Edição 240
O otimismo dos investidores em relação ao México é fruto do seu crescimento superior ao brasileiro nos últimos dois anos e da perspectiva de reformas estruturais no novo governo.
Com mais de US$ 3,7 trilhões em ativos sob gestão, a BlackRock é hoje a maior gestora global de fundos de investimento, com um vasto portfólio de produtos de investimento que incluem desde agressivos hedge funds, passando por fundos de ações e chegando aos passivos ETFs. Na América Latina os ativos somam cerca de US$ 7 bilhões, dos quais aproximadamente 65% estão no Brasil.
A área de fundos para América Latina é comandada por um brasileiro com nome de americano, William M. Landers, mais conhecido como Will Landers. Nascido em São Paulo, Landers formou-se em administração e finanças pela Universidade de Georgetown (Washington, EUA) em 1961 e percorreu uma longa trajetória através de bancos de investimento antes de aportar na BlackRock em 2006, na fusão com o Merrill Lynch. Ele estava no Merryl Lynch desde 2002 e antes disso tinha passado pelo Credit Suisse, Lehman Brothers e Bear Stearns.
Apesar de ter passado praticamente toda sua vida adulta fora do Brasil, Landers fala um português praticamente sem sotaque. Passaria despercebido numa assembleia de acionistas de qualquer uma das principais empresas brasileiras, não fosse pelas posições que representa: 5% da Petrobras; 15% de Bradespar; 7% de Itaú Unibanco; 5% de Usiminas; 5% de Gafisa, entre outras.
Ele gosta de deixar claro que sua área de América Latina não tem nada ver com a atuação local da BlackRock, que opera apenas fundos de ETFs sob a plataforma iShares. São 8 fundos de ETFs, somando ativos de R$ 2,12 bilhões (ver ranking Top Asset).
Nesta entrevista à Investidor Institucional, ele fala sobre como os investidores globais estão vendo o Brasil e afirma que o entusiasmo recente com o México é por causa da possibilidade real de que reformas estruturais ocorram naquele País. Já no Brasil, ninguém acredita mais nisso.
Investidor Institucional – Queria que você falasse um pouco sobre essa bipolaridade que os investidores globais parecem ter em relação ao Brasil, um dia está tudo ótimo, no outro está tudo ruim, depois volta a ser bom novamente…
Will Landers – O mercado brasileiro continua sendo tratado como um dos mercados de alto risco, mas como houve uma melhora do sentimento em relação à Europa eu acho que isso aumentou o apetite por risco dos investidores e o Brasil é, sem dúvida, um dos países que se beneficia quando se aumenta esse apetite. Coincidiu que no mesmo momento em que o humor para a Europa melhorou, os números do Brasil também começaram a mostrar uma reação positiva. No primeiro semestre, especialmente no segundo trimestre, tivemos um período difícil para as ações das empresas brasileiras, cujos resultados vieram relativamente fracos apesar de tudo o que o Ministério da Fazenda e o Banco Central estavam fazendo para estimular a economia. Com o início de uma mudança nesse quadro, tanto o investidor tanto doméstico quanto o internacional começam a voltar para a Bolsa brasileira.
II – Os últimos balanços das empresas multinacionais com atuação no Brasil mostra que os seus balanços consolidados foram afetados negativamente pelos resultados de Brasil. Isso pode piorar o humor em relação a Brasil?
WL – As companhias internacionais com operações no Brasil tiveram dois impactos negativos nos seus resultados: um foi o fato de que o PIB brasileiro ter sido bem baixo ou perto de zero no primeiro semestre, e isso sem dúvida teve um impacto negativo nos resultados consolidados das matrizes; o outro foi que, com a desvalorização do Real, ao fazerem a consolidação dos balanços elas também sofreram com isso. Então, esses foram os dois eventos que eu acho que atrapalharam um pouco na consolidação dos resultados das subsidiárias brasileiras pelas companhias internacionais.
II – Então porque os investimentos continuam entrando forte?
