Edição 379

O acerto que ancorou a performance dos fundos de ações desde meados de 2024 foi a decisão de manter posições e não mudar muito as convicções da gestão, em especial durante os meses de novembro e dezembro, para capturar ganhos em 2025, ano de mercado bom, aponta Marcos Peixoto, gestor de renda variável da XP Asset.
A capacidade de evitar os exageros no final do ano ajudou os gestores dessa classe de fundos a atravessar um ponto de virada para o mercado, que agora testa pela primeira vez o patamar histórico de 144 mil pontos no Ibovespa.
“O principal acerto foi não termos mudado muito as nossas convicções, não termos embarcado no pessimismo do mercado naquele momento porque houve algum exagero. Havia empresas negociadas a IPCA mais 15% ou 20%, mas mantivemos a calma e as principais estratégias vencedoras este ano são as mesmas que estavam no nosso portfólio em 2024”, afirma.
A gestão é ligada a uma visão micro, o que permitiu notar que os preços estavam exagerados e não vender, diz Peixoto. “ O cenário macro refletia uma preocupação com a questão fiscal em 2024 e isso continua, mas o mercado é muito mais narrativa do que fatos porque na verdade o governo entregou a meta que tinha desde o início do ano”, observa o gestor.
Em 2025, com o dólar mais fraco e o excesso de concentração de investimentos nos EUA, “o mercado global olha para as confusões do governo Trump e seus ataques às instituições e se pergunta se faz sentido manter 90% dos recursos naquele país”, diz Peixoto. Esse ambiente levou a uma migração para a América Latina, ainda mais estimulada pelos preços baixos dos ativos aqui.
Atualmente as sinalizações do Fed indicam potenciais novas quedas dos juros nos EUA, o que foi uma expectativa não concretizada em 2024 mas deve acontecer agora. “O Fed deve iniciar novo ciclo de baixa e isso será um apoio importante para o BC aqui, já que estamos com a inflação bem sinalizada para baixo, o dólar fraco frente ao real e alguns preços de commodities caindo, o que reforça a perspectiva de queda da Selic”, afirma o gestor.
O portfólio de ações da asset está bem doméstico, sem exportadores porque não há nada do que a gestão goste nesse setor. “Tínhamos petróleo no começo do ano mas não temos mais porque os preços devem cair. Mineração e siderurgia estão no mesmo caso e não vemos qualquer mercado muito construtivo no momento, o outlook para commodities é mais negativo”, explica Peixoto. As exceções são os papéis da Suzano e da Minerva Foods, mas com posições pequenas.
“É um portfólio que deve ir bem no cenário de juro em queda. Além disso, apostamos em empresas mais defensivas e resilientes. Em utilities chegamos a ter 30% da carteira mas hoje temos 20%, o maior setor, seguido pelo de bancos, com 15%”, conta. Gostamos também do setor de educação, que ocupa 8% da carteira – a Cogna subiu mais de 180% este ano, mas mesmo assim reduzimos um pouco a nossa posição”, diz.
Construção Civil é outro setor relevante, com posição em projetos para baixa renda com taxas subsidiadas. “No início do ano, a preocupação do setor era com a inflação, mas não é isso o que estamos vendo agora porque os custos de matéria-prima estão caindo. Mesmo na Cyrella, há demanda forte pelos predutos, graças ao desemprego baixo”, observa.
Com a alocação em renda variável dos fundos de pensão brasileiros em sua mínima histórica, entre 10% e 15% dos seus ativos totais, a expectativa é de que esses investidores retomem o seu apetite pelo risco de bolsa e os resgates. “O investidor olha muito para o retrovisor, mas hoje o maior risco é o de perder oportunidades”, diz Luiz Sorge, sócio e head de estruturas na XP Asset.
Fundos de crédito privado de gestão ativa, fundos de special situations e fundos globais de renda variável estão entre as opções. “Quando olhamos para o juro nominal e real, fica difícil defender o risco, mas é importante para os institucionais ter uma carteira com alocações de médio e longo prazo e as políticas de investimento dos fundos de pensão, que começarão a ser discutidas em outubro, tendem a retomar o tema da diversificação”, acredita Sorge.

