Apetite por gestão ativa

Edição 380

“Os investidores institucionais brasileiros começaram 2025 “sentados” sobre suas posições estruturais de renda fixa, mas nos últimos três meses passaram a buscar gestões mais ativas”, diz Marcelo Mello, da SulAmérica Investimentos

Nos últimos três meses a SulAmérica Investimentos ganhou entre cinco e seis novos mandatos para fundos exclusivos de renda fixa com risco de crédito high grade, moedas, juro real, juro nominal e arbitragem de juros. O movimento é resultado de uma maior clareza em relação ao fim do ciclo de juros altos, que tem levado os fundos de pensão a terceirizar mandatos de renda fixa ativa em busca de capturar o dinamismo dos mercados. “Antes dessa certeza, suas posições eram mais estruturais. Há dois ou três meses, porém, o movimento de apreciação passou a ter maior chance de acontecer graças à visibilidade do ciclo de corte do juro”, diz o CEO da SulAmérica Vida, Previdência e Investimentos, Marcelo Mello.

Segundo ele, os investidores institucionais brasileiros começaram 2025 “sentados” sobre suas posições estruturais de renda fixa, mas nos últimos três meses passaram a buscar gestões mais ativas, analisa Mello. “No primeiro trimestre do ano, a inflação nos EUA mostrou resiliência em patamar elevado, enquanto aqui não havia sequer projeção de afrouxamento para 2025”, relembra. A partir do momento em que o mercado antecipou a queda da Selic para o início de 2026, e passou a projetar três ou quatro quedas do juro americano, a visão ficou mais positiva, observa o gestor. “Aqui, a inflação mais comportada e o real indo bem frente ao dólar ajudaram”, analisa Mello.

Segundo ele, a demanda por fundos exclusivos aumentou com o novo cenário. Ele avalia que os investidores estavam corretos em suas posições anteriores, de busca por títulos públicos, assim como estão corretos agora na busca de pré-fixados e títulos indexados à inflação, uma vez que o afrouxamento monetário foi antecipado. “Agora os institucionais estão olhando não só para o risco de crédito, mas também para o risco de mercado na renda fixa.

“Sempre que há maior visibilidade sobre o início de um ciclo de afrouxamento do juro, o investidor quer capturar um pedaço dessa valorização por meio da criação de mais fundos ou de ajustes nos fundos que já existem”, explica.

Segundo ele, a perspectiva para as fundações ainda não é de voltar a investir muito em bolsa, o que deverá acontecer apenas em 2027. No pano de fundo do mercado, lembra o gestor, estão as dúvidas sobre a ortodoxia fiscal, o cenário eleitoral e o juro real ainda elevado. “Para o investidor local, 2026 será mais um ano de renda fixa, enquanto para o investidor “gringo” pode ser interessante alocar na bolsa brasileira”, diz.

Com R$ 1,4 bilhão em fundos de infraestrutura não listados, a casa decidiu encaminhar uma primeira oferta pública de fundo de infraestrutura listado na B3. “Estamos em período de road show. Vai ser o nosso primeiro fundo listado desse setor e será voltado para o público em geral”, informa Mello.

Exclusivos para estrangeiros – O cenário difícil para a indústria de investimentos, com resgates que deixaram a maioria dos fundos (à exceção do crédito privado) em situação de não poderem mais perder mais dinheiro, gerou uma visão curto-prazista para a bolsa, observa João Luiz Braga, sócio-fundador e CFA da Encore Asset Management, casa focada em fundos de ações.

“Mas essa é uma dicotomia, pois há motivos muito fortes para olhar o longo prazo. Estamos num dos melhores momentos para comprar e ninguém mais tem bolsa, uma vez que o grande comprador marginal, nos últimos cinco anos, foram as próprias empresas”, diz.

Além disso, ele lembra que a bolsa brasileira ainda está extremamente barata e o P/L negociado atualmente está a mais de um desvio padrão abaixo da média. “Está tão barata quanto no pior momento da Covid, por exemplo”, ilustra.

Para o investidor estrangeiro, que representa 80% dos clientes da asset, a perspectiva de redução da Selic é fundamental. “O estrangeiro foge de países em que o juro está subindo e gosta daqueles em que as taxas estão para cair. No Brasil, a Selic parou agora de subir, no seu ponto mais alto em 19 anos. Se vai começar a ser reduzida em março ou abril do próximo ano, isso não importa para esse investidor, que olha de dois a três anos para a frente”, explica Braga.

Outro motivo para voltar às bolsas, segundo ele, é o ambiente do mercado global. Ele explica que houve uma forte concentração em investimentos nos EUA ao longo dos últimos 17 anos. O cenário para investir em empresas dos EUA foi muito bom durante esse tempo, como ocorreu por exemplo com a Apple Store, criada quando o juro real estava zerado e o governo Trump, em seu primeiro mandato, reduziu a regulação.

“O alocador passou a olhar só para lá, o que criou uma imagem de que a bolsa nos EUA é sempre uma boa opção, levando à concentração. Hoje todo mundo está comprado naquele mercado mas em 2025 já vemos uma mudança na economia dos EUA, que está freando”, avalia Braga.

Há pontos diferentes a serem considerados em relação à narrativa do “excepcionalismo americano”, mas para o investidor isso não faz diferença. Este ano, o mercado descobriu que há aspectos em que as empresas dos EUA não estão tão à frente e já olha por exemplo para a DeepSeek, companhia chinesa de inteligência artificial que ganhou destaque ao competir com as americanas como a Meta e a OpenAI.

Incerteza com Trump – “Além disso, o governo Trump hoje adiciona incerteza maior à economia e há o agravante do dólar enfraquecido, então talvez tenhamos chegado ao segundo ponto, aquele em que o investidor começa a pensar sobre o que há mais no mundo além dos EUA”, diz Braga.

Mesmo um pequeno fluxo de recursos que migre de lá para o nosso mercado já pode fazer muito preço. “Não há um motivo de alta para a bolsa local, mas sim um momento global em que todos os emergentes subiram e os estrangeiros começam a jogar mais dinheiro nesses mercados”, afirma.

Os fundos exclusivos da asset se propõem a ser veículos de investimento dos recursos de estrangeiros no Brasil, “que estão muito alinhados à ideia de olhar para prazos de três, quatro ou cinco anos”, diz Braga.

A casa começou a perceber a melhora nesse apetite entre novembro e dezembro de 2024, o que se intensificou a partir de fevereiro deste ano. “No momento eles estão “de lado”, mas assim mesmo é melhor do que antes”.

Hoje a equipe monitora de perto o risco de recessão nos EUA. “Se eles estiverem muito mal, o dinheiro volta para lá porque o investidor liga o “modo defesa”, então o ideal é um cenário intermediário, uma “sopinha morna” na economia americana”, explica.

A carteira atual está balanceada entre posições mais agressivas e outras mais defensivas, com utilities (elétrico, saneamento e shoppings) e empresas previsíveis, aquelas consideradas as “NTN-B da bolsa”. Mas há também posições específicas como a rede Smart Fit de academias, algumas no setor financeiro e um pouco de varejo.

Por Segmentos (arquivo em pdf)