Investidores vão aumentar a exposição ao risco | A queda das taxa...

Edição 67

Marcelo Serfaty, do Pactual

O diretor executivo do Pactual, responsável pela área de asset management, Marcelo Serfaty, está apostando que os investidores estão numa trajetória rumo a aplicações menos conservadoras. Com a queda da taxa de juros, o investidor tende a buscar aplicações que possam oferecer uma rentabilidade um pouco melhor, aumentando gradativamente sua exposição ao risco. “Não que eles vão tornar-se imediatamente agressivos. Eu diria que eles estão saindo de uma posição extremamente conservadora, que é o money market, na direção de uma posição mais moderada”, explica esse carioca de 38 anos, há 7 no Pactual.
Com a reformulação do banco no início deste ano, quando o seu criador e então presidente, Luiz Cezar Fernandes, deixou a instituição após um período turbulento de brigas internas e indefinições estratégicas, quatro jovens (os garotos, como Fernandez costumava nominá-los) assumiram os postos de comando. Um deles é Serfaty, que passou a ser o responsável pela área de gestão de recursos de terceiros e que promete recuperar o tempo perdido no período das brigas. A seguir, os principais trechos da sua entrevista:

IIO Pactual passou por um processo de reestruturação, com a saída do Luiz Cezar Fernandes. Como está o banco hoje?
Marcelo Serfaty – Nós tivemos um processo de transição de estratégia muito grande, onde rediscutimos todo o nosso futuro e tomamos a decisão de consolidar o nosso business como investment bank, dando uma ênfase muito forte em asset management. Nós adotamos uma postura muito mais agressiva na direção de capturar carteiras, e essa postura está sendo muito bem sucedida.

IIDefinitivamente, a idéia de tornar-se um banco de varejo foi abandonada?
MS – Resolvemos manter nosso foco como um banco de investimentos, buscando a liderança nos mercados nos quais já atuamos fortemente, mantendo uma área de trading ativa, um asset management que perseguirá um crescimento orgânico e uma linha de produtos especializados muito ampla – incluindo desde o corporate governance e os fundos money market, yield, high yield, hedge até os fundos mais agressivos, inclusive de equity.

IITudo isso sozinhos?
MS – O Pactual tem parcerias, e vamos continuar buscando novas parcerias. Temos uma parceria com a Electra Fleming para private equity, com a Canadá Life para previdência privada e seguro de vida, e várias parcerias com bancos para distribuição de nossos produtos. A nossa idéia é fazer parcerias em novos negócios onde haja complementaridade de expertise.

IIBancos e empresas de asset estão investindo fortemente na Internet como canal de vendas e distribuição de produtos. O Pactual também?
MS – Estamos colocando na Internet um site interativo do asset management, bastante diversificado, para acesso exclusivo dos nossos clientes atuais e clientes potenciais. O cliente vai ter acesso ao nosso research, vai ter acesso ao chat, vai interagir com nossos gestores, vai ter acesso à tecnologia de gestão de risco, vai ter acesso aos nossos produtos e vai poder transacionar direto on-line.

II Quanto o Pactual administra de recursos de terceiros, hoje?
MS – Temos R$ 3,5 bilhões sob gestão, desconsiderando os FACs, sendo 79% entre renda fixa e high yield e 21% em várias modalidades de produtos ligados ao mercado de ações, fazendo gestão ativa.

IITradicionalmente o Pactual tinha presença mais marcante na área de renda variável. Isso está mudando?
MS – Está mudando o perfil dos nossos clientes. Antigamente tínhamos um forte volume de recursos de investidores estrangeiros, mas isso foi reduzindo, até porque eles passaram a operar por si mesmos. Hoje, apenas 12% dos nossos recursos administrados são de investidores estrangeiros, enquanto aumentou a participação dos investidores institucionais, que são clientes com um perfil mais conservador, e de empresas, para as quais fazemos o cash management. Por isso aumentou também nossa concentração em renda fixa.

IIQual o perfil do investidor do Pactual, hoje?
MS – Eu diria que do total, desconsiderando os FACs, quase 35% são de institucionais, 25% de private, 6% da área corporate e 12% de estrangeiros. O restante são de parcerias.