WL – É verdade. Acho que a maioria desse pessoal que tem uma cabeça mais de investimento de médio e longo prazo entende que o que tivemos no primeiro semestre foi um período de digestão do crescimento do crédito, mas continuamos com uma economia de emprego pleno e com os salários crescendo . Então, esse pessoal vê que o potencial do crescimento doméstico continua sendo interessante e por isso continuam a investir.
II – Como são os investimentos que estão sendo direcionados ao Brasil, são de médio e longo prazo ou de curto prazo?
WL – O que temos visto muito são investimentos diretos, que são investimentos de médio e longo prazo voltados ao setor produtivo, mais do que o investimento em bolsa em si. O investidor de bolsa, por mais que queira mostrar que é investidor de longo prazo e tudo o mais, se os múltiplos ficarem meio altos ele tem sempre a opção de sair para procurar outros mercados mais interessantes, enquanto que o investidor mais estratégico não. Se o estratégico investe numa planta, ele não poderá vender a planta no ano seguinte e sair.
II – O México começou a ser apontado como um rival do Brasil na captação de investimentos internacionais. Podemos ser passados para trás pelo México?
WL – A perspectiva do México sempre foi de ter um potencial de crescimento menor que o Brasil. Mas nos últimos um ano e meio ou dois anos eles cresceram a uma taxa mais alta que o Brasil. Além disso, o México acabou de ter eleições presidenciais, mudando o partido que vai assumir a presidência em primeiro de dezembro, e há perspectivas de reformas importantes na parte de energia e na parte fiscal. E a probabilidade disso acontecer agora é maior do que nos últimos 12 anos, quando estavam sendo esperadas. Para mim, esse é o grande diferencial na história macro do México contra o Brasil, a possibilidade das reformas.
II – Quer dizer que, em grande parte, são as perspectivas de reforma que estão atraindo os investidores globais para o México?
WL – Sim, não é só o fato que nesse período de crise europeia eles terem crescido mais rapidamente que o Brasil, mas é também o potencial de realizar as reformas necessárias. No Brasil não seriam reformas diferentes, e também seriam super importantes, mas no México há uma probabilidade maior de que essas reformas vão para frente nos próximos meses. Isso está impulsionando um pouco as ações do México.
II – A proximidade dos Estados Unidos também não ajuda
WL – Sim, era onde eu ia chegar. A economia mexicana é muito mais ligada com a economia americana do que com a economia da Europa ou da China. Dado o fato de que os Estados Unidos também têm performado um pouco melhor do que a Europa, isso também tem ajudado o México. E nos períodos em que o apetite por risco cai, quando os Estados Unidos se tornam o porto seguro, o México também se beneficia por ter essa relação próxima com os Estados Unidos.
II – Quais são as reformas que o mercado internacional espera do Brasil?
WL – Acho que hoje nada é muito esperado, porque o mercado vê que esse imbróglio em Brasília torna a possibilidade de grandes reformas ser bem baixa. Quando vemos as movimentações de Brasília para tentar impulsionar a economia, tentando fazer micro-reformas, dar micro-ajudas a certos setores ou fazer alguns cortes de impostos, são coisas que a gente chama de administração micro e que no final das contas não resolve muito no longo prazo. Na última semana parece que a história mudou um pouco, mas realmente o mercado não espera grandes mudanças. Uma reforma estrutural maior da parte fiscal, baixando bastante o custo Brasil de fazer um negócio, de contratar e tudo o mais, isso sim teria um impacto de mais longo prazo. Isso seria muito bem visto e realmente teria um impacto muito maior na economia, mas infelizmente, com tudo o que está acontecendo no Brasil, parece que não está na pauta do curto prazo.
II – A exposição em bolsa dos investidores internacionais no Brasil ainda está abaixo do que foi há um ano e meio ou dois anos atrás. Como você avalia a perspectiva de esses recursos voltarem às bolsas brasileiras?
