Edição 233
Já tem algum tempo que assets ligadas a grandes bancos privados e até mesmo casas independentes vêm procurando ingressar ou ampliar sua participação no segmento de regimes próprios de previdência social (RPPS). Acostumada a disputar palmo a palmo a liderança isolada deste mercado com a BB DTVM, a Caixa Econômica Federal percebeu o aumento da concorrência e começou a se mexer. Desde o início do ano passado, a gestora de recursos do banco tem promovido uma diversificação da sua prateleira de produtos de investimento dedicados a institutos de previdência de estados e municípios. Para viabilizar a estruturação de alguns deles, a Caixa está inclusive firmando parcerias com gestoras especializadas em determinadas classes de ativos.
“Percebemos nos eventos do segmento e no contato com os clientes que eles estão sendo cada vez mais assediados por bancos privados e gestores independentes. Essas instituições carregam uma expertise maior em fundos com gestão especializada. Segurar a concorrência foi um dos motivos que nos levou a diversificar o portfólio e buscar parcerias com gestores especializados”, afirma Sérgio Bini, gerente nacional de investidores corporativos da Caixa Econômica Federal. Ele completa que a revisão da legislação que trata dos investimentos dos RPPS com a publicação, em outubro de 2010, da Resolução número 3.922 do Conselho Monetário Nacional (CMN), foi outro fator que motivou as mudanças na oferta de produtos da Caixa.
“A resolução abriu novas possibilidades de investimento para os RPPS. Isso aliado ao cenário de queda da taxa de juros fez com que tomássemos a decisão de diversificar o portfólio. Nossa carteira era muito concentrada em fundos de renda fixa tradicional, e a ideia é oferecer a diversificação para os RPPS dentro da Caixa. Por isso precisávamos ter produtos diferenciados para oferecer a eles”, comenta o executivo.
Sofisticação – Bini detalha que, na parte de renda fixa, a Caixa já contava com uma boa prateleira de fundos, incluindo produtos IMA-Geral, IMA-B, IRFM e DI. Acontece que, por conta da tendência de queda da taxa de juros no Brasil, esses fundos passam a não ser suficientes para o atingimento do objetivo de rentabilidade dos institutos.
Álvaro da Luz, economista chefe da Somma Investimentos, observa que o IMA, contemplando todos os seus subíndices, oferece opções para os RPPS se posicionarem tanto na parte pré quanto pós-fixada, dependendo do que se tem de projeção macroeconômica. “Antes os RPPS só tinham o CDI, mas com a família IMA começaram a contar com a possibilidade de se posicionar mais em pré ou em pós de acordo com suas perspectivas de cenário. O que ocorre é que o retorno trazido por esses fundos não será mais o bastante quando os juros estiverem em outro patamar. E o Banco Central jé tem mostrado que está caminhando para taxas mais baixas no Brasil”, reforça o economista.
Luz estima que no horizonte de dois ou três anos (no máximo) os institutos de previdência de estados e municípios terão de olhar mais para produtos estruturados, tais como Fundos de Investimento em Participações (FIPs), fundos imobiliários e fundos fechados de crédito.
Alinhada a essa perspectiva, a Caixa lançou no ano passado 23 fundos fechados de crédito cuja carteira é composta basicamente por Depósitos a Prazo com Garantia Especial (DPGEs). Bini informa que os fundos têm uma rentabilidade esperada acima de IPCA+6% e cada veículo tem patrimônio líquido de R$ 50 milhões. “O alvo desses produtos também são as entidades fechadas de previdência, mas a maioria esmagadora dos cotistas é de RPPS, mesmo porque os fundos de pensão podem comprar DPGEs diretamente”, pondera o executivo. Essa foi a primeira linha de produtos que a Caixa lançou após partir para a diversificação da oferta – no total, os fundos de crédito têm hoje R$ 1,2 bilhão.
Ainda na área de crédito privado, está no forno da Caixa um produto sobre o qual Bini não pode dar informações. Trata-se de um Fidc aberto que já foi analisado pela agência de classificação de risco Standard & Poor’s (S&P).
No caso deste produto, a Caixa trabalhará em parceria com outras instituições. Um relatório de rating preliminar da S&P atribuiu rating brAAA (sf) às cotas sêniores de um fundo chamado Fundo de Investimento em Direitos Creditórios Aberto Caixa RPPS Consignado BMG.
Segundo o documento, a data para o início da distribuição estava prevista ainda para este mês de janeiro, mas até o fechamento desta edição o lançamento do fundo não foi confirmado por Bini. O relatório aponta ainda a Caixa como administradora do fundo, o BMG como originador dos direitos creditórios, a Integral Investimentos como gestor e a Integral Trust como estruturador.
