Vencimentos em série | Vencimento expressivo de títulos públicos ...

Edição 292

 

Um grande lote de títulos públicos indexados à inflação vai vencer ao longo de 2017, montante que os gestores do mercado estimam entre R$ 50 bilhões a até R$ 90 bilhões, o que tem levado os fundos de pensão e as assets a buscarem alternativas para realocar esses recursos. Algumas entidades, como a Previ e a Fundação Itaú, irão utilizar os vencimentos das NTN-Bs e NTN-Cs para honrar compromissos com seus participantes, mitigando um potencial risco do reinvestimento, ajudar no cumprimento das futuras metas atuariais.
O Postalis teve em fevereiro aproximadamente R$ 200 milhões de recursos que ingressaram na entidade por conta do vencimento de NTN-Bs, que já foram realocados em títulos de vencimento mais longo a preços de mercado. Christian Schneider, diretor de investimentos do Postalis, explica que, em função do fechamento da curva de juros, o fundo de pensão dos Correios decidiu alterar sua estratégia na renda fixa, que passou a ter uma gestão mais ativa. “Ao invés de adquirir NTN-Bs marcadas na curva, estamos comprando esses papéis a mercado, pela possibilidade de fazer a estratégia de alongar e encurtar a carteira conforme for mais vantajoso financeiramente para o Postalis”, afirma o diretor de investimentos.
Além do alongamento da carteira em títulos à mercado, parte dos recursos oriundos do vencimento dos títulos indexados à inflação foi direcionado para a renda variável, em fundos abertos que buscam acompanhar o Ibovespa. Schneider ressalta que não são fundos necessariamente passivos, mas que nos últimos anos entregaram rentabilidade similar à do benchmark. A fundação fez novos investimentos em fundos abertos de ações da XP, BTG Pactual e BNP Paribas, além de ter aumentado a exposição aos fundos que já estavam em seu portfólio, da Saga, Guepardo e SPX. Os novos aportes em renda variável somaram cerca de R$ 180 milhões.
“Vislumbrando as alterações nas condições econômicas, e na rentabilidade dos títulos públicos, começamos a diversificar a carteira, mitigando possíveis efeitos que poderiam levar ao não cumprimento da meta no fim do ano”. A decisão de aumentar a alocação em renda variável foi tomada em dezembro de 2016, e implementada em janeiro e fevereiro, e a estratégia ativa na renda fixa começou a partir de fevereiro e março.

Pagamento de benefícios – Os vencimentos e pagamentos de juros de NTN-Bs previstos para ocorrer em 2017 vão render à Previ cerca de R$ 4 bilhões, montante que também deve se repetir ao longo dos próximos anos. “Antes dos vencimentos, procuramos participar dos leilões ou do mercado secundário para tentar fazer um alongamento dos papéis. Ao longo do ano, sempre que tem alguma oportunidade, vamos alongando os papéis justamente para evitar a necessidade de fazer o reinvestimento”, diz Marcus Moreira, diretor de investimentos da Previ.
Embora os títulos de prazo mais curto já não estejam com prêmios que superem as metas, nos vencimentos de mais longo prazo ainda é possível encontrar ativos que façam frente às obrigações atuariais da fundação, comenta o dirigente. “Conseguimos trocar papeis abaixo do atuarial por outros mais longos acima do atuarial. O mercado secundário ainda nos dá essa oportunidade de alongar com prêmio em relação ao papel que está vencendo”. Como exemplo, o diretor da Previ cita uma NTN-B com vencimento em 2019, que no início de maio pagava um prêmio de 4,85%, enquanto o mesmo ativo para 2045 apresentava rendimento de 5,40%. Moreira admite, contudo, que a estratégia de alongar a carteira pode acarretar em um aumento da volatilidade na carteira do fundo de pensão.
Além disso, até por não ser possível fazer um alongamento de toda a carteira pela falta de disponibilidade no mercado, e com uma folha de pagamento de benefícios mensal da ordem de R$ 1 bilhão, o fundo de pensão do Banco do Brasil irá utilizar parte dos recursos que receberá das NTN-Bs para pagar seus participantes. “Esse já é um fluxo esperado dentro do nosso ALM (Asset Liability Management) para que possamos utilizar uma parte dos recursos para pagamento de benefícios”. Complementam os recursos para pagamento de benefícios os aluguéis de imóveis da Previ, os dividendos que a entidade recebe de alguns investimentos, e eventuais desinvestimentos em outras classes de ativo.
No entanto, por se tratar de um volume expressivo oriundo dos vencimentos e pagamentos de juros dos títulos indexados à inflação, a fundação do BB também tem monitorado oportunidades no mercado. “O mercado de títulos privados está começando a se reaquecer depois de dois anos muito ruins, e estamos atentos às oportunidades no segmento com bom risco e com prêmio em relação às NTN-Bs”, afirma Moreira. O especialista ressalta que não existe uma estratégia pré-definida para os recursos recebidos dos papéis do governo, mas sim uma soma de ações que são adotadas para ajustar o fluxo de caixa da entidade. “Depende muito das condições do mercado no momento”.

