Edição 226
José Maria Rabelo, titular da Previc
Garantir um ambiente favorável ao crescimento do sistema, incentivar o desenvolvimento de programas de educação financeira e previdenciária e avançar na adoção da Supervisão Baseada em Risco (SBR) estão entre as prioridades da Superintendência Nacional de Previdência Complementar (Previc). Os pontos foram elencados pelo novo diretor superintendente da autarquia especial, José Maria Rabelo, em entrevista exclusiva a Investidor Institucional. De cara, é possível notar que o discurso dele vai em linha com o que já vinha sendo colocado em prática na gestão anterior da Previc, o que indica que não deve haver rupturas no caminho percorrido até então pela autarquia, mas sim continuidade. “Não há dúvida de que a previdência complementar fechada está fortalecida e consolidada, porém ainda há muito a fazer”, diz o diretor superintendente.Rabelo vem do Banco do Brasil, instituição em que atuou como vice- presidente de Negócios Internacionais e Atacado, diretor de Comércio Exterior, gerente geral da Unidade de Reestruturação de Ativos Operacionais, superintendente executivo da Unidade de Negócios de Crédito, entre outras atribuições. Ele também desempenhou o papel de conselheiro e presidente de conselhos de entidades e empresas como Previ, Brasilprev, Sebrae e Ativos S/A.Na entrevista, ele revela que a Previc deve lançar quatro guias de boas práticas – de investimento, atuária, gerenciamento de riscos e governança. Rabelo conta ainda que, com a criação da Previc, o órgão passou a desempenhar funções administrativas que antes eram exercidas pelo Ministério da Previdência Social. “Essa situação gerou a necessidade de treinamento dos servidores da extinta SPC, alocados na Diretoria de Administração, e responsáveis, por exemplo, pelas áreas de orçamento e finanças, patrimônio e logística”, detalha. Em relação ao estabelecimento de mandatos para a diretoria da autarquia, Rabelo prefere ser sucinto. “Esse é um tema sobre o qual não pretendo opinar, até para evitar qualquer interpretação de defesa de interesses particulares. Tenho conhecimento das discussões havidas no passado e acho natural que em um momento ou outro o assunto possa voltar à agenda. Imagino, porém, que o debate, caso ocorra, deva focar o futuro, e não gerar qualquer tipo de impacto que possa ser considerado um benefício para a diretoria atual. Pessoalmente, entendo que não dependemos de mandato para realizar o melhor trabalho”, defende. Leia, a seguir, a íntegra da entrevista.
Investidor Institucional – Quais as prioridades da Previc para este ano?
José Maria Rabelo – Não há dúvida de que a previdência complementar fechada está fortalecida e consolidada, porém ainda há muito a fazer. E uma das prioridades que temos para este ano é investir no crescimento do sistema, no fomento. Esta é uma atividade contínua à qual a Previc pretende dar maior atenção, não só na busca de novos patrocinadores, como investindo na previdência associativa. Este é um desafio constante: manter e criar as condições para o contínuo avanço do setor, especialmente quando nos comparamos com as economias mais avançadas, cujo segmento de previdência complementar fechada se encontra em estágio de maior maturidade. Pretendemos, portanto, especialmente na Previc, investir na construção de um ambiente que favoreça a criação de novos planos e entidades, em clima de perfeito equilíbrio entre os principais atores do sistema. Nesse sentido, a educação financeira e previdenciária é fundamental para que esse crescimento se viabilize de maneira permanente e sustentável. É essencial desenvolver a consciência previdenciária nos jovens, incutindo-lhes a ideia de que é de suma importância o investimento no futuro, assim como na educação dos participantes e assistidos. Portanto, continuaremos estimulando as entidades fechadas de previdência complementar para o desenvolvimento de programas de educação para seus públicos. Um terceiro ponto de nossa pauta de trabalho consiste na adoção de novas técnicas de gestão, como, por exemplo, a Supervisão Baseada em Risco (SBR). Tendo tudo isso em mente, minha prioridade-síntese é a busca insaciável e equilibrada da eficiência na condução interna dos processos na Previc.
II – Por falar em Supervisão Baseada em Risco, como está o processo de implementação do modelo brasileiro?
