Edição 246
O mercado de custódia qualificada já estava agitado com a entrada e a saída de players importantes nos últimos meses. Enquanto o HSBC anunciava sua retirada no final do ano passado, o BNY Mellon começava praticamente na mesma época a comunicar a clientes que passaria a oferecer esse serviço. Agora é a Caixa Econômica, um concorrente estatal, que anuncia o início de suas operações de custódia para terceiros. Até agora os maiores bancos estatais não vinham atuando no mercado de custódia para terceiros, custodiando quase que exclusivamente recursos próprios e focando os mercados de gestão de recursos e administração fiduciária. A entrada da Caixa mostra o interesse das instituições financeiras de controle estatal por um mercado da ordem de quase R$ 4 trilhões, que pode ser seguido também pelo Banco do Brasil.
“Queremos dobrar o volume de recursos custodiados até o final de 2013 para nos aproximar dos maiores concorrentes do mercado”, diz Renato Siqueira, gerente nacional de controladoria e custódia da Caixa (Gecoc). A Caixa mantinha R$ 117,3 bilhões sob custódia no final de dezembro de 2012, dos quais quase a totalidade correspondia a recursos do próprio banco e de sua asset – apenas R$ 0,78 bilhão era de terceiros. A meta pode parecer arrojada, mas é possível, segundo o executivo, se os principais parceiros institucionais do banco confirmarem a migração para o serviço. Ele se refere ao fundo de pensão dos funcionários da Caixa (Funcef), que possui patrimônio da ordem de R$ 45 bilhões, e a Caixa Participações (Caixapar), com mais R$ 40 bilhões. Somando os dois prováveis clientes, já seriam mais R$ 85 bilhões.
Além disso, há alguns fundos de varejo da Caixa que não são custodiados pelo banco. No total, são sete fundos de varejo. Tanto esses fundos quanto os recursos da Funcef e da Caixapar são custodiados atualmente com a área de custódia do Bradesco, que deve perder essa parte da carteira. Não é a única perda que o Bradesco pode enfrentar nesse ano, pois um processo similar deve ocorrer com a entrada do BNY Mellon no mercado de custódia. O Bradesco mantinha parceria com a instituição para realizar a custódia dos fundos que contavam com administração fiduciária do BNY Mellon. Segundo estimativas do próprio Bradesco, o volume a ser migrado pode chegar a R$ 95 bilhões.
Somados com os recursos que devem ir para a Caixa, a custódia do Bradesco poderá perder mais de R$ 180 bilhões. O gerente nacional da Caixa, porém, ressalta, que o processos de mudança da Funcef e da Caixapar ainda precisa ser analisados e aprovados por ambas instituições. Se confirmados os acordos com esses clientes, a Caixa já passaria da sexta posição (janeiro de 2013) para a quinta colocação (ver tabela), mas ainda estaria longe dos quatro maiores (Bradesco, Itaú, BB e Citibank). Recentemente, a Caixa já havia ultrapassado o HSBC, que vinha caindo no ranking nos últimos meses devido ao anúncio que deve deixar de prestar o serviço de custódia para terceiros.
Para crescer ainda mais, além dos parceiros institucionais, a Caixa pretende focar nos clientes regimes próprios de previdência (RPPS). “Queremos aproveitar o nosso foco na gestão de recursos dos regimes próprios e dos entes públicos para ganhar escala com a custódia”, explica Siqueira. A asset da Caixa realiza a gestão de R$ 24,32 bilhões para os institutos de previdência dos servidores, segundo dados do ranking Top Asset (até dezembro de 2012). Do total de recursos dos regimes próprios, a parte que é passível de centralização da custódia é apenas da carteira própria de títulos públicos, que acumulam R$ 9,95 bilhões, segundo dados do Ministério da Previdência Social referentes a outubro de 2012.
“Estamos mirando os maiores regimes próprios que possuem carteiras próprias de títulos públicos, mas também queremos crescer com a custódia indireta para estes clientes, através dos fundos de investimentos em que eles aplicam seus recursos”, diz o gerente nacional da Caixa. Ele explica que um dos diferenciais da Caixa é o forte relacionamento com os entes públicos e, por isso, a decisão de focar primeiramente nos regimes próprios. Siqueira ressalta porém que a área deve buscar outros tipos de clientes, como os fundos de pensão e as seguradoras.
Segregação – A Caixa teve que realizar algumas mudanças na sua estrutura organizacional para atender as exigências da regulamentação do mercado de custódia. O mais importante foi a segregação de uma área específica para cuidar do serviço, separada do asset e da tesouraria da instituição. Para isso, a gerência de controladoria e custódia, que antes fazia parte da área de asset management, subordinada à vice-presidência de gestão de ativos de terceiros (Viter), passou a responder para a vice-presidência de logística (Vilog). A área é comandada atualmente pelo vice-presidente da Caixa Paulo Roberto dos Santos. A segregação da área que cuida de custódia tanto da tesouraria quanto da asset é uma exigência fiscalizada pelo Banco Central.
Além disso, a Caixa teve que contratar e implantar um sistema tecnológico novo para rodar o serviço de custódia. Depois de um processo de licitação, foi selecionado o sistema da empresa Maps, em 2011. O sistema foi implantado ainda naquele ano, enquanto no ano seguinte, a Caixa tratou de treinar a equipe e realizar os testes necessários antes de sair a mercado. “Desde o planejamento até a implantação, o projeto levou cerca de três anos para ficar pronto.
No ano passado fizemos todo o processo de testes e treinamento da equipe e agora em 2013 estamos saindo para oferecer o produto no mercado”, diz Siqueira, funcionário da Caixa há 14 anos com formação em tecnologia e especialização em finanças. Com as mudanças ele foi promovido para o cargo de gerente nacional para coordenar a nova área.
Além do crescimento esperado, já para 2013, a área de custódia da Caixa tem objetivos mais ambiciosos. Por enquanto, o serviço está disponível apenas para fundos da resolução 409 da CVM (Comissão de Valores Mobiliários), carteiras próprias e fundos de índices ETF (Exchange Traded Funds). Mas para o ano que vem, a Caixa pretende começar a oferecer a custódia também para os fundos estruturados – fundos de participações (FIPs), imobiliários (FIIs) e direitos creditórios (FIDCs). “Estamos em uma primeira fase do projeto de custódia qualificada. Primeiro queremos ganhar escala, depois vamos abrir, em uma segunda etapa, para os fundos estruturados”, diz o gerente nacional.
Em uma fase mais adiantada, a Caixa não descarta oferecer o serviço também para investidores estrangeiros, ainda que, o relacionamento com esse público não seja o forte da instituição. Apesar de bastante recente, a área de custódia da Caixa já tem dois clientes: uma asset independente e uma empresa que administra planos de saúde.
Ao saber dos planos da Caixa, alguns executivos do Banco do Brasil, também se interessaram pelo projeto. Tanto que fizeram recentemente uma visita à Caixa para conhecer o sistema e a nova área. O Banco do Brasil é o maior administrador fiduciário e gestor da indústria de asset no Brasil, mas ainda não oferece a custódia para terceiros. Ainda não há uma confirmação que o Banco do Brasil esteja implantando um sistema para sair a mercado, mas não é descartado que siga o exemplo da Caixa. O Banco do Brasil também possui foco na gestão de recursos dos regimes próprios e no relacionamento com os governos.