Cobertor curto | Estudo aponta aumento dos custos dos fundos de p...

Edição 278

 

Um estudo sobre as despesas e receitas administrativas dos fundos de pensão divulgado pela Previc no inicio de 2016, apesar de sua defasagem – os dados mais recentes do levantamento são referentes à 2014 – chama atenção por duas razões. Uma delas é que nos últimos três anos abordados pela pesquisa as despesas com os planos superaram as receitas destinadas aos gastos administrativos. Outro ponto que salta aos olhos no trabalho da autarquia é a discrepância que existe entre o custo per capita de um fundo de pensão instituído, que soma R$ 532,63, enquanto entre os privados o valor vai para R$ 975,44 e salta para R$ 1.709,62 entre as entidades de patrocínio público. O aumento das despesas é visto com preocupação pelos especialistas do setor por ser um fator que pode incentivar a retirada de patrocínio e migração de planos para fundos multipatrocinados.
Em 2014, as despesas dos planos de 272 fundos de pensão que fizeram parte da análise da Previc totalizaram R$ 2,5 bilhões, contra R$ 2,3 bilhões do lado das receitas administrativas. Guilherme Gazzoni, diretor da Gama Consultores, lembra que os fundos administrativos existem justamente para quitar eventuais obrigações que superaram as receitas correntes em um determinado período. “Se isso ocorre em um ano por algum motivo específico não é um grande problema, mas se esse descasamento persiste ano após ano, mais à frente vão ter de haver cortes e reestruturações, caminhos que não são desejáveis”, alerta Gazzoni. “Hoje é um modelo que não se sustenta, com fundos que não são bem dimensionados, já que assumem um nível de despesas sem olhar para a receita”.
O diretor da Gama destaca ainda a forte correlação entre o avanço das despesas per capita e a inflação – de 2010 a 2014 a inflação medida pelo IPCA foi de 27%, e o aumento dos custos dos fundos por participante foi de 29%. Tendo em vista o movimento dos últimos anos, é natural a projeção de que em 2015 o elevado patamar do índice de preços tenha novamente pesado no balanço das entidades, pondera o especialista. “Se a tendência dos últimos anos tiver prosseguido, vamos ver novamente crescimento das despesas, e como não houve um aumento significativo de novos planos, com mais participantes e taxas, a curva deve seguir sem fechar”.

Diferença de custos – Sobre a diferença de custos entre as entidades a depender do tipo de patrocínio, o diretor da Gama avalia que os fundos instituídos, até pela falta de um patrocinador, tem como característica administrações que primam pela simplicidade. Gazzoni ressalta que é necessário por parte dos fundos de pensão, principalmente os que apresentam custos mais elevados, repensar seu modelo de gestão. “A adoção por parte de algumas entidades de eventuais ajustes ao cenário que o país atravessa é muito importante, com estratégias para aumentar a captação de novos participantes e reduzir, ou mesmo diluir os custos”, aponta o consultor.
A oferta de benefícios e serviços das fundações de patrocínio privado e público, pontua o especialista, não tem variações tão grandes a ponto de justificar custos per capita com tamanha diferença. “Os instituídos e mesmo os privados são mais eficientes, uma vez que entregam um serviço análogo praticamente pela metade do preço. Os modelos das entidades públicas precisam buscar uma eficiência maior, com revisão no quadro de pessoal, melhorias na área de TI, para obter um casamento entre as receitas e as despesas”.
José Ribeiro Pena Neto, presidente da Abrapp, nota que, entre as entidades que têm patrocínio de multinacionais, ou mesmo de empresas privadas nacionais, é muito comum a adoção de modelos de gestão que são quase totalmente virtuais. “Além disso, como muitos fundos de pensão funcionam dentro da empresa, em alguns casos a despesa administrativa não é efetivamente contabilizada no balanço da entidade, quem paga é o patrocinador”. Em função disso, Pena Neto entende que os dados disponibilizados pelo estudo da Previc não são suficientes para concluir que os fundos de patrocínio privado ou os instituídos de fato têm estruturas mais eficientes que a dos públicos.
Ele cita a Forluz, fundo de pensão de patrocínio público do qual também é o presidente, e que aparece no levantamento com um nível de despesas per capita abaixo da média do grupo. “Para se fazer uma comparação justa, precisaríamos ter mais informações sobre as despesas administrativas das entidades privadas, principalmente as que adotam o modelo que se conhece no mercado como fundos virtuais”, diz o presidente da Abrapp.