JMR – A Previc vem, de forma segura e gradual, com planejamento e sem sobressaltos ou rupturas, implantando o modelo de supervisão baseada em risco. Pode-se destacar dentre essas ações a implantação do PAF – Programa Anual de Fiscalização, que utiliza, como metodologia, indicadores de risco. Algumas ações fiscais previstas para este ano já utilizarão a metodologia. Cabe ressaltar que se trata de um processo contínuo, cuja sedimentação de princípios leva tempo. Não é adequado mudar repentinamente uma cultura formada ao longo de décadas. Um erro na calibragem dos modelos e mesmo na velocidade de implantação pode custar caro ao setor. Temos a consciência disso, e vamos agir com os devidos cuidados, sem abrirmos mão dos avanços, vendo a experiência de outros países, mas sabendo que a adaptação para o Brasil, via “tropicalização” das metodologias, é algo crítico, que merece atenção constante.
II – Em relação à operacionalização da Previc, já podemos considerar que está tudo funcionando?
JMR – Sim. A Previc, claro, está funcionando, exercendo suas atividades de órgão supervisor e fiscalizador das entidades fechadas de previdência complementar e de execução das políticas para o regime de previdência complementar operados por essas entidades. Criada há pouco mais de um ano, a Previc tem mantido em operação todas suas áreas, coordenadorias e assessorias. Seu processo decisório segue em curso, sem qualquer interrupção. Ressalte-se, ainda, o fato de a autarquia ter suas atribuições e realizações, graças ao Acordo de Gestão e Desempenho firmado com o Ministério da Previdência Social, acompanhadas, por indicadores de resultados, na sua gestão pública para atendimento às demandas da sociedade.
II – Mas existe, ainda, algo a ser realizado – no que se refere a novos servidores ou departamentos a serem estruturados?
JMR – De acordo com o Decreto nº 7.075, de 2010, a Previc é dirigida por uma Diretoria Colegiada, composta pelo Diretor Superintendente e quatro Diretorias: Diretoria de Análise Técnica; Diretoria de Fiscalização; Diretoria de Assuntos Atuariais, Contábeis e Econômicos; e Diretoria de Administração. A autarquia possui, em sua estrutura, uma Procuradoria Federal (PF), ouvidoria, corregedoria e auditoria interna, e não há intenção concreta de se alterar essa estrutura, com a criação de mais departamentos. A capacitação é um processo relevante para o aprimoramento dos servidores da Previc, tendo em vista a complexidade do tema previdência complementar, que abrange desde aspectos contábeis, atuariais e jurídicos, até operações financeiras no mercado de derivativos, e questões relativas à governança e controles internos das EFPC. Com a criação da Previc, o órgão passou a desempenhar funções administrativas que antes eram exercidas pelo Ministério da Previdência Social. Essa situação gerou a necessidade de treinamento dos servidores da extinta SPC (Secretaria de Previdência Complementar), alocados na Diretoria de Administração, e responsáveis, por exemplo, pelas áreas de orçamento e finanças, patrimônio e logística. A Previc tem apenas um ano de existência. Portanto, sua fase de estruturação, no campo administrativo, ainda está em andamento e é, sem dúvida, uma prioridade. Transparência nas ações e diálogo com os atores do sistema continuarão pautando as ações da Previc, sempre primando, na forma da lei, pela proteção dos direitos dos participantes e assistidos.
II – O senhor já teve a oportunidade de estar em contato com agentes do sistema?
JMR – Sim, já estive em contato com diversos atores do sistema, como os patrocinadores, participantes, assistidos e instituidores. O resultado inicial desse contato é que concordamos que um esforço suplementar deve ser feito para incrementar o fomento, criando-se mais planos e mais entidades. Ou seja, o sistema precisa e pode crescer, devendo haver um equilíbrio por parte de todos os envolvidos. Também achamos que precisamos formar uma cultura de reservas, criando entrantes no mercado, pois é necessário acumular reservas. Por isso a educação financeira é importante.
II – E quais são as perspectivas de crescimento do sistema brasileiro de fundos de pensão?
