Edição 284
Os retornos dos fundos de crédito privado high yield e investment grade não têm compensado o risco que o investidor tem de assumir, uma vez que eles têm ficado muito próximo à rentabilidade entregue pelo CDI nos últimos meses. Além disso, no período acumulado do ano de 2016, até 31 de julho, os fundos investment grade, de menor risco, têm entregue um retorno acima dos high yield, que geralmente assumem um risco maior na escolha de ativos. E mesmo em períodos mais longos, a diferença entre os dois é bastante reduzida, de acordo com levantamento feito pela consultoria Luz Soluções Financeiras.
Os fundos high yield, de janeiro a julho, alcançaram uma rentabilidade de 8,19%, contra um retorno de 8,01% dos high yield. Excluídos da amostra os dois fundos que tiveram a pior rentabilidade em cada um dos segmentos, bem abaixo da média dos pares, ambos do BTG Pactual – BTG Pactual Crédito Privado (high yield), com queda aproximada de 13%, e BTG Pactual Emissões Primárias (investment grade), que perdeu cerca de 20% – os fundos high yield, com rentabilidade de 8,56%, ficaram ligeiramente acima dos investment grade, que apresentaram valorização de 8,25% no ano. No período, o retorno do CDI é de 7,90%.
Já no intervalo de um ano, até julho, os fundos high yield registraram rentabilidade de 14,37%, ante 14,14% dos investment grade, e 14,13% do CDI. Excluídos os dois fundos do BTG Pactual, o retorno dos high yield sobe para 15,20%, e o dos investment grade, para 14,38%. Em dois anos, sem excluir os fundos do BTG Pactual, os high yield tem apreciação de 29,48%, e os investment grade de 27,62%, o que representa um retorno muito próximo do CDI no período, que foi de 27,87%.
Risco x Retorno – “O nível de risco de crédito que está embutido nos fundos investment grade, e principalmente nos high yield, não gera tanto retorno adicional quando consideramos o retorno do ativo livre de risco que é o CDI”, afirma Maria Paula Cicogna, diretora da área de previdência e family offices da Luz Soluções responsável pelo levantamento. “A remuneração alcançada em relação ao nível do risco está muito baixa”.
Essa remuneração dos fundos de crédito privado desalinhada ao risco dos ativos, avalia Maria Paula, está relacionada com as poucas emissões que ocorreram no mercado nos últimos dois anos. “As emissões não estão muito atrativas, e tem saído poucas operações”, pontua a especialista. Ela nota que, tanto os bancos têm se mostrado pouco inclinados em comprar títulos de crédito, pela remuneração do prêmio de risco abaixo do desejado, como as próprias empresas também não estão captando por já estarem com patamares elevados de endividamento. “Esse ambiente explica a baixa diferença entre os high yield e os investment grade, mas também a gordura pequena entre as duas classes de fundos para o CDI”, diz Maria Paula.
O levantamento da Luz Soluções mostrou também que o índice de sharp, que é o resultado do retorno dividido pelo risco, é de 1,64 entre os high yield em doze meses, e de -1,13 entre os investment grade. “O prêmio associado ao risco está muito baixo. Para o retorno compensar o risco, o ideal é que o índice de sharp esteja acima de 1. No high yield o índice é bom, ainda que não seja tão alto, mas quando observamos o sharp do investment grade, ele está muito baixo, ou seja, o risco que o investidor assume naqueles fundos não está compensando o retorno que ele está tendo”. O cenário de piora no mercado de crédito no país no passado recente, explica a diretora, gerou um risco maior entre as emissoras, que não foi acompanhado por um aumento de mesma magnitude nas taxas atreladas aos papéis.
