Edição 360
A redução do patrimônio dos fundos de pensão e RPPS sob gestão externa ocorreu ao mesmo tempo em que aumentou o patrimônio das entidades abertas de previdência. “Os títulos públicos, sobretudo as NTN-Bs, passaram a ser comprados diretamente pelas entidades fechadas em maior volume, desde o momento em que suas taxas de juros subiram muito, no início deste ano. Além disso, os fundos de pensão saíram de fundos de investimentos mais agressivos, como alguns multimercados, para fazer caixa”, explica Guilherme Benites, sócio da consultoria Aditus.
Mas essa janela de compra está ficando menor hoje porque os fundos de pensão já compraram tanto que não podem mais fazer isso em volumes tão grandes”, diz. Nos estudos de ALM, a consultoria tem sido consultada por essas entidades sobre o possível espaço que ainda lhes resta para comprar mais títulos. “É uma questão de adequação do duration mas também do próprio espaço nas carteiras, porque eles chegaram perto do limite”, afirma.
Esse aumento das compras de títulos públicos e consequente queda do patrimônio sob gestão no mercado já ocorreu em períodos anteriores, lembra o consultor, mas em momentos muito específicos como a pandemia de Covid-19 e nos momentos críticos do governo Dilma Rousseff. “Isso não é bom para o mercado, porque a cada subida da taxa voltamos dez casas no caminho da diversificação”, aponta.
Outro fator que tem afetado o mercado como um todo – e não apenas os institucionais – é o “pé atrás” dos investidores com os fundos multimercados em geral, depois de sua performance sofrível este ano. “Esses fundos foram muito bem em 2022, mas este ano não só deixaram de surfar as tendências dos mercados como também fizeram operações de juros nos EUA que não deram muito certo, o que foi uma quebra grande de expectativas”, diz.
Gestão externa – O aumento da compra de títulos públicos vem como reflexo de muitos anos difíceis e, no caso da Vivest, veio acompanhado pela queda no volume de ativos sob gestão externa de renda variável. “Isso ocorreu desde os anos de 2012 a 2014, quando fizemos uma redução expressiva na renda variável, que nunca mais voltou à magnitude anterior, quando chegamos a ter 25% a 30% do patrimônio total alocado nessa classe”, conta Jorge Simino, diretor de Investimentos e Patrimônio.
Quando esses movimentos são feitos, ele observa que a entidade perde relevância junto aos gestores porque o patrimônio terceirizado fica muito pequeno. Os únicos aumentos de alocação em fundos de investimento ocorreram em multimercados estruturados, classe em que a fundação investe desde 2016, e em fundos de investimento imobiliário, há dois anos, ainda com pequeno volume, “inclusive para garantir a troca de informações com os gestores externos”, diz.
Os recursos da fundação aplicados em títulos públicos tem ficado relativamente constantes em torno de 55% do patrimônio. “Sempre as NTN-Bs mais curtas, para vencimento em 2028, 2030 e 2035, isso na parte atrelada à inflação. Há ainda um caminhão de caixa e cerca de 30% rodando no CDI”, conta. Em renda variável e imóveis, o percentual é de 10%.
A gestão terceirizada hoje atinge algo em torno de R$ 1,3 bilhão, ou 3,5% do patrimônio total de R$ 36 bilhões da entidade. Isso está concentrado em multimercados, renda variável e terceirizações pequenas, da ordem de R$ 60 milhões, nos dois fundos imobiliários exclusivos com as gestoras XP e Vinci..
“O nosso grande volume de terceirização era em exterior, que chegou a representar 14% do patrimônio total (entre cotas de fundos e também BDRs de ETFs) mas recuou para 1,5% hoje”, diz Simino.
Diversificação – Com R$ 18,3 bilhões de patrimônio em setembro, a fundação Real Grandeza ampliou a compra de títulos públicos desde 2021, com maior ênfase este ano, mas isso ocorreu em um contexto muito particular, explica Patrícia Queiroz, diretora de Investimentos. “Estávamos em meio a um processo de seleção de gestores que está sendo implementado em várias etapas. Ele começou pela renda variável passiva e o segundo passo foi o início da alocação em fundos multimercados, nos quais a fundação nunca havia investido”, observa.
A parcela de renda variável, que estava bastante concentrada em fundos passivos (ETFs de Ibovespa) foi reduzida para permitir a compra de mais títulos públicos. A compra direta desses papéis atingiu mais de R$ 4 bilhões desde 2021 no plano BD e R$ 850 milhões no plano CD. “Metade desses valores foi adquirida este ano, enquanto reduzíamos bolsa”, conta.
A gestão externa total, que somava R$ 3,3 bilhões em 2022, recuou para R$ 1,73 bilhão em setembro deste ano. Ao mesmo tempo, houve a entrada nos fundos multimercados. Hoje há 1% do patrimônio do plano BD aplicados em multimercados e 10% no caso do plano CD. A fundação estreou ainda sua aplicação em estratégias passivas de exterior, com os ETFs de S&P.
“Como resultado dessa mudança de modelo, aumentou a nossa diversificação em relação ao que havia antes, mesmo com a maior compra de títulos públicos”, diz Queiroz. A fundação segue com o processo e deve selecionar agora gestores para a renda variável ativa. Um aspecto essencial, diz a diretora “é que fazemos o processo de seleção dentro de casa, com filtros e métricas previstos em nosso Manual de Seleção de Gestores.”
Marcação na curva – A Resolução 4.963, de 2021, que trouxe mais clareza sobre a compra de títulos pelos RPPS, ajudou a mudar o panorama para que os regimes próprios façam esse tipo de alocação, observa Andreson de Oliveira, gerente geral de Investimentos do Reciprev, instituto de previdência do Recife.