Superávit – A Fundação Promon tem um lote de NTN-B que vai vencer em maio, de R$ 25 milhões, e um outro lote de NTN-C, da mesma ordem de grandeza, com vencimento previsto para julho. Os títulos são do plano de benefício definido da entidade, já fechado para novos empregados, e que terá em 2017 uma distribuição de superávit de aproximadamente R$ 70 milhões devido ao terceiro ano seguido no qual a reserva especial acumula recursos excedentes.“Por não termos a necessidade de comprar novos papéis para o plano BD, os recursos dos vencimentos serão mantidos em caixa, em algum rendimento próximo ao CDI”, explica Mário Ribeiro, diretor de investimentos da Fundação Promon.
Alternativas – Guilherme Leão, diretor executivo responsável pela CTN de investimentos da Abrapp e presidente da Casfam, reconhece que o vencimento de NTN-Bs é um fenômeno que ele tem enfrentado na entidade que preside, além de também estar observando essa questão em outras fundações, em um ambiente de redução da taxa de juros. “Aquele cenário de simplesmente vencer os títulos e fazer o alongamento da carteira casando com o ALM está ficando cada vez mais difícil. Será um processo natural as entidades partirem para outros ativos do mercado”, pondera Leão, que cita como possibilidades principais no momento a renda variável ativa, o crédito privado e os multimercados. “Nesse sentido é muito importante que as entidades estejam atentas para fazer o gerenciamento do momento de entrada nos fundos, e de gestão do risco, para conseguir aproveitar os melhores momentos para esses investimentos”.

ALM – Na Fundação Itaú Unibanco, o diretor de investimentos Pedro Boainain conta que o planejamento por meio do estudo de ALM também prevê que os vencimentos e amortizações dos títulos públicos serão usados em grande parte para o pagamento de benefícios aos participantes dos planos. “Fazemos isso justamente para minimizar o risco do reinvestimento”, pondera Boainain.
Esse trabalho de ALM funciona bem quando se trata das NTN-Bs, mas a entidade do Itaú também tem em sua carteira NTN-Cs, títulos indexados ao IGP-M que não são mais emitidos pelo Tesouro ao contrário dos papéis que tem o IPCA como indexador. As NTN-Cs têm vencimentos previstos para 2017, 2021 e 2031. “Nesse caso, os vencimentos de 2017 terão de suprir os pagamentos até 2021”. Em 2031, quando vencer os lotes finais das NTN-Cs, e com a fundação ainda com passivos indexados ao índice, será preciso buscar alternativas que possam diversificar o risco, explica o diretor de investimentos. “Uma opção poderá ser o investimento em imóveis, por conta dos aluguéis que são corrigidos pelo IGP-M, é uma de forma de fazer o hedge para um pedaço do risco”, pontua Boainain. “O trabalho do gestor de fundo de pensão no Brasil geralmente foi sempre muito fácil, compravam NTN-B que pagava 7% com passivo de 6% e pronto. Na vida real é preciso ser mais criativo, e dá para ser”.
Entre as NTN-Bs, o fundo de pensão da instituição financeira não tem vencimentos expressivos para ocorrer nos próximos meses – cerca de R$ 200 milhões, para uma entidade com quase R$ 25 bilhões em ativos totais sob gestão. “Como os planos ainda são longos, com uma duration média entre 13 a 14 anos, a grande concentração dos títulos está entre 2040 e 2055”.

