Maior tolerância | Mudanças na Resolução 3922 torna mais flexível...

Edição 267

 

No apagar das luzes de 2014 o Banco Central publicou no Diário Oficial da União, pouco antes do Natal, alterações na Resolução 3922 que, embora anunciadas de maneira discreta, trazem instruções relevantes para a gestão de recursos dos regimes próprios a partir deste ano. Entre as medidas está a criação de um limite para o desenquadramento passivo de até 25% do previsto para determinado ativo. Isso acontece, geralmente, quando há valorizações ou desvalorizações das cotas de um fundo, elevando o percentual do patrimônio líquido do RPPS naquele produto.
Pela nova regra, por exemplo, um instituto poderá manter, sem necessidade de reenquadramento, até 6,25% do seu patrimônio em um Fundo de Investimento em Participações (Fip), cujo limite era de 5% do patrimônio. O que ultrapassar esse novo teto, terá de ser reajustado em até 180 dias.
“Essa mudança é muito positiva para o sistema. Para se reenquadrar, o regime próprio tinha que vender ativos, prejudicando a rentabilidade, já que o momento para saída do mercado poderia não ser o melhor. Outra alternativa seria encontrar meios de elevar o patrimônio líquido, e isso geralmente se dá aumentando receita de contribuição”, afirma André Rocha Marinho, diretor financeiro do Iprejun, regime próprio de Jundiaí, São Paulo. O instituto, contudo, não possui ativos desenquadrados atualmente. “É preciso ter prudência e não sair por aí aplicando os limites de investimento nos fundos, evitando comprometer a rentabilidade dos ativos no futuro”, complementa.
De acordo com dados do Sistema de Informações dos Regimes Públicos de Previdência Social (Cadprev), o setor acumula R$ 375 milhões em ativos que demandam enquadramento. Com a aplicação da nova regra, a necessidade de reajuste pelos institutos cairia para R$ 280 milhões.
Segundo Narlon Guitierre Nogueira, diretor do departamento de regimes próprios do Ministério da Previdência, como os institutos aplicam a maior parte de seus ativos em fundos compostos por títulos prefixados, como IMAs e IdkA, marcados a mercado, uma desvalorização nas cotas desses produtos elevam também o valor de outros investimentos dos RPPS, proporcionalmente em relação a suas carteiras. “O limite de 25% de desenquadramento é necessário para permitir ao gestor do RPPS a reorganização de sua carteira sem a necessidade de alienar ativos a qualquer preço”, esclarece.
Somado a isso, os instrumentos financeiros desindexados à taxa de juros de um dia estão sujeitos à maior volatilidade, e regras rígidas de desenquadramento passivo tenderiam a desestimular tais aplicações.
Mas, se por um lado a resolução afrouxa a regra para desenquadramentos passivos, por outro ela se torna mais rígida para os Fundos de Investimento em Direitos Creditórios (Fidcs). A partir de agora, a participação de um RPPS dentro de um Fidc está limitada a 25% do valor das cotas sêniores. Antes, o percentual incidia sobre o patrimônio líquido do fundo todo. “A mudança faz todo sentido, pois os RPPS estão limitados a investir apenas nas cotas sêniores”, diz Marinho, do Iprejun.
Ele explica que o impacto da medida sobre o volume investido dependerá de como o Fidc foi estruturado. No caso de um Fidc desenhado nos moldes daqueles multicedentes e multissacados que trouxeram problemas ao sistema – como os do BVA, Trendbank e Banco Rural, que tinham um risco de crédito alto e, portanto, uma participação das cotas subordinadas (que protegem o investimento) também elevada -, o percentual para investimento por parte dos regimes próprios ficaria realmente menor com a nova instrução.
“Mas, para os Fidcs tradicionais, em que os riscos são baixos e a participação das cotas subordinadas não passa de 5%, não fará muita diferença. Nesse sentido, a norma favorece aplicação de recursos dos RPPS em ativos de mais baixo risco, tornando o sistema mais seguro”, analisa Marinho. Pela regulamentação, os regimes próprios estarão limitados a investir até 15% de seu patrimônio em cotas sêniores de um Fidc aberto – e 5% de um Fidc fechado.
Heliomar Santos, presidente da Associação Nacional de Entidades de Previdência dos Estados e Municípios (Aneprem), a medida pode ajudar a alavancar a oferta de “bons Fidcs” no mercado. “O instrumento se torna mais seguro para receber recursos dos regimes próprios e favorece aqueles que apresentam riscos menores. Dessa forma, acredito que teremos uma oferta de Fidcs mais aderentes às regras de investimento dos RPPS. A 3922, afinal, proíbe alocação de ativos dos institutos em produtos de risco elevado”, diz.
Para o diretor de RPPS do Ministério da Previdência, a alteração na resolução esclareceu que é vedada a aplicação dos recursos dos institutos na parcela de maior risco de um Fidc. “Uma eventual inadimplência afetaria também a proporção de cotas subordinadas em relação ao total de cotas do fundo, levando os regimes próprios a um desenquadramento passivo”, pondera Nogueira.