II Essa busca da renda fixa é duradoura?
MS – Acho que os investidores vão começar a buscar rentabilidades mais elevadas, o que não significa que vão tornar-se agressivos. Eu diria que eles estão saindo de uma posição extremamente conservadora, que é o money market, na direção de uma posição moderada em relação ao risco.

IIDos fundos DI para que tipo de ativos?
MS – O investidor vai aumentar gradativamente sua exposição a risco, e o mercado terá produtos nessa linha. Vai haver um espectro de ativos de renda fixa com maior alongamento e rentabilidade crescente, uma retomada de emissões corporativas na dívida pública, para diferentes maturidades e diferentes riscos de crédito, além de uma recriação do mercado de conversíveis e do estímulo contínuo à bolsa, que hoje, a meu ver, é o ativo mais convidativo.

IIPorque você acha isso?
MS – A redução de taxas de juros real é de tal ordem e de tal rapidez que está provocando uma realocação gradativa dos investimentos na direção dos mercados de high yield e de equity por parte do investidor local, que é e continuará sendo comprador com a redução dos juros reais e da volatilidade no mercado de câmbio. Somado a isso, temos o investidor estrangeiro que começa a olhar o mercado brasileiro como um mercado mais atraente, uma vez que os preços relativos do Brasil estão muito baixos face aos outros emergentes da América Latina, incluindo aí o próprio México.

IIEle esqueceu das incertezas do Brasil?
MS – A incerteza maior em relação ao Brasil vinha do fato de ele estar no bloco do dólar. Mas como a economia americana está tendo uma performance excepcional, indicando que não deverá haver nenhum movimento mais abrupto que provoque um efeito de redução rápida da riqueza real e que afete os países dependentes de captação externa para fechamento de seus balanços de pagamentos, essa incerteza também está diminuindo.

II Porque eles escolheriam o Brasil e não outros países emergentes?
MS – Não é que escolheriam o Brasil, é porque hoje eles têm uma sub-exposição em Brasil que está sendo, gradativamente, reposicionada. Você tinha uma situação de baixas expectativas em relação ao país, que está evoluindo para uma situação neutra e que poderá melhorar ainda mais na medida em que você consiga reduzir a percepção do risco de captação externa do país. E isso já está ocorrendo, especialmente porque o déficit de ações correntes projetado para o ano que vem, da ordem de US$ 25 bilhões, é bastante menor do que o imaginado algum tempo atrás, do fluxo de investimento direto que já está acontecendo e da redução de juro real dentro da economia brasileira, que irá implicar numa retomada da atividade econômica com sensíveis melhoras na taxa de crescimento de lucros.

II Isso torna o Brasil mais atraente aos estrangeiros?
MS – Sim, sem dúvida. Num primeiro momento são os jogadores locais que estão dando sustentação ao mercado de capitais brasileiro, mas num segundo momento teremos os estrangeiros realocando seus investimentos para o Brasil. Um outro fato interessante é que, dado o dramático aumento da volatilidade do mercado americano nos últimos tempos, o equity risk premium nos Estados Unidos deve aumentar, e isso deve estimular realocações na direção da América Latina.

IINem o medo do bug do milênio afasta o investidor externo?
MS – Já houve uma retração do mercado devido à percepção de risco do bug do milênio, mas este risco está bastante minimizado e hoje os mercados operam com uma visão reduzida desse risco. Acho que o Brasil apresenta um risco bastante reduzido, no que se refere ao bug do milênio.

IIE o risco do aumento das taxas de juros nos Estados Unidos?
MS – A taxa de juros do mercado americado pode até subir um pouco, talvez os 25 pontos básicos que estão faltando para recomposição dos 75 pontos que caíram por causa do empossamento da liquidez lá, mas não há indicação de um movimento seqüencial de aumento de taxa de juros. Basicamente porque não existem pressões inflacionárias que justifiquem um movimento dessa natureza. Então, como não há uma alta contínua de taxa de juros e nem um movimento de alterações de moedas muito dramático, que poderia vir casado com ajuste diferencial de crescimentos ou ajustes contínuos de juros, está diminuindo o risco percebido em relação aos países emergentes.

II Isso beneficia também as empresas que estão lançando ADRs nos Estados Unidos. Qual sua percepção sobre esse mercado?
MS – Não há dúvidas de que o mercado de ADRs vai crescer para as grandes empresas brasileiras. O investidor está comprando ativos em dólar e tem a possibilidade de ter liquidez diretamente naquele mercado, além de se sentir protegido pelo fato de que existe obrigações de prestação de informações junto à SEC, que é o órgão regulador americano para o mercado de valores mobiliários.