JMR – Os números do sistema e sua evolução de 2002 a 2010, a partir da prioridade do governo e da sociedade para aumentar a capacidade de fiscalização, modernizar a legislação e fomentar a previdência complementar no Brasil, revelam um quadro absolutamente promissor [entre 2002 e 2010, o número de entidades passou de 319 para 372, com crescimento de 17%; a quantidade de planos avançou 48%, de 748 para 1.107; o número de patrocinadores evoluiu de 1.560 para 2.250, com alta de 44%; e o volume de participantes aumentou 17%, de 2.340.663 para 2.742.319]. Além disso, temos a previdência associativa, que permitiu o ingresso de importantes segmentos na previdência complementar fechada e evidencia o potencial de crescimento que ainda há no setor. Para se ter uma ideia, em 2002 não havia nenhum instituidor nessa modalidade. De 2003 até 2010 foram criados 468 instituidores, em 180 planos de benefícios. Hoje, a previdência associativa conta com cerca de 200 mil participantes, entre ativos e dependentes, e com recursos garantidores que já se aproximam do primeiro bilhão de reais. Portanto, não há dúvidas de que o sistema de previdência complementar fechada brasileiro está maduro e, apesar de ainda haver grandes desafios, caminha para o crescimento permanente e sustentável.
II – A Previc editou no ano passado um código de boas práticas e estava prevista a publicação de outros documentos nesse sentido para este ano. Isso deve acontecer de fato?
JMR – Sim, já se encontram em elaboração mais quatro guias de boas práticas: investimento, atuária, gerenciamento de riscos e governança, em complemento ao guia já publicado.
II – Um ponto que vinha sendo levantado pelo próprio sistema na época de aprovação e implementação da Previc dizia respeito ao estabelecimento de mandatos para a diretoria da autarquia. Alguma iniciativa nesse sentido está sendo debatida?
JMR – Esse é um tema sobre o qual não pretendo opinar, até para evitar qualquer interpretação de defesa de interesses particulares. Tenho conhecimento das discussões havidas no passado e acho natural que em um momento ou outro o assunto possa voltar à agenda. Imagino, porém, que o debate, caso ocorra, deva focar o futuro, e não gerar qualquer tipo de impacto que possa ser considerado um “benefício” para a diretoria atual. Pessoalmente, entendo que não dependemos de mandato para realizar o melhor trabalho. A ausência dessa condição jamais poderia ser utilizada como desculpa para eventual ineficiência. Considero que tenho um “mandato” outorgado pelo Ministro Garibaldi Alves e pela Presidenta Dilma, enquanto ambos entenderem válida minha missão, e isso me basta plenamente.
II – Como o senhor recebeu a indicação de seu nome para o cargo de diretor superintendente da Previc?
JMR – Com alguma surpresa e muito orgulho. E também, claro, como mais uma missão a cumprir, nesses meus 35 anos trabalho muito próximo ao serviço público. Não pleiteei o cargo, o que seria absurdo, inclusive porque vinha percorrendo outra trilha profissional, mas o recebi com a disposição de quem pode e quer fazer algo em benefício do sistema, sem advogar interesses privativos de qualquer uma das suas partes, todas importantes. Equilíbrio é o que nos move. Sou grato ao gesto de confiança do Ministro Garibaldi Alves e da Presidente Dilma. Não tenho outra orientação que não seja fazer um trabalho decente e correto, compreendendo a importância do setor e respeitando os interesses e representações a ele inerentes. Acho que o sistema de previdência fechada está consolidado e robusto. Acredito que seu aparato legal precisa de poucos retoques e, no que me diz respeito, trabalharei para levar a bom termo as atribuições principais da Previc, que são a fiscalização e a supervisão, em articulação permanente com as atividades da Secretaria de Políticas de Previdência Complementar (SPPC).
II – De que forma sua experiência pode contribuir para o desempenho neste novo posto?
JMR – Acho que posso dizer que tenho algum conhecimento da área, por oportunidades que tive ao longo de minha vida profissional. Acredito que um de seus pontos fortes é seu arcabouço normativo e sua maturidade institucional, responsáveis por garantir a liquidez e a solvência dos fundos de pensão. Creio que minha vivência como gestor também poderá agregar algum valor para a Previc, desde que somada aos talentos, conhecimentos e experiências positivas já presentes na autarquia. Sou mais um na equipe, cujo valor me honra reconhecer, e não pretendo reinventar a roda. É bom lembrar que integramos uma diretoria colegiada, sem lugar para individualismo. Particularmente, não me dou o direito de agir por motivações pessoais, quando o assunto é trabalho. Como disse, nesse pouco tempo à frente da Previc já tive contato com importantes formadores de opinião do setor, como as representações de participantes, entidades e patrocinadoras, todos na linha dos desafios e esforços para o crescimento e fortalecimento do setor. Se estamos todos de acordo, resta- nos trabalhar para isso. Não escreveremos uma página importante dessa história se não o fizermos. De minha parte, não pretendo perder esta oportunidade.