Excepcionalismo dos EUA – “A virada do ano passado para 2025 foi marcada pelo fim da hipótese do excepcionalismo americano, por conta da discussão sobre tarifas e o questionamento sobre o dólar como moeda reserva global, mas essa situação perdurou apenas até abril deste ano”, observa Frederico Monteiro, head de fundos offshore e alocação no exterior da BB Asset Management.
De abril para cá, essa hipótese voltou a ganhar força diante do teor altamente competitivo dos EUA, de sua capacidade de investimento, escalabilidade e produtividade. “A bolsa lá concentra esses elementos que são importantes para o investidor, a despeito dos ruídos que ainda persistem, então a nossa carteira de ativos globais investe também nos emergentes, mas sem abandonar os EUA”, explica o gestor.
Até porque a mais recente safra de resultados das companhias trouxe surpresas positivas para mais de dez delas, uma tendência que deve prosseguir daqui para a frente porque não há sinais de que aqueles elementos essenciais das empresas serão deletados no curto prazo”, segundo Monteiro.
Os resultados das empresas norte-americanas se impuseram até mesmo à discussão sobre o efeito das tarifas comerciais dos EUA. “Apesar da desvalorização do dólar, esses resultados têm nos permitido capturar retornos interessantes nas estratégias offshore, que ganharam maior importância”, explica Ricardo Fontes, head da área de fundos exclusivos e alocação da BB Asset.
Os produtos estão divididos em quatro áreas, uma das quais é a de offshore, que engloba a maioria dos fundos de ações excelentes em 12 meses. “A plataforma atua em vários segmentos, na renda fixa e na renda variável, além de um segmento para fundos exclusivos, (incluindo institucionais, empresas e pessoas físicas), com sete fundos no exterior, informa Fontes. São todos hedgeados, para explorar melhor a rentabilidade da classe.
“Na bolsa americana, procuramos explorar o mercado de forma ativa e a maior concentração das carteiras está em ativos ligados a empresas de tecnologia”, diz. A performance é o grande diferencial desses fundos uma vez que a gestão faz um combo de estratégias bottom up e top down, procurando bater o benchmark (S&P 500) por meio de um trabalho qualificado.
No investimento em bolsas globais, a análise e a estratégia adotadas não diferem muito do que é feito nos fundos de ações dos EUA, explica Fontes. “Fazemos um call macro na casa e em seguida cada time, cada gerência parte para definir suas estratégias, também na combinação das abordagens bottom up e top down”, detalha. Há também BDRs e ETFs emitidos no Brasil, assim como operação com os ativos da casa na Irlanda, por meio da Unit Trust Ireland, estrutura de acesso aos mercados internacionais.
A custódia fica na Irlanda, mas a gestão é feita pela equipe no Brasil. Hoje a alocação em bolsas globais é majoritariamente nos EUA, que concentra 60% a 75% dos investimentos, seguido pela Europa, mas o objetivo é também investir em emergentes. Há também um fundo específico que investe apenas em países desenvolvidos. Além da Irlanda, há estruturas em Luxemburgo e Cayman.
Com a atual indicação de desaceleração da economia americana, sem sinais de recessão e com o Fed cortando o juro, os investimentos em bolsa podem ganhar mais um vento a favor, acredita Frederico Monteiro. Um fator importante é que as empresas do setor de tecnologia costumam ser hiper escaláveis, ou seja, têm um custo marginal pequeno caso decidam produzir e vender mais.
O mercado europeu, que ficou muito tempo em baixa,voltou a oferecer boas alternativas este ano e o fundo que investe em Europa teve performance relevante, com destaque para os ativos das empresas do setor bélico, agora em alta por conta do difícil cenário geopolítico, lembra Monteiro.