Bolsa – Carlos André, diretor executivo da BB DTVM, também enxerga na renda variável ativa uma das melhores saídas que as fundações podem encontrar no mercado doméstico para realocar parte de seus recursos oriundos dos vencimentos das NTN-Bs. “Para as fundações que não tem sobrealocação na renda variável, acredito que a bolsa é uma alternativa relativamente óbvia, com a ressalva que é preciso fazer uma boa seleção de setores e empresas, mas se trata de uma opção bastante importante”.
O executivo avalia o crédito privado como uma outra alternativa que também pode entrar no portfólio de algumas entidades. “Esses ativos tiveram depreciação relevante em seus preços, mas agora estão em um momento de recuperação, e com as novas emissões vindo a mercado, é uma opção que tem feito parte das nossas discussões com os clientes”. Dentro do crédito privado, Carlos André nota que as oportunidades que têm surgido, ainda que de maneira tímida, são no segmento corporativo, já que entre as instituições financeiras tem sido difícil encontrar boas oportunidades de investimento, já que os bancos não têm sido pró-ativos na tomada de recursos. “As fundações não têm nos procurado, nós que estamos abordando elas e oferecendo soluções, exatamente por já termos esse diagnóstico sobre os vencimentos e as possíveis alternativas no mercado”.

 

Só 10% em posse dos fundos de pensão

O consultor da Aditus Guilherme Benites tem tido diversas conversas com clientes fundos de pensão sobre a questão do vencimento e pagamento de cupons das NTN-Bs e NTN-Cs. O especialista estima que o valor que deve vir a mercado no ano por conta do prazo final desses ativos gira em torno de R$ 60 bilhões, mas ele acredita que o percentual desse total detido por fundos de pensão deve ser ao redor dos 10% somente. A maior parte desses papéis, explica Benites, faz parte da composição dos índices de mercado, como os da família IMA-B.
Carlos André, da BB DTVM, prevê um volume ainda maior de vencimento de títulos públicos para ocorrer em 2017, que pode chegar, segundo ele, na casa dos R$ 96 bilhões. Pelas contas do executivo da gestora do BB, o grupo previdenciário, que inclui tanto as entidades fechadas como também as abertas, responde por aproximadamente 26% da dívida pública federal. E desses 26% na mão de entidades previdenciárias de diferentes naturezas, Carlos André projeta que cerca de 55% está alocado em NTN-Bs, sendo que esse volume representa quase 40% do total de títulos indexados ao IPCA. “De maio até o fim do ano, vamos ter R$ 96 bilhões em vencimentos de NTN-Bs e NTN-Cs”.

Cenários – Em linha com o dirigente da Abrapp, o consultor da Aditus também cita como as duas principais opções hoje no radar dos investidores os multimercados estruturados e a renda variável ativa. Benites ressalta, entretanto, que as entidades que estão inseguras quanto ao cenário à frente, com a possibilidade de a reforma da previdência não ser aprovada, ou passar em moldes muito diferentes do que o mercado hoje precifica, devem manter parte de seus recursos em caixa e aguardar um ambiente mais benigno para então avaliar as alternativas disponíveis.
Caso a evolução da reforma previdenciária frustre os agentes econômicos, o consultor da Aditus prevê uma deterioração importante das expectativas, o que inclusive poderia gerar novas oportunidades para os fundos de pensão nos próprios títulos públicos indexados à inflação. “Se acontecer alguma coisa diferente do que o mercado está prevendo, a chance de as NTN-Bs voltarem para 6% não é baixa”.