Brasil está próximo do ponto de virada | Renomado gestor Mark Mob...

Edição 278

 

Quando o pessimismo alcança o topo é o momento em que devemos começar a ficar otimistas”. Com essa frase Mark Mobius, um dos mais reconhecidos gestores de mercados emergentes do planeta, definiu a situação do Brasil. O desempenho da economia brasileira tem sido fraco há tanto tempo, e já atingiu um estágio tão acentuado, que o ponto de virada, ou seja, o início da recuperação deve estar próximo, avalia o presidente do Templeton Emerging Markets Group, que tem cerca de US$ 30 bilhões em ativos sob gestão, dos quais US$ 1 bilhão estão alocados no Brasil. “Acredito que estamos no ‘turning point”.
Na avaliação de Mobius, o valuation dos mercados emergentes está em patamares muito atraentes. Ele citou como exemplo os bancos brasileiros Itaú e Bradesco, que estão sendo negociados sob o múltiplo de mercado PBV (price to book value, que indica o quão superior a cotação do papel está em relação ao valor patrimonial da empresa) de apenas uma vez por ação. “Os bancos brasileiros estão muito baratos. Eles até podem cair mais, mas nesse patamar em que estão o preço é muito bom”, comentou o gestor, durante encontro com a imprensa realizado em São Paulo no início de fevereiro.
De acordo com Mobius, um possível sinal de que as coisas estão prestes a mudar na região tem vindo das companhias exportadoras, cada vez mais competitivas em função da desvalorização do real frente ao dólar. Segundo os cálculos da Franklin Templeton, a desvalorização da moeda brasileira está 30% acima do que deveria, o que tem contribuído para a competitividade de empresas exportadoras, como a BRF.

Exposição ao Brasil – O gestor está aproveitando a desvalorização cambial, e a própria queda no preço das ações da bolsa brasileira, para aumentar sua exposição em empresas brasileiras. “Quem tem dólares tem uma oportunidade, e disse para minha equipe aumentar o peso de Brasil no portfólio”, ponderou o especialista.
O fundo global gerido por Mobius tem uma exposição de aproximadamente 12% ao Brasil, e que no momento está em elevação. O aumento do posicionamento na região, falou o gestor, tende a se concentrar em exposições que o fundo já mantém atualmente. No portfólio da Templeton Emerging Markets Group estão nomes como Itaú, Bradesco, Ambev, Localiza e BM&FBovespa. Segundo Mobius, o incremento na alocação em Brasil só não ocorre de maneira mais intensa porque os investidores em sua maioria ainda tem sacado o capital investido nos mercados emergentes. “Temos uma limitação do que podemos fazer. Mas quando as coisas reverterem, e com certeza elas vão, vamos colocar mais dinheiro no Brasil”.
Mobius destacou que não está desapontado com os acontecimentos recentes no país, uma vez que já esperava pelas dificuldades que têm sido enfrentadas pela região. Ele lembrou que investe no Brasil desde os anos 80, e que no início da década de 90, quando o país convivia com a hiperinflação, os problemas eram maiores que os atuais. “As coisas não estão tão ruins como antes. É precico colocá-las em uma perspectiva histórica”. Mobius disse estar otimista, e apontou como uma das razões para isso o avanço na transparência do sistema, que leva a tomadas de decisões mais rápidas por parte das autoridades, e consequentemente também dos investidores. Ele elogiou os procuradores que têm trabalhado na Lava Jato, pela “coragem” de ir em frente com a investigação, que envolve pessoas e empresas poderosas.

Estrangeiros – De acordo com o gestor, a maior preocupação dos investidores estrangeiros em relação ao Brasil no momento é a alta volatilidade da moeda. O patamar no qual se encontra a taxa básica de juros também foi citada pelo especialista como um ponto de preocupação dos estrangeiros, uma vez que afeta diretamente o lucro das empresas brasileiras. “Se uma companhia quer tomar um empréstimo, tem que pagar quase 18% de juros, quantas podem ter um lucro nesse patamar? Elas vão ficar sem condições de investir, e se não investem, não tem crescimento, que é o que o investidor busca”.
Diante de um ambiente como esse, o papel do gestor, pontuou Mobius, é ser capaz de selecionar as empresas que conseguirão sobreviver a esse período turbulento. As que sobreviverem, falou o gestor, eventualmente podem até sairem mais fortalecidas de todo o processo, com um ganho de market share que pode torná-las ainda mais dominantes em seus setores de atuação.
Questionado sobre o quanto a percepção do investidor estrangeiro mudou em relação ao país após as perdas do grau de investimento promovidas pelas agências de ratings Fitch e Standard & Poor’s, Mobius minimizou as ações das agências, e lembrou do fracassso delas em evitar a crise do subprime nos Estados Unidos em 2008. “Os investidores aprenderam a lição com as agências de rating após a crise do subprime. Hoje, quando rebaixam um país, não significa muito, elas estão sempre atrasadas”, comentou Mobius.

Contra as agências – “Atualmente muitos investidores vão contra as decisões das agências”. A leitura que parte do mercado faz após uma das agências rebaixar um país ou uma empresa, disse o gestor, é que a queda do mercado rebaixado deve estar próxima do fim. Como exemplo ele citou o caso da argentina YPF, que recentemente conseguiu emitir US$ 100 milhões em bonds em Nova York com juros a 8%. “Os investidores estão assumindo esse tipo de risco”. Ao notarem os primeiros sinais de uma reversão das perspectivas, a mudança do sentimento dos agentes ocorre de maneria muito veloz, falou Mobius.
Sobre quando essa mudança da percepção deve ocorrer com o Brasil, o gestor ponderou que, pelo tamanho do mercado, os investidores estão sempre monitorando a região. “A questão é saber qual é o fundo do poço e quando ele será atingido. Ninguém sabe”, disse o especialista. “Por isso é preciso tentar identificar o ponto máximo de pessimismo. Quando a maior parte das pessoas está muito negativa, desistindo, provalvelmente é o momento de investir”.

Petrobras – Há cerca de seis meses, após o estouro do escândalo da Lava Jato, o Templeton Emerging Markets Group optou por zerar a posição que mantinha na companhia em seu fundo global, ainda que tenha mantido exposição em fundos ofertados fora do Brasil. Mobius destacou que espera por uma recuperação no preço do barril do petróleo, hoje na casa dos US$ 30, fenômeno que poderia contribuir para uma recuperação da empresa brasileira. No entanto, ele ressaltou que, para que a Petrobras volte a ser lucrativa, o preço do barril teria de saltar para US$ 80. “O grande ativo da Petrobras é o petróleo em águas profundas, que exige operações muito caras, por isso o preço do barril tem que ser muito maior do que o atual”.
Além da recuperação no preço do petróleo, o gestor ressaltou que cabe à Petrobras fazer a lição de casa para estar apta a voltar a crescer quando o contexto global lhe for mais favorável. Isso envolve a venda de ativos, e a reestruturação da dívida, que se encontra em montante tão elevado, e em um ambiente de preços globais que não é ‘manejável’, disse Mobius. Ele defendeu como uma das melhores saídas para a empresa apelar para o ‘Chapter 11’ pelas leis americanas, que seria o equivalente a um pedido de recuperação judicial no Brasil.