WL – A dificuldade para vermos esse número aumentar bastante é que, quando olhamos para as grandes companhias brasileiras, a maioria delas ainda têm algumas coisas para provar ao investidor internacional. Começando pela Petrobras, cuja capacidade de investimentos, retornos, aumento de produção e mesmo um pouco na parte de governança corporativa precisam ser provados ao mercado pela nova presidente. A primeira rodada de conversas dela com o mercado foi boa, mas não vai consertar o dano que foi feito desde a mega-capitalização de dois anos atrás. Essa é a maior companhia do Brasil, então quando a Petrobras não funciona é difícil que a Bovespa como um todo funcione e é difícil de ver grandes montantes de dinheiro internacional voltando para o Brasil. A segunda maior companhia é a Vale, que hoje está com problemas porque a China está com uma demanda de aço bem mais baixa e com isso o preço do minério vem caindo. Ainda precisamos ver uma melhora significativa na demanda por aço na China para ela poder ajustar o preço de minério e com isso trazer o investidor de volta. Fora os problemas fiscais e de royalties que está tendo no Brasil e que ainda não foram solucionados.
II – Que setores parecem bem?
WL – Os bancos parecem que estão começando a chegar num ponto melhor, depois de um primeiro semestre bem difícil, com as carteiras de inadimplentes aumentando e a interferência do governo para baixar spread de certos produtos. Tudo isso deixou um gosto amargo na boca dos investidores que acreditavam que os bancos tinham um controle melhor sobre suas carteiras de empréstimos e que a interferência do governo não chegaria nesse nível. Continua sendo uma nuvem sobre o setor o potencial de desconto que pode ocorrer em algum momento, mas o fato é que os resultados já estão melhorando e o segundo semestre deve ser bem melhor que o primeiro e isso já começa a trazer dinheiro de volta para este setor. Há outras empresas, como Ambev por exemplo, que foram bem mas também foram focadas pelo governo em termos de impostos e tudo o mais.
II – E as empresas menores?
WL – Veja, a maioria das companhias grandes no mercado brasileiro tiveram um primeiro semestre difícil, isso tem que ser superado antes que o investidor volte com peso para esses setores. E sem as large capitals funcionando você só consegue ganhar dinheiro no Brasil através de alocação em ações de empresas de pequeno e médio porte, mas com elas a bolsa como um todo fica difícil de performar.
II – Quais são os setores mais interessantes para o investidor internacional?
WL – Quero lembrar que quando eu falo estou dando a minha opinião e do meu time, e não a opinião da firma como um todo. A BlackRock tem interesses bem maiores do que aqueles pelos quais eu sou responsável no Brasil. Em termos dos nossos setores preferido continuamos, agora até mais do que nunca, com um viés para o setor doméstico. Acho que será o setor que vai se recuperar mais rapidamente. Já tivemos uma posição abaixo do esperado na parte de mineração, aço, papel e celulose por algum tempo, mantemos isso e continuamos a preferir na parte de consumo as companhias de varejo. Apesar delas estarem com os múltiplos mais altos, ainda têm espaço para performarem bem. Gostamos também das companhias que se beneficiam de um Real mais perto de R$ 2,00 do que de R$ 1,80. Mas aí tem que tomar um pouco de cuidado porque essa parte de exportação, dada a fragilidade da economia global, tem que olhar caso por caso. Mas a parte de consumo, sem dúvida, seria a área que temos mais interesse. Nos bancos também temos uma posição importante, mas menor do que já foi no passado, dados os problemas de inadimplência do primeiro semestre.
II – O dólar por volta de R$ 2,00 está num ponto de equilíbrio?
WL – Não sei está em equilíbrio ou não. Acredito que se fosse só o mercado tocando a moeda, talvez a moeda estaria um pouco mais forte, perto de R$ 1,80 ou R$ 1,85. Mas, claramente, o governo tem o desejo de manter o Real mais perto de R$ 2,00. Por períodos de curto e médio prazo, acho que eles conseguem fazer isso. Mas no longo prazo, se o fundamento continuar a apontar para um Real mais forte, acho que eventualmente o Real pode se fortalecer. Mas até o fim do ano, pelo menos nos nossos modelos, estamos usando o Real a partir de R$ 2,00.