Edição 195
WestLB perde com a crise do subprime e decide fechar sua área de gestão
de fundos no Brasil, transferindo para o português Besaf os produtos que
tinha em sua carteira
Passado um ano, a crise do subprime, quem diria, continua produzindo
vítimas. No Brasil, o mais recente impacto foi sentido pela asset do banco
estatal alemão WestLB. As atividades da gestora foram encerradas e os
fundos, que somavam R$ 390 milhões, estão sendo transferidos desde
meados de agosto para a BES Ativos Financeiros (Besaf), do português
Banco Espírito Santo. A primeira fase da transição foi concluída no dia 18,
quando a Besaf assumiu os fundos abertos do WestLB, depois de a
mudança ter sido aprovada em assembléia de cotistas. Faltam ser
transferidas as carteiras exclusivas, que demandam mais tempo porque
envolvem um processo de negociação com cada investidor institucional.
Essa segunda fase deve ser finalizada até o fim de setembro, segundo
informou a direção da Besaf. O WestLB do Brasil comunicou, em nota, que
vai se dedicar, a partir de agora, aos negócios com operações
estruturadas – carro-chefe da instituição que, em 2007, movimentou US$
12 bilhões com o segmento.
A ordem de encerrar as atividades de gestão de investimentos no Brasil
veio da matriz, em Düsseldorf, há cerca de quatro meses. Atolado em
títulos hipotecários americanos de alto risco, o WestLB tem pressa.
Acumulou um prejuízo de 1,601 bilhão de euros no ano passado, foi
socorrido pelos controladores (a terceira vez, aliás, nos últimos quatro
anos), mas precisa continuar dando seqüência a um profundo processo de
reestruturação. Vai ter de cortar na carne: estima-se que entre 1,3 e 1,5
mil funcionários serão demitidos até 2010, algo equivalente a 25% de sua
mão-de-obra. Os planos para tingir o balanço de azul englobam, inclusive,
a possibilidade de uma fusão, já cogitada com o Helaba, banco do Estado
de Hessen.
A subsidiária brasileira não escapou aos ajustes, nem mesmo tendo
passado incólume pela sangria que tomou conta do mercado financeiro
internacional com o estouro da bolha imobiliária (registrou, em 2007, lucro
líquido de R$ 43 milhões). O fechamento da asset causou também certa
surpresa porque as estratégias traçadas pelo banco apontavam, até
então, para uma outra direção, na qual o WestLB do Brasil aproveitaria a
baixa liquidez de mercado para crescer, especialmente na concessão de
crédito. O comando brasileiro procurava reiterar que a crise do subprime
não afetaria os negócios no País. Obviamente, o encerramento da
atividade de gestão de recursos não impede que a estratégia de reforço
das operações de empréstimo seja levada adiante. Therese Rabieh,
presidente do WestLB do Brasil, havia adiantado à Investidor Institucional
(edição 191) que ampliaria em 25% o limite de crédito por cliente. O braço
local recebeu, não à toa, um aporte de capital de R$ 157,2 milhões em
janeiro deste ano. Mas o fim da asset não deixa de ser um revés para a
instituição, que estudava, por exemplo, a possibilidade de aproveitar a
forte capacidade de geração de crédito do banco para estruturar fundos
de recebíveis e que também mostrava interesse no segmento private
equity. Além disso, o episódio levanta dúvidas sobre a real extensão do
rombo da matriz e os futuros desdobramentos dessa delicada situação.
Será que o pior já passou?
Em períodos de incerteza, é comum que se faça um retrospecto da
atuação da empresa e que, inevitavelmente, se reascendam rumores do
passado. Desde o fim de 2006, quando o banco decidiu mudar do Brasil
para Nova Iorque a área de tesouraria dedicada à América Latina, circulam
boatos de que o WestLB poderia se desfazer de seus negócios na
região. “A princípio, não faz sentido que um negócio de baixo risco e boa
rentabilidade seja extinto”, observa Alberto Borges Matias, da ABM
Consulting. Mas o especialista pondera, na seqüência, que embora os
mercados emergentes apresentem, atualmente, os melhores resultados
financeiros, os volumes ali operados são baixos em relação aos padrões
movimentados por instituições americanas e européias. “A América Latina
não faz parte da discussão estratégica de muitas matrizes, e a do WestLB
não foge à regra”, assinala ele, lembrando que o banco já deixou de
operar aqui em 2002, assim como outros estrangeiros que fugiram em
debandada do risco Brasil com a eleição de Lula. Segundo Matias, a matriz
exibe uma outra lógica de avaliação. “Eles (acionistas) devem se
questionar: ‘para que perder tempo com um negócio pequeno num
momento complexo como este, de reorganização?’ Por isso, e muitas
vezes por ímpeto, desistem de operar.”