Escala – Independentemente da variação de custos conforme a patrocinadora, Pena Neto aponta que a escala de alguns fundos de pensão, à medida que se tornam mais maduros, com redução no número de assistidos e participantes, começa a ser insuficiente para dar conta das despesas para se manter a estrutura da entidade em funcionamento. Por isso, ele acredita que, como já ocorreu em outros países, a tendência no Brasil, que já começou e deve se fortalecer nos próximos anos, é termos uma consolidação do setor, com fundações com planos pequenos migrando para fundos multipatrocinados.
“Na Suíça havia uma quantidade enorme de fundos de pensão, e esse número foi se reduzindo ao longo dos anos. Os benefícios ou os planos não acabaram, mas a gestão foi concentrada em uma quantidade menor de entidades. Talvez seja um caminho que vamos precisar olhar no Brasil quando a entidade começa a ficar pequena e perde escala”, pondera Pena Neto.

Regulação – O presidente da associação das entidades fechadas ressalta ainda que os custos em virtude do aprimoramento da gestão de risco dos fundos, em parte imposta pelos órgãos supervisores, também precisa ser revisto, para que eventuais obrigações que não tragam vantagens para o participante como contrapartida sejam extintos. “Nos últimos anos vimos algumas medidas que geravam custo sem trazer um beneficio compatível”.
Ele recorda de instrução da Previc publicada em dezembro de 2013, a IN 5, sobre informações adicionais aos participantes, que trouxe novas exigências que elevaram o custo, sem que o participante tivesse um ganho relevante. “Tanto é que foi revisto pela própria Previc”, diz Pena Neto. “A grande dificuldade para os fundos de pensão e para os órgãos reguladores é achar um equilíbrio entre o aumento de custo necessário que efetivamente traz vantagem para o participante, e aquele que simplesmente vai tornar o negócio inviável”, aponta o presidente da Abrapp.
O superintendente da Previc José Roberto Ferreira, disse em entrevista exclusiva (ver na abertura dessa edição) que uma das prioridades é a desoneração dos gastos dos fundos de pensão provenientes de exigências da autarquia. “Temos discutido com a Abrapp um conjunto de medidas que pode desonerar os fundos sem comprometer em nada o controle em relação às operações”, disse Ferreira. O superintendente cita algumas medidas recentes como a suspensão da exigência de encaminhar demonstrativos em papel para os participantes.

Casos de sucessos – Entre os fundos instituídos, em que o custo médio per capita, de R$ 532,63 é o menor entre os modelos de patrocínio existentes, a OABPrev-PR conseguiu adotar uma gestão de estrutura simplificada que permite que o seu custo seja significativamente menor que de seus pares, de R$ 93,99 por participante. “Quando criamos a entidade, pensamos em quais alternativas para viabilizar economicamente uma entidade sem patrocínio, e optamos por ter um fundo exclusivo que compra cotas de fundos”, explica Felipe Vidigal, gerente executivo da OABPrev-PR.
Em 2006, quando o produto foi contratado junto à Sul América, a taxa de administração já era baixa, de 0,10% anual, e hoje é de 0,08%. “Consigo transitar dentro do fundo com rapidez, e não é preciso mudar o gestor. Entendo que é o melhor modelo para instituídos”, diz Vidigal.
A OABPrev-PR, criada em 2006, e que hoje conta com aproximadamente 13 mil participantes, tem apenas sete funcionários operacionais no quadro de pessoal, além de Vidigal, que é o gestor profissional contratado, vindo da FAPA (Fundação de Previdência do Instituto EMATER-PR). “Temos uma estrutura muito enxuta. Todo nosso processo é informatizado, a contratação para os planos é feita virtualmente. São algumas alternativas que adotamos que reduzem os custos da entidade. E com o crescimento acentuado de participantes, o custo per capita cai cada vez mais”, afirma o gerente da entidade.
Na busca pela melhora de sua eficiência, outra medida adotada pela OABPrev-PR foi, a partir de 2016, deixar de cobrar a taxa de carregamento dos participantes, que até o ano passado era de 0,5%. Isso tem relação com o risco de pensão por morte e invalidez, que é terceirizado para a Mongeral. Pela estrutura, a seguradora vende os planos de aposentadoria e a opção pelo risco adicional através de seus corretores, em um acordo que não gera despesa para a entidade. E a partir do momento em que o corretor vende o plano de aposentadoria, a gestão do novo participante passa para a OABPrev-PR, que faz do cadastramento à gestão. Por isso ela recebe um valor da própria Mongeral pelo serviço prestado, e esse montante, diante do aumento no número de adesões, a partir deste ano se tornou suficiente para cobrir as despesas com a taxa de carregamento.

