados, da transparência de informações. Está saindo a plataforma de mercado de capitais, que é o lugar onde vamos estar consolidando todas as informações. A ideia é ter um lugar só onde você possa buscar todos os documentos e todas as informações de todas as emissões dentro do mercado, que vai facilitar o acesso de qualquer investidor ou um profissional que quer entender sobre aquela informação específica.
II – Vocês vão fazer um acordo com Cetip para conseguir isso?
CA – Sim, toda a documentação, se você quiser ter acesso à documentação das debêntures desde a escritura, as atas e relacionar com essa debênture você vai ter tudo num único depositório. Vai ser um sistema que te dá acesso a todo comportamento desse papel. A ideia é que isso gere mais informação, mais tranquilidade, e que isso possa promover o mercado, dar mais liquidez ao mercado.
II – Como a Anbima vê a redução do papel do BNDES como financiador do mercado de capitais?
CA – A gente tem acompanhado com muita satisfação o novo posicionamento do BNDES, deixando de ser a grande fonte de financiamento para ser o catalisador desse financiamento. Sem dúvida nenhuma, o BNDES é reconhecido como especialista e um crivo super importante de aprovação do projeto que está sendo analisado. Quando ele entra ou participa de alguma emissão, participa em condições de mercado, onde o mercado também possa participar, é positivo para todo mundo.
II – A participação do banco nos fundos de infraestrutura é importante?
CA – Muito importante. Têm algumas questões menores, de regulação e enquadramento, que estamos trabalhando com a CVM, e tem essa questão desse incentivo, desse acelerador que é esse posicionamento do BNDES e do programa. Se ele entra com o crivo, uma análise, quase um rating, com a expertise que dá mais segurança para o investidor e para o mercado. Aí ele entrando, sem dúvida nenhuma, potencializa o volume de captação como um todo, acho muito positivo para a indústria, tem potencial de triplicar o que a gente tem aí na indústria de fundos de infraestrutura.
II – As Fintechs surgiram mudando o mercado de distribuição de fundos e já começaram a ir para as áreas de financiamento, de intermediação. Como você vê essas novas empresas no mercado de capitais?
CA – A gente tem acompanhado algumas, nem todas. Essa é a postura da Anbima, de inclusão, de tentar cada vez mais acompanhar, porque acontece rápido e é nosso desafio conseguir acompanhar tudo que está acontecendo e entender o que a gente acredita que é positivo. Precisa existir uma arbitragem regulatória, entender o que são essas atividades, se elas se encaixam dentro das regulações existentes e de certa forma trazer para participar da discussão dentro da associação. Por exemplo, a XP é um grande exemplo e faz parte da nossa diretoria.
II – Você poderia falar um pouco sobre sua previsão de cenário daqui pra frente?
CA – A gente tem um desafio no curto prazo que é a própria situação política aqui, da eleição. Estamos promovendo reuniões com os economistas dos diferentes candidatos e estamos fazendo isso em conjunto com a B3, elaborando uma série de propostas para serem entregues a esses candidatos antes da eleição, até o começo de setembro, e ver como podemos atuar dadas as limitações das incertezas todas. Vamos ser proativos e colocar o que a gente acredita que são reformas e iniciativas positivas para o país para poder enfrentar os outros desafios que não dependem só de nós.
II – As reformas são essenciais? É um dos pontos fundamentais que vocês vão colocar na plataforma?
CA – Sim. O resultado ainda não está pronto mas sim, a gente tem o desafio de ajuste fiscal e tudo o mais. São pontos essenciais o fortalecimento das agências reguladoras e por aí vai. Na prática, a gente vai tentar levar medidas concretas para fortalecer o país, para poder enfrentar os desafios que são desafios externos e não dependem de nós. Existe uma questão da sucessão política que também não depende de nós, vamos ter que aguardar para se reposicionar pós eleição.