O negócio de gestão de recursos, ademais, requer volume. “A taxa real
brasileira é a maior do mundo, mas para que isso mude é questão de
tempo, e os estrangeiros sabem disso”, explica Matias. A julgar pelos
números, a asset do WestLB ocupava posição de pouco destaque. No
ranking Top Asset de 2007, aparece na 67ª posição, com um total de R$
615 milhões sob gestão. Focada no atendimento a investidores
institucionais, principalmente clientes corporativos que já fazem parte da
plataforma corporate do banco, a gestora também vinha tentando, sem
sucesso, redirecionar seus esforços para trabalhar com o segmento de
pessoas físicas de alta renda. Buscaram atuar como uma espécie de
consultor financeiro (a começar pelos proprietários e executivos das
empresas de middle market clientes) e por meio de distribuidores, mas a
mudança de perfil parece que não vingou. De acordo com o mesmo Top
Asset, dos R$ 615 milhões de patrimônio, somente R$ 63,4 milhões
estavam alocados em fundos abertos.
Outra ponta – Se por um lado a crise das hipotecas americanas de alto
risco têm sacudido as estruturas de instituições financeiras de peso, por
outro tem apresentado boas oportunidades de negócio para os bancos
livres de contaminação. É caso da Besaf, que vai praticamente dobrar o
volume de ativos sob gestão, hoje de R$ 458,3 milhões, assim que
concluída a transferência das carteiras do WestLB do Brasil. “O negócio
com o WestLB se mostrou uma chance de crescimento rápido”, afirma
Martim Amaral Neto, diretor executivo da Besaf. “Conciliamos ciclos
opostos: nós, reforçando a área de gestão, e eles, encerrando.”
Em meio ao processo de transição dos fundos do WestLB, a Besaf acaba
de ganhar um impulso extra para acelerar o ritmo de expansão das
atividades no Brasil: a Espírito Santo Activos Financeiros (Esaf), holding do
grupo BES, adquiriu 50% do controle da asset brasileira – outra metade
pertence à BES Investimento do Brasil, empresa do grupo que conta com
20% de participação do Bradesco. “Vamos aprimorar nossas metodologias
e ferramentas de trabalho e distribuir, lá fora, os fundos daqui”, conta
Amaral Neto. Por conta disso, todas as projeções do business plan estão
sendo revistas – para cima, claro. A expectativa inicial era chegar ao fim
do ano com R$ 1 bilhão sob gestão e, até 2012, com de R$ 4,5 bilhões de
patrimônio.
Apesar de as raízes da Besaf estarem fincadas em terreno institucional, à
semelhança do WestLB a instituição portuguesa tenta conquistar o varejo
de alta renda, estratégia que vem sendo desenvolvida desde o fim do ano
passado com a vinda de Amaral Neto. O consultor Alberto Borges Matias
acredita que o fator cultural, muitas vezes subestimado, possa ser
relevante nessa aproximação da Besaf com o mercado local. “Cliente é
relacionamento, e as semelhanças de língua e costume ajudam a
conquistar espaço, além da presença do Bradesco, claro”, destaca ele. A
Besaf recebeu sete fundos abertos do WestLB que serão fundidos e se
transformarão em três. Eles se somarão aos outros seis já existentes na
Besaf – dois multimercados, um long/short, dois off-shores e um fundo
de crédito privado de R$ 55 milhões, lançado há menos de dois meses. A
asset conta, atualmente, com uma rede de 15 distribuidores.
A ampliação da presença no segmento de fundos abertos por meio de
private bankings e family offices não significa, porém, uma mudança de
rota da Besaf. A idéia é atender aos dois nichos, só que com uma aposta
em produtos mais sofisticados. Está para sair do forno, nos próximos
meses, um fundo imobiliário de R$ 200 milhões, mas Amaral Neto não
pode revelar detalhes por conta de restrições impostas pela Comissão de
Valores Mobiliários (CVM). O executivo sabe que os fundos de pensão
estão cada vez mais dispostos a apimentar suas carteiras em troca de
uma boa rentabilidade e pretende explorar esse potencial. A Resolução
3.456 já avançou, nesse sentido, permitindo, por exemplo, que as
entidades fechadas de previdência complementar invistam até 3% do
patrimônio em multimercados agressivos. “O que pretendemos é oferecer
produtos diferenciados em termos de risco, que agreguem valor”, ressalta
Amaral Neto. A Besaf tem hoje, na grade, seis fundos exclusivos.