Ganhos em cenário difuso | Ritmo do Fed em relação à taxa básica ...

Edição 354

O ano de 2022 foi bastante favorável à indústria de crédito privado, que teve um nível histórico de emissões de debêntures e forte fluxo de entrada de recursos, favorecendo os gestores com atuação forte nessa classe, enfatiza Marcelo Pimentel Mello, CEO da Sul América Investimentos, Vida e Previdência. A casa, que tem um perfil ativo em papéis de crédito de primeira linha, tanto em operações no mercado primário quanto no secundário, explorou esse ambiente para gerar performance em seus fundos de renda fixa. “Ao mesmo tempo, fomos muito ativos em operações de juro real – NTN-Bs – e fizemos compra, venda e arbitragem em ambiente que foi se tornando cada vez mais desafiador ao longo do ano”, diz.
No segundo semestre, o ruído eleitoral entrou no radar do mercado e tornou as NTN-Bs mais voláteis, assim como os títulos prefixados. “Diante dessa mudança, passamos a fazer menos operações direcionais (juro real contra juro nominal) e mais operações de arbitragem”, explica.
Em 2023, o ano será bem desafiador para o crédito privado, acredita Mello. “Nos EUA, o mercado começa a perceber no início do ano que a política monetária será mais apertada do que se imaginava, por conta da inflação resistente, enquanto no Brasil o BC sinalizou que a taxa Selic não cairia tão cedo e há preocupação com a questão fiscal, o que levou os ativos a ficarem estressados”. No meio dessa incerteza, surgiram aqui os eventos de Americanas, Light, Marisa e CVC, eventos que deixaram o investidor mais arredio. “Mesmo os ativos que não têm problemas, começam a ser reprecificados, o que já está gerando um problema de fluxo na indústria de crédito”, diz.
A asset mantém sua prioridade para os papéis de primeira linha mas está reduzindo o prazo médio dos portfólios ao mesmo tempo em que aumenta o percentual de caixa. Em Americanas havia um percentual de 0,02% do patrimônio líquido de alguns fundos, e zero alocação nas demais empresas que protagonizaram eventos de crédito este ano. “O valor de Americanas era pequeno e o impacto foi amenizado pela boa performance dos fundos, mas estamos representando os investidores em seus direitos na negociação com a companhia”, conta.
Os reflexos da política monetária muito apertada aqui e no mundo são os responsáveis pelos problemas na indústria de crédito, avalia o gestor. “As empresas de crescimento mais acelerado e que mais precisam de financiamento são as mais impactadas e o primeiro semestre ainda será desafiador para o crédito privado. Por outro lado, a reprecificação dos ativos já levou uma cesta de debêntures de primeira linha a elevar o prêmio de risco (spread), que era de CDI mais 1,60% ou 1,70% no ano passado para CDI mais 2,60% hoje, ou seja, um ajuste de 100 basis points, o que deixa o carrego desses papéis muito positivo”, afirma. Nesse cenário, a reprecificação começará a abrir oportunidades e em algum momento a asset deverá aproveitá-las para comprar debêntures de primeira linha, provavelmente entre o final do primeiro semestre e o começo do segundo.

