Edição 288
Da expertise no aconselhamento a fundos de pensão na área de investimentos e riscos, as consultorias passaram por uma reconfiguração na última década, fortalecendo a oferta de serviços com o auxílio da tecnologia. Trata-se de um mercado que, em mais de uma década, era concentrado em cinco casas – Risk Office, Mercer, Towers, Luz Soluções Financeiras e PPS – e que agora está muito mais pulverizado. O resultado é que o número de empresas mais do que dobrou nos últimos anos.
Pode-se dizer até que as consultorias são novas, mas os profissionais não são necessariamente novos. É que a maioria delas foi aberta por profissionais que saíram de casas mais antigas e criaram novas, como Aditus, i9 Advisory e Manage Risk. O perfil das novas consultorias é voltado para a especialização, enquanto as pioneiras e multinacionais, com estrutura mais ampla, oferecem um trabalho integrado com a parte atuarial. No segmento das consultorias globais, a novidade é a entrada da Lockton, que contratou recentemente o experiente consultor Lauro Araújo.
Entre todas as consultorias, destaca-se a Aditus em termos de market share. Depois de crescer nos últimos anos, a Aditus acabou comprando a própria Risk Office em meados deste ano, consultoria de onde saíram seus principais sócios. Com a aquisição, a consultoria pretende ampliar o foco em tecnologia, segundo Guilherme Benites, sócio da Aditus. “Sempre entregamos relatórios e estudos, mas não tínhamos a entrega de ferramentas. O que mudou é que poderemos atender o cliente que quer apenas o sistema de risco e não a análise, que não quer o estudo de ALM, mas a ferramenta para realizá-lo”, afirma.
A Aditus passa a ter uma equipe de 80 profissionais, o dobro da estrutura que tinha anteriormente. Atualmente, a consultoria atende 125 fundos de pensão, que somam cerca de R$ 200 bilhões em ativos. Para Benites, a configuração de mercado, mais pulverizado, deve caminhar para a especialização e o atendimento personalizado, principalmente no serviço oferecido pelas empresas menores. Desta forma, as novas consultorias devem se concentrar em um número limitado de clientes.
Para reter talentos e evitar a dissolução de equipe, a Aditus, que tem hoje 12 sócios, pratica um modelo similar ao de assets independentes, no qual a partir de determinados critérios, a meritocracia torna o profissional um sócio da empresa. Apesar da relevância dos softwares, Benites destaca a importância do atendimento integrado, voltado para a revisão da política de investimentos, estudo de alocação de ativos e passivos, sem dissociá-los dos recursos tecnológicos.
“O serviço de sistemas é componente relevante da consultoria, de atendimento à legislação até a parte mais sofisticada de aconselhamento. Há uma integração muito forte. Se entrego tudo o que atende a legislação, já conheço a carteira e o estudo de ALM, o que facilita muito na hora de falar sobre investimentos”, afirma.
De fato, a tecnologia converteu-se em um filão para as novas consultorias. E observando essa demanda, alinhada às exigências dos reguladores por controle e compliance nas fundações, que nasceu a Manage Risk, outro filhote da Risk Office.
As atividades começaram em agosto, inicialmente com três consultores técnicos para prestação de serviços focados na gestão de riscos e controles internos, operacionais, sistêmicos e atuariais, segundo explica Herbert Higashi, sócio da Manage Risk junto com Roberta Carvalho (ambos ex-Risk Office). “Hoje temos dois clientes fundos de pensão e a tecnologia é um diferencial em um momento no qual o mercado passa por uma avalanche de novidades nessa área, com fintechs e uberização. O mercado de fundos de pensão também está sendo impactado”, diz.
Ele explica que o escopo do serviço é a auditoria do sistema previdenciário e ferramentas de monitoramento de compliance e gestão, de pagamento de benefícios, além de análise de cadastros para a construção de banco de dados. A Manage Risk não presta consultoria de investimentos, apenas gestão de risco e controles internos, o que abrange o risco financeiro, por meio de mapeamento dos investimentos, boas práticas e controles de ambiente, governança e compliance.
Apesar da relevância da tecnologia, o trabalho da consultoria de investimentos não deve ser confundido com o de controladoria, segundo Everaldo França, sócio da PPS Consultoria, que está há 20 anos no mercado e trabalha atualmente com uma equipe de 15 profissionais.
