Crônica de um CRIs inadimplido _ Alexandre Zakia Albert

Edição 366

Zakia,Alexandre(Cultinvest) 19jul 01(BrunaNishihata)Nos últimos meses, o mercado tem acompanhado uma discussão perigosa e com potencial destruidor, sustentada pela Vibra Energia sobre a possibilidade de afastar o pagamento dos aluguéis decorrentes de contrato atípico de locação celebrado com a Confidere para construção do seu imóvel sede no Rio Janeiro.
Fechado o contrato, a Confidere (locadora) cedeu os créditos para lastrear a emissão de certificados de recebíveis imobiliários, cujo objetivo era captar recursos para a construção do imóvel. No documento, ficou expressamente consignada a anuência da Vibra para uma operação de securitização dos recebíveis oriundos do contrato.
Vale dizer, o prédio atualmente ocupado pela Vibra teve sua construção financiada por milhares de investidores, estando os Certificados de Recebíveis Imobiliários (CRIs), atualmente, segundo informações de mercado, espalhados entre mais de mil pessoas físicas e cerca de três Fundos de Investimentos Imobiliários (FIIs), que passaram a experimentar o gosto amargo do calote, a partir da decisão unilateral da empresa de parar de pagar as prestações devidas.
A Vibra alega que arrematou o imóvel em leilão judicial e que, portanto, não estaria sujeita ao pagamento de aluguel do prédio que pertence à própria empresa, ignorando, sem qualquer constrangimento, a existência da operação de securitização que financiou a construção do imóvel que hoje ocupa. O recado é claro: deixará à própria sorte os investidores que confiaram na idoneidade e reputação da companhia.
Segundo o vice-presidente de Jurídico, Compliance e Relações Institucionais da Vibra, Henry Danyel Hadid, “os crizistas terão de executar as garantias. Como eles vão fazer isso é um problema deles. A Vibra não tem relação com os CRIs “. Hadid só não explicou porque a reputada agência de rating Fitch deu nota máxima de crédito à emissão (AAA) se a Vibra “não tem relação com os CRIs “. Certamente não foi pelo risco da desconhecida Confidere.
É importante salientar a importância dos atores dessa peça de ficção jurídica. De um lado, a Vibra, uma gigante do mercado de energia, líder do segmento de distribuição de combustíveis e lubrificantes, com receitas da ordem de R$ 163,5 bilhões e lucro líquido de R$ 5,47 bilhões, segundo informações publicadas no site Infomoney. De outro, o mercado de Certificados de Recibos Imobiliários, fonte que vem ganhando crescente relevância no financiamento imobiliário e cujas emissões chegaram a R$ 47,8 bilhões em 2023.
A pergunta que fica é: se uma gigante como a Vibra não honra estruturas de securitização de recebíveis, quem honrará? Como ficará a credibilidade desse mercado tão importante para o financiamento imobiliário?
É surpreendente que o Conselho da companhia, formado por profissionais renomados de mercado, tenha concordado com essa “aventura jurídica”, sem considerar adequadamente os impactos que isso certamente terá sobre a credibilidade do mercado de CRI e a reputação da empresa.
Além disso, cria-se um ambiente de insegurança jurídica sem precedentes. Afinal, se essa tese – leviana e carente de fundamentação – prosperar, podemos afirmar que um mercado em crescimento e de enorme potencial será exterminado.
Confiemos que o Tribunal Arbitral atue diligentemente e não permita que a Vibra logre êxito nessa iniciativa aventureira. Pelo bem do mercado de capitais brasileiro.

Alexandre Zakia Albert é presidente da Cult Invest, gestora especializada em crédito estruturado – O conteúdo dos artigos reflete estritamente as opiniões e pontos de vista de seus autores