Diversificação – Além de reforçar alguns pontos da Resolução 3922, a instrução publicada pelo Banco Central permite aos regimes próprios investirem em novos produtos, que ainda aguardam regulamentação. Esse é o caso dos fundos de índices (ETFs) de renda fixa e as Letras Imobiliárias Garantidas (LIGs).
“O BC antecipou uma tendência, na verdade. O que vai definir, contudo, a atratividade desses produtos é a estratégia de alocação dos RPPS e a remuneração dos ativos, que deverá ser compatível com a meta atuarial”, afirma Carlos Takahashi, presidente da BB DTVM.
A gestora ainda está aguardando a regulamentação desses produtos para desenhar um portfólio próprio, mas adianta que estes deverão ser ativos importantes para diversificação da carteira dos institutos. “Os ETFs de renda fixa são muito comuns lá fora e representam, portanto, uma evolução natural do mercado brasileiro”, avalia.
Um dos pontos que demandam esclarecimentos por parte do órgão regulador, na opinião de Takahashi, é se haverá possibilidade de fazer aluguel das cotas do fundo, uma fonte de recursos relevante para ETFs de forma geral. “A regulamentação precisa deixar o funcionamento do produto claro para que as gestoras consigam avaliar a melhor forma de estruturar a carteira”, pondera.
Segundo Takahashi, pela instrução do BC, um instituto poderia aplicar até 80% do seu patrimônio em um ETF que tivesse 100% de seu capital alocado em títulos públicos. Mas o RPPS não poderia exceder 20% do patrimônio do fundo.

Atratividade – Na opinião do executivo, a tendência é que os ETFs de renda fixa sejam produtos relativamente baratos para os regimes próprios, visto que a gestão do fundo deve ser mais passiva. No caso das LIGs, Takahashi afirma que é muito cedo para avaliar se é um produto que deve atrair os regimes próprios. “É um ativo completamente novo e tudo vai depender de como o governo estruturar o produto, quais indicadores serão utilizados e como será a taxa de juros”, complementa.
Para o diretor do departamento de RPPS do Ministério, a vantagem da LIG está no baixo risco. “O produto terá dupla garantia: primeiro da instituição financeira emissora e segundo da carteira de ativos. O patrimônio da carteira de LIG é totalmente apartado do patrimônio da instituição emissora”, explica Nogueira. O produto, entretanto, concorrerá com a poupança, no mesmo limite “A mesma ressalva da poupança é aplicável, de que o RPPS não pode aplicar em LIG emitida por banco estadual”, pondera.
No geral, tanto as LIGs quanto os ETFs de renda fixa tendem a alavancar o mercado de capitais. Embora existam há cerca de dez anos no Brasil, os ETFs de renda variável ainda engatinham. Ao todo, existem apenas16 fundos da categoria listados na BM&FBovespa.

Confira as principais mudanças

Os RPPS não precisarão regularizar desenquadramentos passivos que chegarem a até 25% do limite autorizado para aplicações no produto. O que passar dessa margem deverá ser enquadrado em até 180 dias
O cálculo do limite de alocação em um Fidcs deve levar em consideração apenas o volume de cotas sêniores, e não mais o patrimônio total do fundo
É permitido investir até 80% do patrimônio em um ETF de renda fixa que aloca 100% em títulos públicos.
Os regimes próprios podem aplicar o mesmo limite autorizado para poupança em Letras Imobiliárias Garantidas (Ligs), assim que o produto for regulamentado e ofertado.