IIMas isso não esvazia o mercado de capitais brasileiro?
MS – Seria de se esperar que o mercado brasileiro crescesse na direção de listagem de novas empresas, mas isso não está acontecendo. Ao contrário, o que está acontecendo são sucessivas recompras de ações e fechamentos de capital, por causa das reestruturações e chegada de novos controladores em empresas que foram privatizadas. Além disso, há um desestímulo ao mercado local, por causa dos diferenciais tributários como o pagamento de CPMF nas bolsas, e de ameaças de aumentar o Imposto de Renda sobre ganhos no mercado acionário, de 10% para até 20%, igualando com a renda fixa.

IIComo os investidores reagiriam se houvesse esse aumento do imposto de renda?
MS – Obviamente, isso seria intolerável, Seria uma cunha sobre um mercado já volátil, que nesse momento está apresentando alguma recuperação de liquidez, estando na casa do US$ 1 bilhão ao dia, o que é bastante razoável, mas que cairia novamente com um aumento do imposto de renda.

IIO mercado de capitais brasileiro vai ficar sempre nessa discussão de menos imposto ou mais impostos?
MS – Acredito que a saída para o mercado de capitais no Brasil está na criação de um mercado de previdência privada forte. Grande parte da expansão do mercado de capitais americano durante a última década pode ser explicado pelo crescimento do mercado de previdência privada daquele país. Acho que no Brasil teremos isso também, poderemos até ter uma combinação em que as grandes empresas brasileiras irão para o mercado de ADRs e novas empresas se incorporem ao mercado local, fortalecido pelo dinheiro da previdência privada. A liquidez do mercado local é importante inclusive para as empresas que estão no mercado de ADRs, pois os tomadores do mercado local poderão dar estabilidade à liquidez daquele mercado.

IIQual o cenário que você traça para a inflação, no próximo ano?
MS – Acho que você poderá ter alguma recuperação de margem em alguns setores, ou alguns sub-setores da economia, que ficaram sob pressão de dois choques complexos, o da desvalorização cambial e o da recuperação das tarifas e preços públicos, mas não vejo nenhuma indicação de qualquer forma de indexação ou descontrole inflacionário no curto e médio prazo. Acredito numa inflação na faixa de 7% a 8% para o ano que vem, que me parece um número perfeitamente tolerável para um país que está passando por movimentos de grande complexidade na reformulação de seu programa econômico, com a adoção de câmbio flexível e com a mudança de nível fiscal.

II E a queda da taxa de juros, é consistente?
MS – Sim, a redução da taxa de juros é consistente, porém ela tem limitações naturais. Como acredito que o juro real brasileiro não vá ficar abaixo de 10%, e a inflação fica entre 7% e 8%, teremos que ter uma taxa de juros no patamar de 17% a 18% ao ano, o que significa que nós estamos chegando num limite. Quer dizer, nosso espaço para quedas da taxa básica está diminuindo. A saída será o governo trabalhar de maneira mais inteligente a gestão da dívida interna, conseguindo um alongamento dos prazos.

IIVamos falar um pouco sobre um episódio ocorrido no ano passado, envolvendo o Pactual e a Celos, fundação de Santa Catarina, que rompeu um contrato com a Pactual e enviou cartas a outros fundos de pensão criticando a gestão dos recursos. Isso prejudicou a imagem da instituição?
MS – Eu sei pouco dessa estória, mas parece que o que houve foi uma mudança de equipe na Celos e as regras que a equipe anterior defendia para gestão do portfólio, que foram seguidas pelo Pactual, não eram as que a nova equipe queria. Mas aí não tem como retroagir parâmetros previamente definidos, e os resultados não foram os esperados pela nova equipe. Mas a própria Celos anuiu, depois, que estávamos corretos e se retratou do que foi falado. Para nós, esse assunto é morto e não gostaríamos de retomá-lo.

IIMas essa questão prejudicou a instituição?
MS – Não, absolutamente. Nós somos hoje líderes no mercado de institucionais, temos várias carteiras de grandes fundações, começando por Sistel, Eletrosul, Souza Cruz, Xerox, e Escelsos, entre outras. O tema está superado e não nos prejudicou.