Diversificação com juros | Mudança estrutural do patamar de juros...

O total de recursos sob gestão cresceu acima da variação da inflação entre os meses de junho de 2018 e junho de 2019, desempenho que reflete a evolução dos diferentes players frente à conjuntura agitada desse período. O total sob gestão atingiu R$ 4,59 trilhões em 30 de junho, representando crescimento de 5,3% em seis meses e de 11,75% em 12 meses, em grande parte impulsionado pela migração de investidores para fundos de ações, multimercados e carteiras de crédito privado, que renderam acima da inflação. Desde o segundo semestre do ano passado, houve uma reviravolta nas expectativas de mercado locais e internacionais, passando pela instabilidade do período pré-eleitoral no Brasil, acirramento da guerra comercial EUA x China, desaquecimento abrupto da economia global, inversão de sinais na política monetária dos EUA e Europa, além da redução acentuada dos juros domésticos.
Como consequência da baixa nos juros nominais e reais, ressurge aos poucos o apetite por risco dos investidores, em busca de um novo padrão de retornos a médio e longo prazos. O desafio para os gestores tem sido o de oferecer estratégias e produtos compatíveis com essa demanda e uma adequada relação risco/retorno, de maneira a agregar valor às carteiras.
Maior gestora do mercado, a BB DTVM alcançou em maio o patamar de R$ 1 trilhão em ativos, volume que bateu em R$ 1,051 trilhão no final de junho. Com a maior fatia desses recursos ainda concentrada na renda fixa – mais de R$ 600 bilhões, a asset ganhou novo alinhamento estratégico desde fevereiro de 2019 quando houve a troca de sua diretoria e adotou “uma pegada mais comercial” que tem influenciado os objetivos e o desempenho, segundo explica o diretor executivo Aroldo Salgado de Medeiros Filho, responsável pela área Comercial e de Produtos.
Essa aposta, que inclui uma gestão mais ativa, veio acompanhada do lançamento de 56 novos fundos este ano. Até setembro, a gestora lançou 37 novos multimercados com estratégias diversificadas, 12 fundos de renda fixa e quatro de ações, muitos deles voltados para os investidores do segmento de previdência aberta além de alguns fundos exclusivos. E há vários outros no pipeline, garante o diretor. “Por conta desse realinhamento, baseado também na qualificação dos times de profissionais e em ferramentas de TI, atingimos essa marca histórica para a indústria de gestão no Brasil, com 21% a 22% de market share apesar da concorrência fortíssima que tem sido feita pelas plataformas digitais de investimentos”, avalia Medeiros Filho.
O principal desafio no período de 12 meses, que aliás segue em vigor, foi obter uma combinação eficiente de avanços para atender às demandas dos investidores institucionais em ambiente de juros baixos, explica o diretor. “Isso significou fazer análise de mercado sob a ótica comercial de modo a desenvolver soluções específicas e segmentadas para os clientes; maior qualificação na gestão de ativos com o uso intensivo de novas ferramentas de TI e um time afinado de portfolio managers além de fortalecer a equipe de gestão de riscos”. Ele destaca ainda o esforço para aprimorar as análises de cenário macroeconômico, de crédito e, para o mercado acionário, a análise fundamentalista. “Montamos uma equipe robusta para fazer essas três vertentes de análise, o que nos deu o suporte necessário para o crescimento da gestão”. Na área de análise macro, há um analista especializado no ambiente internacional, avaliando a situação dos juros globais, guerra comercial e outros fatores.
Um movimento que contribuiu para o novo mix de alocação nesse período, observa o diretor da BB DTVM, foi o crescimento dos percentuais de recursos das entidades do RPPS aplicados no mercado de ações. “Isso não acontecia até há pouco tempo e agora já é uma tendência, uma demanda em parte provocada por nós como forma de estimular a diversificação”. O mesmo ocorreu no sistema de previdência aberta, por meio do trabalho conjunto entre a asset e a BrasilPrev, do conglomerado BB. Ao longo de todo o primeiro semestre deste ano houve uma grande quantidade de clientes finais dos fundos abertos interessados em migrar de fundos de renda fixa para fundos multimercados e fundos de ações, informa Medeiros Filho.