“Somos a mais antiga, com exceção da Mercer, e nesses anos nos concentramos em vender inteligência e orientação de investimentos baseados em softwares de ALM”, afirma França. O escopo de trabalho da consultoria, segundo ele, é a avaliação de performance e construção de estratégias, política de investimentos e análise de cenários econômicos e de carteiras administradas.
O endurecimento da legislação a partir de 2001 acelerou a demanda por serviços de controladoria, especialmente em relação ao enquadramento de carteiras aos limites estabelecidos, além de cálculo de VaR (Value at Risk), o que levou a PPS também a executar esse serviço por meio de softwares externos. França diz que todos os consultores atendem os clientes e, em alguns deles, participam também como membros de comitês de investimento.
Integração – O potencial de mercado para as consultorias de investimentos, por enquanto, é maior até mesmo do que a demanda em razão do ambiente macroeconômico pouco propício a estratégias mais sofisticadas. Assim, as pioneiras e maiores optam por oferecer um serviço integrado, aliando estudos atuariais com a consultoria de investimentos.
Quanto mais a economia se desenvolver, o mercado de consultoria tenderá a crescer na opinião de Arthur Lencastre, líder de investimentos da Willis Towers Watson. Segundo ele, o que também ajudou a pulverizar o número de consultorias no mercado foi o aumento da complexidade da regulamentação, o que aumentou as responsabilidades das entidades. “O papel das consultorias é auxiliar as entidades a atender as obrigações exigidas pelos reguladores”, afirma.
Lencastre diz que a pulverização das consultorias no mercado também nasce de oportunidades existentes e a tendência é que elas se posicionem de forma especializada em determinada prestação de serviço.
Ele avalia que são poucas as empresas que conseguem atender as fundações em todas as demandas e oferecer um leque mais completo de serviços. Nesse contexto, diz que a Willis Towers Watson desenvolve desde projetos específicos e individuais, que podem abranger estudos de gestão de ativos e passivos de forma simples ou complexa, ou seja, combinado ou não com a análise e avaliação de resultados de diferentes alocações de ativos sobre o resultado final do plano de previdência em prazo mais longo.
Já a Mercer incentiva a consultoria de investimentos e riscos de maneira integrada, com avaliação completa dos fundos de pensão, abrangendo a parte atuarial, de seguridade e contabilidade, segundo Raphael Santoro, consultor sênior responsável pela área de investimentos no Brasil da Mercer Consultoria.
Segundo ele, a Mercer atende cerca de 100 projetos esporádicos na área de investimentos, mas nos serviços contínuos são 60 fundos de pensão. “O enfoque é olhar para o investimento junto com o estudo atuarial, com ativo e passivo juntos, além de desenho do plano, características dos participantes. Esse tem sido o foco agora, até porque não adianta a entidade tomar uma decisão de investimento que choca com o desenho do plano ou com a parte atuarial. Procuramos atender dessa forma, mas serviços podem ser separados”, afirma. Santoro diz que a consultoria participa de comitês de investimentos, com o intuito de oferecer suporte às decisões e não como membro opinante. A ideia é a que a própria entidade decida a partir do trabalho de consultoria.
Conforme o país entra em um patamar econômico mais estável, o valor do consultor de investimentos tende a ficar mais claro, na opinião de Lauro Araújo, diretor de consultoria de investimentos da Lockton. Segundo ele, que antes passou por carreira solo na LAS, é importante hoje oferecer esse serviço com o suporte de diversos especialistas, algo que encontrou na Lockton, cuja atuação principal é a consultoria atuarial, pela qual atende 50 clientes, entre entidades abertas e fechadas. Araújo diz que a equipe de 18 pessoas trabalha em conjunto e é formada por especialistas nas áreas jurídica, de investimentos e atuarial.
“O mais importante é prestar um serviço de consultoria de investimentos que justifique manter o contrato ativo. Por isso, temos um conhecimento profundo do cliente, com um serviço integrado entre a parte atuarial e a política de investimentos. Participamos da vida do cliente como se fôssemos membro da equipe”, afirma.