Na asset do BNP Paribas, o carregamento de títulos privados nas carteiras de renda fixa foi o fator que mais agregou ao desempenho desses fundos no ano passado, explica Gilberto Kfouri, CIO da casa no Brasil. O FIC de crédito institucional, por exemplo, que aloca 80% de seus recursos em crédito privado, tanto em ativos corporativos (debêntures) como em títulos bancários, foi migrando entre esses dois tipos de ativos ao longo do ano, mas a exposição já está maior em papéis do setor bancário. “De dois anos para cá, reduzimos a participação de debêntures e fizemos compras de modo mais seletivo no crédito corporativo sempre que víamos um prêmio bom em relação ao prazo, enquanto aumentávamos o percentual de títulos financeiros”, conta. Entre os fundos excelentes, há um fundo que combina papéis públicos a um percentual menor de crédito (35% a 40%) enquanto outra carteira aplica cerca de 80% em crédito (LF e CDB) e os 20% restantes em títulos públicos. Apenas um dos fundos desse ranking é voltado exclusivamente a títulos públicos, sem carregar risco de crédito.
A asset vendeu algumas debêntures incentivadas em meados do ano. “Decidimos que seria melhor não carregar alguns papéis”, diz. Este ano, a gestão segue mais focada em ativos financeiros do que corporativos. “Os papéis bancários são de mais curto prazo e não vemos grandes preocupações com o setor, até porque os bancos estão bem capitalizados. No crédito corporativo, já houve um aumento de até 60 pontos base nos prêmios, mas também não vemos grandes riscos”, diz.
Os prêmios aumentaram este ano porque o mercado elevou a percepção de risco de modo geral mas as últimas indicações são de que esse movimento começou a estabilizar e chegou a um ponto de equilíbrio, avalia Kfouri. A casa tinha zero alocação em Americanas ou Light. “Tínhamos pequenas posições de Light no FIDC mas já vendemos. Não sofremos com esses casos a não ser pelo efeito que eles produziram sobre o mercado em geral”, explica. A tendência em 2023 é manter o percentual de crédito privado nas carteiras ou até mesmo aumentar um pouco essa parcela à medida que os prêmios se estabilizarem.

Na base da performance dos fundos de renda fixa/crédito privado da Western Asset Management está uma análise fundamentalista dos papéis que inclui a avaliação quantitativa dos balanços de empresas e a pesquisa qualitativa, “fatiada em diferentes camadas”, o que permite produzir um rating próprio que se compõe com o rating financeiro dos ativos, explica Adriano Casarotto, gestor de portfólio. A diversificação das carteiras é assegurada por um portfólio médio que pode ter entre 100 e 120 ativos e entre 80 e 100 emissores. Dos R$ 40 bilhões sob gestão, a asset tem R$ 10 bilhões em crédito, incluindo R$ 1 bilhão em FIDCs.
“O direcionador do ano de 2022 foi o mercado de debêntures e a nossa alocação de crédito aplica, em geral, 70% dos recursos em debêntures. O restante é dividido entre 15% para Letras Financeiras (LF) e 15% em FIDCs (Fundos de Investimento em Direitos Creditórios”, detalha. O fechamento dos spreads veio junto com maior rentabilidade e mais juros, mas o que diferenciou e ajudou as carteiras foi mesmo a redução dos spreads. No último trimestre do ano os spreads tinham fechado a ponto de haver operações perto de 1,20%, ao mesmo tempo em que o mercado high grade também fechava spreads nos EUA, criando assim uma referência internacional.
O ano de 2022 foi marcado também por um número recorde de emissões, chegando a R$ 271 bilhões, o maior da série histórica da Anbima. “Em 2023 esse número deve cair bastante porque houve muita antecipação de emissões pelas empresas no ano passado, por conta da expectativa de um ano eleitoral, e também como resultado dos eventos Americanas e Light”, diz. O spread já aumentou e está acima de 2% nos títulos triple A de cinco anos.
A redução das emissões este ano já estava encomendada, mas deverá ser acentuada pelo episódio Americanas. “Houve uma histeria inicial do mercado, em janeiro, e quando isso começou a acalmar veio o caso da Light, em fevereiro”, lembra. Nos fundos de crédito, há hoje mais vendas e maiores spreads, situação que deverá perdurar por algum tempo, avalia o gestor.