O estudo da Luz Soluções apontou ainda os três fundos investment grade, e os três high yield que apresentaram as maiores rentabilidades no período de um ano até julho – entre os high yield, o maior retorno é do fundo Crédito Privado da Integral, com valorização de 19,03%. Em seguida, com dois fundos, vem a Quatá Gestão, com o Quatá Multisetorial, com alta de 18,74%, e o Prass Multimercado, que sobe 18,75%. Entre os investment grade, o de maior retorno é o fundo Horizonte da XP Gestão, com valorização de 26,02%. Na sequência aparecem o fundo Mirante, da Votorantim Asset, com ganhos de 21,43%, e o IMA-B 5 Crédito Privado, da Icatu Vanguarda, com 19,98%. Participaram da amostra 34 fundos high yield, e 244 investment grade – a diferença no número de fundos no levantamento entre as classes reflete a que existe no próprio mercado.
“Os gestores que se destacaram em sua maioria são os independentes sem vínculos com grandes bancos. Essa questão da independência do gestor faz bastante diferença, normalmente eles se destacam nesse ambiente mais restritivo de crédito”.
BTG Pactual – Albano Franco, sócio da BTG Pactual Asset Management responsável pela área de crédito, destaca o desempenho do carro chefe da gestora, o Crédito Corporativo, que conseguiu se manter apenas pouco abaixo de sua média histórica apesar do elevado nível de resgates que sofreu por conta dos problemas envolvendo o ex-CEO do banco, André Esteves, nos último meses. “Apesar dos resgates, no acumulado de 2016 o fundo está rendendo perto de 105% do CDI, sendo que o histórico de rentabilidade é de 110% do CDI. Depois de tudo que passamos em termos de resgates, e a própria situação ruim do mercado, estar com um desempenho acima do CDI é surpreendentemente positivo”, afirma Franco.
“Os problemas que envolveram o BTG Pactual foram uma prova pela qual passamos, e apesar do momento delicado, com resgates acima da média histórica não tivemos de fechar nenhum fundo de investimento, sejam os de liquidez diária, ou aqueles com resgate em cinco, 30 ou 60 dias. Honramos todos os resgates dentro do prazo sem dificuldades maiores”.
O momento desafiador pelo qual a gestora do BTG Pactual passou, destaca Franco, serviu também para mitigar dúvidas que existiam sobre a profundidade da liquidez do mercado doméstico de crédito. “Antes do evento do banco já haviam questionamentos quanto à resiliência do fundo aos resgates, e a rentabilidade que conseguimos é a maior prova de que o fundo e esse mercado tem sim alguma liquidez, para os bons nomes. Mesmo tendo que vender ativos conseguimos uma rentabilidade no ano bem satisfatória, o que mostra a qualidade dos ativos que tínhamos. Conseguimos nos desfazer de todos que precisamos com taxas boas”.
O desempenho positivo do fundo Crédito Corporativo, diante do quadro adverso, ressalta o sócio da asset, se deve à composição da carteira, formada por nomes óbvios da indústria de crédito que, ainda que também tenham passado por momentos difíceis, tiveram dificuldades relativamente menores na comparação com concorrentes do segmento. Como exemplo hipotético o especialista cita as Lojas Renner, varejista que usualmente emite papéis de crédito, considerada de primeira linha pelos gestores, e a camisaria Colombo, que nos últimos meses teve de promover uma reestruturação de sua dívida. “Há cerca de um ano as Lojas Renner pagava uma taxa de CDI mais 1,30%, enquanto a Colombo pagava CDI mais 4%. Quem decidiu na época seguir o caminho de maior risco acabou se dando mal”.
Os fundos de crédito da indústria brasileira que se dedicaram aos papéis conhecidos como high grade, que não estão no mesmo nível dos investment grade, mas acima dos high yield, como é o caso das Lojas Renner, sofreram menos. E eventualmente alguns ativos conseguiram passar pela crise e sair dela até mais fortalecidos, por conta da deterioração sentida por concorrentes que não estavam com uma posição de liquidez confortável. “O ciclo de abertura dos juros encareceu o dinheiro para todo mundo, mas esse tipo de empresa high grade sofreu menos”.