Olhar estrangeiro – “Os investidores repensaram a forma de alocação, passaram a buscar mais bolsa, crédito privado e outros ativos alternativos porque foi consolidado o consenso de que os juros continuarão a cair. A economia brasileira está muito fraca e há espaço para novos estímulos monetários sem pressionar a inflação, que não foi contaminada pelos movimentos cambiais”, avalia o CEO da Franklin Templeton no Brasil, Marcus Vinicius Gonçalves. Ações e crédito privado foram determinantes para os resultados da gestão no segundo semestre do ano passado e no primeiro semestre de 2019, sendo que os resultados dos investimentos em ações foram o grande destaque até 30 de junho, aponta Gonçalves. Ele observa que o principal vetor de expansão dos volumes nesse período pode ser creditado principalmente às alocações das EFPC em bolsa.
O movimento de revisão de investimentos foi alavancado pela conclusão de que a redução dos juros locais é estrutural, o que mudou inclusive a forma de análise dos resultados das empresas investidas. “Com juros menores, o fluxo de caixa descontado passou a melhorar os resultados das companhias e o mercado antecipou isso, favorecendo investimentos em ações”, explica Gonçalves.
A Frankling Templeton cresceu organicamente em volume sob gestão, não perdeu clientes e obteve novos aportes, incluindo dois novos e grandes mandatos de ações para investidores institucionais nesse período. “Somos um player importante em ações e há um contínuo trabalho para expandir carteiras, mas o mercado acionário precisa crescer mais no que diz respeito aos investimentos em ações no exterior”, diz o gestor. Ele informa que as maiores EFPC já se movimentam desde 2018 para discutir mandatos de exterior mais criativos, com “carteiras de soluções” que combinam uma asset alocation global de renda fixa e renda variável. A casa gestora está posicionada nesse segmento para os próximos três a cinco anos, informa Gonçalves.
Apesar do reflexo positivo dos juros, a fragilidade da economia brasileira ainda afeta a bolsa, que se ressente de uma perspectiva de crescimento econômico aquém do esperado. Como uma das principais gestoras estrangeiras no Brasil, a Franklin Templeton avalia os efeitos das reformas e de outros aspectos da pauta da área econômica do governo com um olhar positivo. “O Brasil é visto hoje como um dos “bright spots” para os investidores globais e a análise histórica das ações em dólar ajuda a perceber um cenário bom para novos avanços tanto em bolsa quanto em crédito privado”, pontua Gonçalves.
Ele lembra que já há veículos prontos e com históricos bem construídos nessas duas classes, o que vem ao encontro da demanda porque o investidor está preparado para ampliar alocação. No caso do crédito privado, a liquidez do mercado secundário está sendo construída, com soluções para melhorar a precificação e garantir a saída dos investimentos. “Essa infraestrutura dará ainda maior segurança ao investidor”, sublinha Gonçalves. A gestora tem trabalhado para inovar em ativos de empresas que usam tecnologia para aprimorar suas alocações de crédito no chamado mercado de Tech Credit. Emprestam dinheiro com base em algoritmos e utilizam ferramentas sofisticadas de Inteligência Artificial. “As empresas que compramos no exterior tem essa abordagem mais científica do crédito, esse é um diferencial importante. Bolsa no Brasil, alocação internacional e Tech Credit são os pilares em que a Franklin Templeton decidiu apostar como tendência para os próximos anos.

Exterior e inovação – A BB DTVM está investindo pesadamente no planejamento estratégico para alocação off-shore dos institucionais brasileiros, informa Medeiros Filho. “A meta é associar a nossa marca à solução em investimentos no exterior, até porque as EFPC terão que aumentar os percentuais em ativos globais, seja em renda fixa ou renda variável, para atingir seus objetivos atuariais, como já acontece há tempos em outros países’, acredita o diretor. Ele lembra que as fundações patrocinadas por empresas multinacionais estão na frente nessa modalidade de investimento e algumas delas inclusive já chegaram ao teto permitido pela regulação para aplicar no exterior.
Outro ponto de inflexão é a inovação, em busca dos retornos projetados pelas fintechs em todo o mundo. Para capturar esse potencial de mercado, a BB DTVM montou uma equipe de jovens profissionais para avaliar as possibilidades de inovação local e internacional, explorar o potencial de negócios no novo universo de tecnologias disruptivas. “Queremos saber quem será o investidor do futuro, conhecer a próxima geração de investidores”, diz Medeiros Filho. Ele e outros executivos da asset já estão, por sinal, de malas prontas para uma semana de imersão no Silicon Valley, na Califórnia, onde esperam conhecer “o coração das fintechs”.

Ajuste saudável – Responsável pelo quinta posição no ranking dos gestores independentes, a Verde Asset Management enquadra o primeiro semestre de 2019 sob a ótica de uma mudança na lógica de alocação de capital dos investidores institucionais. “Com o juro nominal e o real em novo patamar, decorrência de uma mudança estrutural, surgiu uma nova lógica de alocação de portfolios que é diversa daquela utilizada em ambiente de juros de dois dígitos”, diz o CFA da asset, Artur Wichmann.
Tem sido preciso expor as carteiras a um outro nível de risco e isso, diz Wichmann, leva a um ajuste saudável e a um processo de aprofundamento financeiro, foi o que começou a ocorrer no mercado de gestão de recursos nos últimos meses. “Haverá um novo tipo de portfolio e quanto maior o tempo pelo qual os juros permanecerem baixos, mais essa visão será fortalecida na cabeça dos investidores”. O processo de estabilização da economia já começou a afetar as decisões de diversificação de investimentos, o que tem sido visível, mas a mudança será gradual. “Faz sentido hoje que o institucional tenha um portfolio diversificado, pense mais em renda variável e exterior, comece a participar das boas histórias do capitalismo global, mas é essencial criar capacidade de análise para isso”, afirma Wichmann.

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