“Já é possível fazer a marcação desses títulos na curva e suas taxas reais estão acima de 6%. Atualmente, 60% da carteira do Reciprev está comprado em NTN-Bs e 10% em LF (Letras Financeiras) também marcadas na curva”, informa Oliveira.
Essa posição garante o cumprimento da meta e não sofre volatilidade pelo fato de estar na curva, ou seja, reduz os custos de investimento. “Vários RPPS, principalmente os maiores, têm feito isso. Aqui nós já tínhamos um montante grande alocado em títulos em 2022, quando a maior parte deles foi comprada, num total de R$ 3,1 bilhões”, afirma.
O investimento em renda variável não sofreu uma redução drástica e a carteira mantém uma parcela de 20% do patrimônio alocada nessa classe. Há também 10% em renda fixa passiva, em fundos.
NTN-Bs – A Maringá Previdência, com patrimônio de R$ 790 milhões e 15.400 segurados, aumentou consideravelmente a compra de títulos públicos, que representam hoje perto de 70% do seu patrimônio. “Foram compradas NTN-Bs para vencimentos em 2032, 2040 e 2055, um movimento que começou a ser feito ainda em 2018 e se intensificou a partir do momento em que a taxa Selic passou a subir de maneira mais acentuada”, explica Maria Silvana Barbosa Frigo, diretora Previdenciária e Financeira.
Os cupons passaram a ser mais atrativos porque as taxas são altas. “Essa proporção será mantida na nossa política de investimentos para 2024, com uma estratégia alvo de 70% e limite superior em 80%. A intenção é discutir talvez como elevar um pouco essa margem, porque a bolsa ainda está muito volátil”, diz.
Enquanto a compra direta de títulos públicos pagar a meta atuarial e a volatilidade dos mercados estiver elevada, essa continuará a ser uma estratégia importante. “Nos últimos dias chegamos a comprar NTN-Bs para 2055 com taxa de 5,96% frente à nossa meta de 4,95%, com menor risco.
Atualmente, o instituto tem 69,75% em títulos públicos e 30% divididos entre fundos de renda fixa; ações; um fundo imobiliário e ações no exterior.
Parcerias – Até os meses de agosto e setembro o ano foi muito bom, em termos de captação, para o segmento de previdência aberta, observa Altair César de Jesus, superintendente de investimentos da Brasilprev. Com patrimônio de R$ 382 bilhões, dos quais a gestão externa representa apenas R$ 23 bilhões desde 2017/2018, a entidade quer aumentar esse patamar, diz Jesus.
“Quase todo o nosso AUM é gestão própria, lembrando que parte do passivo é da própria Brasilprev, mas a ideia é aumentar a parcela terceirizada porque queremos encontrar no mercado aquilo que não temos”, explica. Isso significa buscar produtos bons em casas boas, excluindo apenas casas com patrimônios muito pequeno.
“Este ano já tivemos captação líquida de R$ 6,4 bilhões, um resultado forte, além da própria rentabilidade dos ativos, principalmente de renda fixa, que tem sido muito boa embora tenha sofrido um pouco em setembro”, afirma.
A diversificação dos investimentos utiliza toda a estrutura de renda fixa no Brasil e algumas no exterior. Na renda variável o modelo é o mesmo e há fundos mais dedicados e outros de Ibovespa. “Diversificar é o mais importante. Hoje temos mais de 15 estratégias só em renda fixa e a intenção é criar vários fundos para que o cliente seja beneficiado por essa diversidade”, afirma Jesus.
Arquitetura aberta – O fim da pandemia, que veio de fato apenas em 2022, somado aos efeitos da regulação que flexibilizou a arquitetura de gestão dos investimentos das seguradoras, foram as alavancas para o crescimento desse segmento, avalia Victor Bernardes, diretor da área de vida e previdência na Sul América. “Antes da mudança regulatória, as butiques de investimento criticavam o fato de a Susep ser super restritiva e de as seguradoras só poderem fazer sua gestão dentro de casa”, diz. Como as alocações ficavam 95% concentradas em renda fixa, as entidades não eram consideradas importantes para os gestores.
Com a nova legislação (Resolução CMN 4444) isso mudou e hoje há uma infinidade de estratégias e produtos disponíveis, o que ajudou a tirar a imagem negativa de uma alocação super conservadora. “A alta da Selic gerou um fluxo grande para a renda fixa, mas ainda assim há estratégias de renda fixa que dão retornos além do CDI, o que aproxima mais a previdência do mundo”, afirma Bernardes.
Na Sul América, as gestoras externas respondem por aproximadamente 20% do AUM. A maior parte dos ativos, portanto, é investida com a bandeira da instituição, um ponto que os corretores aproveitam para vender a marca nas duas pontas. “Nós não somos um ”shopping de fundos” como outras seguradoras, não sobrepomos estratégias”, diz.
A carteira ainda é pequena- R$ 10 bilhões em ativos sob gestão entre VGBL e PGBL – mas tem tido captação acima da média do mercado, diz Bernardes. “Enquanto a captação dos VGBL no mercado cresceu 16% até julho, nós tivemos quase 18% em comparação ao mesmo período do ano passado”, observa.
O fator que pode trazer volatilidade expressiva ao mercado é a tributação dos fundos exclusivos. “Mas se isso avançar de fato, boa parte do volume aplicado nesses fundos deverá ter um endereçamento para a previdência, o que será um indicador relevante porque o total alocado em exclusivos hoje representa metade do mercado de previdência”, afirma.