EmbraerPrev – No fundo de pensão da Embraer, a novidade no ano passado que deve ser trabalhada para aumentar a adesão dos participantes em 2016 foi a adoção das redes sociais para prestar alguns serviços e informações. “Temos procurado disponibilizar as informações por meio desses canais de forma que o participante se auto atenda”, afirma Eleu Baccon, diretor superintendente da EmbraerPrev. “À medida que eles se auto atendem, naturalmente temos menos atendimentos via 0800, que hoje é terceirizado, e tem também um menor número de atendimentos presenciais”.
A política do fundo de pensão da Embraer veta que a patrocinadora faça aportes extras à entidade ao orçamento previamente aprovado no ano anterior em caso de insuficiência de recursos, o que a leva a constantemente buscar ganhos de eficiência. Um dos caminhos que se mostraram mais proveitosos, diz Baccon, são as campanhas promovidas dentro da patrocinadora para que aumente a adesão dos funcionários ao plano. Em 2009, quando o fundo teve sua criação formalizada, eram cerca de 70% dos funcionários que tinham aderido ao plano; hoje o percentual saltou para 93,73%. Quando o fundo começou, lembra o diretor, a baixa adesão tornava a receita reduzida, o que levava a patrocinadora a ter de bancar quase 50% do custeio do fundo de pensão no inicio das operações.
“À medida que o tempo foi passando, por iniciativa da própria fundação, por acreditar em um modelo de custeio eficiente, fomos absorvendo os custos conforme ganhamos produtividade com o aumento na base de participantes”, explica Baccon. Hoje não tem nenhum custo que seja bancado pela patrocinadora, exceto o aluguel do espaço que é usado dentro da Embraer e acordado entre as partes, até por ambas entenderem que a localização é essencial para ajudar no fomento do fundo junto aos empregados.

Perfil de investimento deixa de ser oferecido

Uma medida que algumas entidades começaram a adotar para reduzir os custos, diz Cecilia Harumi, da LUZ Soluções Financeiras, é por meio da simplificação de suas estruturas internas. “Duas entidades em 2015, e uma em 2014, que haviam implementado os perfis de investimento deixaram de adotar a prática para reduzir as despesas. Em épocas de crise, a busca por uma estrutura mais simples tem movido algumas entidades”, explica a consultora. Os perfis de investimento, por necessitarem de um aumento nos controles e na exposição a diferentes tipos de fundos, cada qual com sua taxa de administração, onera de maneira relevante o fundo de pensão, aponta Cecilia. “São ferramentas que tornam a entidade mais sofisticada, mas por outro lado tem o incremento das despesas por causa dos controles”.
A consultora nota ainda que fundos de determinados perfis, como de renda variável no caso do mais agressivo, ficam praticamente sem nenhuma adesão em momentos como o atual, e a entidade paga uma taxa de administração apenas para manter uma estrutura sem uso. A sofisticação do mercado financeiro, com novos produtos, pondera Cecilia, levou algumas entidades a criarem estruturas próprias que se assemelham a de uma asset. “Algumas esquecem que o principal objetivo do fundo é preservação de capital”, destaca a consultora.