A despeito do ambiente de alta volatilidade, o ano foi ótimo para a rentabilidade do crédito privado, com companhias mais líquidas e pouco alavancadas, bons spreads e bons retornos absolutos, diz Luiz Sedrani, diretor de investimentos da BV Asset Management. Mas já havia um processo de deterioração em curso, com ajuste na situação de crédito das pessoas físicas e das pequenas empresas. “2022 foi o ano da renda fixa, mas lá fora todos sofreram pela alta da taxa de juros nos EUA e na Europa e o custo do dinheiro aumentou para todos, exceto no Japão. Estamos vivendo hoje talvez o final desse período de ajuste monetário e isso traz reprecificação e turbulência”, avalia.
Os três fundos de crédito da asset, que são mais focados no perfil de risco high grade, operam na busca por oportunidades no mercado secundário e a gestão alongou o duration das carteiras, promoveu a diversificação setorial e por emissores. Ao todo, a casa tem sob gestão R$ 10 bilhões em fundos que têm crédito em seus portfólios. “A captação foi boa em 2022 e acelerou em plataformas, no segmento de institucionais e de empresas. Este ano ela sofre um pouco mais e os papéis de bancos, que foram bem, continuam a ser os mais seguros”, acredita Sedrani.
Com a aceleração dos saques no novo mundo de crédito pós-Americanas e Light, o trabalho é para elevar a liquidez dos fundos na medida do possível e fazer ajustes nas carteiras em papéis que faça mais sentido vender. “Estamos olhando para a estratégia de diversificação, dado o cenário de maior risco, e buscamos aumentar a liquidez de todos os fundos, além de reduzir um pouco a exposição ao varejo”, afirma.
Os níveis absolutos de retorno na renda fixa devem continuar elevados este ano porque há dúvidas sobre a inflação global e a dose de antídoto necessária As dúvidas sobre o preço do dinheiro no mundo continuam presentes e continuarão pelo menos até o final deste semestre”, observa.
No Brasil, os juros altos e a maior inadimplência já eram uma realidade, assim como o impacto dos eventos corporativos deste ano, principalmente no mercado secundário. O ambiente hoje é mais restritivo tanto nos preços como na liquidez, ainda que as grandes empresas continuem capitalizadas e com baixa alavancagem.
Os fundos de crédito da asset tinham percentuais de Americanas entre 0,6% e 0,7%, na média, sendo que o fundo com maior exposição nesses papéis chegava a 2%. A opção foi por ficar com eles e ”ir para a briga” como parte do grupo de investidores que participou de uma emissão de R$ 1 bilhão em debêntures. “Estamos com esse grupo de debenturistas que integra o processo de reestruturação da dívida”, conta.

Os gestores de fundos de renda fixa navegaram, em 2022, em cenário francamente favorável aos ativos indexados ao CDI (títulos públicos e privados), beneficiados por novo e forte aumento da taxa Selic, que iniciou o ano em 9,25% e chegou a 13,65% em dezembro. “Nesse período, os ativos indexados ao índice de preços e os prefixados não tiveram o mesmo desempenho em função do aumento da percepção de risco, principalmente inflacionário”, lembra Roberto Balestrin, diretor de gestão de recursos de terceiros da Banrisul Corretora.
A performance dos fundos de renda fixa da casa foi impactada pelo desempenho dos títulos públicos, de acordo com as estratégias de cada carteira, seja em juro pós-fixado ou juro prefixado. Entre elas, o gestor cita a estratégia que manteve maior exposição a títulos públicos, em especial às Letras Financeiras do Tesouro (LFTs), com a consequente redução dos percentuais em over e aproveitando o fechamento das taxas de juros, movimento que aconteceu pela pressão de demanda ocorrida sobre esses ativos.
No crédito privado, nas carteiras de fundos que permitem essa alocação, a opção foi pelos papéis emitidos por instituições financeiras A casa fechou o ano com um total de R$ 15,9 bilhões sob gestão, dos quais R$ 5,2 bilhões (33%) voltados ao segmento de RPPS (Regimes Próprios de Previdência Social) e R$ 1,3 bilhão (8%) para as EFPCs (Entidades fechadas de Previdência Complementar).
“A possibilidade do fim do ciclo de alta de juros nos principais mercados globais em 2023, em especial nos EUA, deve apresentar oportunidades na renda fixa para a diversificação das carteiras dos investidores institucionais”, diz.

Melhores gestores em Renda Fixa (arquivo em pdf)