Há mais de cem conflitos armados no mundo hoje, envolvendo Europa,Ásia e África, o que aumenta a necessidade de diversificar. “Esse ambiente está bem mais complexo do que era há 12 ou 24 meses e a tese para os próximos dois anos, pelo menos, é de que essa complexidade permaneça devido à independência cada vez maior do bloco europeu em relação aos EUA, que tem se afastado”,diz. À medida que os países europeus precisam se defender sozinhos, o seu lado fiscal fica mais frouxo e há maior estímulo para alguns setores.
Entre os fundos de melhor performance ele destaca a estratégia que investe em Ásia (exceto Japão). “As oportunidades em China, India,Coreia do Sul e Taiwan podem ser o grande atrativo para os investimentos que venham a deixar os EUA”, diz Monteiro. É uma alternativa de diversificação para quem quer investir em tecnologia mas considera os EUA muito caros, porque as bolsas asiáticas concentram muita tecnologia. “É uma maneira de investir no mainstream com preços mais baixos”, afirma.
A perspectiva nos EUA é de pouso suave, o que seria benéfico para as bolsas, mas é preciso acompanhar de perto os resultados das companhias, lembra Ricardo Fontes. “O investimento dessas empresas em IA também sinaliza um impacto positivo em sua produtividade”, diz.
Os institucionais brasileiros começam a utilizar a estrutura offshore da asset, embora o juro ainda provoque uma certa aversão ao risco. “No momento esse apetite não parece maior, mas os passos começam a ser dados e temos procurado também criar estruturas no exterior em mercados que tenham critérios ASG mais consolidados, o que é interessante para esse investidor”, afirma Fontes.

Dólar mais fraco e eleições – O enfraquecimento do dólar, consequência da guerra tarifária empreendida pelo governo Trump, deu o tom ao primeiro semestre deste ano para as estratégias de renda variável, avalia Welliam Wang, gestor de fundos de ações da AZQuest. “O primeiro semestre foi muito positivo para o mercado de ações local, graças principalmente ao ambiente externo porque as políticas do governo Trump enfraqueceram o dólar e beneficiaram o mundo como um todo”, diz.
Esse movimento teve forte correlação com o melhor desempenho dos mercados emergentes e veio aliado à alta dos preços das commodities, o que também favoreceu o Brasil, que é grande exportador desses produtos, analisa Wang.
Esses fatores contribuíram para fortalecer o desempenho das estratégias da gestora, que estava comprada em papéis de setores particularmente favorecidos pelo cenário, como o de construção civil. “Nesse setor, funcionaram bem o estímulo do governo ao programa Minha Casa, Minha Vida, assim como a forte demanda por imóveis nas grandes cidades”, afirma. Além disso, foram beneficiados os papéis de empresas ligadas aos setores de consumo/varejo e de utilities – em especial de energia elétrica e saneamento.
Neste segundo semestre e ao longo de 2026, diz Wang, o cenário de renda variável será pautado pelo ambiente eleitoral. As carteiras devem continuar a priorizar ativos dos mesmos setores, com o provável acréscimo das ações da Petrobras porque o mercado vê a possibilidade de privatização da companhia.
Ao longo dos próximos meses, a tendência externa é de que os EUA sigam refletindo a busca dos países por uma alternativa ao dólar, em especial a China, que já está definida como o principal adversário de Trump. “Embora não seja fácil encontrar um substituto para o dólar, a moeda americana deve continuar enfraquecida, agora também por conta da queda dos juros nos EUA”, diz Wang.
No Brasil, a gigantesca migração dos investidores institucionais para a renda fixa nos últimos anos, provocada pelas elevadas taxas de juros, tende a ser revertida gradualmente à medida que o prêmio embutido nas NTN-Bs começar a baixar. “A Selic dificilmente cairá este ano, o que só deve acontecer em 2026. A NTN-B a 7,5% precifica um problema de solvência do País ao longo do tempo, mas à medida que o prêmio de risco cair, é natural imaginar uma volta do investidor para o risco”, diz.
Nesse contexto, as ações tendem a ser as mais favorecidas entre os ativos de risco porque a bolsa está extremamente descontada e deve registrar a maior valorização caso o cenário eleitoral seja visto como mais positivo, acredita o gestor.
Melhores gestores em Ações (arquivo em pdf)