Papel fiduciário – Araújo explica que a consultoria está presente no comitê de investimentos das fundações, seguindo o modelo praticado nos Estados Unidos, no qual o consultor atua como fiduciário, e isso vem ganhando relevância em tempos de Lava Jato. Ele avalia que o consultor, quando atua como fiduciário, assume a responsabilidade junto com o fundo de pensão pelos riscos, pois participa de todas as reuniões, tem de ler todas as atas e conversar com o gestor todo mês.
“Só topa esse risco quem sabe avaliar, monitorar e gerenciar esse risco. Esse é um movimento muito maior. Por isso não queremos muitos clientes, por ser um trabalho que demanda muito conhecimento e envolvimento. Para atuar dessa forma, é difícil para um consultor atender mais do que 15 clientes ao mesmo tempo”, afirma.
Quem também aposta na figura do consultor como um fiduciário é a i9 Advisory, que iniciou as atividades em dezembro de 2015, composta por sete sócios, dos quais seis também saíram da Risk Office.
Um deles é Relton Rodrigues, diretor-comercial da i9 Advisory. Ele diz que a equipe estudou o mercado de consultoria a fundos de pensão em Nova York e Londres para adaptar o modelo ao Brasil.
“O papel do advisory no exterior é mais amplo porque ele é parte integrante e membro consultivo do comitê de investimentos dos fundos de pensão”, afirma. Hoje com 24 clientes, que somam cerca de R$ 40 bilhões em ativos, a i9 tem consultores em comitês de dez entidades, com mandatos registrados e duração de dois anos.
De acordo com Rodrigues, esse trabalho mais próximo possibilita uma discussão estratégica do âmbito atuarial, que determina a solvência do fundo de pensão no médio e longo prazos. Assim, a estratégia da consultoria é oferecer um serviço de maior valor agregado e intensivo na figura do consultor, principalmente em um mercado no qual os dirigentes de fundações evoluíram muito em termos de capacitação técnica, por meio de treinamentos promovidos pelos órgãos reguladores.
“Eles são mais exigentes em relação ao serviço de consultoria e o profissional que pisava na fundação uma vez a cada seis meses para aconselhar na área de compliance já não atende a demanda”, afirma.
Enquanto a taxa de juros mantém-se em patamar elevado, o que ganhou espaço nas consultorias foi o atendimento à demanda por compliance e governança nos investimentos para que as fundações estejam em linha com as exigências dos reguladores.
Atento a essa necessidade, Fabio Punsuvo, consultor e proprietário da F8A Consult, que atua de maneira independente há 12 anos, se dedica hoje à governança de investimentos. “Uma boa governança, com bons contratos, custódia, mandatos estruturados com gestor, entre outros fatores, estão associados a resultados satisfatórios e à prevenção de perdas e ao desenquadramento”, afirma.
Para Punsuvo, o mais importante é a estratégia e a experiência do consultor do que propriamente a oferta de sistemas, embora eles sejam importantes ferramentas para a execução do trabalho. “Invisto bastante em tecnologia, mas meu foco é estratégia e a experiência no mercado. Para trabalhar de forma isenta e independente, uso elementos de prestadores de fundo de pensão para fazer a leitura de indicadores e ações recomendáveis”, diz o consultor.
Um modelo alternativo de consultoria
Um outro modelo que ainda tenta encontrar espaço no mercado de fundos de pensão é o de consultoria estratégica ligada à asset. É o caso da TAG Investimentos, que contratou a consultora Francisca Albuquerque Brasileiro como responsável da área de gestão estratégica de recursos de institucionais. A profissional atuou nos últimos oito anos na Willis Towers Watson (antiga Towers Watson) na área de consultoria de investimentos para fundos de pensão. Ela tem passagem também pela Luz Soluções Financeiras onde atuou como analista financeira.
“É um novo modelo de consultoria que inclui um olhar integrado da carteira como um todo e inclui uma gestão estratégica, inclusive com seleção de gestores”, explica Francisca Brasileiro. A consultora afirma ainda que o fato de contar com um equipe de gestão, a asset tem uma vantagem de contar com estrategistas de mercado em comparação com as atuais consultorias do mercado. Francisca ressalta ainda que não há conflito de interesses, pois a TAG não distribuirá fundos próprios para os fundos de pensão. Aliás, a asset não realiza gestão de fundos próprios, apenas atua como gestor de fundos de fundos, com a maioria de clientes composta por family offices e private.