O lançamento de um FIP para RPPS voltado à área de infraestrutura também está nos planos da Caixa, mas o projeto está em uma etapa mais preliminar. Sérgio Bini comenta que os institutos de estados e municípios ainda não têm muita familiaridade com essa classe de ativos e, por conta disso, o segmento ainda terá de passar por uma “curva de aprendizagem” antes de aplicar de fato em fundos de participações. De qualquer maneira, a intenção é colocar os planos em prática no primeiro semestre de 2012. “A gestão do FIP será feita dentro de casa, porque já temos experiência com o FI-FGTS, que conta com R$ 20 bilhões em projetos de infraestrutura”, recorda o executivo.
Mundo real – Mas assim como parece ser o caso do Fidc aberto, a Caixa também procurou um parceiro para oferecer aos investidores um fundo de ações com “estratégia de valor”. Trata-se da Vinci Partners, cujos fundadores eram sócios do então Pactual (hoje BTG Pactual). Bini explica que o produto aplica em small caps com base em uma análise fundamentalista das empresas e da identificação dos papéis que estão sendo negociados abaixo do valor justo. “O fundo compra ações dessas companhias e carrega as posições por um prazo de médio a longo”, acrescenta o executivo.
Bini comenta que este é um “fundo de ações small caps com cara de FIP”, uma vez que o objetivo é tomar posições relevantes nas empresas investidas e contribuir para o aprimoramento da governança, transparência, comunicação com o mercado e gestão das companhias, além de estimular o aumento da liquidez das ações.
O fundo tem carência de cinco anos, o que na visão de Bini é importante uma vez que os papéis das empresas investidas ainda não têm liquidez. “Para fazer um investimento concentrado nessas companhias e desenvolver o trabalho que nós chamamos de engajamento construtivo, é preciso ter esse prazo de carência. O fundo precisa de um passivo que não tenha de fazer resgate a toda hora, porque não podemos correr o risco de perder com a venda das ações”, sublinha. Ao contrário dos demais, esse produto não tem os RPPS como alvo principal, sendo direcionado também para fundos de pensão, seguradoras e private. A meta de captação total do produto é de R$ 500 milhões, e a Caixa espera levantar R$ 100 milhões junto aos institutos de previdência de estados e municípios.
A Caixa é responsável pela administração e distribuição do fundo, enquanto a Vinci fica com a gestão. “Já temos um fundo em parceria com eles, que é um Fidc com gestão da Vinci que nós administramos. A aproximação no caso do fundo de ações partiu do nosso objetivo estratégico de diversificar o portfólio. Aquilo que nós conseguimos fazer dentro de casa nós temos feito, mas estamos procurando parcerias para os nichos em que não temos tanta expertise. A Vinci é um gestor bastante qualificado, os sócios têm bastante experiência em private equity e IPOs e nós identificamos valor nessa estratégia de gestão que eles se propõe a fazer”, esclarece Bini.
Álvaro da Luz, da Somma Investimentos, comenta que o mercado de gestão de recursos está se movimentando no sentido de oferecer produtos mais sofisticados que podem aumentar a rentabilidade das carteiras dos RPPS, “e a Caixa é um bom exemplo disso”. Ele observa que as casas que não têm track record em produtos mais específicos, como fundos imobiliários e FIPs, estão se associando a outras assets para poder levar o acesso ao produto para os clientes. “A iniciativa da Caixa junto com a Vinci ilustra muito bem isso. E nesse fundo de small caps que eles lançaram, o investidor torna-se de fato sócio da empresa, não só alocando capital como também agregando valor à companhia para depois desinvestir. É por aí que os institutos vão ter de caminhar: saindo do mundo financeiro, de títulos pré e pós e ações, rumo ao mundo real, tornando-se financiadores e sócios de empresas e projetos”, resume o economista.
Estreia – Ainda na renda variável, a Caixa lançou em meados do ano passado um fundo multimercado de capital protegido voltado para RPPS. Também lançado na linha da diversificação do portfólio, o produto captou R$ 120 milhões. “Vemos uma tendência de o segmento migrar um pouco da renda fixa para a renda variável em função da queda da taxa de juros, e o fundo capital protegido oferece a oportunidade para quem nunca investiu em renda variável ter essa primeira experiência com mais segurança. Muitos dos cotistas desse fundo nunca tinham aplicado em ações, até porque quem investe em bolsa já tem um poder de decisão e um timing melhor para entrar e sair, não precisa passar por uma estrutura com capital protegido”, comenta Bini.
Ele informa que hoje a Caixa tem R$ 16 bilhões de ativos de RPPS sob gestão, sendo que R$ 2,8 bilhões foram captados somente em 2011 (até o início de dezembro). “Foi um dos segmentos de clientes em que a Caixa mais captou”, diz Bini. Hoje, os recursos dos institutos respondem por entre 10% e 15% do total de ativos em fundos da instituição, que encerrou outubro em R$ 123 bilhões. A ideia, segundo o executivo, é que o segmento chegue a representar 20% do total de fundos da Caixa nos próximos dois ou três anos. “É uma diretriz estratégica da Caixa ser líder no segmento de RPPS e consolidar essa liderança. O nicho de institutos de previdência de estados e municípios é uma prioridade da instituição”, avisa Bini.